Pronunciamento de Gleisi Hoffmann em 04/04/2016
Discurso durante a 43ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal
Considerações sobre o editorial do jornal Folha de São Paulo que recomenda o pedido de renúncia de S. Exª. Dilma Rousseff, Presidente República, e defesa da insustentabilidade jurídica para o impeachment.
Comentário sobre os sinais de recuperação apresentados pela economia brasileira e defesa da utilização do superávit primário para manutenção do emprego e da renda da população.
- Autor
- Gleisi Hoffmann (PT - Partido dos Trabalhadores/PR)
- Nome completo: Gleisi Helena Hoffmann
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
GOVERNO FEDERAL:
- Considerações sobre o editorial do jornal Folha de São Paulo que recomenda o pedido de renúncia de S. Exª. Dilma Rousseff, Presidente República, e defesa da insustentabilidade jurídica para o impeachment.
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ECONOMIA:
- Comentário sobre os sinais de recuperação apresentados pela economia brasileira e defesa da utilização do superávit primário para manutenção do emprego e da renda da população.
- Aparteantes
- José Medeiros.
- Publicação
- Publicação no DSF de 05/04/2016 - Página 39
- Assuntos
- Outros > GOVERNO FEDERAL
- Outros > ECONOMIA
- Indexação
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- COMENTARIO, EDITORIAL, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ASSUNTO, PEDIDO, RENUNCIA, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, CRITICA, AUSENCIA, FUNDAMENTAÇÃO JURIDICA, PROCESSO, IMPEACHMENT.
- COMENTARIO, SINALIZAÇÃO, RECUPERAÇÃO, ECONOMIA NACIONAL, DEFESA, UTILIZAÇÃO, SUPERAVIT, OBJETIVO, MANUTENÇÃO, EMPREGO, RENDA.
A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Apoio Governo/PT - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Obrigada, Senador Paim, que preside esta sessão. Srs. Senadores, Srªs Senadoras, quem nos assiste pela TV Senado, quem nos ouve pela Rádio Senado.
Eu queria também fazer um comentário político dessa semana que passou, dos últimos acontecimentos, começando, como fez aqui o Senador Humberto, pelo editorial do jornal Folha de S.Paulo, porque eu o acho muito simbólico do momento que nós passamos a viver depois desse final de semana.
Para mim, está muito claro que a manifestação da Folha de S.Paulo, através do seu editorial na primeira capa, dá conta de que o impeachment não se sustenta, ou seja, que nós não teremos impeachment. Por isso, a Folha de S.Paulo vai logo tentando dar uma alternativa à situação, querendo a renúncia da Presidenta Dilma, também do Vice-Presidente Temer, para que a gente possa ter uma nova eleição. Eu disse que era uma sugestão torta porque é uma eleição só para a Presidência da República.
Ora, se nós queremos uma nova eleição ou se a Folha de S.Paulo acha que a nova eleição é a que pode realmente trazer ao País condições de governabilidade, então que se faça uma eleição geral. Como disse aqui o Senador Humberto Costa, qual é a moral do Congresso Nacional para apontar o dedo à Presidente da República e não fazer a sua autocrítica? Aí poderíamos até, eventualmente, concordar com essa posição de fazer uma eleição.
Mas eu acredito que não vai ter impeachment. Não vai por alguns motivos muito claros. E a Folha de S.Paulo só fez no seu editorial estabelecer ou mostrar isso. O primeiro motivo: as manifestações foram fortes e claras em defesa da democracia nas ruas. Não se esperava que tivessem manifestações de rua com a força que nós tivemos, como as manifestações de sexta-feira e mesmo do dia 18 de março.
Tivemos posicionamento de várias entidades. A CNBB se posicionou, outras entidades, como os movimentos dos trabalhadores rurais sem terra, os sindicatos, todos firmemente na defesa da democracia. Os artistas e os intelectuais foram ao Palácio do Planalto, vieram aqui falar conosco, com o Presidente Renan, dizendo que não admitiam um golpe, que a Presidenta foi eleita por 54 milhões de pessoas, que tinha que terminar o seu mandato e que a conquista da democracia custou muito caro a todos. Nós já vivemos um período de exceção e já vivemos um período de ditadura.
E vários juristas. Aliás, tivemos agora, parece-me, que um abaixo-assinado de mais de três mil juristas defendendo o Estado democrático de direito. Isso tudo foi importantíssimo para que a sociedade ficasse alerta de que esse processo de impeachment não era um direito constitucional sendo exercido e sim um golpe sendo dado à democracia, a duras penas conquistada.
Outro aspecto que levou a murchar, como eu disse inclusive no posicionamento que fiz neste final de semana, o processo de impeachment foi a convenção relâmpago do PMDB. Na realidade ela foi muito rápida, desrespeitosa até com a sociedade, porque não explicou o motivo de um partido que fica tantos anos no Governo, por que sai daquela forma. E a foto do evento, que falou por si, deu inclusive na manifestação do Ministro Barroso: "Meu Deus do céu, essa é a nossa alternativa de poder?"
Isso tudo, juntadas as manifestações, deu esse processo de enfraquecimento do impeachment. E, por outro lado, a resistência de parte muito grande do próprio PMDB, dos Ministros do PMDB em deixar o Governo, as críticas do próprio Presidente do Senado, Renan Calheiros, de que a decisão foi um erro e foi precipitada. Penso que o Vice-Presidente Michel Temer acabou perdendo o jogo e até certa parte de respeito que tinha na sociedade.
Então esse conjunto de fatores, com certeza, influenciou muito para que um jornal do tamanho da Folha de S.Paulo estampasse na primeira página seu editorial dizendo que deveria ser feita a renúncia da Presidenta.
E de pronto a Presidenta falou que não ia renunciar, que ela teve o seu mandato concedido pelos brasileiros e pelas brasileiras e que esse mandato vai ser exercido.
Eu não tenho dúvidas, Senador Paim, de que nós vamos vencer o impeachment. Vamos vencer esse impeachment e começar uma fase nova para o Brasil.
Eu queria falar um pouquinho daquilo que para mim é muito importante, que é a economia deste País, porque é a economia que mexe com a vida das pessoas, é a economia que mexe com a vida dos trabalhadores, é a economia que dá o sustento das famílias, é a economia que faz o desenvolvimento do nosso Brasil.
É certo, Senador Paim, que nós vivemos uma crise econômica. E ela é grave. Já disse isso desta tribuna. Diria que é maior do que as vividas nas décadas de 80 e 90, como eu já disse aqui. Uma crise que não é só brasileira. Ela afeta o sistema capitalista mundial.
No Brasil esse ciclo da crise não é sistêmico, como aconteceu em outras ocasiões. Também já disse isso. E por que ele não é sistêmico? Porque ele não atinge todas as regiões, todos os Estados brasileiros e todas as pessoas de maneira igual. E tampouco está deixando o País fragilizado no plano externo. Por quê? Porque nós conseguimos, ao longo dos últimos anos, dar respostas mais eficientes às situações de crise.
Por exemplo, nós conseguimos construir um conjunto de políticas estruturais que amortecem, para uma parcela considerável da população, os efeitos nefastos dessas crises cíclicas e nos protegem das especulações do capital externo.
As reservas internacionais são um grande exemplo disso. Na casa dos R$370 bilhões, dão credibilidade aos investimentos externos. E a rede de proteção social, através do Bolsa Família, maior inclusão previdenciária, valorização do salário mínimo, que protege os mais pobres, e a diversificação da economia que nós experimentamos nos últimos 13 anos são pilares fortes, que nos permitem enfrentar a crise em curso, minimizando o seu impacto.
Eu não fecho os olhos às nossas dificuldades. Sei que o desemprego aumentou muito em algumas regiões, que a indústria brasileira está indo de mal a pior, embora não seja em todos os setores, que temos inflação alta, mas começa a se tornar evidente que o Brasil tem respondido melhor à crise do que em anos anteriores. Em razão disso, eu sou tão crítica às posições dos que querem cortar direitos adquiridos pelos trabalhadores e pelo povo mais pobre, com o intuito de reduzir déficits orçamentários ou, nesse momento, mesmo usar as reservas internacionais para o expansionismo fiscal para despesas.
Nas últimas duas semanas, nós recebemos, na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado Federal, Sr. Presidente, o Presidente do Banco Central, Ministro Alexandre Tombini, e o Ministro da Fazenda, Nelson Barbosa. Ambos falaram do início da retomada da economia, com indicadores claros de que isso está acontecendo.
O problema é que a retórica pessimista e agourenta não alivia. Assim, as boas notícias na área da economia ficam embaçadas, escondidas. Mas eu queria destacá-las aqui novamente, porque o nosso povo precisa saber que nós estamos fazendo um caminho de recuperação da economia do País, e a área externa é a que mostra recuperação mais acentuada, e ela é muito importante para nós.
Então, além de continuarmos com as altas reservas em dólares, hoje nós temos superávit na balança comercial, recuperação significativa no balanço de pagamentos, os investimentos estrangeiros diretos estão na casa de Us$75 bilhões, e fizemos uma oferta de títulos do Tesouro que teve demanda quatro vezes maior do que a oferta. Isso tudo comprova o interesse do investidor externo no Brasil.
Qual seria o investidor que colocaria aqui seu dinheiro se nós não tivéssemos reservas para garanti-lo ou se não tivéssemos estabilidade institucional?
No plano interno, a inflação começa a cair, abrindo importante caminho para a redução dos juros. Além disso, teremos redução no preço da energia - já tivemos em março, vamos ter em abril -, aumento de crédito para diversos setores, e o Governo continua sustentando suas políticas sociais: Bolsa Família, inclusão previdenciária, valorização do salário mínimo, Minha Casa, Minha Vida, entre outros. Isso vai manter uma proteção social mínima às pessoas mais vulneráveis nesse momento que passamos na crise.
Por isso está certo, Sr. Presidente, o Governo ao mandar para o Congresso Nacional a proposta de não cumprir o superávit primário este ano. A prioridade deve ser proteger o emprego e a renda. Às vezes, eu vejo aqui alguns Senadores comentarem que a gente não pode abrir mão do superávit fiscal, que a gente tem que gastar o que tem. É verdade que temos que gastar o que tem, mas, se temos que manter uma família e pagar uma dívida e o nosso orçamento está apertado, é melhor nós negociarmos com o credor e colocar a comida em casa para os nossos filhos não perecerem. É assim que eu penso, e é assim que tem que pensar o Governo.
Então, neste momento, é melhor fazer um déficit, conversar com os nossos credores, alongar um pouco essa dívida, mas manter as políticas que dão condições, emprego e renda para a população. Esse é o nosso papel.
Um complicador neste momento, Sr. Presidente, é a crise na política, porque, enquanto em várias ocasiões a política soube trabalhar para vencer crises, desta vez a política está atrapalhando a solução para a economia. O inconformismo das derrotas na eleição de 2014 e os erros políticos do Governo mesmo nos levaram a um impasse que atrasa o País.
Derrotada essa pauta do impeachment - e vai ser derrotada -, nós precisamos abrir o caminho para a retomada do diálogo e do esforço político para melhorar a economia e a vida do povo brasileiro. É essa a nossa função nesta Casa, é esse o papel que nós temos como Senadores da República.
O Sr. José Medeiros (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - MT) - Concede-me um aparte, Senadora?
A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Concedo um aparte, sim, Senador.
O Sr. José Medeiros (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - MT) - Senadora, V. Exª tocou num ponto chave. Talvez seja o nosso grande problema - talvez não, com certeza -, seja justamente essa dívida que nos assola, que corrói as estruturas do País, porque hoje boa parte do que fazemos, como V. Exª disse, é para superávit primário, é para pagar juros. Recentemente, a nossa preocupação era colocar para que a Presidente pudesse solicitar uma auditoria dessa dívida pública. Infelizmente, a Presidente Dilma vetou esse artigo. Espero que V. Exª ajude a derrubar o veto, porque nós precisamos, sim, falar dessa dívida pública. Não é possível. E V. Exª colocou, quando a gente está em dificuldade, a gente vai negociar, a gente vai renegociar com os credores. E todos os países que fizeram uma renegociação, fazendo uma auditoria, descobriram que a dívida não era bem aquela, e não estou falando do Governo do PT. Desde que essa dívida começou, bem, mas muito, lá atrás, todos os que entendem desse sistema dizem que ela precisa ser auditada, porque nós não devemos isso tudo. E, neste momento... Mas, infelizmente, a Presidência da República entendeu de outra forma e vetou justamente a parte que falava da auditoria da dívida. Mas fica aqui esse relato, porque nós, daqui a uns dias, já vamos estar com 100% do PIB comprometido com essa questão dessa dívida pública, que só cresce. A cada ano fiscal, nós ficamos devendo mais e, daqui a pouco, nós já não vamos poder mais, o País, andar com uma carga tão pesada nos ombros dessa forma. Muito obrigado.
A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Agradeço o aparte, Senador José Medeiros, mas, na realidade, o que nós precisaríamos era ter, na época das décadas de 70 e 80, feito auditoria na dívida externa. Essa, sim, precisaria de uma auditoria minuciosa, mas com o tempo, já, no governo do Presidente Fernando Henrique e, depois, no do Presidente Lula, essa dívida foi praticamente eliminada. Hoje, a nossa dívida externa é muito menor do que os valores que nós temos em reservas internacionais.
Então, pode-se dizer que o Brasil praticamente não tem dívida. O que nós temos é uma grande dívida interna, que é a dívida mobiliária, emissão de títulos pelo Tesouro, emissão de títulos pelo Banco Central, que seja para ajustar a política cambial, seja para financiar a própria rolagem da dívida.
O Sr. José Medeiros (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - MT) - É, o erro foi internalizar uma dívida externa.
A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Não, nós não internalizamos a dívida externa. Na realidade, nós conseguimos pagar grande parte da dívida externa. O que a gente fez foi, no Plano Real, ao fazer a estabilidade da economia, primeiro, nós não emitimos mais moeda; segundo, colocamos muitos títulos públicos, para poder acertar a questão dos Estados, porque a União recebeu todas as dívidas dos Estados, como determinou a Lei de Responsabilidade Fiscal, e fizemos a consolidação da dívida para equacionar e renegociar. Então, era uma dívida interna mesmo, e isso foi quando foi implantado o Plano Real.
Então, o que acontece? Nós estamos administrando essa dívida, mas a boa notícia, Senador José Medeiros, é que em 2003 essa dívida líquida perfazia cerca de 65% do Produto Interno Bruto brasileiro. Hoje, essa dívida líquida está na casa dos 35%, 36%.
Nós temos um aumento da dívida bruta, estávamos com 68%, hoje, está um pouco mais de 70%. Agora, se você for pegar todos os países de Primeiro Mundo, os países desenvolvidos, nenhum deles tem dívida bruta abaixo de 80%, de 90% do seu PIB. Aliás, os americanos têm uma dívida de quase 200% do seu PIB.
Não estou dizendo que nós tenhamos que chegar a isso, nem estou dizendo que a dívida é um mal em si. Se precisamos de grandes investimentos, muitas vezes não há condições, de, com o orçamento corrente, fazer. O grande problema nosso com relação à dívida são os juros, que são muito altos: o Brasil tem juros de 14,25% ao ano, quer dizer, são os juros mais altos do mundo.
Então, com certeza, isso eleva muito o valor da nossa dívida. Há um impacto no Orçamento, para não deixar a dívida crescer, porque aí você tem que ficar pagando mais juros, e a administração desse orçamento. Por isso é que eu estou dizendo aqui que é correto, quando a gente chega, num momento de crise, como o que estamos, dizer o seguinte: vamos fazer um de déficit um pouco aqui, e aí a gente resolve, nem que aumento um pouco a dívida, pois ela vai passar de setenta e poucos por cento para setenta e poucos por cento e meio do Produto Interno Bruto, mas a gente segura esse momento para garantir emprego e renda.
O que nós não podemos é mexer com as reservas internacionais - com isso, eu concordo plenamente! Até não teria sentido trazer reservas internacionais para fazer investimentos no País, quando muito a reserva internacional serviria para pagar a dívida bruta, porque a reserva internacional está ligada à dívida bruta. Quanto maior a minha dívida bruta, maior a minha reserva internacional, é assim que funciona.
Então, a gente está com um equilíbrio de contas externas por conta disso. Assim, tirar dinheiro das reservas internacionais é temerário, mas fazer déficit não é problema. Superávit não é um valor em si; ele é um instrumento de política fiscal.
Então, às vezes, eu vejo o pessoal repetindo aqui: "Não, não podemos fazer déficit!" Isso faz parte. A administração você faz de acordo com a sua realidade econômica conjuntural.
Por isso, eu quero reafirmar aqui que está correto o Governo. Nós temos que manter firmes esses dois pilares que estão fazendo com que nós enfrentemos diferentemente a crise na economia brasileira: o primeiro pilar são as nossas reservas internacionais, que nos protegem de uma crise de especulação externa; e o segundo pilar são as políticas de proteção social - é o Bolsa Família, a valorização do salário mínimo, os programas de investimentos, como o Minha Casa, Minha Vida -, porque eles protegem a maioria da população desta crise extrema. Mesmo enfrentando o aumento do desemprego, que não chega nem perto do que foi na década de 80 e 90, não se sente como tão grandes os efeitos na geração de miséria e de extrema pobreza, e, por esse motivo, isso é importante.
Então, eu queria deixar registrado aqui, Sr. Presidente, o acerto dessa política e dizer que, passado o impeachment, nós temos, sim, uma política econômica que está provocando efeitos no Brasil, que, infelizmente, está embaçada pela crise política, mas nós estamos começando a recuperar. E nós precisamos, sim, retomar o diálogo, Senador José Medeiros, e o esforço com todas as forças políticas e setores da sociedade, para fortalecer essa retomada do desenvolvimento econômico brasileiro.
Muito obrigada, Senador Paim.