Discurso durante a 46ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Reflexões sobre a atual situação da política nacional; apelo às instituições para que busquem o equilíbrio a fim de superar a grave crise por que passa o País, e defesa da realização de reforma política.

Autor
Simone Tebet (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/MS)
Nome completo: Simone Nassar Tebet
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Reflexões sobre a atual situação da política nacional; apelo às instituições para que busquem o equilíbrio a fim de superar a grave crise por que passa o País, e defesa da realização de reforma política.
Aparteantes
Cássio Cunha Lima.
Publicação
Publicação no DSF de 08/04/2016 - Página 18
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • COMENTARIO, CRISE, POLITICA NACIONAL, REFERENCIA, INFLAÇÃO, RECESSÃO, DESEMPREGO, CRITICA, GOVERNO FEDERAL, AUSENCIA, ATENÇÃO, EDUCAÇÃO, VIOLENCIA, FALTA, PLANEJAMENTO, HIPOTESE, PARALISAÇÃO, ATIVIDADE POLITICA, MOTIVO, ABERTURA, PROCESSO, IMPEACHMENT, DEFESA, NECESSIDADE, REALIZAÇÃO, REFORMA POLITICA, IMPORTANCIA, APOIO, INSTITUIÇÃO DEMOCRATICA, OBJETIVO, SUPLANTAÇÃO, PERIODO.

    A SRª SIMONE TEBET (PMDB - MS. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão da oradora.) - Obrigada, Sr. Presidente.

    Começo minha fala fazendo um agradecimento especial ao Senador Walter Pinheiro, que, gentilmente, inverteu a ordem dos oradores para que eu pudesse me pronunciar primeiro, até porque minha fala poderia muito bem ser considerada uma continuidade do pronunciamento do ilustre Senador Blairo Maggi e também do aparte dado pelo Líder do PSDB, Senador Cássio Cunha Lima.

    Ocupo, hoje, esta tribuna para falar de doença, ou melhor, de doenças. Sei que é um tema do qual não gostamos muito de falar. Não falamos muito das doenças físicas, talvez por medo delas, mas também venho falar da doença da alma, que chamo neste momento de doença ou doenças institucionais. Destas, muitas vezes, não falamos porque temos tendência a negá-las.

    A doença institucional a que me refiro - ou as doenças institucionais que estão contaminando todo o Brasil, a República Federativa - tem ameaçado nossa jovem democracia. Tem ameaçado a democracia, Sr. Presidente, porque está levando a nossa geração de jovens, nossos filhos, nossos netos a terem de conviver e de aprender com conceitos que considerávamos, até então, enterrados no passado, ainda que não muito longínquo. As doenças a que me refiro são doenças que não faziam mais parte do quotidiano e do vocabulário e que não eram sequer do conhecimento da nossa juventude.

    Estou falando de doenças como a inflação, a recessão, o desemprego, a segregação social e política. Quero utilizar esse termo de forma muito específica e trocar a palavra "segregação" pela palavra "intolerância". Essa intolerância tem dividido a sociedade brasileira. Ela já nos dividiu social e politicamente. Ainda não nos dividiu como povo, mas, hoje, já é uma febre generalizada, institucionalizada, como a febre zika. É uma epidemia como a da zika, mencionada pelo Líder do PSDB, e a de sua filha maldita, a microcefalia. Essa doença nos assusta, tem nos assustado, porque, na realidade, não só assombra as jovens mulheres e mães brasileiras que se preocupam com o futuro de seus futuros filhos, mas também nos preocupa e nos atinge como futuro, como Nação.

    A microcefalia não apenas reduz o cérebro dos nossos bebês e causa com isso danos neurológicos irreparáveis, até mesmo doenças que nem sequer ainda conhecemos. Ela é mais grave. Tanto a febre zika quanto a microcefalia estão contaminando e atingindo todos os filhos não só dessas mães, mas toda uma geração futura. Srs. Senadores, Srªs Senadoras e todos que nos estão ouvindo, falo da próxima geração, que receberá de nós este projeto inacabado de Brasil, esta geração que terá a responsabilidade de fazer aquilo que não estamos tendo a coragem e a capacidade de fazer.

    Confesso que não sei qual é a epidemia ou a febre mais nefasta, se a febre zika ou a institucional. Sobre esta, a institucional, na forma de segregação, de intolerância, que lança essa nuvem escura sobre o nosso projeto futuro de Nação, ela hoje pode ser vista não mais de forma oculta, sem rosto e sem face, pela internet, pelo WhatsApp, pelos meios de comunicação eletrônica. Essa febre generalizada da intolerância é vista nas ruas, nas reuniões dos almoços de domingo e dos aniversários, nas discussões entre pais, entre amigos, entre conhecidos, entre irmãos brasileiros. Ela chega às raias da agressão e do ódio, do ódio de um povo que tinha orgulho de dizer que era o povo mais pacífico do globo terrestre.

    E, se hoje tanto os filhos da zika quanto os nossos filhos e irmãos brasileiros se encontram ameaçados, como estão ameaçados todos os doentes, como foi bem lembrado aqui num aparte, que, infelizmente, quando precisam da saúde pública, encontram-na de forma precária e omissa, se eles estão ameaçados, Srs. Senadores e Srªs Senadoras - este é o cerne da minha fala -, isso é uma prova cabal de que falhamos. É preciso reconhecer esse erro. É preciso reconhecer essa falha.

    Com muito prazer, ouço o Senador Cássio.

    O Sr. Cássio Cunha Lima (Bloco Oposição/PSDB - PB) - Senadora Simone Tebet, agradeço a oportunidade do aparte que V. Exª me concede, para, mais uma vez, em primeiro lugar, registrar o trabalho sempre muito competente, sereno, firme, dedicado, capaz e qualificado que V. Exª vem exercendo no Senado da República. Não é difícil para mim admirá-la, porque conhecemos nós dois a relação de fraternidade e de amizade que uniu nossos pais, e isso transborda na nossa relação no Senado. Eu gostaria de, publicamente, mais uma vez, fazer a consignação da admiração do trabalho que V. Exª realiza, com muita altivez, com muita independência, com muita firmeza, num momento grave da vida nacional. O tema que V. Exª traz à tribuna do Senado mais uma vez precisa ser, de fato, incorporado à agenda diária do Congresso Nacional, da imprensa brasileira, porque os brasileiros estão sofrendo, estão morrendo numa proporção jamais vista na história recente deste País. É claro que problemas na área de saúde nós tivemos sempre. Sempre tivemos dificuldades no modelo arrojado, criado na Constituição de 1988, do Sistema Único de Saúde. Talvez, sejamos o único País do mundo com a nossa dimensão territorial de um verdadeiro continente e com uma população expressiva que optou por um regime ou um sistema universal de atendimento em saúde. Então, o atendimento em saúde pública sempre foi um grave problema. Só que agora estamos vivendo uma calamidade pública. Não é apenas a falta de um medicamento ou a ausência de humanização em um atendimento ou a inexistência de vagas em um hospital; estamos falando de mortes em proporções jamais vistas. É duro dizer isso, mas as pessoas estão morrendo abandonadas; as pessoas estão morrendo entregues à própria sorte. As que conseguem sobreviver sofrem barbaridades, sofrem dores físicas, limitações extremas. É um quadro caótico, um quadro de calamidade pública. Eu não estou sendo dramático na minha fala, mas é preciso que o Senado Federal possa cobrar das autoridades, dos Governos estaduais, e aqui não há crítica dirigida a esse ou àquele partido, mas a todos os governantes do Brasil, que precisam adotar uma providência. Não é possível que um País como o nosso não consiga comprar um fumacê para as cidades, para os Estados! Os Estados não tomam providências! Eu estive, Senadora Simone - não quero me alongar muito no meu aparte -, como faço com muita frequência, como V. Exª faz, seguramente, no Mato Grosso do Sul, visitando algumas cidades da Paraíba, notadamente do Vale do Piancó. Estive em Conceição, passei por Ibiara, Diamante, Itaporanga, fui a Monteiro, Sumé. Especificamente em Itaporanga, praticamente toda a população daquela cidade já foi contaminada ou pela dengue, ou pelo zika, ou pelo chikungunya. Falava, há poucos instantes, com o Prefeito Fábio Moura - registrei isso ontem, aqui no Senado - da cidade de Riachão. Praticamente a metade daquela população já foi contaminada. Eu estou citando apenas dois exemplos, mas isso pode ser generalizado. As mortes estão ocorrendo, e as pessoas não sabem a quem recorrer. É um estado de calamidade verdadeiro, que se soma àquilo que o Senador Blairo disse há poucos instantes na tribuna, com esse quadro de desemprego. Ou seja, o Brasil caiu num abismo. Não é que estamos à beira do precipício. Não, nós já caímos no abismo. É preciso, com urgência e com a emergência que a situação nos impõe, adotarmos providências para ontem, para que pelo menos nesses quadros agudos de emergência e urgência o Estado brasileiro possa agir. E aí eu me refiro especificamente a esse drama da população atingida com a gripe H1N1, com o zika, com o chikungunya, com a dengue, nesse verdadeiro estágio de calamidade pública em que o Brasil vive. É isso mesmo. Estamos diante de uma calamidade pública, com um governo omisso, incompetente, insensível, desumano, que permite que milhões e milhões de brasileiros não apenas sofram terríveis dores físicas, limitações de toda ordem, mas percam suas vidas. Vidas estão sendo ceifadas. É preciso que se dê um basta urgente nessa situação e que possamos tomar providências para salvar aquelas vidas que podem ainda ser salvas, lamentando aquelas que já perdemos pela omissão, pela incompetência, pelo desgoverno que impera hoje no Brasil. Agradeço a V. Exª pelo aparte e cumprimento-a mais uma vez não apenas pelo pronunciamento, mas por sua atuação digna e honrada no Senado da República.

    A SRª SIMONE TEBET (PMDB - MS) - Obrigada, Senador Cássio, pelas palavras gentis. Eu que agradeço o seu aparte, se me permitir incorporá-lo ao meu pronunciamento, porque V. Exª só engrandece e enriquece a minha fala, neste que é o Dia Mundial da Saúde. E eu não iria nem mencioná-lo, porque, na realidade, seria mundial lá fora, em homenagem à saúde ou à saúde pública que é feita mundo afora. Aqui nós podíamos muito bem dizer que este dia 7 de abril é o dia nacional da falta dela, dia da falta de saúde pública no Brasil.

    Muito bem lembrou o Senador Cássio, fazendo um paralelo com a fala do Senador Blairo, com relação ao zika e a todas as consequências trazidas pelo vetor Aedes aegyti: microcefalia, dengue, chikungunya, febre amarela, que ouvi falar agora que é uma preocupação, uma vez que ela ainda é uma epidemia em alguns países da África, de voltar a sê-lo aqui também no Brasil.

    Aliado a essa microcefalia física e às doenças endêmicas que o Brasil vive, não só de hoje, também do passado, nós temos uma outra microcefalia que precisa ser analisada. Essa, talvez, seja a grande responsável pela microcefalia física. Eu me refiro à microcefalia política. Se a microcefalia física significa a redução do cérebro dos nossos bebês e das nossas crianças, causando, como eu disse, danos neurológicos irreparáveis, a microcefalia política atrofia, é a miopia da classe política de conseguir enxergar além do hoje. Isso é a miopia. Eu sou míope e sei muito bem. Eu enxergo muito bem até uma determinada distância; depois, fica tudo embaçado. Mas enxergo tão bem de perto que ainda não preciso, apesar de ter passado dos 40 anos, de óculos para perto. É isso que a nossa classe política está vivendo.

    Nós estamos conseguindo ver o hoje, e não conseguimos nem virar a página e resolver o problema do agora. Em compensação, o amanhã e o depois de amanhã parecem estar à distância! E parece haver uma nuvem gravíssima perante a nossa visão.

    Essa microcefalia política levou à intolerância, leva ao descaso com a educação, leva à violência urbana, leva à falta de planejamento e de combate às desigualdades sociais e regionais. É desse futuro muito próximo que estou falando. E estamos, infelizmente, por essa microcefalia política, essa doença institucional, essa febre que acometeu todos nós, inertes, apáticos, sem saber para onde ir, aguardando um acontecimento político, como se, depois do acontecido, com ou sem impeachment, nós tivéssemos um outro Brasil. Não teremos um Brasil melhor com ou sem impeachment. Nós teremos um Brasil com problemas imensos, que ficaram se acumulando, sem ações permanentes e constantes, e teremos um problema ainda muito maior a ser resolvido.

    Mas, como eu disse, cabe a cada um de nós assumir a responsabilidade, mas também agir e ter a certeza de que esse descalabro não é fruto do acaso ou do acidente. O Aedes aegypti, que já foi erradicado por duas vezes - no início do século passado e, depois, na década de 50 -, voltou na década de 70. A pergunta é: por quê? Por causa do descaso, da omissão, da má gestão, da incompetência e, por que não dizer, principalmente, por causa da corrupção, Sr. Presidente, da falta de reformas estruturantes.

    Da mesma forma que faltou e falta uma reforma urbana para resolver os problemas caóticos das nossas cidades, falta uma reforma política para reformar a classe política e todos nós. Resta saber - e já indo para a fase final da minha fala - se conseguiremos, Senador Walter, fazer a reforma urbana necessária para fazer uma limpeza, a começar pelo saneamento básico nas nossas cidades, fonte principal dessa endemia, dessa epidemia de dengue, zika e chikungunya.

(Soa a campainha.)

    A SRª SIMONE TEBET (PMDB - MS) - Resta saber se conseguiremos fazer um planejamento urbano para as nossas cidades, que cresceram de forma desordenada, fruto do êxodo rural do final do século passado e do crescimento populacional, que acabou sendo acelerado, chegando a cidades totalmente despreparadas, sem instrumentos públicos eficientes para acolher toda essa população, de forma igual e com serviços públicos de qualidade.

    Mas, principalmente, resta saber se nós teremos a coragem e a capacidade de fazer as reformas estruturantes, a começar pela mãe de todas elas, que é a reforma política.

    Não há outra saída. Eu aqui, já finalizando, quero ler uma frase que me chama muito a atenção e que é muito pertinente ao momento.

(Soa a campainha.)

    A SRª SIMONE TEBET (PMDB - MS) - Hegel, filósofo alemão, disse certa vez que um organismo fica doente, quando um ou mais órgãos deixam de trabalhar em benefício do conjunto, o que cria um sistema de desequilíbrio, que, no limite, levará à morte o organismo como um todo. Se o coração ou o cérebro para, o corpo morre.

    E pergunto se não é isto o que está acontecendo com o País: um desequilíbrio desordenado, a começar dos Poderes, que ainda são independentes, ainda, mas não mais harmônicos; um presidencialismo atual diferente do que preceitua o Texto Constitucional, um presidencialismo de coalizão que realmente, infelizmente, não une coisa alguma ao interesse público, mas que, ao contrário, hoje serve para barganhas de cargos e ministérios da forma mais agressiva possível.

    Antes eram oferecidos cargos e ministérios em nome da governabilidade, e num limite isso é razoável, porque ninguém governa sozinho. Mas hoje esse presidencialismo de coalizão passou a ter outro nome, essa barganha, que hoje muitos dizem com o nome bonito de repactuação, tem um nome muito claro: chama-se balcão de negócios, fisiologismo, da forma mais nefasta e endêmica, esse fisiologismo que está fazendo com que se entreguem cargos e ministérios por conta de voto, voto contra o impeachment.

    Esse desequilíbrio não é só dos Poderes, mas também partidário. E esse é um grande dilema que sempre vivi dentro do meu Partido e que espero que o atual Presidente, Romero Jucá, tenha a capacidade de mudar.

    Que o meu Partido, o PMDB, possa voltar a ouvir as bases, e não fazer, num sistema de ditadura partidária...

(Interrupção do som.)

    A SRª SIMONE TEBET (PMDB - MS) - Já estou concluindo, Sr. Presidente. Não preciso mais do que os dois minutos colocados no painel.

    Espero, sinceramente, que o nosso Partido, a partir de agora, com a Presidência do Senador Romero Jucá, virando uma página, possa voltar a ouvir as bases deste Partido, que não é nacional, mas um Partido regional; e que, através das bases, nós possamos voltar a ser o partido de Ulysses Guimarães.

    Na minha fala final, ao agradecer a paciência de todos, quero finalizar, Senador Dário - V. Exª também é do meu Partido e sei que tem a mesma linha de pensamento -, dizendo que o Brasil está doente. O Brasil está numa febre endêmica generalizada.

    E nós não podemos deixar que essa febre, Senadores, vire uma convulsão. É preciso que voltemos a ter uma institucionalidade forte.

(Soa a campainha.)

    A SRª SIMONE TEBET (Bloco Maioria/PMDB - MS) - Que possamos fortificar as instituições e fortalecer a democracia, sob pena de matar a nossa querida democracia e os ideais democráticos da justiça social.

    É preciso restabelecer o equilíbrio. Mas é preciso restabelecer o equilíbrio não apenas com base nos princípios legais; sim, através de pilares sólidos como o da legalidade, como também através dos princípios da publicidade, da impessoalidade, da eficiência, mas, acima de tudo, em cima de pilares sólidos como o da moralidade e o da ética.

    Eu sei, Srs. Senadores, que estou pedindo muito, porque é preciso coragem. É preciso coragem para mudar, mas é preciso mudar.

    Muito obrigada, Sr. Presidente, pela paciência.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/04/2016 - Página 18