Discurso durante a 41ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Registro de manifestações de segmentos da sociedade contrários ao impeachment da Presidente da República.

Autor
Gleisi Hoffmann (PT - Partido dos Trabalhadores/PR)
Nome completo: Gleisi Helena Hoffmann
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Registro de manifestações de segmentos da sociedade contrários ao impeachment da Presidente da República.
Aparteantes
Cristovam Buarque, Cássio Cunha Lima, José Pimentel, Reguffe.
Publicação
Publicação no DSF de 01/04/2016 - Página 33
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • DEFESA, GESTÃO, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, ADMINISTRAÇÃO PUBLICA, PAIS, COMENTARIO, MANIFESTAÇÃO COLETIVA, POPULAÇÃO, REFERENCIA, REPUDIO, POSSIBILIDADE, GOLPE DE ESTADO, BRASIL.

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Apoio Governo/PT - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Srs. Senadores, Srªs Senadoras, quem nos ouve pela Rádio Senado e nos vê pela TV Senado, é claro que eu não poderia subir à tribuna hoje sem falar do tema do momento.

    Primeiro, a data histórica que nós temos hoje: 52 anos do golpe militar que houve, que ceifou a nossa democracia e nos deixou com uma jovem democracia até aqui, uma democracia de 31 anos, em que vivemos. Então, eu não podia deixar de registrar isso. E há a coincidência dos fatos e da história: no mesmo dia 31 de março, nós estamos debatendo aqui a possibilidade efetiva do Brasil sofrer um golpe. E, na minha opinião, é um golpe pior do que o golpe militar, porque é um golpe travestido com as cores democráticas, como disse a Presidenta Dilma, ou seja, é uma intervenção civil, que no fundo retira os direitos e as garantias fundamentais - uma delas, o voto, a eleição pelo voto direto. Então, eu quero aqui deixar registrado que hoje é um momento histórico que nós estamos vivendo.

    E eu quero deixar registrado que essa discussão que nós trazemos aqui do golpe, do questionamento que nós fazemos a esse processo de impeachment não é algo só por parte do PT, do PCdoB, de partidos que são aliados da Presidenta Dilma ou da esquerda brasileira. Nós estamos vendo vários setores da sociedade que necessariamente não apoiam politicamente a Presidenta, mas que sabem o que está em risco no Brasil com um retrocesso desses, caso um impeachment seja aprovado sem base legal e constitucional.

    Ontem, eu participei de um ato muito bonito lá Câmara dos Deputados: um encontro do Comitê Nacional de Respeito à Diversidade Religiosa, Senador Paim. Estavam lá todas as religiões - católica, espírita, umbanda, candomblé e evangélica - e todos irmanados. Eu disse que era um encontro bonito, porque era um encontro de pessoas unidas por Deus pela democracia. E eles diziam exatamente isto: a democracia é fundamental para a diversidade religiosa, é o Estado democrático de direitos, com os direitos das pessoas, que dá direito à manifestação religiosa. Senão, poderíamos descambar para uma intolerância religiosa - aliás, já há demonstrações disso na sociedade. E é a democracia, com o nosso regramento jurídico e constitucional, que dá sustentação a essas pessoas de se manifestarem pela religião que elas se expressam melhor em relação a Deus. Então, foi um ato bonito. E não havia pessoas só do PT, não havia pessoas só de esquerda, não havia pessoas só de partidos aliados. Eram pessoas que estavam lá para defender o seu direito, o direito à religiosidade.

    Eu participei também, agora há pouco, com o Senador Renan, na Presidência da Casa, de um encontro de artistas. Os artistas foram ao Palácio do Planalto levar um apoio à Presidenta Dilma e se manifestar contra o impeachment. Foram vários artistas. Estavam lá a Beth Carvalho, o Sérgio Mamberti, os cineastas Luiz Carlos Barreto e Ana Maria Magalhães, o Antônio Pitanga, a Letícia Sabatella. Enfim, foram vários artistas, não tenho a relação de todos aqui. E me impactaram duas colocações que foram feitas lá. A primeira foi feita pela Beth Carvalho, que foi, inclusive, graciosa; ela virou para o Presidente Renan e disse assim:

Presente Renan, eu, desde a época das Diretas, faço show neste País. Faço show para o PMDB, um Partido que eu gosto, um Partido que nasceu da democracia, que sempre afirmou a necessidade do regramento democrático. E defendi essa bandeira no Brasil inteiro fazendo show. E, agora, eu vejo aqui que setores do PMDB estão juntos para dar um golpe na Constituição brasileira, para retirar alguém foi legitimamente eleito pelas urnas, através de um impeachment que não tem base constitucional. E para subir quem? Quem não teve votos nas urnas ou que também tem grandes questionamentos, inclusive políticos. O senhor não acha que isso é um golpe?

    Aí todo mundo riu, porque o Presidente a estava ouvindo pacienciosamente. Depois, conversou a respeito.

    E é verdade. A Beth Carvalho é um sinônimo da luta democrática do povo brasileiro. Ela andou por este País. Ela tem legitimidade e autoridade de chegar a esta Casa e de cobrar um posicionamento não só do PMDB, mas do Congresso Nacional, porque ela foi lá, mostrou a cara, defendeu a democracia, brigou contra a ditadura. E, se ela fez isso e tem no seu histórico essa caminhada, é porque ela está falando com razão. Eles têm medo do que pode acontecer a partir do momento em que um impeachment sem base constitucional e legal aconteça no Brasil.

    E aí a Ana Maria Magalhães, cineasta, disse: "Meu pai foi Deputado. E foi Deputado na época do golpe militar. Eu vivi aquele momento. Era tão parecido com o que nós vivemos agora". E ela recordou uma manchete, Senador Paim, da Folha de S.Paulo que dizia que o décimo terceiro salário tinha sido instituído e iria quebrar empresas. Era isso, porque foi João Goulart, Jango, que instituiu o décimo terceiro salário. Naquela época, era uma luta ferrenha contra a corrupção, porque se dizia que o governo do Jango era o mais corrupto que tinha existido na história, o mesmo discurso que se diz agora, mas havia, sobretudo, uma resistência muito grande a que os direitos sociais avançassem. Eu lembro que na época havia uma luta grande pela reforma agrária. Isso foi um dos motivos também que "coesionou" uma parte conservadora da sociedade contra o governo João Goulart. E aí a Ana Maria Magalhães lembrou a manchete da Folha de S.Paulo que dizia que décimo terceiro salário tinha sido aprovado e iria prejudicar as empresas do País. Era como se fosse algo que realmente fosse contra a democracia. E era contra os direitos trabalhistas. Veja: quando dizemos que isso é golpe, é porque todos os ingredientes que estão colocados na imprensa, nos debates, nas discussões remetem àquela época. E ela disse que a situação hoje é pior, porque, naquela época, foi um golpe militar. Então, os militares vieram com as armas, tomaram conta do País, e ninguém podia falar nada. Inclusive, o Congresso Nacional ajudou, porque o Presidente do Congresso Nacional encerrou uma sessão, apagou as luzes da Casa, foi embora, disse que ninguém mais podia questionar e declarou vaga a Presidência da República. Foi isso que aconteceu. Foi um golpe militar, mas foi muito claro isso. Então, depois de a sociedade ver o que tinha acontecido, inclusive setores que apoiaram esse golpe em nome da democracia, como a Ordem dos Advogados do Brasil e alguns jornais, alguns órgãos de comunicação, viram o que tinha acontecido, começou-se uma resistência no País.

    A Ana Maria Magalhães diz que agora é muito pior, porque o golpe que vem é revestido pelas cores democráticas e não tem vestimenta militar. Ele é civil. Então, nós estamos fazendo uma alteração da nossa Constituição, na prática, para justificar a retirada de uma Presidenta que foi eleita com 54 milhões de votos para quê? Para, no fundo, poder fazer um grande acordo, que é o que vai acontecer, para ter retrocesso em direitos conquistados, porque é verdade, Senador Paim, isso que o Senador Lindbergh disse aqui, isso que ele leu.

    Eu não estou dizendo que isso é a proposta do PMDB, porque sei que não há unidade no PMDB sobre isso. O Senador Requião já se manifestou. Outros Senadores já se manifestaram. Já conversei também com o Senador Lobão, que está aqui e esteve junto conosco na briga pela defesa do pré-sal.

    Enfim, sei que não há unanimidade, mas é grave o que está escrito ali, porque é exatamente o que ele relatou aqui, como é grave a entrevista que o ex-Ministro Moreira Franco deu para o jornal O Estado de S. Paulo. Não estamos mentindo aqui. Ele falou que o Bolsa Família tinha que ser reduzido aos 10% mais pobres da população. Como vamos cortar 30 milhões de pessoas do Bolsa Família hoje se é esse programa que está enfrentando a situação conjuntural de desemprego que nós temos? Como vamos dizer isso para a sociedade? Para fazer que tipo de equilíbrio fiscal?

    É verdade que também foi o ex-Ministro Moreira Franco que disse que já há um consenso de que é preciso rever subsídios. Um deles é o uso do FGTS para financiar o programa Minha Casa, Minha Vida. Não sou eu que estou dizendo. Não é o PT. Foi o ex-Ministro Moreira Franco, que é Coordenador da Fundação Ulysses Guimarães, do PMDB, e que estava coordenando esse programa Uma Ponte para o Futuro.

    Então, nós precisamos ter claro o que está em jogo. É por isso que os artistas estão se mobilizando. É por isso que os religiosos estão se mobilizando. A CNBB não se coloca contra o golpe porque é a favor da Dilma, do PT ou do Lula. Muitas vezes, a CNBB fez críticas ao Governo e, aliás, continua fazendo, porque tem críticas a determinadas políticas econômicas, tem críticas a determinados programas, mas se coloca contra porque está vendo que a história está se repetindo. Como dizia Marx, se repete em farsa. A história está se repetindo.

    Hoje nós tivemos um encontro maravilhoso na CDH. Quero parabenizar V. Exª pelo encontro e pelo lançamento da Frente Parlamentar Mista em defesa da classe trabalhadora, dos interesses da classe trabalhadora. Estavam lá representantes de todos os sindicatos dos trabalhadores - não eram só do PT -, inclusive muitos que já foram e são críticos até a políticas do Governo. Mas todos - todos! - uníssonos, dizem que os direitos só vão ser mantidos se a democracia persistir. Não há direitos fora da democracia, porque não há direito à expressão, não há direito à legalidade, não há direito à base constitucional. Onde a lei não é respeitada, não há direito.

    Então, é importante a gente ter clareza de que o que nós estamos falando desta tribuna não é um discurso fácil, não é nós contra eles, não é de dizer que nós queremos defender a Presidenta ou o PT a qualquer custo para que fique. Não. É muito sério o que nós estamos vivendo no País hoje, porque, se for perpetuado esse impeachment, vai ser contra a Constituição, contra a lei e vai ser principalmente para dar guarida a uma grande retirada de direitos do povo brasileiro.

    Na questão econômica, se nós estamos vivendo um momento conjuntural difícil, nós vamos passá-lo, até porque foi este Governo, Governo do Lula, Governo da Dilma, que criou 20 milhões de empregos neste País. E V. Exª, Senador Paim, sabe disso, sabe o que era o desemprego na década de 90. Vinte milhões de empregos. Foi este Governo que reduziu a taxa de juros, mesmo tendo uma taxa alta hoje, uma taxa que realmente eu também acho que tem de reduzir, mas ela é menos da metade da taxa com que o Presidente Lula pegou o Brasil na década de 90, quando saiu a década de 90, em 2003.

    O crédito é a mesma coisa. O povo brasileiro não tinha crédito. Não conseguia comprar um televisor, não conseguia comprar uma geladeira. O micro e pequeno empresário não tinha o direito de chegar num banco para tomar crédito, tampouco o produtor rural, os "pronafianos", o agricultor familiar. Quantas vezes eu ouvi agricultores familiares - tenho certeza de que nós representantes do Sul, principalmente Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, onde há um grande contingente de agricultores familiares -, quantas vezes eu já ouvi e os nossos colegas aqui que são representantes desses Estados já ouviram que um agricultor familiar passava pela porta do Banco do Brasil, olhava para dentro, nas pontas dos pés, para olhar pela janela. O gerente não lhe dava nem um bom-dia. Hoje o agricultor entra no Banco do Brasil. Hoje o agricultor tem acesso ao crédito, ao seguro agrícola. Nós não tínhamos isso.

    Mas do jeito que está aqui, nessa Ponte para o Futuro, do jeito que está escrito nesse programa, vão se rever os subsídios. A agricultura brasileira é subsidiada, muito subsidiada, deveras subsidiada. Nós conseguimos hoje ter competitividade da soja brasileira porque nós temos boa produtividade e porque nós investimos em pesquisa na Embrapa. O País investiu. Mas também porque nós damos crédito aos nossos agricultores, que conseguem exportar, porque, se não houvesse o crédito subsidiado - vou repetir aqui -, subsidiado, nós não teríamos esse desempenho da agricultura brasileira.

    Então é preciso reconhecer isso. Não dá para chegar ao plenário e dizer: "mas temos desemprego, e o que se diz para o desempregado? Temos juros altos e o que se diz?" Dissemos, durante esses últimos 13 anos, o que íamos fazer e fizemos. Se estamos passando por dificuldades hoje, são dificuldades por que o mundo passa. Não são dificuldades só do Brasil. Achar que nós temos o maior problema e que não se tem paralelo da crise brasileira! Ora, podemos cair três anos consecutivos na economia, vai acontecer isso, mas lhe garanto, Senador Paim, que o impacto para o povo brasileiro é muito menor do que foi a crise nos anos 90 em que o PSDB administrou este País, muito menor! Naquela época, tínhamos miséria. Naquela época, o povo brasileiro passava muita fome. Naquela época, não tinha perspectiva alguma. Hoje, não! Hoje, temos um colchão social de proteção. Temos o Bolsa Família. Temos uma previdência que acolhe. Quantos milhões de pessoas colocamos na Previdência Social? Mais de 30 milhões em 13 anos, Senador Paim. São pessoas que ganham um salário mínimo hoje. Setores que não tinham proteção social, como o microempreendedor individual, a dona de casa, o micro e pequeno empresário, e não tinham condições de pagar o INSS, hoje, têm condições e são beneficiários. Hoje, temos programa de proteção social. Não é o que era antes.

    Para aqueles que vêm aqui questionar e dizer que estamos trabalhando com o medo, que estamos levando desesperança, digo que não estamos, não! Estamos trabalhando com a realidade. Estamos mostrando o que era e o que foram esses 13 anos e que temos condições de superar as dificuldades que estamos vivendo. Aliás, foi isso que a população disse em 2014, não porque a população não estivesse decepcionada com a Presidenta Dilma ou até contrária a muitos programas ou até posturas da Presidenta - foi uma eleição muito apertada a eleição de 2014, a Presidenta ganhou por pouco -, mas porque a população sabia que não tinha alternativa melhor, que aqueles que estavam fazendo oposição a ela, que estavam se propondo a governar o País tinham feito um governo e tinham quebrado este País e levado o povo brasileiro a pagar a maior parte do pacote, que é o que está acontecendo agora.

(Soa a campainha.)

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Apoio Governo/PT - PR) - É o que vai acontecer agora, porque esse programa que está aqui a ser implementado pelo Vice-Presidente Michel Temer, se ele vier a assumir - também não acredito que venha -, é um programa que não ganha eleição. É um programa que está sendo corroborado, que está sendo ajudado pela oposição do País, que, aliás, há cerca de duas semanas, já estava praticamente nomeando ministros e estava dando diretrizes à política econômica.

    Então, nós temos que ter clareza do que está em jogo. Não é o discurso fácil, não é o discurso do medo, não é o discurso do "nós contra eles". É o discurso da realidade: realidade é emprego; realidade é programa social; realidade são conquistas.

    Concedo aparte ao Senador Cássio.

    O Sr. Cássio Cunha Lima (Bloco Oposição/PSDB - PB) - Senadora Gleisi, hoje é uma data muito importante para a história do Brasil: 52 anos do golpe militar. Nada a se comemorar em relação a essa data, mas muito, sim, a se celebrar na trajetória do País nesses 52 anos, sobretudo a partir da redemocratização. Se pudéssemos sintetizar essa trajetória histórica, nós poderíamos dividir esse período do País em três grandes momentos. O primeiro momento, claro, foi a conquista da democracia, quando o povo brasileiro conseguiu, com a sua luta e com a participação de muitos, a volta da democracia, o direito ao voto direto para Presidente, e toda a história que nós conhecemos. Conquistada a democracia, o País alcançou outro grande avanço, que foi a estabilidade econômica, que V. Exª não tem a grandeza de reconhecer, construída no governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso e do Presidente Itamar Franco com o Plano Real. O Brasil tinha um cadastro sujo - para fazer uso de uma linguagem muito popular -, e nós estávamos negativados em todos os cadastros, internos e externos. Foi graças ao Plano Real que se conseguiu essa estabilidade econômica, estabilidade fiscal, preparando um terreno para um outro momento importante. E aí, diferentemente de V. Exª que não tem a grandeza de reconhecer os aspectos extremamente positivos do governo Fernando Henrique Cardoso com o Plano Real, eu não tenho dificuldade de reconhecer os avanços sociais do governo do Presidente Lula, que foram importantes para o Brasil e ainda são importantes. Mas, para que esses avanços sociais fossem possíveis, foi preciso um trabalho anterior. Eu acho lastimável ver, ainda a esta altura dos acontecimentos, com tudo que está acontecendo no Brasil, a linha do discurso que V. Exª faz, como se o Brasil tivesse sido descoberto nesses últimos 13 anos. Não! Nos últimos 13 anos, houve alguns acertos que - repito e insisto - não tenho dificuldade de reconhecer, tenho a alegria de aplaudir, e muitos erros, porque é assim e será sempre assim. Homens, mulheres, governos acertam e erram e a seu tempo e a seu modo contribuem, diante de suas circunstâncias, para os avanços do Brasil. Então, retirar do Presidente Fernando Henrique Cardoso - e não da pessoa dele, porque isso não é patrimônio de uma pessoa, é da Nação brasileira, é conquista de um povo - essas conquistas que possibilitaram os avanços sociais que foram verificados no governo do Presidente Lula é uma profunda injustiça, é talvez um gesto de pequenez política, que não contribui para com este momento. O que nós estamos tentando fazer é virar a página do terceiro momento. Então, eu me reportei à estabilidade política com a democracia; à estabilidade econômica, com o Plano Real; à ampliação de avanços sociais, porque não pode deixar de ser lembrado que todos os programas da rede de proteção social começaram ainda no governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso e, inegavelmente, o Presidente Lula teve méritos de não apenas consolidar, mas também de expandir esses programas, e nós reconhecemos isso. Quando V. Exª fala, por exemplo, do aumento do número de segurados da Previdência Social, faz-me lembrar - e o Senador Paim que nos preside neste instante estava lá conosco - da Assembleia Nacional Constituinte, quando fui, Senadora Gleisi, o autor do dispositivo da Constituição que provocou mais transformações na vida dos pobres no Brasil, muito mais do que o Bolsa Família. Isso porque eu fui o responsável por inscrever na Constituição brasileira - a emenda foi de minha autoria - a garantia de um salário mínimo para todos os trabalhadores rurais deste Brasil, que até então recebiam apenas meio salário mínimo de aposentadoria. Além de garantir o pagamento do salário mínimo, o que provocou uma transformação completa no meio rural do País inteiro, garanti com minha iniciativa parlamentar de Constituinte que fui a redução da idade limite para a aposentadoria dos homens e das mulheres que trabalham no campo. Se olharmos para a importância do Bolsa Família cotejada, comparada com a importância do que representa hoje a aposentadoria rural do Brasil, tenha a certeza de que essa minha iniciativa, chancelada pelos Constituinte de 1988, teve um efeito econômico-social muito mais profundo e benéfico do que o próprio Bolsa Família, que tem os seus méritos. Acontece que nós não estamos vivendo no passado. Nós estamos vivendo no presente. Estamos aqui fazendo referência a uma data histórica, que não há de ser comemorada, o golpe militar, mas o Brasil de hoje não é mais o Brasil que V. Exª relata e não há mais nada que atinja o direito do trabalhador do que o desemprego. Que direitos tem um trabalhador desempregado? Nenhum. Então, nada mais atinge, ataca, fere o direito dos trabalhadores do que o desemprego. E V. Exª faz sempre referências ao Governo Fernando Henrique, que viveu outras circunstâncias, que era outro momento histórico e que cumpriu a sua prioridade, que era combater a inflação, Senadora Gleisi, porque, se perdurasse...

(Soa a campainha.)

    O Sr. Cássio Cunha Lima (Bloco Oposição/PSDB - PB) - ... aquele quadro inflacionário de hiperinflação no Brasil, o País não teria condições de lançar as bases para outros avanços que governos que sucederam, já por mim reconhecidos, conseguiram alcançar. Então, o Presidente Fernando Henrique Cardoso, sua equipe e o povo brasileiro tinham como prioridade número um acabar com a inflação, que é a maior penalização que o trabalhador pode ter. Não há nada que castigue mais e penalize mais um assalariado do que a inflação. Era essa a prioridade do momento e essa prioridade foi alcançada. O Brasil teve o seu cadastro limpo, com todas as medidas que foram adotadas, e se pavimentou um caminho de avanços. E não reconhecer isso não contribui para o momento que nós estamos vivendo, de profunda crise, em que todos nós temos responsabilidades de apontar saídas porque quem está pagando o preço dessa crise é o povo brasileiro. Essa que é a grande verdade. Uma economia esfacelada, uma economia que foi,...

(Interrupção do som.)

    O Sr. Cássio Cunha Lima (Bloco Oposição/PSDB - PB) - ... propositadamente, atacada. Então, quando se refere às eleições de 2014, também é inegável que, para manter esse projeto político, o Governo fez um conjunto de medidas que não poderiam ter sido feitas. Errou e falta, desculpe a franqueza da expressão, humildade de dizer: "Erramos e as consequências dos erros estão aqui." E quem é que está pagando? São os partidos políticos? Os mandatários? Não, é o povo brasileiro. Quem está pagando é a Nação brasileira, é a nossa gente que está sofrendo, que está no desemprego, com a inflação, ou mesmo ameaçada de desemprego, e não há sequer uma palavra de dizer: "Puxa vida, erramos. Acertamos durante algum tempo, mas erramos." E o que é grave é que o erro cometido - e eu concluo, diante da tolerância de V. Exª - está corroendo, está destruindo aquela segunda conquista da estabilidade econômica. E, não satisfeitos em corroer a estabilidade econômica conquistada pelo povo brasileiro, a postura equivocada de confronto da Presidente da República, que, impedida de ir às ruas, transforma o Palácio do Planalto em palanque, ameaça agora também a conquista da democracia. É por isso que eu tenho feito o apelo para que possamos agilizar o processo de impeachment e, qualquer que seja o resultado, que tenhamos um ponto de entendimento em nome da sociedade brasileira, do nosso povo, que não vai viver em confronto eterno, que não vai viver em disputa permanente, para que nós possamos compreender que há uma consequência muito danosa na vida das pessoas. Os Municípios, quebrados, já não conseguem mais cumprir suas obrigações. Por quê? Porque simplesmente, para ganhar a eleição de 2014, que V. Exª reconhece que foi uma vitória apertada e que só foi ganha com o conjunto de inverdades, de mentiras que foram ditas durante a campanha eleitoral, enganaram o povo brasileiro, que foi iludido na sua boa-fé. Porque, do contrário, se tivéssemos o conhecimento pleno da realidade que já era do conhecimento da Presidente Dilma, o povo brasileiro teria votado de outra maneira. Então, que nós possamos entender que conquistamos a democracia, é um marco histórico; conquistamos a estabilidade econômica, outro marco histórico; conquistamos avanços sociais, outro marco histórico; mas agora estamos na derrocada econômica, fruto dos erros que foram cometidos. E esses erros precisam ser consertados, porque quem paga a conta é o trabalhador com a volta da inflação, com a volta do desemprego. E não será com as medidas populistas que foram adotadas nos últimos dois, três anos que nós vamos ter a retomada do desenvolvimento da economia. São precisos dois pontos, ao meu ver, para que nós tenhamos capacidade de olhar o futuro do Brasil a curto, médio prazo: em primeiro lugar, de fato, um ajuste fiscal, uma responsabilidade no gasto público, para que a sociedade não seja obrigada a pagar cada vez mais impostos para um governo perdulário, que não se planeja, que gasta mal e de maneira ineficiente. Ninguém aguenta mais pagar impostos. E até aqui toda solução apresentada pelo Governo da Presidente Dilma tem sido somente no aumento da carga tributária, e a caixa d'água tem que olhar a entrada da receita, mas também a saída da despesa. O orçamento público, eu faço uma figura de linguagem, é uma caixa d'água, em que você tem a entrada com a arrecadação e a saída com a despesa. Não pode só querer aumentar a entrada e não controlar a despesa minimamente de uma máquina pública inchada, de tudo aquilo que já se falou. E outro ponto que teremos que enfrentar é a modernização da nossa economia...

(Soa a campainha.)

    O Sr. Cássio Cunha Lima (Bloco Oposição/PSDB - PB) - ... para tornar o Brasil um País mais produtivo, mais competitivo. Ao contrário do que aconteceu na Coreia, onde, à medida que crescia a escolaridade do povo coreano, crescia junto a produtividade da economia, no Brasil, graças a Deus, cresceu a escolaridade, mas infelizmente a produtividade da nossa economia continuou no mesmo patamar. Esse é um desafio que precisa ser enfrentado. Então, se tivéssemos grandeza de reconhecer conquistas históricas nessa data simbólica do Brasil, talvez o nosso entendimento ficasse mais fácil. Mas, enquanto ficar com esse discurso míope de quem não quer enxergar a realidade, de quem acha que descobriu o Brasil, nesses últimos 13 ou 14 anos, e de quem não tem a grandeza política - perdoe-me mais uma vez a expressão, para concluir - de reconhecer que acertos foram praticados em governos pretéritos, assim como erros, e que erros e acertos também foram praticados no atual Governo, seguramente nós faremos uma discussão que não levará a nada, pois haverá a velha postura maniqueísta do bem contra o mal. Não será com esta postura que o Brasil vai sair dessas dificuldades provocadas, trazidas e acarretadas pelos equívocos, pelos erros do Governo da Presidente Dilma Rousseff do PT.

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Os apartes do Senador Cássio são verdadeiros pronunciamentos.

    Mas quero, aqui, Senador, primeiro dizer que o maior reconhecimento que nós tivemos aos pressupostos da estabilidade econômica foi tê-los mantido. Quando o Presidente Lula assumiu o Governo, não fez alterações nos pressupostos da política econômica. Aliás, salvou o Plano Real, porque, na época, o Governo de V. Exªs tinha praticamente se desmantelado, não tinha conseguido, em nenhum ano, fazer superávit primário. Essa é a grande verdade. Mudou todos os anos as metas, porque a Lei de Responsabilidade Fiscal passou a vigorar efetivamente depois que V. Exªs saíram do Governo. E quem manteve os pressupostos econômicos do Plano Real foi o Presidente Lula. Acho que esse é o maior reconhecimento que poderíamos ter da colaboração da estabilidade econômica.

(Soa a campainha.)

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Apoio Governo/PT - PR) - A outra coisa que eu acho que V. Exª fala e não procede é em relação às conquistas sociais. V. Exª lembrou aqui as conquistas na área da Previdência - e parabenizo V. Exª pelas iniciativas -, na questão dos direitos dos trabalhadores rurais e também da aposentadoria por idade, a reversão disso. Mas V. Exª tem que convencer seu Partido agora a não retroceder, porque o PSDB é o Partido que mais defende mudanças estruturais na Previdência. É o que mais faz discurso da necessidade de rever essas despesas, como se elas fossem as despesas que efetivamente impactassem o Orçamento público brasileiro.

    E, na questão dos impostos, é importante dizer que não houve Governo que mais desonerou impostos que o Governo da Presidenta Dilma. E esta Casa votou várias medidas exatamente em desoneração.

    E lembro, quando eu era Ministra da Casa Civil, quando mandamos para cá a desoneração da folha de pagamento. Mandamos para alguns setores que eram os que chamávamos de mais intensivos em mão de obra e esta Casa aumentou muito, muito os setores a serem beneficiados pela mudança que estávamos fazendo em relação à tributação da folha.

    Desoneramos IPI, PIS/Cofins, as exportações, os investimentos, muitos. Precisamos, é claro, dar alguma adequação agora, num momento maior de crise. Mas nem de perto estamos aumentando a tributação como era no passado. Aliás, as tentativas que nós fizemos aqui de ter um ajustamento mais progressivo na tributação, todas as vezes o PSDB foi contra. Juro sobre capital próprio, por exemplo: por que é que nós não conseguimos aprovar nesta Casa para que se parem os juros sobre capital próprio, que é um ganho a mais que o empresário tem sobre capital? Não é um ganho de produtividade, é um ganho sobre capital. E nós não conseguimos tirar isso.

    E é importante dizer, Senador Cássio, que os juros sobre capital próprio foram instituídos exatamente na época do Plano Real, para que o setor empresarial não sofresse tanto a perda do que fazia de investimento no mercado financeiro com a inflação alta. Foi um ajuste que se fez. Então, beneficiou a retirada da inflação da maioria da população, mas protegeu o setor financeiro, o setor empresarial. Assim como nós não temos hoje uma tributação efetiva sobre dividendos, sobre lucros, é tudo mais brando aqui no Brasil. Então, eu acho que isso é importante a gente deixar claro.

    E a outra coisa que é importante é que nós estamos retomando o desenvolvimento econômico, sim. A área externa, para mim, é o principal indicador. Sabe por que, Senador Lobão? Primeiro, porque hoje nós estamos com um balanço de pagamentos com um déficit muito pequeno. Já tivemos um déficit grande, enorme: de R$104 bilhões caiu para R$30 bilhões. Nossa balança comercial está superavitária, isso é muito importante. Fizemos emissão agora de títulos do Tesouro e tivemos mais demanda do que oferta, mostrando que o Brasil tem receptividade no exterior. Estamos com o dólar estabilizado. Não vamos mais ter problema de swaps cambiais. Ou seja, temos R$370 bilhões de reservas, que é o que nos dá condição de enfrentar essa crise. A inflação começa a cair, e, com certeza, nós vamos ter redução de juros. Nós estamos, sim, recuperando. O governo que mais fez pelos trabalhadores com certeza é o governo que tem condições de também levar à recuperação da economia.

    Eu tenho pouco tempo, mas eu concedo um aparte ao Senador Reguffe, depois Senador Pimentel e depois Senador Cristovam.

    O Sr. Reguffe (S/Partido - DF) - Senadora Gleisi, V. Exª colocou aí a questão das desonerações que foram feitas no primeiro Governo da Presidente Dilma. Eu fui muito crítico, e continuo sendo, porque eu não consigo entender a lógica de tirarem impostos de automóveis para baixar preço de automóvel e não tirarem impostos de remédios para que a população possa comprar um remédio por um preço mais acessível. Sou autor, aqui nesta Casa, de uma proposta de emenda à Constituição que proíbe a tributação sobre remédios, no Brasil. Quando fui Deputado Federal, no início do meu mandato, também tinha proposto algo semelhante. Tentei levar a proposta ao Governo para que ele a executasse. Não posso entender que automóvel seja mais importante do que remédio. Países como a Inglaterra, como o Canadá, como a Colômbia não cobram impostos sobre medicamentos. No Brasil, 35,7% do preço de um remédio são apenas impostos. Isso não é justo, não é correto. O Governo, ao invés de retirar impostos de uma coisa que ninguém compra porque quer, mas compra porque precisa, vai e retira impostos de automóveis e eletrodomésticos, apenas pelo viés econômico. Qual é a lógica de tirarem impostos de automóveis e de não tirarem de remédios? Então, essa foi uma crítica que eu fiz e que coloco aqui, democraticamente, nesse ponto do discurso de V. Exª.

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Claro.

    O Sr. Reguffe (S/Partido - DF) - É uma coisa que, para mim, não dá para entender. Isso é a corrupção das prioridades. O Governo, ao invés de priorizar o que é mais necessário para a população, não! Pior: fiz um requerimento formal de informações. Hoje, o impacto de serem retirados todos os impostos de remédios, no Brasil, seria de R$5 bilhões. Só a desoneração para a indústria automotiva custou R$20 bilhões, ou seja, quatro vezes mais do que se retirarem os impostos dos remédios. Essa foi uma resposta formal do Ministério da Fazenda ao requerimento de informações que fiz. Ou seja, não dá para entender. E por último, mais grave, não existe controle de preço, no Brasil, para automóveis. Ao se desonerar o preço dos automóveis, uma parte vai para o preço ao consumidor, mas a outra parte vai para o lucro das montadoras. Para os remédios existe controle de preço. Se entrarmos no site da Anvisa, está lá o nome de todos os remédios e, do lado, o preço máximo que pode ser cobrado do consumidor final de cada um. Ou seja, seria só reduzir o preço máximo na mesma proporção da isenção que nós ainda teríamos a garantia de que toda isenção seria revertida diretamente para o consumidor final.

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Senador Reguffe, esse é um debate que nós temos de fazer nesta Casa. A maior incidência de impostos sobre remédios é de impostos sobre a circulação de mercadoria, são os impostos estaduais e não federais.

    Quando nós fizemos a desoneração do IPI - Imposto sobre Produtos Industrializados -, não se atingiu apenas a cadeia de produção automobilística, mas várias cadeias produtoras no Brasil, inclusive a de remédios.

    E lembro a V. Exª que o Brasil é um dos poucos países que têm um programa que distribui, gratuitamente, remédios à sua população, o Farmácia Popular. Aliás, é um programa de sucesso.

    O Sr. Reguffe (S/Partido - DF) - Mas só diabetes e hipertensão. Existe uma série de outras doenças crônicas.

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Apoio Governo/PT - PR) - E vários outros remédios com preços muito baixos, que são vendidos a 10% do preço da tabela que V. Exª está falando.

    Então, não é fácil isso. Se nós convencermos os Estados a retirar o ICMS, creio que V. Exª vai ter um avanço importante. Agora, todas as discussões que tentamos nesta Casa sobre esse tipo de imposto restaram frustradas, porque cada Estado defende o seu.

    Concedo um aparte ao Senador Pimentel.

    O Sr. José Pimentel (Bloco Apoio Governo/PT - CE) - Senadora Gleisi, quero parabenizá-la pelo tema que V. Exª traz ao debate nesta Casa e registrar que o Governo Federal, em 2013, tentou fazer com o Confaz um acordo para desonerar integralmente a carga tributária sobre remédios. Naquele ano de 2013, o Governo Federal tomou uma decisão que se mantém até hoje: na importação de medicamentos, não há impostos.

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Exatamente.

    O Sr. José Pimentel (Bloco Apoio Governo/PT - CE) - E há um conjunto de outros com isenção integral ou parcial. E 80% dos remédios comercializados no Brasil vêm para o setor público. Lamentavelmente, dos 27 Estados, dois deles, em 2013, não aceitaram a desoneração do ICMS para haver imposto zero...

(Soa a campainha.)

    O Sr. José Pimentel (Bloco Apoio Governo/PT - CE) - ... sobre medicamentos. Portanto, se há alguém responsável por isso são os secretários de fazenda estaduais, no Confaz, que não tiveram acordo.

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Isso mesmo.

    O Sr. José Pimentel (Bloco Apoio Governo/PT - CE) - E, entre esses dois Estados, o Estado mais rico da Federação foi um dos que não aceitou a desoneração, dizendo que grande parte da indústria farmacêutica fica em seu território. E, ao cobrar o ICMS na origem, transfere para os Estados mais pobres, que não têm fábrica de medicamentos, o subsídio que o Estado mais rico sempre recebeu. Isso é preciso registrar. E eu não vi, em 2013, nenhuma assembleia legislativa, nem a distrital insurgirem-se contra essa posição do Confaz e de seu Secretário de Fazenda, que, evidentemente, tinha o aval dos 27 Governadores. Quero também registrar, Senadora Gleisi, que a micro e a pequena empresa são um dos fatores que ajudaram a equilibrar a Previdência Social. Nós, em 2006, criamos o Simples Nacional. Tínhamos ali 1,337 milhão de micro e pequenas empresas formais. Estamos hoje com 10,5 milhões, e num processo crescente. Naquele período, nós tínhamos um número de carteiras de trabalho assinadas bastante insignificante para o mundo dos trabalhadores no mercado de trabalho. E esse crescimento permitiu chegarmos a 20 milhões de novos empregos com carteira assinada a partir desses eventos. E esse número basicamente se mantém até hoje, com um pequeno retrocesso em 2015, 2016. Mas, neste 2016, já começa a haver a primeira reação de alguns setores da economia. Ao mesmo tempo que essa Previdência, em 2007, precisou de R$15 bilhões para fechar a folha urbana, que é a contributiva, em 2013, teve um saldo de R$23 bilhões, cobrindo os R$15 bilhões de 2007 e acumulando esse resultado. Evidentemente, nós tivemos um processo de desoneração da folha para aquelas empresas fora do Simples, e esse saldo foi compartilhado com esse setor que não tinha nenhuma participação no Simples Nacional. Nós precisamos, sim, sempre ter ajuste na Previdência pública brasileira, mas precisamos também cuidar da receita, ou seja, aqueles que historicamente não pagam impostos. Em dezembro de 2015, nós tínhamos R$1,2 trilhão, que é quase 50% da dívida pública nacional, em cobrança judicial, na mão de quatro mil empresas que não pagam. E tínhamos mais R$550 bilhões no Carf, vinculados à Receita Federal, no processo administrativo. Quando você abre, também, esses R$550 bilhões que estão no Carf, totalizando algo em torno de R$2 trilhões, pertencem exatamente ao mesmo grupo que historicamente não paga impostos no Brasil ou cria mecanismos aguardando o Refis. Quando você abre os financiadores de campanha, são exatamente esses quatro mil que não pagam impostos, que se utilizam desses artifícios, que podem contratar excelentes bancas de advogados para não pagar impostos. E eu não vejo ninguém tratar disso aqui no Congresso Nacional. Para fazer justiça, o Presidente Renan Calheiros determinou a criação de um grupo de estudos para rever a LEF (Lei de Execução Fiscal)...

(Soa a campainha.)

    O Sr. José Pimentel (Bloco Apoio Governo/PT - CE) - ... que é ainda dos anos 70, anterior à Constituição de 1988, que fez essa grande reformulação no Brasil, mas infelizmente, nessa parte da execução fiscal, nós fomos incapazes de alterar qualquer coisa ao longo desse tempo. Por isso, o problema do Brasil é de carga tributária, mas é muito mais grave quando se refere àqueles que utilizam os espaços legais para levar vantagem sobre os trabalhadores e os pequenos e médios empresários, que não podem constituir excelentes bancas de advogado para sonegar tributos. Quero aproveitar, Srª Senadora da República nossa companheira, para dizer que o Supremo Tribunal Federal termina de referendar a liminar concedida pelo Ministro Teori Zavascki sobre o ato ilegal praticado pelo Sérgio Moro quando determinou a quebra do sigilo bancário da Presidenta da República e divulgou com uma rapidez fantástica. Se nós observarmos naquele ato, naquele dia em que ele suspendeu a escuta telefônica, às 11h12, aquela captação foi às 11h32, e, já às 16h21, esse garoto propaganda da Rede Globo estava com esse material na Rede Globo, cometendo um ato ilegal, condenado sob todos os aspectos, conforme termina de decidir o Supremo Tribunal Federal. E, lamentavelmente, aqueles que dizem que defendem o Estado democrático de direito não reconhecem os erros praticados por setores do Estado nacional. Esse erro aqui praticado também está contaminando a questão tributária, porque essas ações não andam no Poder Judiciário brasileiro.

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Agradeço, Senador Pimentel, a informação e também seu aparte, o qual integro totalmente ao meu pronunciamento.

    Senador Cristovam.

    O Sr. Cristovam Buarque (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Senadora Gleisi, primeiro, eu quero dizer que, se um dia eu fosse Presidente da República, eu queria ter uma Líder como a senhora.

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Muito obrigada.

    O Sr. Cristovam Buarque (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Com a firmeza e a competência como defende as coisas. Eu só iria pedir uma coisa: de vez em quando, ser menos eufórica com as coisas e perguntar: "Será que estamos errando ou não estamos errando? - nós, o Governo, de que a senhora seria Líder, nesse caso. Mas eu quero parabenizá-la: desde sempre, o seu comportamento aqui é de extrema competência e firmeza. Mas eu quero retomar um pouco a fala da senhora sobre a reforma da Previdência, que me fez despertar para um ponto. Se eu fosse imaginar onde é que nós erramos - eu digo nós, o Brasil -, com as consequências que estamos tendo no Governo, eu diria que foi não termos enfrentado as reformas de que o Brasil precisa. E é o que a gente esperava do Partido dos Trabalhadores, é o que a gente esperava de um governo de esquerda. E a reforma da Previdência é uma delas. Claro que não para prejudicar o trabalhador, mas para beneficiá-lo mais. E aí incorporando, Senador Reguffe, não apenas os trabalhadores que estão em idade de aposentadoria, mas os trabalhadores que, daqui a alguns anos, vão entrar no mercado, os de 15 anos hoje, 16 anos, que vão ter uma Previdência quebrada se não fizermos uma reforma. Nós temos que discutir a reforma da Previdência com coragem, olhando a história, e não a política. Talvez o erro do Governo nesses últimos anos e da Presidente Dilma tenha sido olhar mais para a política do que para a história. Para a história, Senador Ferrer, é quando a gente olha lá na frente e corre riscos hoje. Eu creio que a Presidente cometeu diversos erros olhando a política do dia a dia, e não a história do longo prazo. E o último talvez seja este: querer entrar no varejo para conseguir os votos de que precisa no imediato. A Presidente Dilma estaria hoje muito melhor na história se tivesse mandado para cá uma quantidade de reformas e corrido o risco de dizer "não tive apoio; o que eu queria fazer não consegui". Senador Reguffe, quando o senhor falou que não entende a lógica da desoneração para automóveis, a lógica eu entendo, eu não entendo é a moral. A lógica eu entendo: automóvel dá uma dinâmica maior à economia do que remédio; só que, a médio prazo, esquecendo a história - e aí é que está o problema -, termina caindo na crise que a gente vive. Mas não é só a da Previdência. A gente precisava de uma reforma na educação. Nós fizemos programas para a educação, fizemos programas que aumentaram o número de universitários pobres, graças a cotas - e isso é bom, é correto -, mas não fizemos a reforma educacional - a que eu defendo é a federalização, mas poderia ser outra. Não fizemos a reforma do sistema de assistência social; ficamos prisioneiros do Bolsa Família. Precisávamos fazer uma reforma que emancipasse o povo da necessidade de bolsas dentro de 20 anos, 30 anos, 15 anos, mas uma reforma do sistema que desse empregabilidade, que desse consistência a um programa emancipador. E aí eu volto ao que disse o Senador Reguffe: ficou faltando propor uma reforma fiscal. Não sei se passaria não, Senadora, apesar da sua competência como Líder; eu não sei se passaria, se a gente teria condições, mas está faltando ter marcado: "Está aqui a reforma fiscal de que o Brasil precisa, que simplifique os impostos, que dê mais justiça regionalmente, que dê mais justiça socialmente e que fique insonegável. Estava precisando de uma reforma". Então, eu quero concluir, dizendo que - e esse debate um dia a gente vai fazer aqui, quando passar essa crise de hoje, em que só se fala em impeachment ou não impeachment - um dia a gente vai ter que se sentar e olhar quais são as reformas que estamos devendo ao Brasil, quais as reformas que esses 13 anos de Governo não trouxeram para nós aqui, mesmo correndo o risco de perder, porque estaria olhando a história, estaria deixando a marca das reformas. Até hoje falamos das reformas de Jango, que ele não fez, mas ele deixou ali aquelas ideias. Nós olhamos muito a política e olhamos pouco a história. E talvez isso esteja levando a uma situação trágica em que se pode perder na história e na política, porque não está certo que se vai ganhar para impedir o impeachment. E aí se perdem as duas coisas. Era isso que eu queria colocar aqui, mas isso é uma reflexão para o futuro. Hoje essa reflexão não interessa realmente a ninguém. Eu sei que eu estou falando em português, e as pessoas estão ouvindo em PTs, e em PSDBs e em outros idiomas... (Risos.)... que foram surgindo no Brasil nestes últimos meses. Mas, de qualquer maneira, parabéns, Senadora, pela sua combatividade e competência - não é só combatividade, não.

(Soa a campainha.)

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Obrigada, Senador Cristovam. Seria uma honra muito grande ser Líder de um governo de V. Exª - quero lhe dizer. Eu o respeito e o admiro muito.

    Senador, sobre a questão de reconhecimento de erros, é que todos que vêm aqui falam dos erros cometidos pelo Governo. Tem que haver alguém que fale dos acertos. Cabe-me vir aqui falar também dos acertos, senão parece que este Governo é um conjunto de erros e que só há erros. E cabe-me, como integrante do Governo, fazer uma discussão junto ao Governo para que reconheça os erros na prática e mude. Eu acho que é isso que a gente tem feito ao longo desses anos de militância aqui e também tentei fazer na Casa Civil da Presidência da República. Então, queria lhe dizer isso.

    Em termos das reformas, concordo plenamente com V. Exª em que nós precisamos delas. A reforma tributária a gente não consegue levá-la à frente. O Presidente Lula mandou no seu governo para cá, para o Congresso Nacional, uma proposta de reforma tributária. Está até hoje dormindo em berço esplêndido na Câmara dos Deputados. A Presidenta Dilma resolveu não mandar uma reforma total, mas parcial. Nós não conseguimos votar ainda nesta Casa as mudanças de que precisávamos para efetivamente colocar em prática, por exemplo, a unificação da alíquota do ICMS no Brasil.

    Então, é muito complexo, porque inclusive a carga tributária maior deste País não está tirando as contribuições sociais, não está no âmbito federal, mas está no âmbito dos Estados. É um imposto sobre comercialização de mercadorias. Nessa questão de remédios, é isto que o Senador Pimentel disse: a carga tributária é ICMS. E nós não conseguimos mudar isso. Se pegar do ponto de vista federal, há uma carga muito pequena em alguns remédios; como eu disse, há uma parte considerável que é vendida muito abaixo do preço de custo, com o Governo subsidiando, até para fazer frente a essa situação do tributo estadual; e há a outra parte que é distribuída gratuitamente.

    Quanto à Previdência, é óbvio que nós precisamos pensar na Previdência, porque ela tem de ter sustentabilidade ao longo prazo, mas não pode significar retirar direitos. Essa questão, por exemplo, da idade. Eu tenho muita dúvida em mexer com isso. Ouço muito o que o Senador Paim fala, o Senador Requião e outros Senadores, porque a idade é diferente se comparamos a função que nós exercemos aqui e a função de um trabalhador manual.

    Eu não posso dizer que 60 anos para um Senador tem o mesmo peso na vida do que tem 60 anos para um agricultor, para um varredor de rua, para um capinador. Nós temos que pensar nisso, porque, ao estabelecer uma regra aqui, nós podemos estar melhorando muito a vida de uns e condenando a vida de outros. Então, tem que ser uma coisa muito bem pensada. Não pode ser no calor. Por isso, eu defendo que se mande o projeto e que façamos um grande debate. E ele tem que ter perspectiva de médio e longo prazos na implantação.

(Soa a campainha.)

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Porque, se nós temos que pagar uma conta, essa conta maior é com os trabalhadores e com a população deste País. Não podem ser eles a pagar. Nós temos que pagar com eles. Portanto, não podemos retirar direitos.

    E, para encerrar, porque minha campainha já tocou, o Senador Reguffe gostaria de falar novamente?

    O Sr. Reguffe (S/Partido - DF) - Senadora Gleisi, obrigado por me dar aqui mais uma oportunidade de fazer um comentário. Com relação ao que V. Exª colocou, aqui, no Distrito Federal, por exemplo, dos 35,7% de impostos sobre remédios, 17% é realmente ICMS, é o imposto local, mas 18,7% é o imposto federal. Então, existe um imposto local, mas existe também um imposto federal. A soma dá 35,7%. Agora, eu ouvi aqui vários Parlamentares dizerem que são favoráveis a que desonerem os impostos sobre remédios - e V. Exª também concordou. Eu quero dizer aqui que é muito simples: é só votar minha PEC, que está parada na CCJ, que proíbe a tributação sobre remédios no Brasil.

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Então, vamos falar com todos os governadores. Eu não tenho problema nenhum de votar sua PEC. Não tenho mesmo problema nenhum, até pelo que temos de entendimento sobre essa área. O problema não é esse. E, mesmo nesse cálculo, tem-se que ver se essa carga tributária do Governo Federal não é concentrada em alguns poucos remédios, porque, como disse aqui o Senador Pimentel, há vários deles que já são isentos. E, quando a Anvisa coloca o preço final, é justamente para tentar conter um pouco o aumento nas regiões e nos Estados.

    Enfim, para terminar aqui, Sr. Presidente, o meu pronunciamento, só quero dizer que esse é um debate importante que nós temos que fazer. Concordo com o Senador Cristovam, com aquilo que o Senador Pimentel colocou também. Temos que fazer, retomar. Óbvio que o calor das discussões hoje, atualmente, nessa conjuntura, é a questão do impeachment, que eu acho de extrema relevância para o País, porque, conforme nós conduzirmos esse tema, nós vamos ter consequências. Para isso que nós estamos discutindo aqui e, inclusive, para a economia do País.

    Muito obrigada, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 01/04/2016 - Página 33