Discurso durante a 53ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Reflexões sobre o instituto jurídico do impeachment.

Autor
Ricardo Ferraço (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/ES)
Nome completo: Ricardo de Rezende Ferraço
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Reflexões sobre o instituto jurídico do impeachment.
Aparteantes
Lindbergh Farias, Vanessa Grazziotin.
Publicação
Publicação no DSF de 19/04/2016 - Página 5
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • ANALISE, INSTITUTO, DIREITO, IMPEACHMENT, REFERENCIA, PAULO BROSSARD, JURISTA, PROFESSOR UNIVERSITARIO, REGISTRO, COMPETENCIA, SENADO, JULGAMENTO, MERITO, PROCESSO, AFASTAMENTO, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA.

    O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Oposição/PSDB - ES. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Jorge Viana, Srªs e Srs. Senadores, brasileiros e capixabas que nos acompanham pela TV Senado, Senadora Vanessa, Senadora Ana Amélia, nossos colegas, o sentido maior da minha vinda à tribuna é, naturalmente, repercutir a decisão adotada pela Câmara dos Deputados nesse domingo.

    À luz dos fatos, das evidências, dos indicativos, mais de 70% dos Deputados Federais votaram favoravelmente à admissibilidade, ou seja, dando autorização para que o Senado Federal, como determina a Constituição Federal, como juiz natural, faça a avaliação relacionada aos crimes cometidos pela Presidente Dilma e pelo seu Governo.

    Diante desses fatos, Senadora Ana Amélia, procurei orientação e inspiração em um conterrâneo de V. Exª, homem público de extraordinária presença não apenas na política do Rio Grande do Sul, mas na política brasileira. Ex-Senador da República, Ministro da Justiça, catedrático em Direito Constitucional da PUC de Porto Alegre, Ministro do Supremo Tribunal Federal, é sempre dele, do Prof. Paulo Brossard, o mais completo estudo científico desapaixonado sobre o instituto do impeachment, que não nasce no Brasil e tampouco tem vida curta, tem uma vida muito, muito longa.

    Deixou Paulo Brossard, homem público de primeira grandeza, que teve um compromisso fundamental em sua vitoriosa e exitosa jornada pessoal, política e existencial, muitos ensinamentos. Paulo Brossard foi um homem devotado à causa democrática. Lutou e resistiu duramente contra o regime autoritário e a ditadura militar, de quem foi um duro e competente opositor.

    E vêm desse extraordinário homem público, jurista e político os principais ensinamentos sobre o instituto do impeachment, que pela segunda vez o nosso País está tendo que enfrentar, o que não é motivo de alegria para nenhum de nós. Nenhum de nós deve torcer para uma circunstância e uma quadra como essa, porque essa circunstância e essa quadra é uma quadra delicada da nossa vida política.

    O fato objetivo é que o estudo completo do ex-Ministro Paulo Brossard, Senador Lindbergh, ganha mais dimensão e domínio a partir de 1992, porque os ensinamentos contidos no livro do ex-Ministro Paulo Brossard, de 1965, foi escrito ainda como tese acadêmica para acadêmicos e especialistas, mas, a partir do impedimento do Presidente Collor, a obra de Paulo Brossard, sobretudo o que está relacionado com o impeachment, ganha muito mais dimensão e popularidade.

    O estudo do Prof. Paulo Brossard estabeleceu com precisão a exata fisionomia do impeachment, sua natureza, sentido, alcance e objetivo; seu lugar, inclusive, na órbita Federal e dos Estados.

    Fez Paulo Brossard uma profunda pesquisa, com riquezas de detalhes, sobre o nascimento do impeachment, ainda na Grã-Bretanha, depois migrando para os Estados Unidos, de onde recolhemos a inspiração para incorporar, no Direito brasileiro, a figura do impeachment, a partir da República, com plena jurisdição, como se fosse um tribunal, aplicando a pena que for necessária.

    Nos Estados Unidos, o Senado decide apenas pela perda ou não do cargo do Presidente. O homem permanece intocado. Há ali um enfrentamento de tese, porque, no Parlamento britânico, o impeachment não é apenas um julgamento político. Aplicam-se também as penas comuns, ou seja, aquilo que está previsto no Código Penal, diferentemente do Brasil.

    Em nosso País, seguimos o modelo norte-americano. No limite, o que se faz é, de fato, o afastamento, no caso Federal, do Presidente da República, e, no caso dos Estados, dos Governadores, porque o impeachment também é um instrumento para afastar Governadores que eventualmente vão de encontro às Constituições estaduais.

    O fato objetivo é que, na República, passou a ser simplesmente político, como nos Estados Unidos, e assim segue nos dias atuais. Não tem no Brasil, assim como nos Estados Unidos, o caráter de pena, buscando apenas retirar, afastar o governante do seu cargo.

    Leciona Paulo Brossard que, antes de tudo, o interesse maior é proteger o Estado e não punir o delinquente. Uma vez afastado o governante do seu cargo, o processo já não tem mais sentido algum e não prosseguirá. O que motiva o processo é o governante que gere erroneamente a coisa pública, e sua condenação não tem caráter de pena, visando apenas que ele deixe o cargo. Ou seja, o impeachment é, portanto, um julgamento político em bases jurídicas, e não tem o caráter de punir o governante, mas de proteger o Estado do governante que viola a Constituição Federal, como é o caso, a meu juízo, da Presidente Dilma. Uma vez afastada em definitivo - o que considero ser o caminho natural -, ela terá que responder pelos seus crimes comuns diante do Supremo Tribunal Federal.

    O estudo do Prof. Brossard é exaustivo e magnificamente organizado e apoiado na melhor doutrina existente na época. Dispôs-se, como disse aqui, a deixar clara a fisionomia do impeachment, sua natureza, sentido, alcance e objetivo, seu lugar na órbita federal e também nos Estados.

    Bebendo, enfim, dessa fonte, retiramos a lição de que o processo de impeachment tem um forte ingrediente político e só avança na medida em que o governo transgride os bens constitucionalmente protegidos por sua figura, distanciando-se, portanto, da sociedade. Sua legitimidade encontra-se no âmbito da Constituição e exige, além desse evidente ingrediente político, que tenha havido o chamado crime de responsabilidade, consistente no atentado aos valores basilares da República e da democracia, enunciados no art. 85 da Constituição Federal.

    Mas a sua natureza e expressão política, além de sua grave repercussão, ou seja, a mais severa delas, a de afastar o Presidente da República, remete ao juízo sobre as condições para sua efetivação, tanto a jurídica, no caso, a ocorrência do crime de responsabilidade, como a política, sua necessidade para a preservação do Estado desse governante que viola as regras constitucionais. Ou seja, ao Poder Legislativo é dada essa prerrogativa, em primeiro plano, à Câmara, que faz a denúncia, e, num segundo momento, ao Senado, que é o julgador natural das denúncias e das acusações.

    O Poder Judiciário, por não ter seus agentes derivados do voto popular, não reúne as condições de legitimidade política para interferir nesse julgamento de mérito. O mérito, portanto, do impedimento da Presidente da República é do Congresso brasileiro: num primeiro momento, da Câmara, e, no segundo momento, do Senado, que acaba se transformando em uma espécie de tribunal extraordinário, de juiz natural.

    Não por outro motivo, em todas as democracias estáveis, esse é um processo, como eu disse aqui, que tem como juízo natural o Parlamento.

    Nosso Constituinte foi nessa esteira de entendimento. Estabeleceu um processo em que a Câmara dos Deputados, ao admitir a denúncia, torna-se autora; e o Senado, o seu juiz natural. Teve também o Constituinte o cuidado de estabelecer um processo em que as decisões parlamentares se darão por maioria qualificada, capaz de constatar tanto a gravidade política da acusação como da situação política que exija o afastamento da Presidente da República. Esse quórum qualificado igualmente assegura que não se estabeleça uma maioria circunstancial ou mesmo uma maioria despótica. E é o caso. Mais de 70% dos Deputados Federais, aliás, alinhados com a opinião pública brasileira, votaram pelo impedimento. Essa votação, por óbvio, não é obra apenas daqueles que fazem oposição: grande parte desses votos veio da própria Base do Governo. O Governo está experimentando aquilo que plantou ao longo desses anos, que foi um esgotado presidencialismo de coalizão que, na prática, se revelou, ao longo do tempo, como um presidencialismo de cooptação. Ou seja, o que esteve em jogo foi a fragilidade da identidade política e programática dessa Base política, que sempre se estabeleceu pelo troca-troca, pelo aparelhamento, efetivamente, pela velha política, pela política de baixa qualidade, na qual se coloca o interesse...

    A Srª Vanessa Grazziotin (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - Senador, concede-me um aparte?

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - Para mim também, Senador.

    O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Oposição/PSDB - ES) - Eu vou ouvir V. Exª com muito prazer, assim como ao Senador Lindbergh, eu só peço um pouco de paciência a S. Exªs, para que eu possa concluir o meu raciocínio. Terei, por óbvio, prazer e alegria em debater com V. Exªs.

    Portanto, não foi apenas a oposição, foi a própria Base do Governo que ruiu. E ruiu por quê? Porque essa Base nunca foi construída tendo como fundamento princípios, valores, projetos, programas. Não, essa Base foi construída em torno dos elementos mais frágeis de um Governo, ou seja, o interesse do curto prazo, o interesse do particular, o interesse do financiamento, o interesse, enfim, de manter o patrimonialismo partidário como forma de se estabelecer. Aí a Base ruiu. Quando o Governo precisou da sua Base, onde estava ela? A Base bateu asas, por conta dessa absoluta desorganização.

    A Constituição de 1988, ao manter o remédio extremo do impeachment, estabeleceu, portanto, a necessidade da ocorrência de crimes de atentado contra as bases republicanos e democráticas praticados pelo Presidente da República e um procedimento de julgamento capaz de assegurar um juízo de valor político acerca da gravidade do crime e da crise política decorrente do desajuste do Governo para com a sociedade.

    A Lei nº 1.079, de 1950, regulando o art. 85 do Texto Constitucional, imputa como crime ações, mas não apenas ações e atos, também omissões que atentem contra, entre outros, a probidade na Administração e na Lei Orçamentária. Aqui há naturalmente um debate, um debate que vai se estabelecer e vai se esgarçar nesta Casa, porque, para o meu juízo pessoal, a Presidente da República e o seu Governo cometeram crime de responsabilidade, diferentemente - tenho certeza - daquilo que pensa o Senador Lindbergh, a Senadora Vanessa e tantos outros.

    Acontece que o juiz natural que vai avaliar se houve crime ou não são os Senadores da República, não por ordem e capricho de cada um, mas porque a Constituição Federal delega ao Senado da República este papel, o papel de julgar se houve ou não crime.

(Soa a campainha.)

    O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Oposição/PSDB - ES) - Não cabe à Câmara dos Deputados dizer se houve ou não crime. Cabe à Câmara fazer a acusação. E todos nós, ao longo dos próximos dias e semanas, teremos que estar debruçados em torno deste tema. Eu pessoalmente estou convencido de que a Presidente Dilma violou a Constituição Federal; estou convencido de que ela atentou contra a Lei Orçamentária, atentou contra a probidade administrativa. E nós teremos amplo espaço para o enfrentamento dessas teses ou dessas opiniões ou desses juízos de valor ao longo dos próximos dias.

    Vejam que a Constituição, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, fala de ato da Presidente. O ato próprio da Presidente está por óbvio nos decretos, mas a omissão no dever funcional se compara ao ato quando ele se revela doloso. E eu estou também convencido de que tudo o que aconteceu em relação a essas violações, não apenas atentando contra as leis orçamentárias, mas assim como atentando contra a probidade administrativa, na minha opinião, na minha convicção, foi feito de caso pensado, foi feito de forma absolutamente premeditada.

    Ao discorrer sobre tais crimes, a Lei nº 1.079 tipifica não só a ação como a omissão do Presidente da República em atentar contra esses valores. Portanto, não só os atos típicos e próprios praticados pelo Presidente da República, mas também sua omissão no desempenho de seu poder-dever de zelar pelos princípios republicanos e democráticos, poderão, a meu juízo, ensejar a prática de tais crimes.

    A denúncia que receberemos e que nos exigirá o desempenho de nossa função constitucional de julgar a Presidente Dilma lhe imputa crimes de atentado à Lei Orçamentária e à probidade administrativa.

    Quanto à Lei Orçamentária, por infringir, patentemente e de qualquer modo, dispositivos da Lei Orçamentária: ordenar ou autorizar a abertura de crédito em desacordo com os limites estabelecidos pelo Senado, sem fundamento na Lei Orçamentária ou na de crédito adicional ou com inobservância de prescrição legal; ordenar ou autorizar, em desacordo com a Lei, a realização de operações de crédito com qualquer um dos demais entes da Federação, inclusive suas entidades da administração indireta - no caso dos bancos: Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal e assim por diante -, ainda que na forma de novação, refinanciamento ou postergação de dívida contraída anteriormente; todos, segundo a denúncia, praticados por atos próprios atribuídos à Presidente da República.

    Quanto à probidade na Administração, por não tornar efetiva a responsabilidade de seus subordinados quando manifesta em delitos funcionais ou na prática de atos contrários à Constituição e por proceder de modo incompatível com a dignidade, a honra e o decoro do cargo.

    Estamos diante de um modelo de governo, de um método de governar que se baseia na crença...

(Soa a campainha.)

    O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Oposição/PSDB - ES) - ... de que tudo é possível para realizar um projeto de poder quase messiânico, que dispensa os contrários e despreza a lei quando a lei não lhe interessa ou quando a lei lhe convém.

    Estamos diante de uma cultura política, liderada pela Presidente, pelo seu Partido e pelos seus aliados, que acredita que tudo é válido para ganhar as eleições, que tudo é válido para governar, desde mascarar as contas públicas até a prática de estelionato eleitoral, em que se promete o que se sabe que não se vai cumprir.

    A crise é grave e sua solução se dará pela afirmação dos valores republicanos e democráticos - já vou caminhando para o encerramento, Sr. Presidente...

    O SR. PRESIDENTE (Jorge Viana. Bloco Apoio Governo/PT - AC) - Já foram 20 minutos e há ainda os apartes. Falo isso para podermos dar uma dinâmica. Mas V. Exª terá o tempo necessário para fazer o discurso.

    O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Oposição/PSDB - ES) - Agradeço a delicadeza de V. Exª.

    A crise é grave e sua solução se dará pela afirmação dos valores republicanos e democráticos que adotamos na Constituição de 1988 e na manutenção da tradição desta Casa. Aliás, o Senado é a mais antiga das instituições brasileiras. O Senado sempre soube, com serenidade, mas com firmeza, manter a unidade nacional e corresponder à vontade soberana do povo brasileiro. Assim foi. Assim é, Sr. Presidente. E estou seguro que assim será.

    Tenho a mais absoluta convicção de que o Senado Federal saberá corresponder para com as expectativas da sociedade brasileira, procedendo a um julgamento justo, que compreenda o legítimo direito de defesa e do contraditório, mas atento à grave crise política gerada pelo Governo, de gravíssimas consequências para a sociedade, sobretudo para os mais pobres, para os mais humildes; procedendo a um julgamento intocável, do ponto de vista constitucional, agindo como juiz natural, última e mais legítima instância para apreciação da fundamentação do pedido de afastamento da Presidente, sua oportunidade e sua necessidade para que possamos reconstruir o nosso País a partir de todos os fatos e atos que estão presentes em nossa realidade.

    A meu juízo, é o caminho da Justiça, até porque postergar a Justiça é negar, por assim dizer, a própria democracia.

    Como as mulheres estão, meu caro Senador Lindbergh, sempre em primeiro lugar, peço licença a V. Exª para ouvir a Senadora Vanessa Grazziotin e, em seguida, terei a honra de ouvi-lo.

(Soa a campainha.)

    A Srª Vanessa Grazziotin (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - Senador Ferraço, quero dizer que serei mais breve do que eu gostaria, porque o tempo de V. Exª já expirou... Creio que a gente, como diz o Senador...

    O SR. PRESIDENTE (Jorge Viana. Bloco Apoio Governo/PT - AC) - Eu agradeço, porque há vários colegas que querem expressar sua opinião sobre a sessão de ontem na Câmara. Eu sou, inclusive, um dos inscritos.

    A Srª Vanessa Grazziotin (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - Perfeitamente. Então, até por conta de que o tempo do nobre e querido colega Senador Ferraço já tenha expirado, serei muito breve.

    O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Oposição/PSDB - ES) - Fique à vontade. É um enorme prazer ouvir V. Exª.

    A Srª Vanessa Grazziotin (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - Senador Ferraço, quero primeiro cumprimentar V. Exª e comparar um pouco o que está sendo o discurso de V. Exª com aquilo que vimos durante todo o debate da mais longa sessão já realizada pela Câmara dos Deputados. Eu não me recordo, Senador Ferraço, de quantos subiram à tribuna, seja ocupando o espaço da Liderança de partido, seja por inscrição individual ou até mesmo no encaminhamento do voto. Tenho analisado questões relativas ao teor do processo de impeachment. Todos lá diziam: "porque há muito desemprego", "porque a Lava Jato", e, aliás, vaiavam muito os Deputados que criticavam o Presidente que conduzia aquela decisão, o Presidente da Câmara, Deputado Eduardo Cunha. Ele, sim, diferentemente da Presidente Dilma, é réu no Supremo Tribunal Federal, sobre quem pesam inúmeras provas, não apenas suposições ou ilações, mas provas. Então, creio, Senador Ferraço, que esse é o rumo que devemos adotar aqui, no Senado Federal, porque impopularidade, crise econômica...

(Soa a campainha.)

    A Srª Vanessa Grazziotin (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - ... não são razão para impedimento de nenhum Presidente da República. Senador Ferraço, vamos ter aqui, nesta Casa, no mínimo, um belo debate. Vamos ter a oportunidade, e V. Exª já sabe da nossa opinião - a cada dia, quanto mais eu estudo, mais tenho razão, mais acho que a razão está do nosso lado: ela não cometeu nenhum crime de responsabilidade, nenhum crime. Aliás, não fez nada diferente do que fizeram presidentes anteriores, não só Lula, mas Fernando Henrique também. Sobre operação de crédito, eu acho que a melhor defesa para nós, Senador Lindbergh, é o relatório do Deputado Jovair Arantes. Quando fala nisso, ele diz: "Há um questionamento sobre se é ou não operação de crédito. Pode até não ser, e até acho que não é, mas passa, na dúvida, passa, porque quem vai decidir o mérito é o Senado". Então, acho que temos aqui que elevar o nível do debate, Senador Ferraço. O que nós vimos ontem...

(Interrupção do som.)

    A Srª Vanessa Grazziotin (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - Estou concluindo, Sr. Presidente (Fora do microfone.). O que nós vimos ontem foi um conjunto de manifestações de absoluta intolerância, absoluto desrespeito. V. Exª viu tanto quanto eu, como viu todo o povo brasileiro. Acho que aqui o debate tem que ser de alto nível e sobre aquilo que temos de debater. A Presidente não está sendo julgada politicamente, por crise econômica, por nada, apenas por dois fatos contidos no processo de impeachment, que são as tais pedaladas e os tais decretos. Então, cumprimento V. Exª, Senador Ricardo Ferraço, porque não tenho dúvida de que teremos um grande debate, um debate de alto nível; e não aquilo que vimos na Câmara dos Deputados nos últimos dias. Muito obrigada.

    O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Oposição/PSDB - ES) - De tudo o que V. Exª falou, tenho divergências, mas absolutamente respeito, porque a questão do respeito é uma preliminar para a convivência democrática e para a diversidade; acho que é uma obrigação respeitar, não apenas a opinião de um semelhante Senador...

(Soa a campainha.)

    O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Oposição/PSDB - ES) - ... mas respeitar a opinião de qualquer cidadão.

    Eu tenho apenas uma convergência com V. Exª. De fato, a Presidente Dilma não pode ser julgada porque está com baixa popularidade, pois popularidade, na vida pública, é circunstancial. Em alguns momentos, ela vai muito bem, em outros momentos, ela vai muito mal.

    Mas, a meu juízo, há um julgamento de legitimidade! E eu explico o porquê, pois, Senadora Vanessa Grazziotin, é um equívoco partir dessa premissa equivocada. O voto, por óbvio, é a forma de nós nos habilitarmos para exercermos o mandato em nome da sociedade. O voto popular é uma premissa. Mas o voto popular não garante, ele não é um salvo-conduto, ele não pode permitir que as pessoas saiam transgredindo de qualquer forma!

(Interrupção do som.)

    O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Oposição/PSDB - ES) - Quando você tem o voto popular no exercício do seu mandato, e não o legitima no dia a dia, você está perdendo a legitimidade.

    E nós vamos ter oportunidade aqui para, detalhadamente - V. Exª com o seu juízo de valor, enfim, eu com o meu -, debatermos, de maneira frontal, onde a Presidente da República afrontou a Constituição, onde ela atentou contra as leis orçamentárias, que é um sistema como um todo, e, ao atentar contra as leis orçamentárias, o que ela proporcionou.

    O que está na origem do seu atentado é a mais absoluta desorganização do nosso País, que está mergulhado hoje num colapso, não apenas financeiro, mas econômico.

    Mas teremos tempo, V. Exª e eu, e tantos outros Senadores, de fazermos esse debate.

    Eu agradeço a V. Exª, mesmo divergindo, pelas contribuições ao meu pronunciamento.

    E ouço naturalmente, com o mesmo prazer, o Senador Lindbergh.

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - Obrigado, Senador Ricardo Ferraço.

(Soa a campainha.)

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - No começo, só uma pequena correção: não é a segunda vez que temos um processo de impeachment, é a terceira.

    O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Oposição/PSDB - ES) - Pós-momento em que o Brasil voltou a votar para presidente da República. Pós-Collor.

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - É porque eu ia citar o caso de Getúlio Vargas também, que teve um pedido feito por Wilson Leite Passos, que foi vereador do Rio de Janeiro depois.

    O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Oposição/PSDB - ES) - Mas foi recusado.

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - Foi recusado. E pedia em cima de empréstimos ao jornal Última Hora. A História sabe desse episódio.

    O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Oposição/PSDB - ES) - Sempre lembrando que Getúlio se salvou do impeachment, mas, pouco dias depois, suicidou-se.

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - Claro, porque os golpistas continuaram naquele momento insano! E não foi só com Getúlio; foi com Juscelino, foi com Jango. V. Exª pode estar certo de que o que aconteceu ontem na Câmara, aquele circo de horrores, que espero o Senado rebata aqui, ficará na história como um golpe! Eu não tenho dúvidas! E vou entrar aqui nos pontos concretos, porque, infelizmente, quem viu aquela sessão da Câmara no dia de ontem viu tudo, menos Parlamentares votando, argumentando sobre questões políticas e jurídicas. A admissibilidade também, esse processo todo do impeachment é um processo político e jurídico. Eu vi gente ali votando pela paz em Jerusalém; vi Bolsonaro falando do torturador Brilhante Ustra; ouvi também Eduardo Cunha dizendo "que Deus tenha misericórdia desta Nação"; ouvi a Deputada Raquel Muniz citar seu marido, Prefeito de Montes Claros, bradando contra a corrupção - e o prefeito foi preso hoje pela manhã, numa operação da Polícia Federal! Eu vi aquilo como um escândalo. Eu espero que, no Senado Federal, tenhamos um debate de altíssimo nível, com argumentos....

(Soa a campainha.)

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - E V. Exª foi para um campo que tem de existir: o campo jurídico.

    O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Oposição/PSDB - ES. Fora do microfone.) - Claro.

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - Falou de Paulo Brossard e fez boa intervenção nesse sentido. Mas é aí que eu quero chegar, com V. Exª, aos pontos concretos, porque, na semana passada, V. Exª fez um pronunciamento falando de 2014. Primeiro, é preciso dizer o seguinte: o Presidente da Câmara acolheu apenas denúncias relativas a 2015. O Supremo Tribunal Federal, na sexta-feira, antes da votação da admissibilidade na Câmara dos Deputados, Senador Ricardo Ferraço, também decidiu dessa forma. O que está em discussão aqui são os pontos acolhidos pelo Presidente da Câmara. Então, vamos aos pontos. Aqui nós não vamos ficar três semanas fugindo dos pontos, fazendo discurso aberto não! Temos de ir! Tem de haver crime, tem que haver ato da Presidente. Isso se resume a quê? A duas questões...

    O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Oposição/PSDB - ES) - Isso para V. Exª; para mim, não.

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - Não é para V. Exª; é para o Supremo.

    O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Oposição/PSDB - ES) - Mas só para contribuir com o raciocínio de V. Exª.

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - V. Exª pode contribuir.

    O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Oposição/PSDB - ES) - O Senado Federal cumpre uma prerrogativa constitucional de ser o juiz. Nós somos aqui o juiz natural, e cada um de nós vai firmar o seu valor de juízo e vai exercer o seu voto.

    Portanto, nesse particular, em casos de enfrentamento de impedimento, o Senado Federal é transformado num tribunal extraordinário, especificamente para julgar se houve ou não.

    Vai caber a cada um de nós firmar o juízo de valor. Aquilo que para V. Exª pode parecer correto, para mim, pode não parecer! Imagine V. Exª se todos os juízes do Supremo Tribunal Federal...

(Soa a campainha.)

    O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Oposição/PSDB - ES) - ... tivessem a mesma opinião sobre as questões que lhe são submetidas!

    Apenas essa contribuição.

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - Mas escute, Senador: o Supremo circunscreveu em dois pontos. Por quê? Porque a Presidente tem que ter direito de defesa. Você não pode...

    O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Oposição/PSDB - ES. Fora do microfone.) - Tem que ter...

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - Escute! Escute! Você não pode condenar uma Presidente em cima do conjunto da obra. Ela tem que se defender pontualmente em cima das acusações. E o Supremo decidiu; não sou eu e V. Exª, não. O Supremo decidiu: são dois pontos. São dois pontos, Senador Ricardo Ferraço. Então, primeiro ponto: Plano Safra. Não é nem pedalada de forma geral. É um ponto só: Plano Safra de 2015. O primeiro ponto sobre esse aspecto: não existe ato da Presidenta. Plano Safra existe há muito tempo e é gerido sabe por quem? Pelo Ministro da Fazenda e pelo Conselho Monetário Nacional. Como...

(Soa a campainha.)

    O SR. PRESIDENTE (Jorge Viana. Bloco Apoio Governo/PT - AC. Fazendo soar a campainha.) - Eu pediria...

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - Eu vou ser bem rápido. Eu vou ser bem rápido.

    O SR. PRESIDENTE (Jorge Viana. Bloco Apoio Governo/PT - AC) - Eu pediria que concluísse porque, após...

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - V. Exª está certo.

    O SR. PRESIDENTE (Jorge Viana. Bloco Apoio Governo/PT - AC) - Já são 30 minutos. Não pode mais conceder aparte num tempo que não existe mais.

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - Eu pergunto: como ter crime de responsabilidade...

    O SR. PRESIDENTE (Jorge Viana. Bloco Apoio Governo/PT - AC) - Eu pediria ao colega que...

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - Vou acabar. Como ter crime de responsabilidade se não existe ato da Presidenta? Responda-me isso, Senador Ricardo! A segunda resposta que tem que me dar: em relação a créditos suplementares. O art. 4º da Lei Orçamentária é claro: o Governo pode, sim, abrir crédito suplementar, desde que respeitado o superávit primário. Quem foi que mudou a meta do superávit primário? Fomos nós, o Congresso Nacional!

    O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Oposição/PSDB - ES. Fora do microfone.) - Após.

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - No PLN 5 após!

    O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Oposição/PSDB - ES. Fora do microfone.) - Após.

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - Agora, o Orçamento, se V. Exª for estudar, é anual; é o princípio da anualidade. Você resolvendo lá, você resolve... Mais grave, para encerrar. Sabe quando o Tribunal de Contas mudou o entendimento? Em outubro. Antes disso, o entendimento do TCU...

(Soa a campainha.)

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - Tanto em relação às pedaladas quanto ao decreto de créditos suplementares. V. Exª sabe, V. Exª é Senador, que a lei não pode retroagir para prejudicar. O Governo assinou esses seis decretos antes de outubro! Então, explique, Senador, objetivamente, em cima desses pontos. Não adianta fugir, ir para outro assunto, porque o tema é esse. A decisão do Supremo é que são esses dois assuntos em que a Presidenta Dilma está acusada de crime de responsabilidade. Eu queria que os senhores entrassem nesses pontos específicos.

    O Sr. José Medeiros (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - MT) - A decisão do Supremo não foi essa. O Lewandowski, no final, concluiu isso...

    O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Oposição/PSDB - ES) - Senador...

    O Sr. José Medeiros (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - MT) - ... mas eu acompanhei até a madrugada; nenhum juiz decidiu isso.

    O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Oposição/PSDB - ES) - Senador Lindbergh...

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - V. Exª está enganado.

    O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Oposição/PSDB - ES) - Se V. Exª me garantir a palavra, eu vou...

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - V. Exª está enganado. Pode pegar...

    O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Oposição/PSDB - ES) - Senador...

    O SR. PRESIDENTE (Jorge Viana. Bloco Apoio Governo/PT - AC) - Por favor, eu pediria... Temos orador. Eu só peço ao colega que ele possa concluir.

    O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Oposição/PSDB - ES) - Eu estou tentando!

    O SR. PRESIDENTE (Jorge Viana. Bloco Apoio Governo/PT - AC) - Não, não. não. Eu peço que conclua. Já são 38 minutos, Senador. Eu faço um apelo, eu tenho que fazer, senão eu não tenho...

    O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Oposição/PSDB - ES) - V. Exª vai apelar, e eu vou atender V. Exª. Eu vou concluir o meu raciocínio.

    O SR. PRESIDENTE (Jorge Viana. Bloco Apoio Governo/PT - AC) - Com a palavra o querido colega Senador.

    O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Oposição/PSDB - ES) - Agradeço a V. Exª. O fato objetivo, meu caro Senador Lindbergh, é que cada um de nós aqui vai firmar o juízo de valor. Cada um de nós vai firmar o nosso juízo de valor, e não cabe a V. Exª patrulhar o meu juízo de valor. E eu também não vou patrulhar o juízo de valor de V. Exª, porque, acima de dever satisfação a V. Exª, eu devo satisfação à sociedade brasileira.

    E, como juiz, eu saberei exercer o meu juízo de valor. Agora, vou respeitar a opinião de todos os meus colegas, mas não vou admitir ser patrulhado.

    Por óbvio, é o seguinte, Presidente: temos prazos agora que precisam ser obedecidos. A Mesa dispõe de 48 horas para publicar um ato, constituindo uma comissão que vai decidir pelo afastamento preliminar da Presidente da República. E nós precisamos, Sr. Presidente - aí, sim, meu caro Senador Lindbergh - obedecer ao devido processo legal...

(Soa a campainha.)

    O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Oposição/PSDB - ES) - ... obedecer ao rito, ao contraditório, estabelecer todo esse rito; mas nós não podemos demorar; nós precisamos ser precisos no prazo porque o Brasil não suporta continuar exposto a esse grau de indefinição e de incertezas.

    Agradeço, Senador Jorge Viana, pela condescendência e delicadeza de V. Exª com a extensão do tempo, mas, mais uma vez, o responsável foi o Senador Lindbergh, que se arrastou no seu aparte.

    Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/04/2016 - Página 5