Discurso durante a 49ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Críticas à tentativa do Governo Federal de usar cargos da Companhia de Eletricidade do Amapá a fim de obter votos contrários ao "impeachment".

Autor
Randolfe Rodrigues (REDE - Rede Sustentabilidade/AP)
Nome completo: Randolph Frederich Rodrigues Alves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PUBLICA E IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA:
  • Críticas à tentativa do Governo Federal de usar cargos da Companhia de Eletricidade do Amapá a fim de obter votos contrários ao "impeachment".
Publicação
Publicação no DSF de 13/04/2016 - Página 79
Assunto
Outros > CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PUBLICA E IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA
Indexação
  • CRITICA, GOVERNO FEDERAL, OFERECIMENTO, CARGO DE DIREÇÃO, COMPANHIA DE ELETRICIDADE DO AMAPA (CEA), OBJETIVO, OBTENÇÃO, VOTO CONTRARIO, PROCESSO, IMPEACHMENT, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, CAMARA DOS DEPUTADOS, DEFESA, AFASTAMENTO, PRESIDENTE, MICHEL TEMER, VICE-PRESIDENTE DA REPUBLICA.

    O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco Socialismo e Democracia/REDE - AP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, senhores que nos assistem e nos ouvem pela TV Senado e pela Rádio Senado, quero mais uma vez trazer à tribuna um tema que tem sido recorrente, que é a situação da Companhia de Eletricidade do meu Estado, a CEA.

    Eu queria desconectar o tema da CEA da grave crise que nós atravessamos hoje no País, mas isso é impossível. Lamentavelmente, Sr. Presidente, nós estamos assistindo no País hoje ao maior festival de fisiologismo da história republicana. Eu diria que a atual Presidente da República poderia não ter razões para o impeachment no processo que está tramitando na Câmara, mas o processo de troca de favores por votos, de troca de cargos por votos, talvez esse já fosse motivo para tal.

    E não é só da parte dela o que nós estamos assistindo. Nós estamos assistindo ao fisiologismo dos dois lados: fisiologismo da parte da atual Presidente da República e fisiologismo da parte do Vice-Presidente, prometendo o que ainda não tem, que são os cargos do seu futuro governo.

    Lamentavelmente, Senador Medeiros, no balcão do fisiologismo, esta semana ocorreu o que nós, no Amapá, menos imaginávamos: a troca por voto da companhia de eletricidade do nosso Estado, que está em vias de federalização.

    Neste aspecto, antes detalhar o que ocorreu, da troca de votos para impedir o impeachment e o sacrifício no altar da companhia de eletricidade do meu Estado, é importante nós sabermos, eu vou historicizar, a situação da Companhia de Eletricidade do Amapá.

    As dívidas da CEA, por irresponsabilidade de seus dirigentes, ao longo do tempo, ao longo de pelo menos 20, 25 ou 30 anos, chegaram à estrondosa cifra de aproximadamente R$1,4 bilhões.

    Para se ter uma ideia, a dívida da Companhia de Eletricidade do Amapá se tornou mais da metade do orçamento global do Estado. A CEA tomou emprestado, junto à Caixa Econômica Federal, o mesmo valor que seria repassado para a empresa em quatro parcelas. Dessas quatro parcelas, três foram liberadas, endividando a companhia e endividando o Estado. Falta uma das parcelas.

    Desse montante, R$1,4 bilhão foram destinados ao pagamento das dívidas da empresa e cerca de R$260 milhões foram alocados para investimentos e para a formação de um fundo, o Fundo para Despesas Eventuais e Capital de Giro (Funac).

    Ocorre, Sr. Presidente - veja a contradição e a incoerência -, que como condição para liberação do empréstimo por parte da Caixa Econômica Federal, foi firmado um acordo de acionistas entre o Governo do Estado e a Empresa Brasileira de Energia Elétrica (Eletrobras), em nome da União. Esse acordo previa, dentre outras cláusulas, a obrigatoriedade de indicação eminentemente técnica para os principais cargos de gestão. Esse acordo foi firmado em 12 de setembro de 2013.

    Conforme o previsto nesse acordo, caberia à Eletrobras a indicação do diretor presidente e do diretor de planejamento e expansão e caberia ao Governo do Estado do Amapá a indicação da diretoria executiva, assim como a indicação majoritária dos membros do Conselho de Administração e Fiscal caberia a essa repartição.

    Repito: no acordo firmado em 12 de setembro de 2013, o critério de nomeação deveria ser eminentemente técnico, de administradores com pelo menos dois anos de experiência em gestão, em direção de empresa de energia elétrica, isso para tentar sanar ou reduzir a situação de extrema gravidade, que hoje traz enormes dificuldades em atender a demanda de distribuição de energia com o mínimo de qualidade para os cidadãos do Amapá.

    Esse quadro de ineficiência da Companhia de Eletricidade do Amapá, responsável hoje pela insustentabilidade do abastecimento e fornecimento de energia elétrica na capital, Macapá, e nos principais Municípios do Estado do Amapá, foi exposto, há uma semana, aos membros da Bancada federal, em uma reunião.

    Pois bem, Sr. Presidente, logo após sua exposição sobre a situação da CEA, sobre as dificuldades, o então Presidente da Companhia de Eletricidade do Amapá, Sr. Angelo do Carmo, um técnico conceituado da Eletrobras, recebeu o comunicado de sua exoneração. A própria União descumpre o acordo que havia estabelecido. Ocupou o cargo um cidadão indicado por uma Deputada Federal da Bancada do Amapá. Agora parece que já mudou a indicação, que deverá ser feita por outro Deputado Federal. Não importa quem vai ocupar o cargo, por melhor que seja o currículo, mas foi rompido o acordo de indicação técnica que o próprio Governo do Estado do Amapá firmou com a Eletrobras.

    Volta o balcão de cargos, que levou a CEA a uma situação pré-falimentar. Só advirto para o fato de que a CEA está na iminência de uma situação pré-falimentar. O próprio Estado do Amapá não tem hoje condições financeiras de sustentar a CEA. A única alternativa seria a federalização.

    Só que entregar a companhia de eletricidade no balcão de negócios para evitar o impeachment significa condenar o povo do Amapá a daqui a pouco ter decretada a caducidade da concessão de energia elétrica para a CEA por parte da Aneel e, com isso, deixar o povo amapaense sem sua distribuidora de energia elétrica, que vai acabar sendo entregue, num leilão de energia elétrica, e alguma empresa de energia elétrica privada vai consegui-la como troco, aumentando a tarifa de energia elétrica para os cidadãos amapaenses, para o povo do Amapá.

    No final das contas, a venda no balcão de negócios da Companhia de Eletricidade do Amapá para evitar o impeachment só vai resultar em uma conta alta a ser paga pelo povo amapaense, com o aumento da tarifa de energia elétrica.

    Ora, Sr. Presidente, a cláusula 5ª do Acordo de Acionistas, como eu já disse, exigia uma condição mínima para os diretores nomeados: que apresentassem no currículo o mínimo de dois anos nos cargos de direção de empresas de energia. Isso não foi considerado. Vale tudo no balcão. Eu sei que está valendo tudo de qualquer jeito, vale tudo da parte do Vice-Presidente para assumir a cadeira, vale tudo da parte da Presidente para evitar sair da cadeira. Repito, Sr. Presidente, esse leilão do cargo de presidente da Companhia de Eletricidade do Amapá no balcão, para evitar o impeachment, é uma medida que rasga o termo de compromisso e o Acordo de Acionistas para o saneamento da Companhia de Eletricidade do Amapá.

    As consequências podem chegar, Sr. Presidente, até a intervenção da Aneel. Como eu já disse, podemos ter a decretação da caducidade e, consequentemente, a concessionária de energia elétrica do Amapá, a distribuidora de energia elétrica do Amapá, não ser mais uma empresa pertencente ao Poder Público, à União ou ao Estado do Amapá.

    Quero destacar aqui o que foi dito pelo Presidente do Sindicato dos Urbanitários, o Sr. Audrey Cardoso, que eu subscrevo:

Nós pagamos a conta até hoje de más gestões que passaram por aqui. Inclusive, todas eram indicações políticas. Geralmente, essas indicações usam a empresa para favorecimento em campanhas eleitorais e nós não vamos aceitar que a companhia afunde em dívidas novamente.

    Ora, Sr. Presidente, eu queria também ser otimista, mas não há outra consequência à Companhia de Eletricidade do que a utilização dela em processos eleitorais. É para isso. Por que razão político quer indicar direção da companhia de eletricidade do meu Estado? Não há outra razão senão a utilização da empresa nos processos eleitorais, afundando ainda mais a empresa.

    Veja, Sr. Presidente, as indicações políticas para a Companhia de Eletricidade datam dos anos 80. Isso foi responsável por levar uma das empresas de energia mais rentáveis da Amazônia e do Brasil à bancarrota em que está agora, a uma dívida superior a R$1 bilhão. Dívida essa que foi contraída também pelo Estado e que também impõe seus encargos às contas públicas do Estado do Amapá, porque parte do seu orçamento público tem que ser destinado a sanar os compromissos com essa dívida, com a dívida contraída pela Companhia de Eletricidade do Amapá.

    Parece-me de uma irresponsabilidade, de uma insensatez algum representante político ver a situação em que está a companhia de eletricidade do meu Estado e achar que a melhor coisa que pode fazer pelo povo do seu Estado é a indicação de um apaniguado, de um indicado seu para trocar o seu voto - além da indignidade da troca do voto do impeachment aqui -, a melhor coisa que pode fazer é utilizar como balcão de negócios uma empresa que, repito, está em situação pré-falimentar.

    Quero reiterar, Sr. Presidente: a Presidente da República, entregando a companhia de eletricidade no balcão de negócios para evitar o seu impeachment, atenta contra o povo do Amapá. Os políticos, mesmo membros da nossa Bancada federal, que utilizam da companhia de eletricidade do meu Estado para trocar o seu voto no balcão do impeachment atentam contra os interesses do povo do Amapá, porque isso significará que, dentro de pouco tempo, nós percamos a nossa distribuidora de energia elétrica, que já está comprometida.

    O esforço que estava sendo feito pela diretoria indicada pela Eletrobras era gigantesco, Sr. Presidente, estava sendo gigantesco, no sentido de sanear a empresa e mantê-la nas mãos e no controle do Poder Público, mesmo que fosse federalizado nas mãos do controle da União.

    Eu lamento muito, Sr. Presidente, e falo isso para concluir. Eu lamento muito. Nós estamos assistindo ao maior festival de fisiologismo da história brasileira. O fisiologismo é uma das piores faces da corrupção. Os Parlamentares lá na Câmara deveriam votar com a sua consciência, a favor ou contra o impeachment. Os Parlamentares lá na Câmara deveriam ser orientados pela convicção que têm no processo que tramita em relação à Senhora Presidente da República, formar sua convicção: se é pela instauração do processo ou se é pela absolvição dela. Mas isso é uma convicção republicana a ser formada na consciência de cada um dos Parlamentares, à luz do processo.

    Eu repito: o que se denota, neste momento, contra a Presidente da República é esse balcão de negócios para evitar o seu impeachment. Eu repito aqui: o que se denota, neste instante, contra o Vice-Presidente da República é o balcão de negócio para assumir a cadeira de Presidente. Os dois se completam, prova mais do que material de que PMDB e PT são faces da mesma moeda. Por isso é que o meu Partido, acertadamente, defende a posição de que a melhor alternativa para essa crise política não seria o impeachment, mas, sim, o afastamento dos dois e a realização imediata de novas eleições. Eu acho que o mais legítimo seria que, o quanto antes, o Tribunal Superior Eleitoral julgasse o processo que está lá em relação à impugnação da chapa de eleitos. Ambos estão se locupletando nesse jogo. E é verdade que a responsabilidade dessa crise política não pode ser jogada nas costas somente de um partido político: o PMDB é cúmplice dos erros da política econômica; o PMDB é cúmplice do consórcio de poder que se apossou do Brasil nos últimos anos; o PMDB tem tanta responsabilidade quanto o Governo da Senhora Dilma Rousseff. Então, não venha um se isentar da responsabilidade que também é do outro.

    Eu só lamento - e falo isso para concluir, Presidente -, eu só lamento que, a esta altura, o triste e sujo balcão de negócios da política brasileira seja visto como nunca na história deste País. Como nunca na história deste País, repetiu-se o triste jogo do fisiologismo, da troca de favores por emendas e por cargos, como nós estamos vendo nestes dias que antecedem a deliberação, a votação do impeachment na Câmara dos Deputados. Nós, com certeza, nunca, na história republicana, tínhamos assistido a um festival lamentável dessa natureza.

    Eu só lamento mais ainda que o povo amapaense, o povo do meu Estado, esteja sendo vítima desse jogo de barganha, de favores e de fisiologismo com o leilão - leilão! - às claras, o leilão em lentes abertas, da nossa companhia de eletricidade. E com a inviabilização, em definitivo - porque é isso o que nós estamos vendo -, da possibilidade de o povo do Amapá ainda ter, em posse do Poder Público, a sua companhia de eletricidade.

    A consequência disso, lamentavelmente, será triste e dramática para os amapaenses. A consequência disso será a perda da concessão, a caducidade da concessão, a transferência da concessão da distribuidora de energia elétrica, num leilão, para alguma empresa privada, o que representará o aumento inominável, ainda mais, da tarifa de energia elétrica no meu Estado. No jogo triste do fisiologismo, no balcão de negócios da política, lamentavelmente, o preço final a ser pago é por parte do povo, por parte do povo brasileiro e, nesse caso específico, por parte do povo do meu Estado.

    Obrigado, Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 13/04/2016 - Página 79