Discurso durante a 37ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Críticas às tentativas de interrupção do mandado da Presidente da República.

Autor
Paulo Rocha (PT - Partido dos Trabalhadores/PA)
Nome completo: Paulo Roberto Galvão da Rocha
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Críticas às tentativas de interrupção do mandado da Presidente da República.
Publicação
Publicação no DSF de 24/03/2016 - Página 67
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • CRITICA, IMPEACHMENT, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, DEFESA, ENTENDIMENTO, GOLPE DE ESTADO, AMEAÇA, DEMOCRACIA, PAIS.

    O SR. PAULO ROCHA (Bloco Apoio Governo/PT - PA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Presidente, obrigado pela atenção e por me conceder, no final do expediente, este pronunciamento que eu queria fazer.

    Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a crescente resistência ao golpe e à defesa da democracia brasileira não são apenas nacionais, são também internacionais. Com efeito, representantes de vários órgãos e instituições internacionais vêm se manifestando contra o golpe e os arbítrios cometidos contra o Estado democrático de direito e os direitos e garantias fundamentais.

    Luis Almagro, Diretor Geral da Organização dos Estados Americanos - OEA, afirmou em nota oficial que o mandato constitucional de Dilma Rousseff deve ser assegurado. E em uma clara referência aos arbítrios de juízes de primeira instância no Brasil, ressaltou que nenhum juiz está acima da lei.

    A Chanceler do governo conservador de Macri, Susana Malcorra, afirmou que o Mercosul pode usar da cláusula democrática do Protocolo de Ushuaia caso haja rompimento de ordem constitucional no Brasil.

    Ernesto Samper, Secretário Geral da Unasul, afirmou recentemente que "Lula goza de toda a sua confiança, mas que ele sofre, infelizmente, uma perseguição midiática em seu próprio País."

    A própria Cepal, organização especializada da ONU, através da sua Diretora Alicia Bárcena, se pronunciou ontem, declarando que "Dilma sofre julgamento sem provas e ataque midiático."

    Em carta oficial, a Cepal assim se manifestou:

A soberania popular, a única fonte de legitimidade em uma democracia, elegeu Lula antes e depois a Presidente Dilma Rousseff, em mandato constitucional que resultou em governos comprometidos com justiça e igualdade.

Nunca na história do Brasil, tantos e tantos de seus compatriotas tinham conseguido superar a fome, a pobreza e a desigualdade. Significativo é, para nós, o marco decisivo com o qual reforçou a nova arquitetura da integração da nossa região, da Celac e da Unasul.

Sabemos dos esforços dos tribunais para perseguir e punir a cultura de práticas de corrupção que têm sido historicamente a parte mais opaca da ligação entre os interesses privados e instituições do Estado. Vimos apoiando permanentemente esta tarefa com coragem e honestidade, que é a marca de sua biografia, apoiando a criação de nova legislação e exigindo mais fortes instituições de controle.

É por isso que nos violenta hoje, que sem julgamento ou evidência, usando vazamentos e uma ofensiva de mídia que já emitiu convicção, se tente demolir sua imagem e legado, enquanto os esforços são multiplicados por minar a autoridade presidencial e encerrar o mandato conferido aos cidadãos nas urnas.

    Os eventos que estão sendo experimentados pelo Brasil nos dias de hoje ressoam com força além de suas fronteiras e ilustram para o conjunto da América Latina os riscos e as dificuldades a que a nossa democracia ainda está exposta.

    Ex-chefes de Estado e de governo de diversos países da Europa e da América Latina também publicaram uma declaração de apoio ao ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Entre os 14 primeiros signatários estão José Pepe Mujica, ex-Presidente do Uruguai; Cristina Kírchner, ex-Presidenta da Argentina e Felipe González, ex-Presidente de governo da Espanha. Firmaram também a declaração, entre vários outros ex-mandatários, Massímo d'Alema, Itália, José Miguel Insulza (OEA) e Ricardo Lagos do Chile.

    Na declaração, os ex-mandatários afirmaram, a respeito de Lula, que seu Governo aprofundou a democracia, estimulando a diversidade política e cultural do País, a transparência do Estado e da vida pública. O Executivo, o Ministério Público e o Poder Judiciário puderam realizar investigações de atos de corrupção eventualmente ocorridos na Administração Direta ou Indireta do Estado.

    Preocupa a opinião democrática internacional, no entanto, a tentativa de alguns setores de destruir a imagem desse grande brasileiro. Evo Morales, Nicolás Maduro, Rafael Correa e outros Chefes de Governo já se declaram empenhados na defesa internacional da democracia brasileira em todas as instâncias internacionais.

    Adolfo Pérez Esquivel, Prêmio Nobel da Paz, se pronunciou contra o golpe que está sendo gestado. Em sua manifestação, o Prêmio Nobel afirmou que a corrupção não se combate violando a Constituição, se combate com transparência e mais democracia. A transparência não só do Executivo, mas também do Judiciário poderoso e de seus funcionários.

    O progressismo latino-americano sabe perder eleições porque é democrático. As últimas apertadas eleições na Argentina e na Bolívia são outro claro e recente exemplo disso. Aqueles que não sabem perder e apoiam o novo golpismo em nome da democracia, de sua vocação autoritária ou de sua impoluta moralidade não são muito diferentes daqueles que antes apoiavam ou se calavam diante das ditaduras genocidas do nosso continente.

    Os próprios meios de comunicação internacionais mais independentes, como o jornal britânico The Guardian, a revista alemã Der Spiegel, o jornal francês Le Monde, o jornal espanhol El País e muitos outros, já fazem reportagens e matérias questionando fortemente o processo de golpe no Brasil.

    A Der Spiegel já está chamando o impeachment de golpe frio. E é preciso lembrar que tanto o Mercosul como a Unasul e a OEA possuem cláusulas democráticas que poderiam ser acionadas caso o golpe vingue.

    De fato, as consequências nefastas do golpe não ficariam restritas somente à ordem interna. O Brasil muito provavelmente também sofreria com desdobramentos profundamente negativos no plano internacional, além da vergonha de retroceder à condição de uma republiqueta, que, perante a opinião pública mundial, faria com que o País, quase que certamente, arcasse com o peso de um isolamento diplomático no plano regional e internacional.

    Deve-se recordar que o Paraguai, após promover o "golpe de Estado parlamentar" contra o Presidente Lugo, em 2012, foi suspenso, por unanimidade, tanto do Mercosul, quanto da Unasul.

    No caso do golpe contra Zelaya, em Honduras, no ano de 2009, esse País também foi suspenso da OEA, também pela unanimidade dos países votantes.

    Em ambos os casos, os golpes tinham a forma de destruições conduzidas dentro da ordem constitucional e legal daqueles países.

    Contudo, esse verniz constitucional e jurídico não convenceu ninguém. Prevaleceu o entendimento de que ocorrera agressão contra o mandato popular e o governante legítimo. Não há por que pensar que no caso do Brasil o entendimento seria diferente. Até mesmo o New York Times, jornal conservador, afirmou em editorial recente, que não há motivo para a deposição da Presidenta. Mesmo que não houvesse confirmação formal ou possível golpe, o mal-estar diplomático seria duradouro.

    Convenhamos, uma tentativa de deposição da Presidenta, inequivocamente honesta, conduzida pelo atual Presidente da Câmara dos Deputados, denunciado em diversos processos criminais, seria motivo de chacota em todo o mundo, seria uma piada pronta a percorrer o Planeta.

    Por isso, crescem no mundo todo as manifestações contra o golpe, contra os arbítrios cometidos contra os direitos fundamentais e, sobretudo, as declarações de apreço ao Brasil e a sua democracia, pois é disso de que se trata.

    Não é necessário ter apreço por Dilma ou pelo seu Governo. Trata-se de ter apreço pela democracia e pelos direitos e garantias fundamentais. O golpe, se concretizado, nos igualaria a países e criaria uma fratura política de difícil superação.

    A crise tenderia a se prolongar e a governabilidade ficaria comprometida com uma espada de Dâmocles, que nos ameaçaria com constantes golpes parlamentares os quais poderiam se realizar ao sabor das crises políticas artificialmente gestadas no bojo do presidencialismo de coalizão.

    Golpe não é a solução para a crise e seu agravamento e prolongamento.

    Vivemos agora uma situação parecida à que os ingleses viveram em Agincourt, se defrontando com as tropas mais numerosas e bem armadas dos franceses.

    O mais importante é ter convicção de que se trata, de que se está do lado certo. O decisivo não é o julgamento conjuntural da mídia venal e dos cultores do ódio; é o julgamento da história, que, no longo prazo, condenará implacavelmente os que se colocaram contra a democracia. Como escreveu Shakespeare em Henrique V, a respeito da batalha de Agincourt: "O fundamental está entre os poucos, os poucos afortunados, o bando de irmãos e irmãs que tiverem a coragem e a glória de enfrentar adversários mais poderosos em nome de uma causa justa."

    Eles venceram, e nós também poderemos vencer. A democracia, no nosso País, pode vencer. A democracia vencerá!

    Muito obrigado, Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/03/2016 - Página 67