Discurso durante a 53ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Reflexão acerca da instabilidade política no País e defesa da reforma política que institua o “recall” e o sistema parlamentarista de governo.

Autor
Rose de Freitas (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/ES)
Nome completo: Rosilda de Freitas
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Reflexão acerca da instabilidade política no País e defesa da reforma política que institua o “recall” e o sistema parlamentarista de governo.
Publicação
Publicação no DSF de 19/04/2016 - Página 35
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • REGISTRO, AUSENCIA, ESTABILIDADE, POLITICA, DEFESA, ADOÇÃO, PARLAMENTARISMO, POSSIBILIDADE, CIDADÃO, VOTO, REVOGAÇÃO, MANDATO PARLAMENTAR, MANDATO ELETIVO, LEITURA, ARTIGO DE IMPRENSA, INTERNET, AUTORIA, SERGIO ABRANCHES, ASSUNTO, UNIÃO, ORIGEM, PROBLEMA, POLITICA NACIONAL.

    A SRª ROSE DE FREITAS (PMDB - ES. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srs. Parlamentares, eu estou olhando o Senador Medeiros, porque fiz uma maratona para chegar a esta tribuna. Mas eu vou agradecer sempre a compreensão dos senhores, sobretudo do Presidente Raimundo Lira, que é um companheiro nesta Casa, por entender um pouco das nossas angústias e por ser sempre bom para dar conselhos.

    Eu queria retratar aqui um pouco a instabilidade deste tempo, em que estamos vivendo com uma grande indefinição política. Eu sei que até tocar no assunto que vou tocar poderia ser uma falta de sensibilidade ou poderia ser uma visão míope dos problemas que estamos vivendo. Não há quem não diga, não há quem não aborde esta crise, a admissibilidade do impeachment que ocorreu ontem na Câmara, sem que tenha uma dose de crítica e de ponderação sobre tudo aquilo que se deixou de fazer e que era importante ter sido feito para que não chegássemos a esse ponto.

    Alguns discutem que a Presidente cometeu crime de responsabilidade e, portanto, ela teria que passar por esse processo, com vai passar nesta Casa. E é visível o resultado do que pode acontecer. Eu diria que teria sido muito pertinente - e nós perdermos as oportunidades, Senador Medeiros - termos discutido a reforma política. Será que o que acontece hoje no País é apenas o problema da falta de interesse da Presidente Dilma pela política, pela incapacidade de seus pares de dialogarem?

    Eu fui Presidente da Comissão de Orçamento e muitas vezes, solitariamente, eu presidia um colégio de Srs. Líderes e Parlamentares, Senadores e Deputados, e parecia que eu estava sozinha travando uma luta a favor do País, a favor inclusive do Governo para que ele tivesse um orçamento para trabalhar as suas medidas, ajustar seus programas. Parecia haver um alheamento que eu não conseguia entender. Disse a V. Exª, Presidente, várias vezes, que parecia que eu estava travando uma batalha solo. Parecia que o País, no que tange à organização do Governo, do Poder Executivo, não tinha interesse de que nós nos aprofundássemos no debate sobre o plano dos Orçamentos Públicos.

    E aí me volta à mente sempre a mesma pergunta, porque fui Constituinte e sou, na minha essência, parlamentarista: e se nós tivéssemos aproveitado o momento da reforma política para fazê-la, para propor todas aquelas questões que sempre atrapalharam o bom andamento da política neste País?

    Até propus recentemente um requerimento para que pudéssemos fazer um debate que tem que começar agora. Como dizia o velho Ulysses: "As grandes mudanças não se operam na época de calmaria." Portanto, em um momento de crise como este, em que há vários dias dão solavancos na nossa consciência política e, sobretudo, dão solavancos na inércia com que este País viveu seus momentos mais críticos, inclusive chegando a 2015 sem um orçamento para trabalhar, e o Governo trabalhando com duodécimos, fazendo ajuste forçado em cima das nossas necessidades, das nossas privações.

    Foi nesse sentido, inclusive, que falei sobre a necessidade de ter um debate oportuno para falarmos sobre sistema de governo. A questão é assim: se você falar sobre sistema de governo agora, é inapropriado; se falar antes, ninguém está interessado, porque acabaram de eleger o Presidente da República. Esta oportunidade para discutir tem que acontecer em algum momento em que as pessoas se interessem em ver de perto, não vendo a distância, as imperfeições que tem um sistema político como esse.

    Afinal, qual é o melhor sistema de governo para o Brasil? Estaremos sempre capturando cabeça de alguém para dizer que aquele não era bom, que aquela não era boa e tenha aí seus descaminhos, suas responsabilidades? Nunca vi um governo ficar tão sozinho, tão solitário na sua angústia de não estar progredindo, na necessidade e no caminho, na direção de que o País precisa.

    Teremos que discutir uma hora: o parlamentarismo ou o presidencialismo? Disso não podemos fugir. Espero que consigamos pensar nisso de uma maneira que dê à população a visão necessária da diferença entre esses sistemas.

    Não estou pretendendo aqui, de maneira nenhuma, ministrar aula, palestra, falar sobre parlamentarismo, fazer uma pregação, até porque acredito que os nossos pares aqui conheçam a questão e já tenham inclusive formado uma opinião sobre esse assunto.

    Em vez disso, quero falar sobre vantagens e desvantagens de ambos os sistemas. Darei essa pequena contribuição que também já me foi dada um dia, para que, quando chegarmos a esse debate, possamos oferecer subsídios que possam enriquecê-lo. É um debate que, no Brasil, infelizmente, só aparece com vigor nos momentos de crise, de ingovernabilidade e de desajuste do presidencialismo. Foi assim na década de 60; foi assim no plebiscito de 1993; está sendo assim agora, com a crise que vai se agravando dia a dia neste País.

    Em setembro de 1961 - não vou dizer que muitos se lembram, porque não é o caso -, após a renúncia do Presidente Jânio Quadros, em um momento extremamente conturbado da nossa história política, o Congresso Nacional aprovou, por meio de uma emenda constitucional, a adoção do sistema parlamentarista.

    Eu falo isso me ressentindo de que, neste momento, quando chega a esta Casa o relatório da admissibilidade, que passou com uma folgada maioria na Câmara, as pessoas também estão um pouco perplexas, em dúvida sobre o que será o dia de amanhã. Como será este dia? O que acontecerá? Será que o Sr. Michel Temer será o salvador da Pátria? Vamos nos conduzir por um caminho? Qual é o projeto para fazer os ajustes do País? Ninguém tem essas respostas. Então, diante das dúvidas, eu também quero refletir sobre esta.

    Infelizmente, naquela época, quando foi adotado o sistema parlamentarista, ele não recebeu apoio suficiente dos políticos, especialmente dos governadores. Em 6 de janeiro de 1963, com o voto de mais de 80% dos eleitores, um plebiscito acabou selando o retorno do presidencialismo no Brasil.

    Em 1993 também, em outro momento bastante complicado da vida política do País, após o traumático impeachment do Presidente Collor, foi realizado, de acordo com o programado, inclusive no art. 2º das Disposições Transitórias da Constituição, um plebiscito para a escolha da forma do sistema de Governo. O povo brasileiro, mais uma vez, escolheu a forma republicana e o sistema presidencialista. Mas, dessa vez, o parlamentarismo teve a adesão de mais de 30% dos eleitores. Por que não sistematizamos essa discussão, não nos aprofundamos, mostrando as diferenças? Por que não foi adotado, escalonadamente, um sistema que pudesse aperfeiçoar o sistema presidencialista?

    Eu me lembro de que, em uma conversa de presidenciáveis, num debate sobre o momento político, um deles disse assim: "o presidencialismo é muito importante porque, acima do Presidente, não há ninguém". E não estou falando aqui para que os religiosos me contestem e digam que acima do sistema de Governo, acima do Presidente, há Deus. Não estamos entrando no aspecto religioso. Nós vamos falar que as vozes que ressurgiram sempre acreditaram que haveria uma alternativa ao presidencialismo, mas era preciso acreditar na prática. É preciso tentar, e estamos vendo, agora, que as pautas desta Casa, nas Comissões, estão repletas, Sr. Presidente, de propostas parlamentaristas. Por quê? Porque estamos em crise.

    Estamos em crise, mas também não acreditamos que possamos fazer esse debate aprofundadamente e inclusive achar o momento adequado, sem ser essa solução casuística em que você fala: "Isso é oportunismo! A Rose está na tribuna tratando com oportunismo a questão do sistema de governo. Por que isso não foi tratado antes?" Há anos nós tentamos aprofundar essa discussão, mostrar que pode ser uma solução para o Brasil, do nosso jeito. Não é preciso que seja o modelo que nós inventemos para perguntar de qual lado você está, qual seria o melhor momento; mas, sim, quando as coisas vão mal, há necessidade de pensar. Há uma crise neste País, e é preciso priorizar alguma discussão sobre essa crise.

    Atualmente, eu falei que tramitam no Congresso várias propostas que têm o objetivo de instaurar o parlamentarismo. Na Câmara, nós temos a PEC nº 20, de 1995; no Senado, há a PEC nº 102, de 2015, além da PEC nº 9, Sr. Presidente, de 2016, que tem como primeiro signatário o Senador Aloysio Nunes Ferreira, grande defensor também do parlamentarismo há muitos anos, mas o clima é de tanta incerteza que as pessoas temem em ir adiante e gerar, nessa discussão, uma sensação de que é um golpe - já que se fala tanto em golpe - que está sendo tramado, que é feitio da classe política, sem ponderar que há um momento em que nós temos que aprofundar essa discussão, falar sobre isso, mostrar ao País as diferenças do sistema e formar uma comissão específica de estudos para que possam ser contemplados as universidades e os sindicatos e, onde quer que seja esclarecer a diferença entre um sistema e outro. Mas aqui nós estamos ainda na antessala do pensamento que possa oferecer uma organização sistematizada para essa discussão.

    É evidente que essa comissão ainda não foi instalada, e nós vamos ver a efervescência do clima político, se aumentar, e as ruas estão aí movimentadas em cima da política, graças a Deus. Gostaria que neste momento houvesse eleições, e nós não estivéssemos procurando, no day after, a melhor maneira de se colocar um protagonista nessa crise política para ajudar o País. Nós precisamos só conhecer as regras desse protagonismo. Nós não podemos colocar uma venda e achar que, no dia seguinte, tudo vai se resolver. Não. O povo foi para a rua dando um basta. Agora, nós precisamos oferecer-lhe as propostas necessárias para enfrentar essa crise.

    Em seguida, eu queria dizer que o próprio STF adiou a análise do Mandado de Segurança nº 22.972, impetrado em 1997, que questiona se há respaldo constitucional para que o Congresso institua o Parlamentarismo no País mediante uma PEC, uma proposta de emenda à Constituição. Foram duas decisões maduras, acertadas, a meu ver. Ao mesmo tempo, não avalio que seja de todo interessante que esse debate venha a morrer. Também não avalio que seja importante que se vote qualquer proposta dessa natureza.

    No parlamentarismo, como V. Exªs sabem, existe a figura do primeiro-ministro, que sempre sai do Parlamento e é o chefe do governo. Há monarquias parlamentaristas, como o Reino Unido e a Espanha, por exemplo; e há repúblicas parlamentaristas, como Portugal e França, que são, naturalmente, nossas referências mais próximas.

    Muita gente parece não saber disto, mas nas repúblicas parlamentaristas existe um presidente que é eleito pelo povo. E nós temos a cultura do voto. Portanto, ela não pode ser retirada do consciente político da sociedade. No entanto os poderes do presidente são limitados, Presidente. Vamos dizer que ele é mais limitado do que o sistema presidencialismo em que nós vivemos, uma vez que ele, o presidente eleito pelo voto, não acumula as funções de chefe de estado e chefe do governo. Não pode acumular.

    Essa é a diferença do Parlamentarismo. Esse governo dual, com divisão entre os papéis de chefe de estado e de governo, tem a vantagem de fortalecer os mecanismos de freios e contrapesos, limitando o poder de ambas as figuras - tanto do presidente, quanto do primeiro-ministro.

    A outra vantagem do parlamentarismo é que, nos momentos de crise, em que não há mais apoio político, é possível contorná-la com muito mais facilidade. Cai o gabinete do primeiro-ministro e outro tem que ser escolhido entre os Parlamentares, de forma que essa substituição costuma se dar sem maiores sobressaltos, sem maiores constrangimentos.

    É claro que há diferenças entre os parlamentarismos nos diversos países. No Reino Unido, por exemplo, o primeiro-ministro é um Parlamentar escolhido pelos próprios pares. Já na França também é um Parlamentar, mas ele é indicado pelo presidente da república e tem que ter o nome chancelado pela maioria do Legislativo. É uma construção democrática muito interessante e de sustentação política.

    A França, como eu já disse, assim como Portugal, seria a nossa principal fonte de inspiração, a meu ver, porque vigora nesses dois países um tipo de sistema de governo comumente chamado de semipresidencialismo.

    Nesse sistema, apesar de ainda haver a separação dos papéis de chefes de Estado, como o presidente da República, e de chefe do governo, como o primeiro-ministro, o presidente tem mais poder e prerrogativa do que no parlamentarismo puro. Ele indica o primeiro-ministro, pode dissolver o parlamento nos casos previstos na constituição, convocar novas eleições e, em geral, assume a política externa do seu país.

    Em Portugal - gosto sempre de ressaltar essa diferença do Brasil -, o presidente vai além de tudo isso; ele também pode vetar decisões do governo e propor leis ao tribunal constitucional.

    Tanto na França como em Portugal, o presidente da República tem muita força, está longe de ser aquela figura simbólica que estamos sempre mencionando nos debates como se fosse a Rainha da Inglaterra - como se diz comumente.

    O defeito do semipresidencialismo aparece quando a oposição elege a maioria no Legislativo e que, na prática, obriga o presidente da República a indicar um primeiro-ministro de oposição. Essas relações costumam ficar extremamente sensíveis. E, se ele quiser governar, vai ter de dialogar, como no Brasil, mas com duas figuras. Esse sistema dual ajuda, por demais, o país a estabelecer a democracia plena.

    Esse governo tem de ser compartilhado, e essa palavra compartilhada é tão importante que, por não termos esse compartilhamento, essa crise de hoje se aprofundou, porque o PT conseguiu chegar ao poder duas vezes, três vezes, na quarta vez a questão do compartilhamento fracassou em tudo. Eles já perderam a capacidade de diálogo, não conseguiram formar consenso sobre nada e assim não é possível, de maneira nenhuma, governar nem o Município, nem o Estado, muito menos o País.

    Vou lembrar aqui que, no período de 1997 a 2002, governava a França o Presidente Jacques Chirac, conservador, e o Primeiro-Ministro Lionel Jospin, que era socialista, como todos se lembram. Começaram a prometer entendimento e cooperação em prol da França, mas terminaram o período enredados em vários impasses institucionais e se tornaram publicamente desafetos, o que não ajudou em nada a vida dos franceses.

    Já no presidencialismo tradicional, quando o presidente da República não se mostra um bom governante - como é o caso de agora -; quando perde representatividade junto à sociedade - como é o caso de agora -; quando não consegue formar sua base de sustentação no Congresso para tocar o seu governo, o seu programa, enfim, quando se chega a um impasse político - como é o caso de agora -, que instrumentos legais temos para desatar esse nó, Sr. Presidente? Nós não temos nenhum. Não temos nenhum.

    Portanto, no Brasil, a solução desse tipo de impasse chama-se clientelismo. Você vive fazendo: é dando que se recebe, uma troca de favores, distribuem-se cargos para obtenção de apoio.

    Dessa forma, a Base aliada nada mais é do que uma base favorecida. Negocia, acintosamente, emendas parlamentares ao Orçamento, bem como apoio às mais diversas proposições que subsistem nessa prática de Governo. É um verdadeiro balcão de negócios, onde reina o chamado jeitinho brasileiro, Senador Elmano.

    Portanto, senhoras e senhores, com a perpetuação dessas práticas, as reformas que são de interesse legítimo do País demoram demais ou quase nunca se concretizam, quando se concretizam. E, muitas vezes, o que acontece só incidentalmente? Quando determinado conjunto de interesses particulares beneficia uma proposta política...

(Soa a campainha.)

    A SRª ROSE DE FREITAS (PMDB - ES) - ... ela acaba sendo aprovada.

    O cientista político Sérgio Abranches, em matéria recém-publicada no site G1, faz uma análise muito interessante, Presidente. No contexto do presidencialismo de coalizão brasileiro, ele acredita que o cerne do nosso problema político não seria tanto o presidencialismo, mas as coalizões, outro grave problema de toda gestão política sobre o presidencialismo.

    "A necessidade, a dificuldade e o modo de formar as coalizões" no Brasil.

    Vou pedir licença para citar, na íntegra, algumas palavras ditas por ele:

Necessidade [das coalizações, ele definiu], porque o descasamento que parece inevitável entre a maioria que elege o presidente e a maioria parlamentar que sai das urnas exige que o eleito negocie uma coalizão para poder governar. Dificuldade [de essas coalizões serem realizadas], porque a legislação partidária, a diversidade federativa, a forma de campanha e o método de converter votos em cadeiras promove forte fragmentação partidária. [Sendo assim], o modo de formar coalizões em um contexto de fragmentação partidária e déficit programático é o clientelismo, o toma-lá-dá-cá, a troca de favores entre partidos e eleitores e entre presidentes e partidos. E clientelismo custa caro [Presidente Raimundo Lira], exige capacidade fiscal para pagar por todas as demandas e discricionariedade no gasto. Nas bolhas, tudo bem. [Pode-se até mascarar esse tipo de transação]. No colapso econômico que se segue [como agora] ao estouro das bolhas, [ocorre essa ] crise [que aí está].

    Nós precisamos, então, Senador Elmano, urgentemente, de uma reforma política. Ao falar isso, sinto-me até como se estivesse pregando num deserto, porque, há 20 anos, eu me lembro da questão tão enfaticamente debatida nas campanhas de vários candidatos: a reforma política...

(Soa a campainha.)

    A SRª ROSE DE FREITAS (PMDB - ES) - ... que é absolutamente importante.

    Então, uma reforma que diminua a cláusula de barreira que é colocada para se enfrentar o problema de acúmulo de legendas, que diminua de maneira importante a limitação do financiamento privado das campanhas da pessoa física, com o valor máximo de contribuição por pessoa, algo que acaba mascarado pelo caixa dois.

    Voto com lista fechada é uma das propostas que existem. Eu, particularmente, tenho restrição por conta da cultura do voto no nosso País. Menos personalismo, Presidente! Menos personalismo! Quando se faz uma campanha para um governo de Estado, aqueles que participam daquela campanha têm de estar todos submetidos à vontade daquele candidato. É menos programático e mais, eu diria... É menos pragmático até...

(Soa a campainha.)

    A SRª ROSE DE FREITAS (PMDB - ES) - ... e fica, Presidente, sem nenhum programa partidário.

    Esses são alguns pontos da reforma que, se aprovados, na minha visão, Presidente, ajudariam a evitar a paralisia institucional da política no Brasil, mesmo sob o sistema presidencialista do Governo.

    Num momento de crise como o que hoje nós estamos vivendo, com a Presidente enfraquecida, o que vemos é uma sucessão de denúncias do seu Governo e do seu Partido, e o único instrumento constitucional é o que é colocado na pauta sempre que acontece isso com a gravidade de agora: impeachment.

    Mas o impeachment, como todo mundo sabe, é um instrumento extremo, depende da comprovação do crime de responsabilidade, é institucionalmente doloroso, é complicado, depende de um desgastante processo político e judicial. Seja qual for o resultado de um processo dessa natureza, no final o país sempre sofre duras consequências.

    E o fato é, Sr. Presidente...

(Soa a campainha.)

    A SRª ROSE DE FREITAS (PMDB - ES) - Concluo. Sejam ou não encontradas evidências para a instauração desse processo, ocorra ou não ocorra o impeachment, a Presidente já demonstrou repetidas vezes que não está apta a continuar a presidir o Brasil. Todos nós sabemos disso. Ela perdeu a confiança dos agentes políticos, dos agentes econômicos nacionais e internacionais; perdeu a confiança dos eleitores; não consegue dialogar, Sr. Presidente - isso é um absurdo -, minimamente com o Congresso, nem mesmo com a Bancada do seu próprio Partido. Enfim, decididamente, nós todos já sabemos que se esgotou um ciclo de poder.

    Existe, Sr. Presidente, concluindo esse raciocínio, o instituto jurídico de participação democrática, que nossa legislação não prevê, que é o recall. Basicamente, trata-se de um direito popular de revogação de mandato, que pode ser usado em certos casos, dentro de regras previamente estabelecidas.

    Em 2013, o Senador Randolfe, que não...

(Soa a campainha.)

    A SRª ROSE DE FREITAS (PMDB - ES) - ...está aqui, defendeu, em plenário, a inclusão na agenda prioritária de votações do Senado três propostas de emenda à Constituição que modificam o sistema político, entre elas a PEC n° 80, cujo primeiro signatário, na verdade, era o Senador Antonio Carlos Valadares, que altera o art. 14 da Constituição para instaurar o recall no Brasil.

    Essa proposição foi arquivada no ano passado, mas eu acredito que nós devíamos cotejar essa hipótese com bastante atenção e boa vontade, possivelmente até possa ser desarquivada essa PEC.

    Na lição do emérito professor e jurista Paulo Bonavides, o recall capacita o eleitorado a destituir funcionários públicos e detentores de mandato eletivo que, por qualquer motivo que seja, não estejam agradando...

(Soa a campainha.)

    A SRª ROSE DE FREITAS (PMDB - ES) - ...o percurso da sua trajetória administrativa. Eu sublinho aqui a expressão "por qualquer motivo", que ela não precisa exatamente ser no raciocínio exato da classe política. E essa expressão traduz a liberdade, a maneira discricionária da vontade popular, a qual, dentro do balizamento normativo vigente, é soberana, Sr. Presidente.

    O recall é mais famoso na Suíça e nos Estados Unidos, no âmbito regional, de grupo de eleitores -geralmente 10% do eleitorado, no mínimo -, que subscreve uma petição assinada com reclamações ou acusações contra o mandatário que caiu no descrédito popular, pedindo sua destituição ou o intimando a renunciar.

    Aceita essa moção, se ele não se demitir, realiza-se uma consulta - isso que eu acho interessante, Presidente Raimundo - à população sobre a conveniência da permanência do agente público no cargo. Se a maioria votar a seu favor, ele pode permanecer; caso contrário, o seu...

(Soa a campainha.)

    A SRª ROSE DE FREITAS (PMDB - ES) - ...mandato é automaticamente revogado.

    Enfim, Srªs e Srs. Senadores, são muitas as opções, muitos os ajustes que podemos fazer para que o nosso sistema político funcione melhor, evitando e contornando com mais agilidade eventuais crises de governabilidade.

    Alguém há de dizer: "mas, neste momento, foi rápido". Saibam todos que foi doído, que foi cheio de dúvida. O País estava de um lado da grade, outro do outro lado da grade.

    Foi tão doloroso! Pode ser uma decisão rápida, sem perder a representatividade da manifestação que o povo tinha. Ainda assim é um impasse político. É um impasse político. Tudo combina com o objetivo de se procurar aperfeiçoar a função precípua do Estado, a sua razão mesmo de existir, que é servir ao interesse da coletividade e ao bem comum.

    Na minha modesta opinião, o parlamentarismo poderia ser, perfeitamente, uma boa alternativa.

(Soa a campainha.)

    A SRª ROSE DE FREITAS (PMDB - ES) - Assim, como o semipresidencialismo. Este mais próximo, inclusive, da cultura política brasileira, porque ainda se manteria um presidente da República bastante empoderado e um primeiro-ministro escolhido da forma mais adequada para exercitar o parlamentarismo no Brasil.

    De qualquer forma, a despeito dessa relevante discussão sobre a crise do Governo, quero inserir este dado, este componente - e V. Exª poderá, inclusive, contribuir para uma discussão apropriada no momento certo-: exatamente a discussão sobre o sistema de Governo.

    Quero reforçar aqui, encerrando as minhas palavras, a importância de implementarmos uma reforma política no País. Não mais com a hipocrisia de fingir que se está fazendo o que não se está fazendo ou de então abrir uma janela para dar oportunidades. Existem inúmeros problemas regionais aos quais as pessoas precisam se adaptar. Então, abre-se uma janela para que se possa mudar de partido. Daqui a dois anos, será a mesma coisa: vão criar circunstâncias e você vai se sentir - dentro desse tornado que é o processo eleitoral - prejudicado porque aquela cláusula da reforma política não veio para atendê-lo.

    Eu digo que o parlamentarismo, tanto quanto o recall, seria, no meu entender, um instrumento fabuloso de participação democrática, para solução da grande crise de governabilidade que hoje nós estamos vivendo. E ainda poderia ser usado, no futuro, contra qualquer mandatário que também viesse a cair, como agora, no descrédito popular.

    Sr. Presidente, era isso o que eu queria dizer. Talvez não seja o momento mais apropriado, devido à dor que nós todos, brasileiros, estamos vivendo. Estamos caminhando para uma solução, que seria aquela que todos nós gostaríamos de evitar. Mas, no presidencialismo, só uma pessoa pode evitar uma crise desse tamanho; só uma pessoa pode transformar esse caminho doloroso que tanta desesperança e agonia nos traz: só o Presidente da República. E um País inteiro depender da noite em que alguém pensou sobre isso ou do dia em que acordou revelando-se preocupado com o aperfeiçoamento do nosso sistema... É muito triste um País com essa população.

    Muito obrigada. 

    O SR. PRESIDENTE (Raimundo Lira. PMDB - PB) - Senadora Rose de Freitas, permaneça, por favor, um minuto na tribuna.

    V. Exª falou do orçamento de 2016, e eu sou testemunha, na Comissão de Orçamento, do esforço, do trabalho, da dedicação, das longas horas de trabalho que V. Exª dedicou, para que o Brasil tivesse um orçamento no ano de 2016.

    Portanto, aqui, desta cadeira, quero parabenizar V. Exª pelo excelente trabalho que V. Exª executou como Presidente da Comissão de Orçamento, sobretudo em uma situação difícil, de crise, e, mais ainda, por conciliar dezenas de Líderes, que hoje são representados tanto na Câmara como no Senado.

    Parabéns, Senadora.

    A SRª ROSE DE FREITAS (PMDB - ES) - Eu agradeço a V. Exª.

(Interrupção do som.)

(Soa a campainha.)

    A SRª ROSE DE FREITAS (PMDB - ES) - Até o dia de hoje nós não temos instalada a Comissão de Orçamento, devido à crise por que o País passa. No parlamentarismo, com certeza, seria diferente.

    Muito obrigada, mais uma vez, pela gentileza de V. Exª.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/04/2016 - Página 35