Discurso durante a 38ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Registro de manifestações favoráveis à continuidade do mandato da Presidente da República e críticas condução da Operação Lava Jato pelo Juiz Sérgio Moro.

Análise das propostas econômicas contidas no documento "Uma Ponte para o Futuro".

Comentários sobre a repercussão internacional do processo de impeachment da Presidente Dilma Rousseff.

Autor
Lindbergh Farias (PT - Partido dos Trabalhadores/RJ)
Nome completo: Luiz Lindbergh Farias Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Registro de manifestações favoráveis à continuidade do mandato da Presidente da República e críticas condução da Operação Lava Jato pelo Juiz Sérgio Moro.
ECONOMIA:
  • Análise das propostas econômicas contidas no documento "Uma Ponte para o Futuro".
POLITICA INTERNACIONAL:
  • Comentários sobre a repercussão internacional do processo de impeachment da Presidente Dilma Rousseff.
Publicação
Publicação no DSF de 29/03/2016 - Página 27
Assuntos
Outros > GOVERNO FEDERAL
Outros > ECONOMIA
Outros > POLITICA INTERNACIONAL
Indexação
  • REGISTRO, MANIFESTAÇÃO COLETIVA, APOIO, MANUTENÇÃO, MANDATO ELETIVO, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, REPUDIO, ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL (OAB), DEFESA, IMPEACHMENT, CRITICA, SERGIO MORO, JUIZ FEDERAL, LIDERANÇA, OPERAÇÃO, POLICIA FEDERAL, INVESTIGAÇÃO, CORRUPÇÃO, PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS), MOTIVO, COERÇÃO, AUDIENCIA, LUIZ INACIO LULA DA SILVA, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, DIVULGAÇÃO, ESCUTA TELEFONICA, PRESIDENTE.
  • ANALISE, DOCUMENTO, PROPOSTA, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, GESTÃO, MICHEL TEMER, PRESIDENCIA DA REPUBLICA, CRITICA, POSSIBILIDADE, REDUÇÃO, DIREITOS E GARANTIAS TRABALHISTAS, EFEITO, AJUSTE FISCAL, PREJUIZO, POPULAÇÃO, BAIXA RENDA, ENFASE, RESTRIÇÃO, FUNDO DE FINANCIAMENTO AO ESTUDANTE DE ENSINO SUPERIOR (FIES), PROGRAMA UNIVERSIDADE PARA TODOS (PROUNI), FINANCIAMENTO AGRICOLA, VALORIZAÇÃO, SALARIO MINIMO, APOSENTADORIA, ENTREGA, PRE-SAL, ROMPIMENTO, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL).
  • COMENTARIO, ANALISE, AMBITO INTERNACIONAL, TENTATIVA, IMPEACHMENT, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, REFERENCIA, CRITICA, MEIOS DE COMUNICAÇÃO, EX PRESIDENTE, PRESIDENTE DE REPUBLICA ESTRANGEIRA, ORGANISMO INTERNACIONAL, ORGANISMOS REGIONAIS.

    O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - Claro.

    O SR. PRESIDENTE (José Medeiros. S/Partido - MT) - ... a presença do Presidente do Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso e também Deputado Federal, que está aqui nos visitando.

    Com muita honra, agradecemos a sua presença.

    O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Apoio Governo/PT - RJ. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, eu hoje quero falar...

    O SR. PRESIDENTE (José Medeiros. S/Partido - MT) - Eu acabei não citando o nome dele, Antônio Joaquim.

    O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - Quero cumprimentá-lo, junto com o nosso Senador Blairo Maggi.

    Sr. Presidente, hoje eu quero falar da repercussão internacional contra este golpe em curso aqui no País, mas, antes de começar a ler o meu discurso, Senador, eu queria entrar neste debate sobre a questão do golpe, porque cresceu muito no Brasil manifestação de amplos setores denunciando a existência de um golpe aqui no Brasil.

    Isso cresceu, e as últimas manifestações do dia 18 foram a demonstração disso. Engana-se quem acha que, naquelas manifestações, nós tínhamos apenas militantes do PT e do PCdoB. Muita gente que não estava próxima ao nosso Governo, aos nossos partidos, foi para as ruas, muitos advogados, professores, uma parcela grande da nossa juventude, porque encaram que está acontecendo um golpe no nosso País.

    Eu presenciei, nesse final de semana, essa disputa de narrativa, por parte de setores da imprensa, entrevistando Ministros que diziam: "O impeachment está previsto na Constituição". Ora, isso nós sabemos. Eu vi, inclusive, o Presidente da OAB com o argumento ridículo de que, se o Supremo Tribunal Federal definir o rito, o impeachment pode ser realizado. Definir o rito? Definir o processo, foi isso que o Supremo Tribunal Federal disse.

    O que ficou claro nos debates aqui hoje é que o impeachment está previsto na nossa Constituição, só que é preciso que haja o crime de responsabilidade por parte da Presidenta da República. Eu aqui falei das diferenças. Fui líder estudantil na época daquele impeachment em 1992. Ali, Senador Medeiros, surgiram contas fantasmas que abasteciam pagamentos da família do ex-Presidente Collor, despesas pessoais, a reforma do jardim da casa da Dinda, era isso.

    Contra a nossa Presidenta Dilma, ela não tem conta na Suíça, não tem apartamento na Avenue Foch, em Paris, não tem aeroporto em propriedade particular, não tem dinheiro sonegado, não tem patrimônio suspeito, não desviou nada. Qual é a alegação?

    V. Exªs estão com um problema objetivo aqui, porque a todo mundo que sobe aqui à Tribuna perguntamos: mas crime de responsabilidade na abertura de créditos suplementares, senhores? V. Exªs não sabem o que responder. V. Exªs estão com a batata quente, porque estão construindo acordão de cúpula, para tentar afastar uma Presidente da República que não tem uma denúncia sequer contra ela, sem base jurídica alguma.

    Créditos suplementares. Aqui está uma matéria do jornalista da CartaCapital, André Barrocal, que eu acabei de ler, do dia de ontem, atrasado, sobre as pedaladas do Governo Geraldo Alckmin. Sabem quantos decretos o Governador Geraldo Alckmin apresentou em 2015, Senadora Gleisi? Foram 31 ou 32 decretos. Agora, estão querendo cassar o mandato de uma Presidente por seis decretos suplementares.

    Eu vejo alguns Senadores aqui que não leram a própria Lei Orçamentária, porque a Lei Orçamentária diz, no seu art. 4º, que é autorizado o Poder Executivo a abrir crédito suplementar, desde que respeitado o superávit primário. O que aconteceu? Houve uma arrecadação muito baixa, por causa da crise econômica, e houve a mudança, pelo PLN nº 5, da meta de superávit primário. Isso foi feito pelo Governo da Presidenta Dilma e por vários governadores. Há que cassar catorze governadores do País!

    Então, concretamente, os senhores não têm resposta. Estão, sim, com um problema jurídico nas mãos. Querem dar um golpe sem base concreta alguma. Alguns aqui, que são mais verdadeiros, chegam a falar: "É, temos que começar o processo de novo com outros pedidos."

    Eu fico impressionado que uma entidade, Senadora Gleisi... Está havendo, agora, lá fora, manifestação dos dois lados, porque a posição da OAB é muito acintosa. A OAB teve uma posição como essa em 1964. A OAB reconheceu a ditadura militar, aplaudiu o Conselho Federal da OAB. Mas o papel da OAB hoje é vergonhoso. Está havendo advogados contrários vindo aqui a Brasília, e hoje está havendo uma manifestação contra a OAB também, porque eles lançam um novo argumento: a delação do Delcídio. Só que sinceramente, a delação do Delcídio precisa ser investigada. Agora, eu cobrei aqui do PSDB um dia, porque eles queriam também "adendar" a delação do Delcídio. Quer dizer que serve quando é contra o Governo; quando citam líderes da oposição, aí não vale. Essa posição da OAB não se sustenta.

    E falou muito bem a Senadora Gleisi: nós estamos discutindo 2015; nem o Tribunal de Contas começou a apreciação das contas de 2015, nem o Congresso Nacional, porque o Tribunal de Contas é um órgão auxiliar deste Poder Legislativo. Não houve decisão por parte do Congresso. Então isso aqui é uma precipitação.

    Agora, eu queria chamar atenção para duas medidas que foram tomadas - medidas ilegais - também no sentido de impulsionar essa campanha pelo golpe, pelo afastamento da Presidenta Dilma. Duas ilegalidades, na verdade, feitas pelo juiz do Paraná Sérgio Moro, que tentaram, na verdade, colocar fogo nesse processo do impeachment. A primeira foi a condução coercitiva do Presidente Lula, uma condução coercitiva ilegal, como atestou a maior parte dos juristas deste País, porque o Presidente não foi intimado, não tinha se negado a depor. Agora, se vamos olhando a história, aquela ilegalidade ali foi fundamental para eles aquecerem as ruas no domingo.

    E depois outra ilegalidade quando a Presidente Dilma decidiu nomear Lula Ministro da Casa Civil; quando fizeram aquela divulgação, também ilegal, daquelas gravações envolvendo uma Presidenta da República. Tinha que ter ido diretamente para o STF.

    E eu pergunto, Senador Blairo: onde está o direito à privacidade neste País? Nós temos a Lei de Interceptação Telefônica, que proíbe a divulgação dessas interceptações. Há o art. 9º, que diz, claramente, que tudo o que não tiver a ver com a investigação tem que ser destruído. Ali colocaram conversas de D. Marisa Letícia com sua filha, conversas, gravações com advogados. Então, essas ilegalidades ajudaram a construir esse caminho do impeachment aqui no Congresso Nacional - volto a dizer - sem base jurídica alguma.

    A Senadora Gleisi foi muito feliz: esse golpe em curso tem um programa. É um programa radicalmente antipovo. É um programa de restauração do neoliberalismo. Eu diria: nunca um Presidente da República seria eleito com um programa como o programa Uma Ponte para o Futuro. Nunca! Porque é um programa que não teria condições de ser aprovado em uma eleição presidencial, por ser um programa, volto a dizer, radicalmente antipovo.

    Agora, é importante irmos para a história. O neoliberalismo, às vezes, se valeu muito das ditaduras. Antes da implantação no governo Thatcher-Reagan, ele foi experimentado no Chile de Pinochet, por 25 Chicago Boys. E aqui se está aproveitando dessa crise, desse golpe em curso para eles apresentarem um programa que até o Fernando Henrique Cardoso considerou muito radical do ponto de vista liberal na economia. O Fernando Henrique Cardoso disse isso. Eu, de fato, concordo. Nunca foi apresentado um programa neoliberal tão radical como esse aqui.

    Vamos aos pontos centrais, já muito bem abordados pela Senadora Gleisi. O primeiro ponto para o qual quero chamar atenção é quando eles dizem: "Para isso é necessário" - eles fazem várias constatações sobre a situação econômica brasileira -, "em primeiro lugar, acabar com as vinculações constitucionais estabelecidas, como no caso dos gastos com saúde e educação." Pelo amor de Deus! Eu fui Prefeito de Município. Eu sabia. Todos os prefeitos hoje têm que investir 15% em saúde e 25% em educação. Eles querem a desvinculação geral, tanto em nível federal quanto em nível estadual e municipal. O impacto disso na vida do povo vai ser gigantesco. O nosso sistema de saúde já é precário. Quanto aos nossos professores, nós estamos conseguindo avançar com esse piso com muita luta. Agora, se aprovado isso aqui, o impacto na saúde e na educação será algo enorme. Nós não temos condições de ter a dimensão do que significaria tudo isso.

    Agora, qual é o objetivo? O objetivo é o de sempre: apertar aqui para sobrar dinheiro para o deus do superávit primário, para eles terem dinheiro para pagar juros aos rentistas brasileiros.

    Esse é o primeiro ponto, gravíssimo, mas vamos ao segundo.

    Está aqui no texto deles:

Outro elemento para o novo orçamento tem que ser o fim de todas as indexações, seja para salários, benefícios previdenciários e tudo o mais. (...) Quando a indexação é pelo salário mínimo, como é o caso dos benefícios sociais, a distorção se torna mais grave, pois assegura a eles um aumento real, com prejuízo para todos os demais itens do orçamento público, que terão necessariamente que ceder espaço para este aumento.

    Isso aqui, resumindo, é o fim da política de valorização do salário mínimo. Resumindo, é o fim da vinculação do salário mínimo com os benefícios previdenciários. Hoje, o benefício mínimo da Previdência é um salário mínimo. Setenta por cento dos aposentados recebem um salário mínimo. Eles querem acabar com isso! Eles dizem que estamos engessando muito. Ora, essa política, tanto a política de valorização do salário mínimo quanto a vinculação do salário mínimo com o piso do benefício previdenciário, foram fundamentais no governo do Presidente Lula para que criássemos esse grande mercado de consumo de massas. Esse é um dinheiro que movimenta a economia. É, como o Presidente Lula dizia, colocar dinheiro na mão de pobre. Aqui, não! Eles querem tirar isso!

    Estou chamando atenção dos senhores, de quem está nos assistindo agora na TV Senado, porque esse debate tem que ganhar o País. Os trabalhadores brasileiros têm que saber as consequências da implementação de um programa como esse.

    Vamos ao terceiro ponto.

A terceira regra nova do orçamento é a ideia de 'orçamento com base zero', que significa que a cada ano todos os programas estatais serão avaliados por um comitê independente, que poderá sugerir a continuação ou o fim do programa, de acordo com os seus custos e benefícios. Hoje, os programas e projetos tendem a se eternizar, mesmo quando há uma mudança completa das condições. De qualquer modo, o Congresso será sempre soberano e dará a palavra final sobre a continuação ou fim de cada programa ou projeto.

    O Programa Mais Médicos é um programa que se estrutura ao longo do tempo.

    O que eles estão querendo dizer é que não está garantido nada. Para falar a verdade, nem o Bolsa Família. Nada. E a Senadora Gleisi falou aqui do corte que eles querem fazer no Bolsa Família, em uma entrevista do Moreira Franco, que é coordenador desse programa.

    Isso aqui não garante a continuidade de políticas públicas. Vai ser muito difícil garantirmos conquistas que foram alcançadas depois de muito suor. Esse é o terceiro ponto desse belíssimo programa. É em cima desse programa que eles querem fazer um acordão para governar o País.

    Vamos ao quarto ponto, tema longo, reforma da Previdência, aumento da idade mínima, enfim, um conjunto de bondades para o povo trabalhador brasileiro.

    O quinto ponto para o qual quero chamar atenção é na parte que eles falam dos juros da política monetária: "Nossos juros são altos neste momento porque a inflação está muito acima da meta de 4,5% e ameaça sair do controle." Eles sabem e todo mundo sabe que, neste Brasil, a inflação alta deriva centralmente de preços administrados - energia elétrica, gasolina - ou também de alimentos, não inflação de demanda.

    E eles continuam: "Qualquer voluntarismo na questão dos juros é o caminho certo para o desastre. Tentativas anteriores de baixar a taxa básica, sem amparo nos fundamentos, fracassaram e cobraram o seu preço."

    Aqui eles estão dizendo para o mercado: fiquem tranquilos, nós não vamos ser irresponsáveis na política monetária, nós vamos manter essa taxa de juros. E eles continuam todo esse debate falando do aperto em relação ao superávit primário.

    O que eles querem na verdade é isto: ir para cima de programas sociais, de recursos da área da educação e da área da saúde para fazer um ajuste fiscal de longo prazo rigorosíssimo, que, a meu ver, vai piorar a situação da economia. E eles querem deixar intocada a questão do déficit nominal, porque, nos últimos 12 meses, chegando a janeiro, pagamos R$540 bilhões de juros; 9,1% do nosso PIB foram para pagamento de juros. Mas eles querem saber é do 1% de déficit primário. Essa parte dos juros eles já deixam claro nesse ponto do documento Uma Ponte para o Futuro.

    E vamos para o item 6: executar uma política desenvolvimentista centrada na iniciativa privada por meio de transferências de ativos que se fizerem necessários, concessões amplas em todas as áreas, etc. Aqui, concretamente, é a volta da velha política de privatizações. E nós conseguimos impedir que fossem privatizados, na época do Governo Fernando Henrique Cardoso, o Banco do Brasil, o BNDES, a Caixa, a Petrobras. Enfim, eles aqui vêm com tudo.

    Também falam do pré-sal, falam do retorno do regime de concessões, acabam com o regime de partilha.

    Item 7: realizar a inserção plena da economia brasileira no comércio internacional, com maior abertura comercial e busca de acordos regionais de comércio em todas as áreas econômicas relevantes - Estados Unidos, União Europeia, Ásia, com ou sem a companhia do Mercosul, embora preferencialmente com eles.

    Aqui concretamente eles falam do fim do Acordo de União Aduaneira do Mercosul. Eles se reposicionam aqui contra a política externa Sul-Sul, que foi extremamente exitosa para o Governo brasileiro e para as empresas brasileiras. O que eles querem aqui é voltar a uma reinserção no mercado internacional de forma subordinada aos interesses norte-americanos. Aqui há um claro interesse - nós construímos uma relação aqui na América Latina, no Mercosul, na Celac - de voltar à situação anterior, de submissão à lógica da política internacional norte-americana.

    Eu chamo atenção novamente dos trabalhadores brasileiros. Item 8: na área trabalhista, permitir que as convenções coletivas prevaleçam sobre as normas legais. Aqui concretamente nós estamos rasgando a CLT. Esse documento todo de fato ataca o acordo que foi firmado na Constituição de 1988. Mas alguns pontos vão mais atrás, rasgamos a CLT, uma conquista dos trabalhadores desde Getúlio Vargas.

    Eu falo tudo isso, Sr. Presidente, porque acho que nós vamos ter semanas em que esse debate político precisa ser feito de forma clara no País. O que está por trás dessa campanha, desse acordão para tirar uma Presidente eleita democraticamente sem uma acusação direta a ela, sem crime de responsabilidade? O que está expresso, de forma muito clara, nesse programa Uma Ponte para o Futuro é um projeto ambicioso, que vai ferir direitos dos trabalhadores, que vai retirar conquistas históricas dos trabalhadores brasileiros.

    Eu concluo a minha fala, Senador Blairo Maggi, entrando agora no terceiro ponto, talvez o mais longo - e por isso eu peço desculpas a V. Exª -, que é uma leitura sobre a repercussão internacional disso que eu chamo de golpe.

    Sr. Presidente, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, a crescente resistência ao golpe e a defesa da democracia brasileira não são apenas nacionais, são também internacionais. Com efeito, representantes de vários órgãos e instituições internacionais vêm se manifestando contra o golpe e os arbítrios cometidos contra o Estado democrático de direito e os direitos e garantias fundamentais em nosso País.

    Luis Almagro, Diretor-Geral da Organização dos Estados Americanos (OEA) afirmou em nota oficial que "o mandato constitucional de Dilma Rousseff deve ser assegurado". E, em uma clara referência aos arbítrios de juiz de primeira instância no Brasil, ressaltou que "nenhum juiz está acima da lei".

    A chanceler do governo conservador de Macri, Susana Malcorra, afirmou que "o Mercosul pode usar da cláusula democrática do Protocolo de Ushuaia, caso haja rompimento da ordem constitucional no Brasil".

    Ernesto Samper, Secretário-Geral da Unasul,...

(Soa a campainha.)

    O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - ... afirmou, recentemente, que "Lula goza de toda a sua confiança, mas que esse grande líder sofre, infelizmente, uma perseguição midiática em seu próprio país".

    A própria Cepal, órgão especializado da ONU, através de sua diretora Alicia Bárcena, pronunciou-se, na semana passada, declarando que "Dilma sofre julgamento sem provas e ataque midiático".

    Em carta à Presidenta Dilma, a Cepal assim se manifestou:

Com profunda preocupação, assistimos ao desenvolvimento dos acontecimentos políticos e judiciais que têm convulsionado o Brasil nas últimas semanas. Nos alarma ver a estabilidade democrática de sua pátria ameaçada.

A soberania popular, fonte única da legitimidade numa democracia, foi entregue a Lula e em seguida à Senhora Presidenta Rousseff, através de um mandato constitucional, que se traduziu em governos comprometidos com a justiça e a igualdade. Nunca, na história do Brasil, tantos e tantos de seus compatriotas conseguiram evitar a fome, a pobreza e a desigualdade. Também foi significativa para nós a marca determinante com a qual suas gestões reforçaram a nova arquitetura de integração da nossa região, da Unasul à Celac.

Reconhecemos o esforço dos tribunais em perseguir e castigar a cultura de práticas corruptas, que foram historicamente a parte mais opaca do vínculo entre interesses privados e as instituições do Estado.

Temos apoiado permanentemente essa sua tarefa, com a valentia e honradez que é selo de sua biografia, que propicia a criação de uma nova legislação, mais exigente, e de instituições persecutórias mais fortes.

É por isso que nos violenta que hoje, sem julgamentos nem provas, servindo-se de vazamentos e uma ofensiva midiática que já ditou antecipadamente condenação, se tente demolir sua imagem e seu legado, enquanto se multiplicam as tentativas de menosprezar a autoridade presidencial e interromper o mandato entregue nas urnas pelos cidadãos.

Os acontecimentos pelos quais o Brasil atravessa nesses dias ressoam com força para além de suas fronteiras e ilustram para o conjunto da América Latina os riscos e dificuldades aos quais nossa democracia ainda está exposta.

    O escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH), outro órgão da ONU, emitiu, na última terça-feira, dia 22, mensagem do seu porta-voz Rupert Colville. Disse ele:

Estamos preocupados com o debate cada vez mais acalorado e politizado que tomou o Brasil nos últimos dias e semanas.

Apelamos ao Governo, bem como aos políticos de outros partidos, que cooperem plenamente com as autoridades judiciais em suas investigações sobre alegações de corrupção de alto nível e que evitem quaisquer ações que poderiam ser interpretadas como um meio de obstruir a Justiça.

Ao mesmo tempo, solicitamos às autoridades judiciais que ajam de maneira escrupulosa, dentro dos limites do Direito nacional e internacional, e que evitem tomar posições político-partidárias.

Estamos preocupados com que um círculo vicioso que ameaça desacreditar tanto o Executivo quanto o Judiciário possa estar se desenvolvendo, provocando dessa forma danos sérios e duradouros ao Estado e às conquistas democráticas feitas nos últimos quase 30 anos, durante os quais o Brasil tem sido governado de acordo com uma Constituição que oferece sólidas garantias de direitos humanos.

    Mais uma entidade da Organização das Nações Unidas se pronunciou recentemente condenando a tentativa de golpe no Brasil. Trata-se da ONU Mulheres, criada, em julho de 2010 pela Assembleia Geral da ONU como a Entidade das Nações Unidas para a Igualdade de Gênero e o Empoderamento das Mulheres.

    A representante da ONU Mulheres, Nadine Gasman, publicou nota, na qual diz que:

O organismo conclama a preservação da legalidade, como condição máxima das garantias estabelecidas na Constituição Federal de 1988 e nos tratados internacionais de direitos humanos dos quais o Brasil é signatário.

(Soa a campainha.)

    O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - A entidade também saiu em defesa da Presidenta Dilma Rousseff, afirmando que:

Nos últimos 30 anos, a democracia e a estabilidade política no Brasil tornaram reais direitos humanos individuais e coletivos. São, sobretudo, base para políticas públicas, entre elas as de eliminação das desigualdades de gênero e raça, determinantes para a construção de uma sociedade inclusiva e equitativa. Como defensora dos direitos das mulheres e meninos do mundo, a ONU Mulheres condena todas as formas de violência contra as mulheres, inclusive a violência política, de ordem sexista contra a Presidente da República, Dilma Rousseff.

    Ex-chefes de Estado e de Governo de diversos países da Europa e da América Latina também publicaram a declaração de apoio ao ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

    Entre os 14 primeiros signatários estão: José Pepe Mujica, ex-Presidente do Uruguai; Cristina Kírchner, ex-Presidenta da Argentina; Felipe González, ex-Presidente do Governo da Espanha.

    Firmaram também a declaração entre vários outros ex-mandatários: Massímo D'Alema - Itália; José Miguel Insulza - OEA; Ricardo Lagos - Chile.

    Na declaração, os ex-mandatários afirmaram a respeito de Lula que:

Seu governo aprofundou a democracia, estimulando a diversidade política e cultural do País, a transparência do Estado e da vida pública. O Executivo, o Ministério Público e o Poder Judiciário puderam realizar investigações de atos de corrupção eventualmente ocorridos na administração direta ou indireta do Estado.

Preocupa à opinião democrática internacional, no entanto, a tentativa de alguns setores de destruir a imagem desse grande brasileiro.

    Evo Morales - Bolívia, Nicolás Maduro - Venezuela, Rafael Corrêa - Equador, Michelle Bachelet - Chile, Tabaré Vasquez - Uruguai - e outros chefes de governo já se declararam empenhados na defesa internacional da democracia brasileira em todas as instâncias internacionais.

    Adolfo Pérez Esquivel, Prêmio Nobel da Paz, se pronunciou duramente contra o golpe que está sendo gestado. Em sua manifestação, o Prêmio Nobel afirmou que:

A corrupção não se combate violando a Constituição. Se combate com transparência e mais democracia. A transparência não só do Executivo, mas também do Judiciário poderoso e de seus funcionários.

O progressismo latino-americano sabe perder eleições porque é democrático. As últimas apertadas eleições na Argentina e Bolívia são outro claro recente exemplo disso. Aqueles que não sabem perder e apoiam o novo golpismo, em nome da democracia, de sua vocação autoritária e de sua impoluta moralidade, não são muito diferentes daqueles que antes apoiavam ou se calavam diante das ditaduras genocidas de nosso continente.

    Os próprios meios de comunicação internacionais, Sr. Presidente, mais independentes, como o jornal britânico The Guardian, a revista alemã Der Spiegel, o jornal francês Le Monde e o jornal espanhol El País, entre muitos outros, já fazem reportagens e matérias questionando fortemente o processo do golpe no Brasil.

    A Der Spiegel, alemã, já está chamando o impeachment de "golpe frio". A TV Al Jazeera, maior emissora do mundo árabe, acessada em 47 países, fez dura reportagem denunciando o golpe e o papel da mídia partidarizada em sua criação.

    Sr. Presidente, não há dúvida de que a rejeição ao golpe vem crescendo rapidamente em todo o mundo, embora em alguns casos tal rejeição seja silenciosa. Foi o que aconteceu com o seminário promovido pelo Ministro Gilmar Mendes, em Lisboa, com a presença de José Serra, Aécio Neves e o Michel Temer, que suspendeu a ida. Uma espécie de convescote internacional do golpe.

    Pois bem, as autoridades portuguesas que foram convidadas ao evento, como o Presidente de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa, e o Ministro de Negócios Estrangeiros, Jaime Gama, mandaram cancelar suas participações, temendo o "tom conspiratório"...

(Soa a campainha.)

    O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - ... do seminário, que mais parecia reunião de um "governo no exílio".

    Golpes e conspiratas não são populares. Ninguém com o mínimo de bom senso gosta de se associar a eles. É fato que mancham a biografia para sempre.

    Sr. Presidente, é preciso lembrar - e eu peço desculpas novamente pelo tempo, Sr. Presidente, mas estou concluindo - que tanto o Mercosul, como a Unasul e a OEA possuem cláusulas democráticas que poderiam ser acionadas, caso o golpe vingue.

    De fato, as consequências nefastas do golpe não ficariam restritas somente à ordem interna. O Brasil muito provavelmente também sofreria com desdobramentos profundamente negativos no plano internacional.

(Interrupção do som.)

    O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - Além da vergonha de retroceder à condição de uma republiqueta de bananas perante a opinião pública mundial, o País quase que certamente arcaria com o peso de um isolamento diplomático no plano regional e internacional.

    Deve-se recordar que o Paraguai, após promover golpe de Estado Parlamentar contra o Presidente Lugo, em 2012, foi suspenso, por unanimidade, tanto do Mercosul, quanto da Unasul.

    No caso do golpe contra Manuel Zelaya, em Honduras, no ano de 2009, esse país foi suspenso da OEA também pela unanimidade dos países votantes.

    Em ambos os casos, os golpes tinham a forma de destituições, conduzidas dentro da ordem constitucional e legal daqueles países. Contudo, esse verniz constitucional e jurídico não convenceu ninguém. Prevaleceu o entendimento de que ocorrera uma agressão...

(Soa a campainha.)

    O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - ... contra o mandato popular e o governo legítimo.

    Não há por que pensar que, no caso do Brasil, o entendimento seria diferente. Até mesmo o The New York Times, jornal conservador, afirmou, em editorial recente, que "não há motivo para a deposição de uma presidenta".

    Eu quero citar, inclusive, aqui, a revista The Economist também - ouviu, Senadora Gleisi? -, porque ela fala pedindo a renúncia da Presidente, mas concorda que não há base jurídica no pedido do impeachment, tanto é que eles se centram na questão da renúncia.

    Mesmo que não houvesse condenação formal ao possível golpe, o mal-estar diplomático seria duradouro. Convenhamos: uma tentativa de deposição da Presidenta inequivocamente honesta, conduzida pelo atual Presidente da Câmara dos Deputados, denunciado em diversos processos criminais...

(Soa a campainha.)

    O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - ... seria motivo de chacota em todo o mundo. Seria piada pronta a percorrer o Planeta.

    Por isso, crescem no mundo todo manifestações contra o golpe, contra os arbítrios cometidos contra os direitos fundamentais e, sobretudo, declarações de apreço ao Brasil e a sua democracia, pois é disso que se trata. Não é necessário se ter apreço por Dilma ou por seu Governo. Trata-se de ter apreço pela democracia e pelos direitos e garantias individuais.

    O golpe, se concretizado, nos igualaria a países como Honduras e criaria uma fratura política de difícil superação. A crise tenderia a se prolongar, e a governabilidade ficaria ainda mais comprometida.

    Teríamos uma espada de Dâmocles que nos ameaçaria com constantes golpes parlamentares, os quais poderiam se realizar ao sabor de crises políticas artificialmente gestadas, no bojo de um presidencialismo de coalizão.

(Soa a campainha.)

    O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - Golpe não é solução para a crise; é seu agravamento e prolongamento, é prolongamento da crise interna e prolongada a vergonha internacional.

     Srs. Senadores e Srªs Senadoras, as forças democráticas do Brasil vivem agora uma situação parecida com a que os ingleses viveram na famosa Batalha de Agincourt, defrontando-se com as tropas mais numerosas e bem armadas dos franceses. Mas o mais importante não é a escolha oportunista de quem quer ganhar o poder a qualquer custo; é se ter a convicção de que se está do lado certo. O decisivo não é o julgamento conjuntural da mídia venal e dos cultores do ódio; é o julgamento da história, que, no longo prazo, condenará implacavelmente os que se colocarem contra a democracia.

(Soa a campainha.)

    O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - Como escreveu Shakespeare, em Henrique V, a respeito daquela Batalha de Agincourt, o fundamental é estar entre os, talvez, poucos afortunados, um bando de irmãos e irmãs que tiveram a coragem e a glória de enfrentar adversário mais poderoso em nome de uma causa justa. E já não somos tão poucos assim. As forças que defendem a democracia crescem no Brasil e no mundo sem ódio e com dignidade. Em Agincourt, os que pareciam mais fracos venceram. Nós também podemos vencer. A democracia pode vencer. A democracia vencerá.

    Muito obrigado, Sr. Presidente, pela tolerância. Eu lhe agradeço muito. Sei que extrapolei em mais de dez ou, talvez, quinze minutos o tempo. Então, agradeço a V. Exª.

    (Durante o discurso do Sr. Lindbergh Farias, o Sr. José Medeiros deixa a cadeira da Presidência, que é ocupada pelo Sr. Blairo Maggi.)

    O SR. PRESIDENTE (Blairo Maggi. Bloco União e Força/PR - MT) - Obrigado, Senador Lindbergh. Foram três prorrogações de cinco minutos.

    Eu estava preocupado, caso V. Exª fosse querer comentar todo o discurso. Aí, nós teríamos que tomar outra providência. (Risos.)

    O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 29/03/2016 - Página 27