Discurso durante a 61ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Defesa de que os decretos para abertura de créditos suplementares editados pela Presidente Dilma Rousseff não configuram crime de responsabilidade e não ferem a lei de responsabilidade fiscal.

Autor
Donizeti Nogueira (PT - Partido dos Trabalhadores/TO)
Nome completo: Divino Donizeti Borges Nogueira
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Defesa de que os decretos para abertura de créditos suplementares editados pela Presidente Dilma Rousseff não configuram crime de responsabilidade e não ferem a lei de responsabilidade fiscal.
Publicação
Publicação no DCN2 de 29/04/2016 - Página 42
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • COMENTARIO, UTILIZAÇÃO, DECRETO FEDERAL, OBJETIVO, ABERTURA, CREDITO SUPLEMENTAR, AUSENCIA, CRIME DE RESPONSABILIDADE, RESPEITO, LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL.

    O SR. DONIZETI NOGUEIRA (Bloco Apoio Governo/PT - TO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidenta, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, nós temos, neste tempo - e é bom podermos estar aqui dialogando com os telespectadores da TV Senado, com os radiouvintes da Rádio Senado -, ouvido: golpe, não golpe; impeachment, não impeachment.

    Hoje, quero falar só de um ponto que está apresentado e acolhido pela Câmara como crime da Presidenta Dilma, que são os decretos suplementares. Aqueles que defendem o impeachment dizem que ela cometeu um crime porque não havia previsão legislativa para poder fazer os decretos suplementares e que havia orientação do TCU de que não poderia fazê-lo.

    Vou tentar, na minha fala, explicar hoje, única e exclusivamente, a questão dos decretos suplementares.

    A denúncia apresentada na Câmara dos Deputados, acolhida pelo Presidente da Câmara e, depois, pelo Plenário, acusa a Presidenta de ter editado decretos de suplementação que estariam em desconformidade com a Constituição e com a lei, além de imputar à Presidente, também lá na denúncia, o crime pelo fato de o Tesouro ter deixado de repassar recursos ao Banco do Brasil.

    Argumentam os denunciantes que os decretos não poderiam ter sido baixados por colidirem com a Lei de Diretrizes Orçamentárias, que prevê metas fiscais. Entendemos, contudo, Srªs e Srs. Senadores, que não houve qualquer ilegalidade na edição de tais decretos, tendo em vista que estão previstos na Lei Orçamentária, mais especificamente no art. 4º da Lei Orçamentária nº 13.115/2015.

    Art. 4º Fica autorizada a abertura de créditos suplementares, restritos aos valores constantes desta Lei, [ou seja, desde que não exceda o que está autorizado pela lei] [...] compatíveis com a obtenção da meta de resultado primário estabelecida para o exercício de 2015 e sejam observados o disposto no parágrafo único do art. 8º da LRF e os limites e as condições estabelecidos neste artigo [que é o art. 4º da Lei Orçamentária], vedado o cancelamento de valores incluídos ou acrescidos em decorrência da aprovação de emendas individuais, para o atendimento de despesas:

    Esse artigo traz 29 incisos, mais uma série de alíneas que são colocadas.

    A Presidenta emitiu os decretos, de acordo com a Lei Orçamentária, não feriu nenhum inciso, nenhuma alínea daquilo que prevê o artigo. Então, não cometeu crime ao editar os decretos.

    Para que se tenha uma ideia, a lei autoriza a utilização de decretos para créditos suplementares, como eu disse, em 29 situações específicas, em que há permissão para que o Governo faça remanejamento de recursos por meio de anulação de recursos existentes ou até mesmo utilizando-se de recursos de outras fontes previstas em lei, desde que as alterações promovidas na programação orçamentária sejam compatíveis com a obtenção da meta do resultado primário.

    Esse mesmo artigo da Lei Orçamentária de 2015, em seu inciso I, define que as fontes possíveis para abertura de crédito são:

    a) anulação parcial de dotação a 20% [que é o que autoriza a Lei Orçamentária] [...], do valor do subtítulo objeto da anulação;

    b) reserva de contingência, inclusive à conta de recursos próprios vinculados, observado o disposto no art. 5º, inciso III, da Lei de Responsabilidade Fiscal;

    c) excesso de arrecadação de receitas próprias, nos termos do art. 43, §§ 1º, inciso II, 3º e 4º da Lei 4.320, de 17 de março de 1964;

    d) excesso de arrecadação de receitas do Tesouro Nacional; e

    e) superávit financeiro apurado no balanço patrimonial do exercício de 2014, nos termos do art. 43, §§ 1º e 2º da Lei 4.320, de 1964.

    A Presidenta emitiu os decretos em conformidade com essa lei. Resta saber se ela descumpriu alguma orientação do que poderia estar dizendo o Tribunal de Contas. Também não descumpriu.

    Existe a polêmica de que não poderia fazer, mas, só em 7 de outubro, é que o Tribunal de Contas vai apresentar o acórdão formalizado, dizendo que não poderia. A partir de 7 de outubro, o Governo parou de fazer decretos suplementares, passando a mandar pedidos de autorização para o Congresso. Então, até aquele momento, os decretos editados pela Presidenta estavam em conformidade com a Lei Orçamentária e em conformidade com todos os preceitos legais previstos nessa questão.

    O Governo tem procurado deixar bem claro ao Congresso e à população brasileira que a abertura dos créditos suplementares sequer expôs o risco de descumprimento da meta, porque tais despesas estão condicionadas à disponibilidade de recursos para se concretizar. Como funciona? Para entendermos, a Presidente ou o Poder Executivo manda o orçamento para cá, a proposta de orçamento; o Congresso aprova a proposta de orçamento; e o Governo edita um decreto de execução orçamentária.

    Se há possibilidade de redução das receitas, o Governo edita um decreto de contingenciamento; e, como havia previsão de redução das receitas, o Governo emitiu um decreto de contingenciamento. Consoante com a didática explanação do Ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, esse instrumento serve apenas para remanejar os gastos já autorizados pelo Congresso, ou seja, os decretos orçamentários só servem para remanejar os gastos. Então, foi isso que a Presidenta fez.

    Eles permitem que, no caso de uma receita específica vir acima do projetado, ela possa ser destinada a algum gasto também previsto. Gasto previsto, se não houver a previsão do gasto, não se pode fazer decreto suplementar para aquela despesa. No entanto, isso implica, necessariamente, que outras despesas sejam cortadas.

    Na visão do Ministro, os autores da denúncia confundem a gestão orçamentária e a gestão financeira da União. Os decretos de créditos suplementares são objetos de gestão orçamentária, enquanto o cumprimento da meta diz respeito à gestão financeira.

    No caso da gestão financeira, determina a Lei de Responsabilidade Fiscal que, se verificado, ao final de um bimestre, que a realização de receita poderá não comportar o cumprimento das metas de resultado primário, os Poderes e o Ministério Público, ou seja, os Poderes Executivo e o Ministério Público promoverão por ato próprio, e nos montantes necessários, a limitação de empenho e movimentação financeira.

    Essa limitação de empenho e movimentação financeira é chamada popularmente de contingenciamento, como falei, do decreto de contingenciamento, ou seja, a cada ano, o Governo limita, por meio de decreto específico enumerado o total de despesas que pode efetivamente ser executada por cada órgão. Assim, para executar uma despesa, não basta que o órgão tenha dotação orçamentária, ele também precisa de limite de execução financeira. E tudo isso foi observado rigorosamente pela Presidenta Dilma em 2015.

    Os decretos que estão sendo questionados são decorrentes da gestão orçamentária e não aumentaram o limite de execução para nenhum dos órgãos definidos no decreto de contingenciamento. O que os decretos fizeram foi aumentar alternativas que o Governo tem, para aplicar o mesmo valor financeiro, fixado no decreto de contingenciamento. Disse-nos o Ministro Nelson Barbosa ainda, antes da publicação desse decreto, que o valor de contingenciamento de despesas cortadas subiu de R$71 bilhões para R$78 bilhões, não havendo que se falar em crime de responsabilidade fiscal num momento em que o Governo fez o maior contingenciamento da História. Portanto, a abertura dos créditos suplementares, por meio de decreto, possui expressa previsão legal, constitucional, não havendo que se falar de qualquer irregularidade nesse tema.

    Outro aspecto de extrema relevância sobre esse tema é a súbita alteração do entendimento do Tribunal de Contas da União, em relação à edição de decretos suplementares. Isso, porque em 7/10/2015, ou seja, depois de 15 anos da entrada em vigor da Lei de Responsabilidade Fiscal, a Corte de Contas, por meio do Acórdão nº 2.461/2015, TCU-Plenário, considerou, pela primeira vez ao longo desses anos, irregular a edição de decretos que abriam créditos suplementares, com o fundamento de que eram incompatíveis com a obtenção da meta fiscal, o que ensejou a recomendação pela rejeição das contas.

    Essa nova postura contrariou o entendimento até então consolidado, no âmbito do próprio Tribunal, quando do exame de casos similares, como os ocorridos nos exercícios de 2001 a 2009. Nesses anos, os Presidentes Fernando Henrique e Luiz Inácio Lula da Silva editaram respectivamente decretos de crédito suplementar, tendo como fonte o superávit financeiro do exercício anterior, o excesso de arrecadação ou situações análogas ao presente exercícios. Nesses dois momentos, o TCU, ao examinar as contas correspondentes, não fez qualquer ressalva, em relação à referida prática dos decretos suplementares.

    No entanto, a partir de 7 de outubro de 2015, quando saiu o acórdão do TCU, a Presidenta Dilma não emitiu mais nenhum decreto, sempre encaminhando para que o Congresso pudesse autorizar alguma mudança.

    O Presidente Fernando Henrique Cardoso, por exemplo, alterou a meta fiscal, por meio da Medida Provisória nº 2.046-33, de 25 de agosto de 2000, reduzindo o valor da meta e incluindo a possibilidade de compensação entre o orçamento da União e os resultados das estatais. Essa medida provisória foi sucessivamente reeditada - porque, naquele tempo, ainda se podia reeditar medida provisória -, culminando em sua conversão na Lei nº 10.210, de 23 de março de 2001. Na prática, criou a possibilidade de abatimento da meta da União, utilizando o resultado das estatais.

    É interessante notar que ao final de 2001, o Governo Federal não conseguiu cumprir a meta. Foram editados 101 decretos de créditos suplementares, dos quais 27 utilizaram como fonte excesso de arrecadação ou superávit financeiro. Considerando apenas os períodos após a publicação da referida medida provisória, foram editados 20 decretos.

    À época, a avaliação do TCU sobre a abertura dos referidos créditos não mencionou qualquer irregularidade. Temos que lembrar ainda que houve a aprovação da alteração da meta fiscal por lei aprovada por nós, pelo Congresso Nacional, o que implica ter o Governo cumprido fielmente a Lei Orçamentária, inclusive no tocante às metas, indicando a mais absoluta tipicidade da conduta que pretendem os denunciantes imputar à Presidência.

    Por fim cabe ressaltar um detalhe importante: os decretos de suplementação questionados no pedido de impeachment não possuem numeração. Isso é outra inverdade e uma forma de enganar a população, porque não possuem caráter normativo. De acordo com o Decreto nº 4.176, de 2002, editado pelo então Presidente Fernando Henrique Cardoso, somente os decretos de caráter normativo deverão ser numerados - é bom que a população compreenda isso, somente aqueles de caráter normativo deverão ser numerados! Os demais tipos de decreto, como de abertura de créditos e provimento e vacância de cargos, são identificados pelo seu tema e data de publicação.

    Esses decretos editados pela Presidenta... Isso, porque alguns gostam de dizer que ela escondeu e, por isso, não tinham número - não é verdade. Ela não escondeu, porque não é preciso numerar. E não há como esconder, porque todos eles foram publicados no Diário Oficial da União. Então, é de conhecimento público essa questão dos decretos.

    Concluímos, Srª Presidente, esta parte, afirmando que não há que se falar em qualquer ação ilegal por parte da Presidenta da República, até porque todos os atos foram praticados por meio de solicitações, pareceres e manifestações jurídicas expressas aos atos administrativos e expedidos pelos órgãos técnicos do Governo, e que se encontram inteiramente ao abrigo da presunção de legitimidade que envolve todos os atos administrativos em geral.

    Então, nesse ponto - eu não estou falando aqui na questão das chamadas pedaladas fiscais; estou falando dos decretos suplementares -, a Presidenta não cometeu nenhum crime. É por isso que, se aqui no Senado, ao fim do julgamento, por esse crime, perpetramos o impedimento de a Presidenta continuar governando, aí, sim, estaremos dando um golpe. Não é um golpe com as armas nas ruas, não é um golpe de ruptura com violência; é um golpe de ruptura com violência, sim, aos preceitos constitucionais, à legislação e ao voto dos eleitores, porque 110 milhões foram às urnas, para definir quem seria Presidente.

    Mas acredito que, na observância da lei, no debate do mérito que vai ser feito aqui no Senado, nessa observação de que não houve o crime - e, na semana que vem, quero voltar para falar sobre as pedaladas fiscais -, a Presidenta não cometeu crime. Por isso, qualquer iniciativa de impedimento do prosseguimento do exercício do seu mandato aí, sim, será golpe, o que creio que não vai ocorrer.

    Por fim, ouço aqui a oposição, dizendo que o PT quebrou o Brasil, que a Dilma e o Lula quebraram o Brasil. Ora, quem quebrou o Brasil foram os oito anos do Fernando Henrique. E vou mostrar alguns dados do Banco Mundial e do Fundo Monetário Internacional.

    (Soa a campainha.)

    O SR. DONIZETI NOGUEIRA (Bloco Apoio Governo/PT - TO) - O PIB brasileiro, em 1994 - o Fernando Henrique ganha as eleições e assume em 1995 -, era de US$534 bilhões. Quando o Fernando Henrique conclui seu mandato e entrega o governo para o Presidente eleito Lula, o PIB brasileiro era de US$504 bilhões. Em oito anos, não só não conseguimos crescer, como decrescemos - em vez de crescermos, decrescemos, porque, de US$534 bilhões, o nosso PIB caiu para US$504 bilhões; então, é um decrescimento!

    (Soa a campainha.)

    O SR. DONIZETI NOGUEIRA (Bloco Apoio Governo/PT - TO) - E o PIB dos Governos do PT até 2014 subiu de US$504 bilhões para US$2,3 trilhões ao final de 2014. Isso é apenas 400% de aumento; a economia brasileira cresceu 400% de aumento em apenas 12 anos, quando, em oito anos, ela havia decrescido.

    Então, não é verdade o que querem passar para o povo brasileiro de que os Governos do PT quebraram o País. Podemos dizer que quem quebrou o País mesmo foi o governo que privatizou as nossas estatais, como, por exemplo, a Vale do Rio Doce. Quer um ato de corrupção maior do que esse?

    (Soa a campainha.)

    O SR. DONIZETI NOGUEIRA (Bloco Apoio Governo/PT - TO) - Pegar um patrimônio do povo brasileiro que estava avaliado em US$98 bilhões e vender por apenas US$3,8 bilhões não foi uma venda, foi uma doação. Eu não sei para onde foi essa diferença.

    Srªs e Srs. Senadores, eu termino para dizer o seguinte: eu não posso aceitar as pessoas virem dizer que a gente hoje criou uma situação constrangedora aqui, que foi articulada pelos Líderes do PT. Isso é uma desfaçatez e uma mentira. O Prêmio Nobel da Paz Esquivel esteve aqui conosco e não tinha, do nosso ponto de vista...

    (Soa a campainha.)

    O SR. DONIZETI NOGUEIRA (Bloco Apoio Governo/PT - TO) - Os Líderes do PT não tinham previsão de que ele iria falar. Ele só veio fazer uma visita à Mesa. O Senador Paim, por cortesia, quis dar a ele a palavra.

    A SRª PRESIDENTE (Lúcia Vânia. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - GO) - Para concluir, Senador.

    O SR. DONIZETI NOGUEIRA (Bloco Apoio Governo/PT - TO) - E o orientou...

    A SRª PRESIDENTE (Lúcia Vânia. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - GO) - Para concluir.

    O SR. DONIZETI NOGUEIRA (Bloco Apoio Governo/PT - TO) - Senadora, aqui houve Senador e Senadora que falaram mais de 30 minutos. Eu estou aqui há 24 minutos, Senadora. Então, eu vou concluir.

    Não havia previsão. O Senador Paim fez a cortesia. E ele falou, do meu ponto de vista, o que não devia falar. Eu concordo com isso. Mas querer imputar aos Líderes do PT essa responsabilidade é uma irresponsabilidade daqueles que usaram os microfones aqui do Senado para falar isso.

    Era isso.

    Nós não vamos baixar a guarda. Vamos continuar na luta, defendendo a democracia...

    (Soa a campainha.)

    O SR. DONIZETI NOGUEIRA (Bloco Apoio Governo/PT - TO) - ... e combatendo o golpe.

    Obrigado. (Pausa.)


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 29/04/2016 - Página 42