Discurso durante a 53ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Comparação da situação político-econômica no Brasil entre os períodos dos processos de impeachment de S. Exª e da Presidente Dilma Rousseff.

Apresentação do plano proposto pelo Bloco Parlamentar Moderador, intitulado “Brasil: Diretrizes para um Plano de Reconstrução”, no qual se propõe promover a retomada do desenvolvimento econômico e social do País.

Autor
Fernando Collor (PTC - Partido Trabalhista Cristão/AL)
Nome completo: Fernando Affonso Collor de Mello
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Comparação da situação político-econômica no Brasil entre os períodos dos processos de impeachment de S. Exª e da Presidente Dilma Rousseff.
ECONOMIA:
  • Apresentação do plano proposto pelo Bloco Parlamentar Moderador, intitulado “Brasil: Diretrizes para um Plano de Reconstrução”, no qual se propõe promover a retomada do desenvolvimento econômico e social do País.
Aparteantes
Cristovam Buarque.
Publicação
Publicação no DSF de 19/04/2016 - Página 49
Assuntos
Outros > GOVERNO FEDERAL
Outros > ECONOMIA
Indexação
  • COMPARAÇÃO, SITUAÇÃO, ECONOMIA NACIONAL, POLITICA NACIONAL, PERIODO, IMPEACHMENT, ORADOR, ATUALIDADE, PROCESSO, IMPEDIMENTO, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA.
  • LEITURA, DOCUMENTO, AUTORIA, BLOCO PARLAMENTAR, SENADO, ASSUNTO, DIRETRIZ, PLANO, RECONSTRUÇÃO, PAIS, OBJETIVO, RETOMADA, DESENVOLVIMENTO SOCIAL, DESENVOLVIMENTO ECONOMICO, SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO.

    O SR. FERNANDO COLLOR (Bloco Moderador/PTC - AL. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão do orador.) - Exmo Sr. Presidente desta sessão, Senador Raimundo Lira, Srªs e Srs. Senadores, vivemos, Sr. Presidente, momentos de turbulência. As próximas semanas serão decisivas para o País. Todas as atenções estarão voltadas para este Senado Federal, onde se decidirá o destino político do comando da Nação. A partir de agora, esta Casa passa a ser um tribunal, e nós, Senadoras e Senadores, os juízes. Portanto, antes de qualquer medida, precisamos nos imbuir da índole da serenidade e do espírito moderador.

    Particularmente, vivo uma situação extremamente singular e uma experiência talvez já imaginada pelo meio político. Sou um ex-Presidente da República, único a exercer hoje um mandato conferido pelas urnas. Nessa condição, estou sujeito a ter que votar o impeachment da Presidente da República, tendo sido eu o único Presidente do Brasil, que passou pela experiência de enfrentar igual processo até o fim. Experiência única, sem dúvida, mas que por isso mesmo me faz sentir no dever de trazer uma palavra ao Senado Federal e à sociedade brasileira.

    Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, sinto-me nessa contingência, tenham certeza, com profunda apreensão e pesar. Apreensão pela imensa preocupação com a estabilidade do País, que, há mais de um ano, vive um quadro tormentoso em todos os sentidos e que só vai começar a se reverter após o desfecho da atual crise política do Governo. E pesar, pela possibilidade de ter que participar do julgamento de um Governo, cujos principais atores e Partido protagonizaram exatamente o meu impeachment.

    Não me sinto à vontade nesse papel, até porque não carrego mágoas e menos ainda sentimentos subalternos. Entretanto, diante da autorização da Câmara para instauração do processo aqui no Senado Federal, não terei alternativa. Como assevera Schopenhauer: "O destino embaralha as cartas, e nós jogamos."

    Creiam, Srªs e Srs. Senadores, não é nada confortável para mim rememorar e, menos ainda, reviver, mesmo que em outra trincheira, momentos como este. Por isso, não é minha intenção, neste instante de aflição nacional, traçar paralelos, fazer analogias ou exprimir comparações entre a instabilidade política por que passou o meu Governo, há quase 25 anos, e a grave crise institucional, política, econômica, ética e social em que se encontra o Brasil de hoje. Até porque todo o cotejamento possível, entre os dois momentos e os respectivos processos de impeachment, seja pelas motivações e efeitos, seja pelas circunstâncias, métodos e prazos, creio, tem sido naturalmente feito pelos analistas, pela classe política e pela própria população brasileira.

    Qualquer palavra minha nesse sentido, neste momento, pode vir a ser mal interpretada, mal assimilada ou mesmo desvirtuada de minha real intenção. A análise da dimensão dos fatos de 1992 frente aos atuais acontecimentos, a comparação quantitativa de agentes públicos e privados envolvidos nas duas ocasiões e ainda a avaliação das causas e consequências de ambos os desfechos para o Brasil, eu deixo, como já disse, a cargo da consciência de cada uma das Srªs e dos Srs. Senadores, de cada um dos observadores da cena nacional e, especialmente, de cada um dos brasileiros que viveram os dois momentos.

    Sr. Presidente, que o registro histórico se faça como deve ser feito, que o tempo em sua forma universal de mudança se encarregue de acolher a razão e, mais ainda, de decantar qualquer dúvida quanto à verdade de tudo que orbitou e orbita em torno dos acontecimentos de ontem e de hoje. Afinal, como ensina Machado de Assis, "a verdade sai do poço sem indagar quem se acha à borda".

    Da mesma forma, considero imprudente de minha parte antecipar, neste momento, uma posição frente ao processo de impeachment em curso. Para qualquer que seja minha palavra, celeumas podem ser criadas, e não é essa minha intenção. Desejo tão somente, no plano institucional e no exercício do mandato de Senador, colaborar para que o Brasil encontre soluções para sair de todas as crises por que passa e, o quanto antes, encontre o seu norte, rumo a um porto seguro. Por isso, entendo que este será um período que exigirá de todos nós, Senadores principalmente, muito equilíbrio nos atos, muita moderação dos debates e uma plena consciência da responsabilidade que temos para com o Brasil.

    Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, no cerne das discussões sobre este degradante momento de nossa história, eu gostaria apenas de ressaltar um aspecto. A situação econômica do Brasil de hoje é extremamente grave, ao contrário daquela que deixei no início de outubro de 1992. Em que pese a luta contra o inédito e recordista processo hiperinflacionário que enfrentei no início de meu governo, eu consegui, de forma desabrida e sem receios, estabelecer as bases econômicas, administrativas e de políticas públicas necessárias para o País seguir adiante, se desenvolver, se liberalizar e abrir suas portas ao comércio exterior e à nova ordem de um mundo globalizado. Rompi monopólios, quebrei reservas de mercado, consegui também plantar as sementes para a tão sonhada estabilidade monetária, mediante a fixação dos princípios macroeconômicos que permitiram, um ano e pouco depois, a implantação do Plano Real.

    Tenho plena convicção, Sr. Presidente, de que, em meu governo, o Brasil não retrocedeu em nenhum setor, em nenhuma avaliação relevante. Apesar da abrupta interrupção de meu mandato, creio, o legado foi positivo. Para tanto e a despeito da instabilidade política vivida nos últimos meses do meu governo, foi fundamental a normalidade da administração, obtida com a manutenção de meu ministério, cujos quadros mantiveram funcionando normalmente o programa de governo.

    Aproveito para agradecer a cada um dos meus 14 Ministros e Secretários que compunham aquela enxuta e competente equipe. O meu muito obrigado a cada um deles, aos Ministros: Célio Borja; Embaixador Celso Lafer; Marcílio Marques Moreira; Dr. Adib Jatene, in memoriam; Reinhold Staphanes; Eraldo Tinoco, in memoriam; João Santana; José Goldemberg; Pratini de Moraes; Ricardo Fiuza, in memoriam; Helio Jaguaribe; Sergio Rouanet; Ângelo Calmon de Sá; Bernard Rajzman; Embaixador Flávio Perri; e Embaixador Carlos Garcia. Da mesma forma, agradeço a cada um dos Deputados Federais que, em 1992, votaram contra a abertura do processo de impeachment, assim como aos Senadores que, ao meu lado, se mantiveram até o julgamento do dia 29 de dezembro daquele ano.

    Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o que hoje presenciamos é o aprofundamento de um processo de desgaste político que agora chega ao seu ápice na forma de uma aguda crise que foi gestada e que cresceu paulatinamente desde o primeiro mandato do atual Governo. Há tempos, detectei e alertei para a falta de sincronia, de receptividade e de diálogo do Executivo com o Congresso Nacional. Sempre procurei manter com o Governo uma posição de interlocução institucional não só diretamente com a Presidenta da República - raríssimas vezes, é verdade, e não por minha vontade -, mas também com os diferentes Ministros da Casa Civil, a quem tentei levar, ao longo desses anos, minha experiência como ex-Presidente e a percepção, como Senador em exercício, da necessidade de uma maior efetividade nas ações políticas e institucionais com o Poder Legislativo, em contraposição a uma menor atuação meramente publicitária junto à população. Desde 2012, desta mesma tribuna, venho chamando a atenção para o esfacelamento institucional do País, para os conflitos entre os seus Poderes, para o empoderamento de órgãos auxiliares e para o paradoxo da legitimidade versus credibilidade nos Poderes da União. O tempo e o presente quadro de degradação do País me deram razão. Porém, Sr. Presidente, o que perdurou foi a postura de sempre: me ouviram, mas não me escutaram.

    O Governo continuou a agir exatamente de forma isolada e inversa aos inúmeros conselhos e alertas advindos deste Congresso Nacional, não somente de mim. Aliou-se a insensibilidade política à fragilidade de uma matriz econômica descabida e insustentável. Desmontou-se uma base política e deteriorou-se uma base fiscal. Princípios elementares da economia e da execução orçamentária foram contrariados e, pior, demolidos. Índices negativos foram subjugados, subestimados. Ficamos carentes não só de política econômica, mas de economia política.

    O resultado de poucos anos de má gestão, devemos reconhecer, é toda uma década perdida. As pessoas se aperceberam, e as ruas se manifestaram. A crise espraiou-se, a política esvaiu-se e a economia tornou-se caótica. Levaremos tempo, Sr. Presidente Elmano Férrer, para resgatar tudo de positivo, em todos os segmentos, que foi alcançado pelo País desde a sua redemocratização. Mais ainda, levaremos tempo, talvez uma geração inteira, para nos recuperar desse certeiro golpe na população brasileira.

    Por isso, seja qual for o resultado do atual processo de impeachment, precisamos nos adiantar, precisamos começar a pensar o futuro. O Estado brasileiro precisará ser reconstruído. O Governo, qualquer que seja, terá que se reinventar. A população não mais concordará com improviso e não mais aceitará amadorismo e, menos ainda, o fisiologismo que humilha a classe política. Precisamos recuperar o ânimo e o encanto com a missão pública. Precisamos, Sr. Presidente, toda a classe política, nos oxigenar e nos remodelar à nova ordem da sociedade brasileira para readquirir a capacidade de participar, de fato, da ação governamental. Precisamos resgatar o básico da liturgia dos cargos, da respeitabilidade dos palácios e da moderação das autoridades. Precisamos de um novo modelo econômico. Precisamos de um novo Estado. Precisamos de uma nova política.

    Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é nesse sentido e dentro desse contexto que, em entendimento pessoal com os Líderes do Bloco Moderador, apresento, para conhecimento e debate desta Casa, uma proposta denominada "Brasil: Diretrizes para um Plano de Reconstrução". Trata-se de um elenco atualizado de diagnósticos, princípios e medidas a serem discutidos, aperfeiçoados e implantados de forma a permitir que o Brasil retome o caminho do desenvolvimento econômico e social, sua credibilidade, sua previsibilidade e segurança jurídica e, com isso, melhorar o ambiente dos negócios. As propostas visam permitir ainda que o Brasil se reinsira, definitivamente, nos grandes blocos econômicos do mundo, sem os quais continuaremos a patinar não apenas no comércio exterior, mas também na liderança e no protagonismo perdidos no âmbito do nosso subcontinente.

    Restrinjo-me, aqui, Sr. Presidente Elmano Férrer, a apresentar as linhas mestras desse plano como subsídio à classe política e a um futuro governo, seja ele qual for. Peço, de antemão, que o documento seja publicado em sua íntegra nos Anais da Casa para a devida publicidade. Como o seu texto contém 19 páginas, vou ler, com a permissão de V. Exªs, apenas os itens referentes à reforma política, ao papel do Estado, à reestruturação competitiva da economia e à política externa e defesa nacional. Os demais subitens serão apenas citados para efeito de referência ao conteúdo completo da proposta.

    Passo, portanto, à leitura resumida.

Brasil: Diretrizes para um Plano de Reconstrução.

I - REFORMA POLÍTICA: O SISTEMA PARLAMENTAR DE GOVERNO

Considerada a "mãe de todas as reformas", a reforma política precisa ser definitivamente encarada de frente por todas as instituições brasileiras, sob o protagonismo do Congresso Nacional.

O sistema presidencialista, agravado nos últimos mandatos pelo chamado "presidencialismo de coalizão", perdeu, de vez, a sua funcionalidade e tornou-se incapaz de proporcionar uma condução política e institucional minimamente viável para qualquer Governo que assuma o comando da Nação.

Todos já percebemos que o atual modelo de se fazer política esgotou-se. Precisamos, portanto, de uma nova política em que os partidos deixem de ter como única serventia o ato de votar e passem a ter o papel de formular.

Não há mais espaço para o fisiologismo que humilha e desacredita a classe política perante a população brasileira. Precisamos sair desse desânimo institucional, desse desencanto com a missão política. Daí ser necessário o correto diagnóstico da situação e a apresentação de ideias claras e definidoras para uma autêntica mudança do sistema político brasileiro.

Urge que a classe política, juntamente com a sociedade, debata com seriedade, sobriedade, mas com determinação, a opção do modelo parlamentarista de governo e suas possíveis variáveis. Será este o remédio para os principais males da política nacional, a começar pela perspectiva de que o País dificilmente voltaria a passar por crise política, econômica e institucional de tamanha gravidade como a que vivemos hoje.

No parlamentarismo, qualquer crise de qualquer natureza é solucionada logo em seu nascedouro, na medida em que a perda do apoio político para se governar enseja a imediata substituição de todo o comando da equipe governante sem precisar, portanto, que se espere o término do mandato de um governo. É por isso que se diz que, enquanto o presidencialismo é o regime da irresponsabilidade a prazo certo, o parlamentarismo é o regime da responsabilidade a prazo incerto. Ademais, a adoção desse novo regime permitirá naturalmente a consecução da tão esperada e necessária reforma política.

A fórmula é, portanto, simples: a adoção do parlamentarismo, avalizada por referendo popular, que necessariamente demandará as mudanças adaptativas, tanto no sistema eleitoral como no sistema partidário brasileiro.

É a fórmula que temos para evitar a crise política que nos legue, como hoje, um Brasil partido. Sim, [Sr. Presidente,] um Brasil partido, partido nas suas esperanças, partido nas suas expectativas, partido nas suas crenças, partido no seu propósito.

Precisamos, pois, reunificá-lo, reconciliá-lo entre seus Entes e consigo próprio. Assim, aos que alegam que o Brasil não pode adotar o Parlamentarismo por não possuir partidos fortes, é preciso dizer que, na realidade, o Brasil não possui partidos fortes por não ser parlamentarista.

2. O papel do Estado. Ao Estado impõem-se duas grandes tarefas: o apoio à transformação da estrutura produtiva e a correção dos desequilíbrios sociais e regionais.

A retomada do crescimento sustentado se dará a partir da transformação da estrutura produtiva, que contemple aumento sistemático da produtividade, melhoria permanente da qualidade de produtos e serviços e fomento à capacidade de inovação.

Caberá ao Estado recriar as condições macroeconômicas e prover, em trabalho conjugado com a iniciativa privada, as infraestruturas econômica, tecnológica e educacional necessárias à reestruturação competitiva das empresas.

Para reverter a grave situação de desequilíbrio social e regional, é necessário, além de mecanismos alternativos de financiamento à infraestrutura social, estabelecer, por meio da coordenação das diversas esferas de governo, políticas sociais, regionais e de caráter compensatório. Assim, o Estado estará recuperando a sua dimensão de promotor do bem-estar social, mas indo além do assistencialismo puro e simples, já que o propósito passaria a ser o de igualar as condições de partida.

A realização dessas tarefas requer uma mudança significativa na natureza do Estado e também nas suas formas de atuação. O que se propõe é um Estado menor, mais ágil e bem informado, com alta capacidade de articulação e flexibilidade para ajustar suas políticas.

A tarefa de modernização da economia terá na iniciativa privada seu principal motor. Ao Estado cabe, porém, o importante papel de articulador dos agentes privados com vistas a mobilizar esse conjunto de forças em direção aos objetivos de progresso e justiça social.

Assim, fatores como controle inflacionário, equilíbrio fiscal, redução do custo dos negócios, política responsável de crédito, redução da burocracia, entre outros, são cruciais para a retomada do crescimento do País.

[Aqui resumo apenas as principais medidas]. Na reforma do Estado, a superação da crise e a viabilização de um projeto de desenvolvimento para o País dependem de quatro fatores fundamentais: primeiro, a credibilidade do governante [em primeiríssimo lugar, a credibilidade do governante]; depois, a segurança jurídica dos contratos; que o ajuste fiscal ganhe dimensão estrutural; e, por fim, que o aparelho estatal seja modernizado e profissionalizado mediante ampla reforma com a introdução da meritocracia e do desempenho.

Reestruturação competitiva da economia. [...] O cerne da estratégia tendo como objetivo maior a melhoria da qualidade de vida da população brasileira deve ser a busca do aumento progressivo da competitividade da economia e os caminhos a seguir devem observar as seguintes premissas: os desafios de modernização e elevação da competitividade exigem transformações estruturais importantes em todo o sistema econômico e não apenas nesse ou naquele setor; [...] o incremento na capacitação científica e tecnológica interna e a melhoria na formação de recursos humanos são elementos indispensáveis ao processo de modernização.

    Assim, faz-se necessário um conjunto de ações específicas nos seguintes setores: indústria, agricultura, infraestrutura - essa desdobrada em energia, transporte e telecomunicações -, ciência e tecnologia, educação, relações entre capital e trabalho, meio ambiente.

(Soa a campainha.)

    O SR. FERNANDO COLLOR (Bloco Moderador/PTC - AL) - Dentro do capítulo da dívida social, o plano prevê programas de combate à pobreza, mediante:

políticas sociais focadas na melhoria da condição socioeconômica da população, com ênfase no acesso aos serviços públicos, na educação e na qualificação profissional. [...] [Um dos meios é a destituição] do caráter eminentemente paternalista dessas políticas, de forma a recuperar a autonomia e a autoestima da população com sua desvinculação da dependência do Estado.

[...] O novo modelo econômico a ser adotado requer que as políticas sociais estejam, necessariamente, coordenadas com as políticas de responsabilidade fiscal nos três níveis da Federação.

    Ainda dentro do capítulo da dívida social, seguem também medidas nos sistemas de seguridade social e integração regional.

    Cidadania e Direitos Fundamentais. Nesse capítulo, são especificadas ações para as seguintes áreas:

1. Direitos Humanos;

2. Violência e Criminalidade;

3. Crianças, adolescentes e idosos;

4. População indígena e minorias;

5. Cultura;

6. Desporto; e

7. Defesa da Concorrência e do Consumidor.

    Essas partes resumidas estão bem detalhadas no documento que já solicitei, no início, à Presidência da Mesa que juntasse ao meu pronunciamento, já que é um documento que contém 19 páginas. Mas farei-o chegar à mão das Srªs e dos Srs. Senadores o quanto antes.

V - O Brasil no Cenário Internacional.

1. Política Externa.

Não há projeto nacional viável para o Brasil sem vinculação eficaz com o mundo. Esta eficácia depende, sobretudo, da credibilidade do País, por meio da recuperação da previsibilidade e da segurança jurídica, o que torna a diplomacia instrumento indispensável para materializar as aspirações nacionais, quer no plano econômico, quer no plano político.

No plano econômico, trata-se de aproveitar as perspectivas presentes no cenário externo para promover a inserção e a modernização da economia brasileira. No plano político, trata-se de contribuir para a paz e de projetar no relacionamento externo os valores democráticos e de observância das normas de direito que regem nossa sociedade.

[...] No fim dos anos 1990, o fim da guerra fria e da rígida configuração bipolar levou a uma flexibilização das fronteiras comerciais e ao impulso da globalização. Aumentou consideravelmente a competição nos mercados internacionais, em que se tornaram maiores as dificuldades de um país concorrer individualmente.

Ao assinar o Tratado de Assunção, [lá atrás, em 1991] que criou o Mercosul, tínhamos em mente a estratégia de desenvolver um espaço econômico mais amplo, mais forte e competitivo.

As transformações do sistema internacional são hoje também muito abrangentes. A negociação de dois megablocos comerciais, a Parceria Transpacífico [...] e a Iniciativa Transatlântica [ambas envolvendo os Estados Unidos] envolvem e abrangem a maior parte da economia internacional. A China, de sua parte, tem aumentado seus laços na Ásia, consolidando sua esfera de influência, além de fazer maciços investimentos na África e na América Latina em busca de garantir fornecimento de matérias-primas e o acesso a mercados.

Esses mega-acordos estão estabelecendo também regras em diversas áreas, como propriedade intelectual, meio ambiente, relações trabalhistas e investimentos. São normas de cuja elaboração [nós, Brasil] não participamos nem influenciamos, mas às quais fatalmente nos submeteremos.

O Brasil escolheu dar prioridade às negociações da Rodada Doha, e não negociar acordos comerciais. Com a OMC (Organização Mundial do Comércio) deixada de lado pelos amplos novos acordos, o nosso País vê frustrada essa opção de sua diplomacia.

De outra parte, a análise que considerava que os países emergentes seriam os grandes catalizadores da economia mundial mostrou-se, no mínimo, açodada.

Verifica-se que, a exemplo do que se temia há 26 anos, o Brasil tem diminuída a sua margem de manobra no campo econômico internacional. Ações com viés ideológico no âmbito do mercado minaram sua credibilidade. O bloco reformulado precisa dar impulso a negociações bilaterais e com os megaespaços comerciais. Assim, a diplomacia brasileira deve retomar suas atividades de promoção comercial que foram abandonadas nos últimos anos, substituídas por atuações de caráter ideológico. O realismo e o bom-senso indicam que esses são os únicos caminhos viáveis e que há urgência em buscá-los.

Portanto, as ações da política externa brasileira necessitam, antes de tudo, de menos ideologia política e mais pragmatismo comercial, [mais agressividade comercial]. Como exigem hoje as grandes correntes do comércio mundial, precisamos de uma política externa muito clara e objetiva, priorizando os acordos multilaterais.[...]

Somente assim, o Brasil será capaz de retomar sua liderança do subcontinente e o seu protagonismo mundial.

    Por fim, Sr. Presidente - e agradecendo desde já a deferência que V. Exª concede pelo tempo que ocupo a tribuna -, no setor de defesa nacional, o documento prevê:

[...] Em que pese o impacto do desenvolvimento da ciência e da tecnologia sobre o relacionamento humano e sobre a vida das nações, em futuro previsível, é improvável que as mudanças decorrentes venham a criar estruturas políticas que tornem imprescindível a capacidade militar. Nesse cenário, as Forças Armadas Brasileiras devem orientar o seu preparo de modo a enfatizar a profissionalização e a prontidão operativa, o desempenho tecnológico e a mobilidade.

O preparo assim delineado exige desenvolvimento de tecnologias adequadas e a evolução de doutrinas e procedimentos herdados do passado histórico e das experiências recentes.

Deve ainda ter por propósitos, em estrita consonância com a Constituição e as leis, a dissuasão de ameaças à integridade e à soberania nacionais, o apoio à lei e à ordem no território e nos espaços sob jurisdição brasileira em questões que transcendam a missão e a capacitação dos sistemas policiais e a contribuição à ordem internacional em cooperação e sob mandado internacional.

O amplo espectro de missões e responsabilidades daí decorrentes exige que seja intensificada a integração entre as forças singulares, de modo a facilitar e desenvolver a capacidade de operação conjunta, com especial foco na inteligência militar, na padronização de processos e equipamentos e no desenvolvimento dos instrumentos de guerra eletrônica.

Por outro lado, a sociedade brasileira precisa ser conscientizada da importância dos assuntos de defesa e que esta é um dever de todos. Nesse sentido, a sociedade deve ser integrada nas ações de defesa dos interesses nacionais, mediante o incentivo ao estudo do tema no meio civil de forma a difundir o conhecimento e contribuir para a preservação da coesão e da unidade nacionais.

    Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, esse é o compêndio das diretrizes para a reestruturação do Brasil, fruto de entendimento com os Líderes do Bloco Moderador.

    Além da publicação da íntegra do documento nos Anais da Casa, como disse anteriormente, o faremos chegar à consideração de V. Exªs. Esperamos, com isso, poder colaborar para os rumos do País a partir do desfecho político a ser tomado, em breve, pelo Senado Federal.

    Para concluir, Sr. Presidente, Senador Elmano Férrer, contextualizando a história que vivemos hoje e ontem, deixo à reflexão da Casa as palavras do historiador francês Vidal-Naquet - abro aspas:

Não existe história possível em que um estado, uma igreja, uma comunidade, mesmo respeitáveis, impõem uma ortodoxia. Porém, inversamente, nenhum livro, por mais rico em documentos sensacionais e em considerações profundas, que seja, é uma obra definitiva. [Esse adjetivo "definitiva", que se lê com frequência nas dissertações: aqui temos um estudo definitivo sobre...] Não existe estudo definitivo. A história deve ser sempre revisada, refeita - eu disse: revisada, refeita. Não disse: destruída, desfeita." - fecho aspas.

    Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente, Senador Elmano Férrer, Srªs e Srs. Senadores.

    Mais uma vez agradeço à Presidência dos trabalhos o tempo que me foi concedido. Muito obrigado!

    O Sr. Cristovam Buarque (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Presidente, Senador, o senhor me permite um comentário?

    O SR. FERNANDO COLLOR (Bloco Moderador/PTC - AL) - Ouço, com muita alegria, o Senador Cristovam Buarque.

    O Sr. Cristovam Buarque (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Primeiro, Senador, quero dizer que é gratificante, no meio desses últimos meses - eu diria, de um tremendo Fla-Flu, de debate entre duas torcidas, pró-Dilma ou pró-Temer -, a gente assistir a um discurso sobre um projeto para o Brasil. É gratificante. Eu gostaria muito de receber - como o senhor disse que todos nós vamos receber - esse documento. Creio que o senhor contemplou todas as linhas fundamentais de um projeto de Brasil. E eu, embora me reserve a uma opinião depois de ler com cuidado, simpatizei bastante com o conteúdo e o estilo que foram usados na apresentação. Eu só queria dar uma sugestão para o senhor analisar e ver se faz sentido. Eu ouvi - apenas ouvi, sem ler - que a educação entrou no aspecto social, como parte da luta contra a pobreza. Para mim, hoje, na economia do conhecimento, de que o senhor, inclusive, trata quando fala da economia, a educação é mais do que um serviço, tipo saúde, água, esgoto. A educação é o motor que permitiria construir esse projeto que o senhor está fazendo. Nesse sentido, acho que valeria a pena trabalhar em como fazer isso realidade no seu projeto, nos entraves para que isso aconteça. Certamente, imagino que o baixo grau de deseducação que nós temos no Brasil é, se não a causa, eu diria, a causa mais importante que precisa ser superada para termos a realização desse projeto. E nesse sentido, de tomar a educação como vetor fundamental da construção desse projeto, em todos os itens, até na reforma política, o próprio parlamentarismo, vai-se exigir educação. Tudo vai exigir! Eu tenho a impressão até - aqui um parêntesis -, ao assistir aos últimos debates, especialmente na Câmara dos Deputados, a sensação que eu tenho é que houve, de fato, uma coisa positiva: a democratização dos que chegam ali, mas uma decadência, pela falta de educação naquelas que chegam ali. A culpa não é dos que chegaram sem educação, a culpa é do Estado brasileiro que não ofereceu educação, lá atrás, para cada um deles. Uma vez, liguei até para o Deputado Tiririca, quando falaram que ele era analfabeto, e eu disse: o senhor deveria criticar era o prefeito de sua cidade, de quando o senhor era menino, que não lhe permitiu ter a educação que o senhor gostaria. Mas, voltando, creio que valia a pena retomar a ideia de como fazer essa educação. E o senhor tem autoridade especial para isso. Porque, na sua Presidência, foi feito o único verdadeiro esforço de federalizar a educação no Brasil, com, se não me engano, 550 CIACs que foram construídos no Brasil. Aquela foi a única experiência de federalização. Brizola fez isso, mas dentro do Estado do Rio de Janeiro e, lá atrás, no Rio Grande do Sul. Fora isso, mais ninguém. A educação continua sendo uma questão municipal ou, no máximo, estadual. E tenho a impressão de que, mantendo a educação nos ombros dos Municípios pobres e desiguais, não conseguiremos realizar um projeto tão bonito como esse que o senhor trouxe para nós nesta tarde. Eu, de fato, gostaria que fosse distribuído para todos - como o senhor disse que fará - e que debatêssemos mais o seu projeto, não para assinar embaixo, copiar ou adotar - que não é o que o senhor quer -, mas que daí pudesse surgir um projeto para o futuro. E, concluindo, estamos na véspera de saber se continuamos com esse Governo, se vamos ter um novo governo, mas, sem um projeto como esse, impeachment ou não-impeachment não vai mudar absolutamente nada no Brasil. Continuaremos com a decadência na qual estamos nesses últimos, alguns anos, não muitos, porque vínhamos ascendendo. Precisamos, ao meu ver, ter como elemento fundamental, unificador do seu projeto, o grande programa pelo qual a educação de cada criança brasileira - independentemente da renda do pai, da cidade onde mora - fosse da maior qualidade.

    O SR. FERNANDO COLLOR (Bloco Moderador/PTC - AL) - Muito obrigado a V. Exª, Senador Cristovam Buarque.

    Gostaria de dizer a V. Exª, inicialmente, que este projeto foi fruto de um amplo e dedicado entendimento havido dentro do Bloco Moderador, que tenho a honra de liderar, com os Líderes dos partidos que fazem parte do Bloco: o Senador Elmano Férrer, Líder do PTB; o Senador Wellington Fagundes, Líder do PTR; o Senador Marcelo Crivella, Líder do PRB; o Senador Eduardo Amorim, Líder do PSC. Graças ao apoio e ao entendimento que todos nós pudemos chegar, é que trago à consideração de V. Exªs na tarde-noite de hoje este projeto com o único objetivo, como V. Exª afirmou, de suscitar o debate, de suscitar opiniões a favor, contra, aperfeiçoamentos, enfim, é a contribuição que o Bloco Moderador do Senado da República entendeu por bem oferecer, neste momento, às Srªs e aos Srs. Senadores e à sociedade brasileira.

    Em relação ao item educação, embora tenha sido citado apenas uma vez, Senador Cristovam, V. Exª, quando receber o documento, verá que a educação, além de ter um capítulo especial, um capítulo dedicado somente a este importantíssimo e vital tema para o nosso desenvolvimento ou de qualquer outro país, permeia também outros itens.

    Quando se fala da atenção às crianças, da questão da criminalidade, aí está a educação; quando se fala na erradicação da pobreza, ali está novamente citada a educação como fator chave, e assim por diante. Porque a educação, como V. Exª sabe, que é um mestre no tema, sobretudo um profeta das medidas que poderão ser tomadas para nós alavancarmos definitivamente o Brasil rumo ao grande destino que está a ele conferido, somente ocorrerá se dermos atenção total devida a ela.

    Quanto ao que V. Exª se referiu a respeito dos Centros Integrados de Apoio à Criança, da federalização do ensino básico e integral neste País, foi realmente um projeto de ampla envergadura. Nosso projeto inicial era de construção de 5 mil CIACs. Infelizmente, o tempo que nos foi dado pela população brasileira, pelo eleitorado brasileiro, não pôde ser cumprido até o final e não tivemos como concluir esse projeto.

    É algo tão evidente, Senador Cristovam, que, sem o ensino integral de alta qualidade, sem o prestígio aos nossos professores, sem o estabelecimento do mérito, sem a capacitação profissional, sem salários condizentes com o esforço que eles realizam, sem a compreensão da comunidade onde se instala uma unidade como essa, nós não teremos condições de avançar com um projeto como esse.

    Para avançar, é necessário que haja uma conscientização e, mais do que isso, um compromisso formal de todos nós detentores de mandato, de todos nós que nos dedicamos à vida pública de mostrarmos à sociedade a validade de um empreendimento como esse, de uma iniciativa como essa.

    Portanto, Senador Cristovam, mais uma vez, muito obrigado a V. Exª por essa sua intervenção e digo, como sempre, que continuo sendo seu leitor. Outro dia, V. Exª lembrava que, quando então Presidente da República, numa das descidas de rampa, numa sexta-feira, eu desci sobraçando dois livros de sua autoria. Tenho em V. Exª um mestre, cujas ideias devem ser seguidas e devem ser atendidas no seu alcance e no seu conteúdo.

    Muito obrigado a V. Exª.

    Obrigado, Sr. Presidente.

    Obrigado, Srªs e Srs. Senadores.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/04/2016 - Página 49