Discurso durante a 57ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Defesa do argumento de que a Presidente Dilma Rousseff não cometeu crime de responsabilidade.

Autor
Fátima Bezerra (PT - Partido dos Trabalhadores/RN)
Nome completo: Maria de Fátima Bezerra
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Defesa do argumento de que a Presidente Dilma Rousseff não cometeu crime de responsabilidade.
Publicação
Publicação no DSF de 26/04/2016 - Página 12
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • DEFESA, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, MOTIVO, AUSENCIA, CRIME DE RESPONSABILIDADE, ENTENDIMENTO, PROCESSO, IMPEACHMENT, SITUAÇÃO, GOLPE DE ESTADO, CITAÇÃO, ARTIGO DE IMPRENSA, FOLHA DE S.PAULO, CIENTISTA POLITICO.

    A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Apoio Governo/PT - RN. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Senadora Vanessa, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, ouvintes da Rádio Senado, telespectadores da TV Senado, hoje iniciamos mais uma etapa desse processo que visa a usurpar o mandato de uma Presidenta legitimamente eleita, sem que contra ela pese nenhuma acusação de crimes, ao contrário, diga-se passagem, do que acontece com grande parte dos seus julgadores.

    Foi um final de semana prolongado, e, como já se tem tornado rotina, mais uma vez, muito disse me disse pelos jornais, a mídia golpista, que tem assumido um verdadeiro papel de partido de oposição.

    O fato é que a oposição e Ministros do Supremo Tribunal Federal vieram a público, neste fim de semana, criticar a Presidenta Dilma, fazendo discursos alarmistas, adiantando que ela iria denunciar da tribuna da ONU o golpe em curso no Brasil. No entanto, não foi isso o que aconteceu. Muito pelo contrário. A fala da Presidenta Dilma na ONU foi digna de uma estadista esperançosa de que a democracia vai prevalecer nesse processo injusto e ilegítimo a que ela está sendo submetida.

    Portanto, quando a oposição viu que a Presidenta não fez o discurso que eles esperavam, mais uma vez eles insistem naquela narrativa de que, na verdade, não é golpe, que é um pedido de impeachment previsto na Constituição, como se nós tivéssemos discordância no tocante a isso. Não temos nenhuma discordância. É claro que o pedido de impeachment está na Constituição. Todos nós sabemos disso. Agora, um pedido de impeachment sem base legal, sem fundamentação jurídica, na medida em que não atende ao próprio comando constitucional, quando não há, de maneira nenhuma, comprovação de crime de responsabilidade direta da Presidenta, nós afirmamos e vamos continuar sempre afirmando que um pedido de impeachment nessas circunstâncias não passa de um golpe, ou seja, um golpe, portanto, travestido de impeachment.

    A Presidenta, quero ainda aqui adiantar, foi elegante ao falar das dificuldades pelas quais o País passa e de sua confiança de que a população brasileira saberá evitar retrocessos. Ela foi sutil, mas parece que alguns não entendem essa forma de elegância.

    Por outro lado, a imprensa internacional não se deixou enganar. Para os grandes jornais de boa parte do mundo, acontece no País o que a nossa imprensa tradicional teima em negar: impeachment sem crime de responsabilidade é golpe!

    E é por isso, senhoras e senhores, que consideramos extremamente importante o papel do Senado neste exato momento. Logo mais, na sessão de hoje ainda, nós vamos dar início aqui à instalação da Comissão que terá como objetivo avaliar se devemos ou não dar prosseguimento a esse processo.

    Aqui, senhoras e senhores, não podemos mais nos ater apenas aos ritos processuais. Claro que temos que respeitar os ritos - e, no Senado, não tenho nenhuma dúvida de que isso será respeitado -, mas nesta Casa temos que analisar fundamentalmente o mérito do processo. Aí, ao analisar o mérito do processo, confiantes de que não há comprovação de crime de responsabilidade direta por parte da Presidenta, nós entendemos que o caminho justo a ser adotado pelo Senado Federal deveria ser o de corrigir o equívoco histórico, jurídico, político e constitucional que a Câmara dos Deputados adotou quando aprovou a admissibilidade do processo.

    Quero ainda dizer, Srª Presidente, que, no último fim de semana, escutamos alguns Ministros do Supremo Tribunal Federal darem declarações políticas sobre o processo de impeachment. Tais Ministros e ex-Ministros rebatem as denúncias de golpe, dizendo reiteradamente que o processo destinado a apurar responsabilidade da Presidenta respeitou todas as fórmulas estabelecidas na Constituição.

    Faço minhas as palavras do colunista da Folha de S.Paulo Jânio de Freitas, ao lembrar que, abre aspas:

O golpe não está na forma, está na essência, no argumento, que apenas se vale da forma. E esse argumento consiste em, de repente, considerar crime para efetivar o impeachment uma prática financeira aceita nos Governos anteriores e em atuais governos de Estados, as chamadas pedaladas. [Diz o colunista Jânio de Freitas]. Um casuísmo. Portanto, um expediente oportunista.

Fecha aspas.

    Quero ainda aqui, Srª Presidente, trazer para reflexão nesta tarde o artigo do cientista político Wanderley Guilherme dos Santos, intitulado "A grande dúvida constitucional de que o Supremo fugirá".

    Neste artigo, o Cientista Político Wanderley Guilherme dos Santos alerta para o fato de que aqueles que defendem o impeachment sem dispor de argumentos, buscam desesperadamente forjar evidências de que a Presidenta teria cometido crime de responsabilidade, pois, sem isso, não há justa causa para o impedimento.

    Diz o Articulista Wanderley Guilherme dos Santos:

Dirão todos [os Ministros do Supremo], ou a maioria esmagadora deles, que o rito foi respeitado e não lhes cabe apreciar o mérito da decisão congressual. O dedo do demônio golpista está precisamente neste detalhe. Pode ser difícil encontrar fissura nos trâmites adotados pelo Presidente da Câmara dos Deputados. E não tenho segurança para julgar se é ilegal um réu de processo no Supremo presidir a votação de um pedido de impedimento da Presidenta da República, sendo, ademais de réu ele próprio, declarado inimigo político dela.

    Prossegue o cientista Wanderley Guilherme dos Santos:

Mas a lisura do rito tem sido reivindicada, até com obsequiosa cautela, não obstante os espasmos alucinados que a TV registrou.

O atentado ao contrato social básico é outro, de cujo exame o Supremo fugirá corno lebre. Cabe a qualquer maioria interpretar como lhe convier a forma de aplicar preceitos constitucionais? O rito pode criar o objeto a que se aplica? Se dois terços da Câmara dos Deputados decidirem que as contas do atual presidente da Casa não são contas e que a Suíça não existe, vale a anistia com que pretendem presenteá-lo?

    Pergunta o cientista Wanderley Guilherme dos Santos.

Se valer, para que serve um Supremo Tribunal Federal? Qualquer decisão majoritária seria constitucional. Esta é a mácula do processo de impedimento da presidente Dilma Rousseff: o rito criou o crime a ser punido. Vale? Não devia, pois a verdade de juízos de existência não é matéria plebiscitária. É matéria jurídica, de lógica e da fé contratual que funda as sociedades. Mas os eminentes Ministros vão fingir que ela não existe.

(Interrupção do som.)

    A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Apoio Governo/PT - RN) - Srª Presidente, eu queria só pedir cinco minutos. (Pausa.)

A seriedade das instituições republicanas se dilui no despudor de um Legislativo que convive com a propaganda da tortura e na prolixidade capciosa dos tribunais de Justiça. A República se esfarela e o amanhã promete ser violento.

Wanderley Guilherme dos Santos.

    Mas, senhoras e senhores, eu quero aqui, Senadora Vanessa, dizer que não perdi a esperança, muito menos a confiança de que esta Casa, o Senado, vai saber agir com a sabedoria exigida para aqueles que compõem a Câmara Alta. Estou certa de que aqui saberemos barrar esse processo simplesmente porque reconhecemos que, apesar de respeitado o rito, não se pode condenar ninguém por um crime que não cometeu.

    E não se enganem aqueles e aquelas que estão dispostos a apear do poder, de qualquer forma, a Presidenta legitimamente eleita. Vamos aos fatos. Pesquisa do Ibope divulgada ontem mostrou dados significativos: apenas 8% dos entrevistados acreditam que o impeachment da Presidenta Dilma, com a posse do Vice Michel Temer, seria a melhor forma para superar a crise política. Ao mesmo tempo, 25% dos entrevistados avaliam que Dilma deveria ficar onde está, seja porque acham que ela fez uma boa gestão, seja porque topariam um novo pacto entre Governo e oposição.

(Soa a campainha.)

    A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Apoio Governo/PT - RN) - Isso demonstra, Srªs e Srs. Senadores, que não será fácil tirar do poder, rasgando a Constituição, violando a democracia, assassinando a soberania popular, desrespeitando o voto secreto, universal e legítimo de 54 milhões de eleitores e eleitoras que elegeram Dilma Rousseff, a Presidenta eleita, para que essa cadeira seja ocupada por alguém que não foi eleito para assumir os destinos do País na condição de Presidente.

    Mais ainda, essa cadeira vir a ser ocupada por alguém que, infelizmente, não se ateve à liturgia do seu cargo, enquanto Vice-Presidente, e passou a fazer o papel de conspirador, tendo como parceiros o réu Eduardo Cunha, Presidente da Câmara, e a oposição conservadora, derrotada, que até hoje não se conformou com o resultado das eleições e que desde outubro de 2014 trama exatamente esse golpe contra a democracia, buscando um atalho para chegar ao poder.

(Soa a campainha.)

    A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Apoio Governo/PT - RN) - Mas quero dizer, Srª Presidente, que a população continua reagindo, isso estamos vendo nas diversas manifestações que se sucederam por todo o País durante o final de semana prolongado. Por todo o País estão acontecendo manifestações espontâneas em defesa da democracia e do cumprimento do mandato da Presidenta Dilma, para o qual ela foi legitimamente eleita.

    O último fim de semana foi marcado por escrachos pacíficos, de iniciativa do Levante Popular da Juventude, à frente da casa do Deputado Bolsonaro e do Vice-Presidente Michel Temer; piquenique e ato na Avenida Paulista, com a presença de famílias; painel humano no gramado do Congresso Nacional para denunciar o golpe; enfim, manifestações de artistas mulheres que se negam a aceitar que lugar de mulher é apenas no lar. Isso para citar só algumas.

    Termino, Srª Presidente, dizendo que desde o início nós colocamos...

(Interrupção do som.)

    A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Apoio Governo/PT - RN) - ... quero só dizer que desde o início nós colocamos que não haveria golpe sem resistência e sem luta. O final de semana demonstrou mais uma vez que a juventude, as mulheres, os artistas, os trabalhadores, os setores médios, enfim, a maioria da sociedade brasileira continua se mobilizando.

    As frentes Brasil Popular e Povo sem Medo estão realizando vários encontros e uma grande manifestação contra o golpe está sendo preparada e convocada para 1º de maio, o Dia do Trabalhador.

    Portanto, Srª Presidente, terminamos falando não só da nossa confiança, mas da nossa esperança de que a soberania popular vai ser respeitada e esse golpe travestido de pedido de impeachment não passará no Senado. Vamos derrotar no Senado e vamos derrotar nas ruas.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 26/04/2016 - Página 12