Discurso durante a 44ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Preocupação com as possíveis consequências negativas para o país em caso de aprovação do “impeachment” da Presidente Dilma Rousseff, e crítica à falta de legitimidade de Eduardo Cunha para condução do referido processo na Câmara dos Deputados.

Autor
Jorge Viana (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Jorge Ney Viana Macedo Neves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Preocupação com as possíveis consequências negativas para o país em caso de aprovação do “impeachment” da Presidente Dilma Rousseff, e crítica à falta de legitimidade de Eduardo Cunha para condução do referido processo na Câmara dos Deputados.
Aparteantes
Fátima Bezerra.
Publicação
Publicação no DSF de 06/04/2016 - Página 12
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • COMENTARIO, ANDAMENTO, PROCESSO, IMPEACHMENT, DILMA ROUSSEFF, APREENSÃO, EFEITO, DECISÃO, CONGRESSO NACIONAL, FUTURO, PAIS, CRITICA, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DO MOVIMENTO DEMOCRATICO BRASILEIRO (PMDB), ROMPIMENTO, GOVERNO FEDERAL, REPUDIO, AUSENCIA, LEGITIMIDADE, EDUARDO CUNHA, DIREÇÃO, PROCEDIMENTO, IMPEDIMENTO, MOTIVO, DENUNCIA, OPERAÇÃO, POLICIA FEDERAL, INVESTIGAÇÃO, CORRUPÇÃO, PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS).

    O SR. JORGE VIANA (Bloco Apoio Governo/PT - AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidenta, caros colegas Senadores e Senadoras, queria cumprimentar todos.

    Estou de volta às atividades do Senado. Na semana passada, participei de um seminário organizado por várias instituições, entre elas o IDP, a Faculdade de Direito de Lisboa, e várias organizações.

    Lá, participei de um debate em que tivemos a mediação do Ministro Gilmar Mendes; de um lado, o Senador Aécio Neves e, de outro, eu, no qual eu pude, tranquilamente, apresentar não só a minha versão, a minha visão, mas a de muitos brasileiros que neste momento entendem e traduzem essa ação política que tem início na Câmara. Eu me refiro à proposta de impeachment da Presidenta Dilma, que, mesmo estando garantido na Constituição, da maneira como está sendo feito, liderado pelo Presidente da Câmara, Eduardo Cunha, sem ter uma base de crime de responsabilidade tipificado, não tem outra palavra que não seja a de que se está orquestrando um golpe, visando a tirar, a qualquer preço, a qualquer custo, a Presidenta Dilma do Governo.

    Lá, fiz essa fala; lá, eu me referi, como vou me referir aqui, ao que nós estamos vivendo no País nesse momento. Ficou mais evidente ainda que não é um processo normal o tal do desembarque do PMDB do Governo. Alguns chegam a ponto de dizer: “Poxa, o PMDB era o Partido que tinha a maior participação no Governo: Vice-Presidente, sete ministérios, centenas de cargos." E, por uma decisão extemporânea, pouco inteligente, pego-me aqui nas palavras de um peemedebista, meu colega, Presidente do Senado, Renan Calheiros, que tem sido, sim, não a voz de um lado ou de outro, mas tem sido sempre o Presidente do Senado, o Presidente do Congresso, um Líder importante do PMDB, procurando ajudar na solução política que o Brasil enfrenta.

    Acho que as palavras do Presidente Renan e as de muitos peemedebistas precisam ter eco na sociedade. E foi muito precipitado: em três minutos, nós tivemos uma decisão, Senadora Fátima, perigosa para o Brasil.

    Lá, no seminário, eu repeti uma frase que os brasileiros falam em todo canto: "Nada é tão ruim que não possa piorar." Estamos diante de uma crise política. É verdade. Estamos diante de dificuldades econômicas - eu estou usando as palavras "dificuldades econômicas" e vou explicar daqui a pouco o porquê. É verdade. Mas, se está ruim, pode ficar péssimo; se está ruim, pode piorar.

    Explico. Ouvi, num seminário em Lisboa, grandes juristas: Heleno Torres, Prof. da USP, que poderia muito bem estar no Supremo, porque foi indicado, chegou a ser sugerido; ouvi juristas de Portugal. O seminário foi muito interessante. Quero cumprimentar os organizadores. Houve mudança no perfil, pelo menos na parte de algumas exposições, tendo em vista o momento em que o Brasil está vivendo. Foi o caso do meu debate com o colega Aécio Neves. Ele falou o que quis, e eu pude também, obviamente, falar o que quis.

    Quero cumprimentar os democratas portugueses, que estavam lá. Fizeram manifestações antes do seminário, bem antes; durante a realização do seminário, após o seminário, na Praça Luís de Camões. Democratas que estão indo às ruas de lá e em outras cidades do mundo não em defesa do Governo da Presidenta Dilma, não em defesa do PT, mas em defesa da democracia no Brasil, em defesa da normalidade democrática constitucional do Brasil.

    Eu ouvi alguns juristas e quero aqui me referir especificamente ao Prof. Pedro Romano Martinez. Quero me referir também a um professor respeitadíssimo por todos nós, brasileiros, o Prof. Manoel Gonçalves Filho, uma pessoa que viveu todos os períodos de contratempo que o Brasil viveu. Ele falava, na sua exposição, que a divisão dos três Poderes - Executivo, Judiciário e Legislativo - não é para garantir governabilidade de governo nenhum. É para garantir que um Poder não assuma um superpoder em detrimento dos demais.

    Vejam que esse esquema que o Sr. Eduardo Cunha montou foi uma revanche, como disse muito bem o Ministro José Eduardo Cardozo, ontem, apresentando a defesa da Presidenta Dilma. Ele não aceitava os pedidos de impeachment, até que, diante das provas do Ministério Público, diante da apresentação da denúncia contra ele, ele disse: "Bem, já que agora o PT não vota comigo, vou aceitar, acolher o pedido de impeachment." Foi esse o enredo, é esse o enunciado, é essa a narrativa desse golpe, capitaneado por Eduardo Cunha. Mas, quando o PMDB desembarca do Governo, abandona o Governo de que eles faziam parte, ficou evidente que temos um alto risco.

    Com grande respeito aos grandes Líderes do PMDB, eu queria chamar a atenção do Brasil, dos meus colegas Senadores e Senadoras para o seguinte: quer dizer que a solução para a crise que estamos vivendo de dificuldades econômicas e a crise política em que os partidos estão na sua maioria desmoralizados, em que a lista dos políticos que estão nos tribunais passa de 300, é pôr o PMDB, sem nenhum voto, na Presidência da República, com o Presidente Michel Temer assumindo sem voto, tendo como Vice Eduardo Cunha e como Presidente da Câmara o Eduardo Cunha e na Presidência do Senado e do Congresso o Presidente Renan Calheiros?

    Faço aqui uma ressalva. O Presidente Renan Calheiros fez duras críticas a Michel Temer. Ele tem procurado ser uma voz equilibrada, independente até, na condução dos trabalhos do Senado e do Congresso. Sou testemunha disso. 

    Não podemos! Será que é isto que os que propõem o impeachment querem? O PMDB governando o Palácio do Planalto com Michel Temer, tendo como Vice Eduardo Cunha, presidindo a Câmara e o Senado? Essa é a solução para o Brasil?

    Se está ruim, pode piorar. Existe o ruim e o perverso. Essa é a saída perversa, porque, aí, sim, vamos viver uma crise institucional.

    A Constituição é muito clara. É óbvio que, às vezes, ouço um discurso fácil: "Há o rito do Supremo." É claro que existe o rito do Supremo! "Está escrito na Constituição o impeachment." Claro que está escrito! Estão aqui os arts. 85 e 86. Sabem o que está escrito no art. 85? Leio aqui a Constituição: "São crimes de responsabilidade - porque, aí, sim, podem dar justificativas ao impeachment - os atos do Presidente da República que atentem contra a Constituição Federal."

    Vou ler aqui o que é atentar, no dicionário Aurélio. Significado de atentar: "cometer um atentado contra algo ou alguém; desrespeitar, atacar, ofender, afrontar, ultrajar ou insultar". Essa é a base. Onde é que se sustenta o atentado da Presidenta Dilma contra a Constituição? Duvido que outro partido no poder tivesse colocado oito Ministros do Supremo como os nossos governos fizeram, Ministros que chegaram lá e estão comprovando sua independência. Duvido que outros não dariam um jeito. Duvido que um Ministro da Justiça de alguns partidos fizesse o que o Ministro...

(Interrupção do som.)

    O SR. JORGE VIANA (Bloco Apoio Governo/PT - AC) - ... José Eduardo Cardozo fez, que, aliás, é criticado... (Fora do microfone.)... por ter sido republicano.

    Eu queria aqui dizer que o risco não é só de termos um impeachment sem crime de responsabilidade tipificado. Faço um apelo: não venham dizer que é a voz das ruas. O PMDB incorreu em um erro, foi ouvir a voz dos militantes do PMDB, levados a uma posição por conta de um segmento poderoso da imprensa absolutamente parcial, que afronta a Constituição todos os dias, como têm feito os grandes grupos econômicos, todos os dias, com agressões, com mentiras e tentando levar o Brasil para o abismo. É isso que têm feito.

    Aliás, digo com tranquilidade aqui: lamentavelmente, a biografia de grandes jornalistas está sendo manchada por conta desses episódios. É uma pena, lamento. Mas também vejo todos os dias grandes jornalistas fazendo belos textos, grandes reportagens colocando a verdade, colocando que, independentemente das críticas ao Governo do PT, ou até mesmo ao PT, ou à Presidenta Dilma, estão fazendo a defesa da democracia. É isso que estão fazendo os artistas, os intelectuais, alguns membros nobres da OAB, diferente do que tomou a decisão, que é uma parte, com certeza, vergonhosa da história da OAB, como foi na época de 1964, quando apoiaram. Isso não significa que os advogados fazem coro com isso; mas essas panelinhas montadas em muitos Estados, que garantem o voto depois, à revelia de um Lavenère, que esteve lá assinando o impeachment do Collor e fez a diferença do impeachment do Collor para essa proposta absurda de impeachment da Presidenta Dilma.

    Eu queria aqui cumprimentar o Ministro José Eduardo Cardozo, que fez a defesa da Presidenta Dilma com serenidade, com firmeza, e depois da defesa apresentada, que os membros daquela Comissão possam refletir. Não temos que ficar aqui também com soberba, acusando quem se posiciona para um lado ou para o outro, mas fazendo um apelo pelo País, pela democracia. Não custa nada.

    Daqui a seis meses temos eleições. Esperem. Ganhem as eleições, mudem os governos pelo voto, como estabelece a Constituição. Daqui a dois anos e meio, vamos ter uma eleição geral, para o Senado, para a Câmara e para a Presidência da República. Vençam no voto.

(Soa a campainha.)

    A Srª Fátima Bezerra (Bloco Apoio Governo/PT - RN) - Senador Jorge.

    O SR. JORGE VIANA (Bloco Apoio Governo/PT - AC) - Eu ouço V. Exª, para poder concluir.

    A Srª Fátima Bezerra (Bloco Apoio Governo/PT - RN) - Mais uma vez, quero parabenizá-lo pela reflexão, sempre com muita lucidez, com muita responsabilidade, que V. Exª tem feito nesta Casa. Segundo, quero me associar a V. Exª nos cumprimentos que fez ao Advogado-Geral da União, José Eduardo Cardozo, pela brilhante defesa que fez ontem, encaminhando, portanto, contra o pedido de impeachment da Presidenta Dilma. Brilhante defesa! Na verdade, José Eduardo, advogado respeitado que é em todo o País, foi brilhante porque a verdade estava com ele. Ontem ele deu uma bela aula de Direito Constitucional. Terceiro, Senador, também quero me somar a V. Exª, porque o que a gente quer é o respeito às regras do jogo. Portanto, o respeito à ordem constitucional. Na verdade, senador Jorge Viana, o que está acontecendo é que, na medida em que cresce exatamente a manifestação popular, na medida em que cresce a resistência contra o golpe e, portanto, o pedido de impeachment contra a Presidenta Dilma se enfraquece, o que é que a gente está agora assistindo? Outras manobras, do seguinte tipo: vamos fazer eleições diretas agora para Presidente, daqui a dois, três meses. Sinceramente, é lamentável tudo isso, porque, como V. Exª coloca, vamos respeitar as regras do jogo. Ou seja, esperamos que haja bom senso e, à medida em que evolui a tese, como está evoluindo, de que o impeachment não se concretizará, porque de fato não há amparo constitucional, pelo amor de Deus, não inventem outra desculpa, violando a própria Constituição, quando as regras do jogo estabelecem, como V. Exª acaba de mencionar, calendário eleitoral em 2016, calendário eleitoral, portanto, em 2018.

    O SR. JORGE VIANA (Bloco Apoio Governo/PT - AC) - Muito obrigado. Eu queria só dizer que o Ministro José Eduardo Cardozo, defendendo a Presidente ontem, falou...

(Interrupção do som.)

    O SR. JORGE VIANA (Bloco Apoio Governo/PT - AC) - ...em vez de rasgarem a Constituição, em vez de aplicarem um Golpe de Estado sim, porque há uma ação dirigida do Presidente Eduardo Cunha, condenado, réu confesso no Supremo Tribunal Federal. Que legitimidade, que País nós teríamos com um impeachment conduzido pari passu pelo Sr. Eduardo Cunha? Ele agora começou a negar, a não receber os pedidos de impeachment contra o Vice-Presidente Michel Temer, que assinou decretos, deixou claro... O Governador de São Paulo, na defesa ontem, disse que foram mais de trinta decretos iguaizinhos aos da Presidente Dilma, mas são do PSDB. Aí pode. Todos os governos fizeram as pedaladas. Eu não vou entrar nesse mérito. O que eu queria deixar aqui claro é que as coisas estão se agravando. Hoje, o Ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo, determinou ao Presidente da Câmara que aceite o impeachment contra o Michel Temer.

(Soa a campainha.)

    O SR. JORGE VIANA (Bloco Apoio Governo/PT - AC) - Olhe a situação para a qual estamos indo, Líder Humberto Costa! Olhe a situação absurda para a qual estamos indo! Alguém pode me perguntar: "mas o PT é a favor do impeachment do Temer, já que os argumentos são os mesmos, ele foi eleito pela mesma chapa?" Eu não sei a posição do meu Partido, mas sei que sou contra. Sou contra o impeachment do Temer, como sou contra impeachment da Presidente Dilma sem crime de responsabilidade. Volto a repetir que está na Constituição o impeachment, pode ter impeachment, tem rito estabelecido pelo Supremo, mas, do jeito que estão fazendo, é golpe. Então, eu faria aqui um apelo. A maioria deles diz: " mas de qualquer jeito vai ser ruim. Se tiver impeachment vai ser ruim, se não tiver vai ser ruim." Se não tiver impeachment, se a Constituição for respeitada, se as oposições, inquietas, intolerantes, atenderem ao calendário eleitoral e disputarem nas urnas o poder no Brasil daqui a seis meses e depois, em 2018, se for esse caminho, não tenho nenhuma...

(Interrupção do som.)

    O SR. JORGE VIANA (Bloco Apoio Governo/PT - AC) - ... o presidente Lula, a Presidente Dilma, passando a votação do impeachment, fará um novo Governo, um Governo que possa unir o Brasil, um Governo que possa corrigir os erros, um Governo que possa a seguir dando todo apoio ao combate à corrupção, mas um Governo que faça com que este País volte a crescer, a preservar e ter garantia de preservar as suas políticas sociais.

    Então, não vale dizer que tanto fazer haver impeachment ou não haver impeachment, pois seria a mesma coisa. Não! Se houver impeachment sem crime de responsabilidade, este País vai para ilegalidade. Vamos ter um Governo ilegítimo. Eu não aceito ter um Presidente sem voto e o Vice-Presidente Eduardo Cunha. Quem vai aceitar? Rasgariam a Constituição.

    Agora, se nós não tivermos o impeachment, se a Constituição for respeitada, o que nós vamos ter? A possibilidade da saída democrática. O Governo vai ter que prestar contas à sociedade...

(Soa a campainha.)

    O SR. JORGE VIANA (Bloco Apoio Governo/PT - AC) - Vai ter que pacificar o País, vai ter que estabelecer novo diálogo, inclusive com setores da oposição, para que o Brasil volte a encontrar um caminho de crescimento, de prosperidade social.

    É isso que eu queria deixar aqui hoje, fazendo um apelo sincero aos peemedebistas que estão naquela comissão, aos membros de todos os partidos que reflitam. O Brasil está precisando de cada um de nós naquilo que nós temos de melhor e não de pior. O Eduardo Cunha está oferecendo o que tem de pior, de mais rancoroso para o Brasil. Em troca, nada contra o Eduardo Cunha, vamos oferecer o que temos de melhor.

    Que os democratas possam votar naquela comissão atendendo a Constituição e por Justiça. E que os Plenários da Câmara e do Senado possam pacificar o País com a saída democrática para a crise.

    Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/04/2016 - Página 12