Discurso durante a 60ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Defesa da rejeição do "impeachment" da senhora Dilma Rousseff, Presidente da República, em razão da inconstitucionalidade do processo, devido à ausência de crime de responsabilidade, e defesa da realização de novas eleições, com base na opinião popular.

Autor
Fátima Bezerra (PT - Partido dos Trabalhadores/RN)
Nome completo: Maria de Fátima Bezerra
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Defesa da rejeição do "impeachment" da senhora Dilma Rousseff, Presidente da República, em razão da inconstitucionalidade do processo, devido à ausência de crime de responsabilidade, e defesa da realização de novas eleições, com base na opinião popular.
Publicação
Publicação no DSF de 28/04/2016 - Página 17
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • DEFESA, REJEIÇÃO, IMPEACHMENT, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, MOTIVO, INCONSTITUCIONALIDADE, PROCESSO, AUSENCIA, CRIME DE RESPONSABILIDADE, ACUSAÇÃO, OPOSIÇÃO, TENTATIVA, GOLPE DE ESTADO, REALIZAÇÃO, ELEIÇÃO DIRETA, PRESIDENCIA DA REPUBLICA.

    A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Apoio Governo/PT - RN. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Senadora Gleisi, Senadores, Senadoras, ouvintes da Rádio Senado, telespectadores da TV Senado.

    Ocupo, mais uma vez, esta tribuna e cumpro esta tarefa com o senso de responsabilidade que deve pautar a conduta de uma Senadora da República, ainda mais num momento grave como este que estamos vivendo, em que nossas decisões terão impacto direto nos destinos do País e na vida das pessoas.

    Antes de mais nada, quero reafirmar o que temos reiteradamente repetido: o movimento político que ora está em execução é uma trama golpista travestida de impeachment. Não que o impedimento de um Presidente, por si só, seja um golpe. É claro que essa possibilidade está prevista na Constituição Federal para casos extremos, até porque vivemos num regime presidencialista, que se assenta na ideia da estabilidade, no respeito à soberania popular manifesta pelo voto, no cumprimento dos mandatos e, portanto, na possibilidade de alternância do poder. Isso faz parte da democracia.

    Srs. Senadores e Senadoras, o Estado brasileiro não foi organizado para vivenciar trocas de comando, a não ser em situações absolutamente excepcionais, como o cometimento por parte do gestor público do chamado, entre aspas, "crime de responsabilidade", e isso já está claro, já está absolutamente claro que a Presidenta Dilma não cometeu. Está claro não é só para nós, do PT, não, Senadora Regina. Está claro para os partidos do campo popular, para os partidos do campo progressista, está claro para todos aqueles e aquelas que têm compromisso com a defesa da democracia, como os movimentos sociais, a intelectualidade, a maioria dos juristas, a imprensa ao redor do mundo e diversas lideranças internacionais importantes.

    Portanto, cada debate sério que é feito aqui ou em qualquer lugar do Brasil contribui para aprofundar, para clarificar que estamos diante de um golpe parlamentar, na medida em que a Presidenta Dilma não cometeu crime de responsabilidade, aliás, golpe parlamentar semelhante ao que foi dado contra Jango na sessão do Congresso Nacional, realizada na madrugada do dia 2 de abril de 1964, quando o cargo de Presidente foi declarado vago, e João Goulart foi deposto.

    Sei que é incômodo falar em golpe para alguns aqui deste Parlamento, até mesmo - reconheço - pela história de vinculação às lutas democráticas no passado, mas não há outro nome para uma articulação que tenha, como objetivo, depor uma Presidenta, legitimamente eleita, que não conseguiu governar até agora, porque os derrotados, os perdedores resolveram desconsiderar o resultado legítimo do pleito de 2014 e adotaram uma postura de boicote sistemático ao Governo para inviabilizá-lo - a chamada oposição, que apostou no quanto pior, melhor: pior para o Brasil e melhor para eles, do ponto de vista da obsessão que têm do poder pelo poder.

    Portanto, ao que estamos assistindo agora é a tentativa da consumação de um golpe que vem sendo executado desde o dia seguinte à eleição, quando a oposição resolveu se comportar como se tivesse ganhado o pleito. Conseguiram, com esse comportamento irresponsável, agravar uma crise econômica, que já é bastante séria, até porque temos que levar em consideração os fatores do ponto de vista da conjuntura internacional que tiveram e têm reflexo aqui na conjuntura nacional.

    Refiro-me à crise da economia, à crise do capitalismo, que começou desde 2008. Os reflexos dessa crise do capitalismo em âmbito mundial, todos sabemos, só vieram a ser estabelecidos fortemente aqui no Brasil, do ponto de vista de impactar negativamente a nossa economia, do ano passado para cá.

    Como o argumento de que a Presidenta Dilma teria cometido o crime de responsabilidade, com base nas chamadas pedaladas fiscais e empréstimos junto ao Banco do Brasil, revelou-se uma fraude, uma farsa, um embuste, agora se mudam as justificativas para o golpe. Agora, falam, entre aspas, em "governabilidade", em "crise econômica" e na palavra da moda: o tal "conjunto da obra".

    Nada disso, senhores e senhoras, tem sustentação. Se o critério para manter ou não um governante no posto para o qual foi eleito for de popularidade, paciência. Dezenas de prefeitos e prefeitas em todo o País, assim como governadores, teriam que ser afastados imediatamente, inclusive os de partidos que estão tramando o golpe.

    Se a regra, por exemplo, fosse essa, o ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso deveria ter sofrido impeachment em 2001 ou 2002, dada a enorme rejeição que o governo FHC enfrentava naquele momento. Aliás, essa rejeição ficou confirmada com o resultado da eleição de 2002, que levou o Presidente Lula à vitória.

    Portanto, Senadora Gleisi, nessa conjuntura, podíamos citar aqui, como exemplo, o Governador Beto Richa, que enfrenta enormes dificuldades e outros governadores.

    Quero, inclusive, acrescentar que entendo que não podemos descartar a possibilidade de, em eventuais movimentações políticas dos que fazem oposição, ou em protestos contra governantes, alguém defender a saída de um governante. Isso é legítimo; faz parte da disputa política, faz parte do jogo de pressão, faz parte da democracia. Agora, falo aqui da gravidade de um Parlamento ir às vias de fato para proceder a um processo de impedimento com base nestes argumentos: crise de impopularidade, dificuldade, rejeição, etc.

    Gostaria de lembrar que, muitas vezes, situações eventuais de crises nas gestões são superadas, e os governantes realizam mandatos vitoriosos. Dou aqui o exemplo do próprio Presidente Lula, que o Brasil inteiro acompanhou. Ele passou por enormes dificuldades, inclusive perda de popularidade em 2003 e 2004, quando teve que tomar medidas muito duras, um ajuste fiscal duro para debelar a gravíssima situação da crise herdada do governo anterior, o governo FHC.

    O que aconteceu? Lula recuperou. Nos anos seguintes, a recuperação foi tão forte, foi tão significativa que ele se reelegeu com razoável tranquilidade em 2006, terminando o seu segundo mandato com 82% de aprovação e sendo até hoje considerado o melhor Presidente da nossa História.

    Outra falácia usada também é que o afastamento da Presidenta Dilma ajudaria a resolver a crise. E aqui quero colocar o seguinte: se uma Presidente eleita de forma legítima como o foi,...

(Soa a campainha.)

    A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Apoio Governo/PT - RN) - ... por mais de 54 milhões de brasileiros, está enfrentando dificuldades para superar essa crise, imagine - meu Deus! - um governo fruto de um golpe, que já nasce sob o signo da rejeição da maioria da população! É importante lembrar que, mesmo com a atual exposição midiática, o Vice-Presidente Michel Temer aparece, nas sondagens de opinião, com, no máximo, 3%.

    Então, sejamos razoáveis. Na verdade, o consórcio Temer e Cunha é um consórcio duro de engolir. Jogar o futuro do Brasil nesse arranjo, no nosso ponto de vista, é ultrapassar todos os limites. Além de todas essas fragilidades, Srª Presidente, esses dois - tanto o Vice-Presidente quanto o Eduardo Cunha, Presidente da Câmara - gozam do agravante...

(Soa a campainha.)

    A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Apoio Governo/PT - RN) - ... de serem acusados, em casos de corrupção; um, citado em delações, e o outro já réu em processos no Supremo Tribunal Federal.

    Para completar esse espetáculo de horrores, estão apresentando um programa com o nome pomposo de Uma Ponte para o Futuro, mas que é uma tosca e mal redigida reedição da velha proposta que o povo brasileiro vivenciou, de forma trágica, no período do ex-Presidente Fernando Henrique, e que foi derrotada, em 2002, com a eleição de Lula. Esse projeto, com esse nome pomposo de Uma Ponte para o Futuro, é o mesmo projeto dos anos 90, vendido agora com uma nova embalagem.

    Portanto, Srª Presidente, eu quero concluir, falando aqui da nossa confiança de que a população brasileira é sábia e, mesmo debaixo desse bombardeio midiático, de caráter fascista, deixa cada vez mais claro, em todas as pesquisas, que está insatisfeita, sim, com os efeitos da crise e que anseia por mudanças. Mas, para desgosto e desalento dos golpistas, não deixa dúvidas quanto à sua opinião de que o impeachment não resolve a crise.

    E é bom lembrar aqui: em pesquisa recente, feita pelo Ibope, 8% apenas consideram um governo Michel Temer como um governo que poderia responder à situação do Brasil neste exato momento. Vinte e cinco por cento aprovam a Presidenta Dilma, e mais de 60% desejam exatamente novas eleições.

    Por isso, Srª Presidente, a clareza e a firmeza do povo dão a exata medida do indicativo de legitimidade de um governo...

(Soa a campainha.)

    A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Apoio Governo/PT - RN) - ... resultante de um golpe. Que ninguém ouse duvidar da capacidade do povo de pensar! Muitas vezes ele pode até não reunir elementos científicos ou meios analíticos mais profundos para formar uma opinião, mas o que já viu e ouviu até agora é suficiente para desconfiar do que estão armando e, portanto, rejeitar o embuste que querem enfiar goela abaixo.

    Termino, Senadora Gleisi, dizendo que o povo tem razão em não colocar fé nessa armação, nessa farsa. Ele sabe que essa conversa bonita e esse jogo representam um retrocesso para o nosso País, representam a volta para uma etapa da nossa História que foi superada. A população sente cheiro de retrocesso e de perda de direitos e não está disposta a pagar esse preço. Jogar o ônus...

(Soa a campainha.)

    A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Apoio Governo/PT - RN) - ... de uma suposta solução para a crise nas costas do povo trabalhador não dá. Volto a dizer, Senadora: a população não está disposta a pagar esse preço, que seria jogar o ônus de uma suposta solução para a crise nas costas do povo trabalhador. Isso não é permitido, não é razoável, não é aceitável, de maneira nenhuma.

    Portanto, de novo "não". Golpe, não. Democracia, sim.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/04/2016 - Página 17