Discurso durante a 73ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Críticas à declaração do Ministro da Justiça, Sr. Alexandre de Moraes, acerca da possível alteração do processo de escolha do Procurador-Geral da República.

Defesa de Proposta de Emenda à Constituição de autoria de S. Exª que põe fim ao foro privilegiado.

Autor
Alvaro Dias (PV - Partido Verde/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
MINISTERIO PUBLICO:
  • Críticas à declaração do Ministro da Justiça, Sr. Alexandre de Moraes, acerca da possível alteração do processo de escolha do Procurador-Geral da República.
CONSTITUIÇÃO:
  • Defesa de Proposta de Emenda à Constituição de autoria de S. Exª que põe fim ao foro privilegiado.
Aparteantes
Garibaldi Alves Filho, Jorge Viana, Reguffe.
Publicação
Publicação no DSF de 17/05/2016 - Página 32
Assuntos
Outros > MINISTERIO PUBLICO
Outros > CONSTITUIÇÃO
Indexação
  • DESAPROVAÇÃO, ALEGAÇÕES, AUTORIA, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA JUSTIÇA (MJ), ASSUNTO, PROCESSO, ESCOLHA, PROCURADOR GERAL DA REPUBLICA, DEFESA, NECESSIDADE, RATIFICAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, DECISÃO, VOTAÇÃO, LOCAL, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL, RECONHECIMENTO, AUTONOMIA, INDEPENDENCIA, ENFASE, CONSOLIDAÇÃO, INSTITUIÇÃO DEMOCRATICA.
  • SOLICITAÇÃO, APOIO, SENADOR, APROVAÇÃO, PROPOSTA DE EMENDA A CONSTITUIÇÃO (PEC), AUTORIA, ORADOR, ASSUNTO, EXTINÇÃO, FORO ESPECIAL, PRERROGATIVA, FUNÇÃO, DEFESA, NECESSIDADE, IGUALDADE, TRATAMENTO, JUSTIÇA COMUM, DESTINATARIO, AUTORIDADE, DEPUTADO FEDERAL, REFERENCIA, ANTERIORIDADE, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, CONSTITUIÇÃO IMPERIAL, PROIBIÇÃO, INSTITUTO.

    O SR. ALVARO DIAS (Bloco Oposição/PV - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, certamente, quando multidões foram às ruas, não o fizeram tão somente para pedir a substituição de uma Presidente pelo Vice-Presidente. Seguramente, as multidões exigem muito mais do que isso: mudança; mudança desse sistema de governança, que é promíscuo; mudança da cultura política vigente no País historicamente; mudança nas instituições.

    Algumas das nossas instituições mais importantes, onde estão fincados alicerces essenciais do Estado democrático de direito, fizeram a leitura correta e já apresentaram mudanças. Uma delas é o Ministério Público Federal, que tem exercitado a função com absoluta independência, com autonomia completa e com competência ímpar. Por essa razão, é uma instituição que deve ser preservada, defendida e valorizada.

    Na Folha de S.Paulo desta segunda-feira, o Ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, afirma que o Governo poderá alterar o processo de escolha do Procurador-Geral da República. Não considero feliz essa iniciativa, e, felizmente, Senador Jorge Viana, o próprio Presidente Michel Temer apressou-se em desautorizar o Ministro da Justiça. Faça-se a ele, portanto, justiça. Seria um retrocesso. Nos últimos anos, o Procurador-Geral da República tem sido o mais votado pelos seus parceiros do Ministério Público, e é assim que deve ser. Por que razão convocar eleições para a escolha do Procurador se depois o Presidente da República desconsidera o resultado da eleição?

    Portanto, a valorização do Ministério Público, com a consagração de sua independência e de sua autonomia, é essencial nestes novos tempos como exigência da sociedade brasileira de mudança real. Nós aspiramos a uma nova Justiça, e ela dá sinais de que se está instalando no País. É preciso que, deste lado, o lado da política, a leitura correta seja também feita, para que a consolidação dessa expectativa nacional de uma nova Justiça se torne realidade e para que essa nova Justiça seja efetivada.

    Concedo-lhe, Senador Jorge Viana, com satisfação, o aparte que solicita.

    O Sr. Jorge Viana (Bloco Apoio Governo/PT - AC) - Para o conforto também do meu colega e querido Senador Garibaldi, mostramos isso. Acho que estamos juntos nisso. Também cumprimento o Presidente Michel Temer, porque temos de fazer isso permanentemente.

    O Sr. Garibaldi Alves Filho (PMDB - RN) - Estamos juntos!

    O Sr. Jorge Viana (Bloco Apoio Governo/PT - AC) - Ele, imediatamente, desautorizou o Ministro da Justiça a pôr sobre dúvida o encaminhamento que, modéstia parte, desde o Presidente Lula, temos adotado no nosso País: os membros do Ministério Público fazem a lista tríplice, e nossos governos escolhem o primeiro colocado. Então, está aí um gesto que acho... Quando houver medidas, imediatamente... Se, amanhã, independentemente de dele seguir discordando, o Presidente Michel Temer, interino, como ele mesmo diz, demitir cinco ou seis Ministros e colocar mulheres que representam a força viva da nossa sociedade - não é do mundo das mulheres, não, mas mulheres e homens, homens e mulheres da nossa sociedade -, certamente, também vou elogiar. Eu queria cumprimentar V. Exª, Senador Alvaro, pela coerência de aqui fazer o que sempre fez. Este País precisa defender que instituições como o Ministério Público atuem com absoluta independência, com o comando do Dr. Rodrigo Janot, gostando ou não das medidas que ele adota. A mesma coisa se deve dar em relação à Polícia Federal e ao Judiciário como um todo. Então, essa salvaguarda precisamos ter no nosso País. Eu só queria me associar a V. Exª nesse aspecto, fazendo, inclusive, o registro de que foi oportuno e importante o Presidente Michel Temer, imediatamente após a entrevista do Ministro da Justiça, fazer a correção e nos trazer de volta a segurança daquilo que conquistamos na sociedade brasileira: quando se trata de lista tríplice do Ministério Público Federal, o primeiro da lista é escolhido.

    O SR. ALVARO DIAS (Bloco Oposição/PV - PR) - Muito obrigado, Senador Jorge Viana.

    O Sr. Garibaldi Alves Filho (PMDB - RN) - Senador Alvaro Dias...

    O SR. ALVARO DIAS (Bloco Oposição/PV - PR) - Pois não, Senador Garibaldi.

    O Sr. Garibaldi Alves Filho (PMDB - RN) - Senador, também não quero deixar de participar do discurso de V. Exª neste momento. V. Exª está fazendo uma colocação muito acertada. V. Exª tem inteira razão. O Senador Jorge Viana apenas estava tão apressado em seu discurso, no julgamento do discurso, que não deixou nem eu me congratular com ele pelo fato de ele chamar a atenção para isso. Realmente, o Presidente da República fez questão de corrigir isso imediatamente, de desautorizar o Ministro da Justiça, o que achei correto.

    O SR. ALVARO DIAS (Bloco Oposição/PV - PR) - Muito obrigado, Senador Garibaldi.

    O Presidente Michel Temer terá da minha parte esta colaboração, a colaboração da crítica leal ao País. Evidentemente nos seus acertos, terá o apoio. Terá o apoio intransigente ao acerto e a implacável condenação do erro. A cultura política do nosso País é do adesismo fácil. As pessoas, os partidos políticos correm apressadamente para o poder quando podem, gostam da sombra do poder. E creio ser mais importante, num momento como este, uma postura de independência altiva, de quem se dispõe a fiscalizar os atos do Governo para apontar seus erros, para sinalizar novos caminhos, se eventualmente desvios estiverem ocorrendo. É uma contribuição que atende o interesse nacional muito mais do que, muitas vezes, a ocupação de um cargo Executivo com o conforto de quem está exercendo uma atividade pública através da nomeação.

    Portanto, o nosso propósito, hoje, é ressaltar a importância da consolidação dessas instituições fundamentais para o presente e o futuro do País.

    Nesse cenário de indignação, de revolta popular, de descrença que se generalizou, há uma esperança latente que nos é concedida exatamente por essas instituições.

    E a desvalorização do Ministério Público através de um retrocesso como esse anunciado, talvez num momento de infelicidade, pelo Ministro da Justiça, certamente não contribuiria para alimentarmos as esperanças do nosso povo de que é possível, sim, plantarmos uma nova Justiça capaz de oferecer um futuro de dignidade ao povo brasileiro.

    E eu ressalto - até para que eu fique com crédito no momento da crítica - a pronta intervenção do Presidente Michel Temer, desautorizando essa iniciativa, que seria danosa aos interesses da independência, da autonomia e da eficiência, hoje, tão proclamada, do nosso Ministério Público.

    Sr. Presidente, aproveito também para destacar a importância de uma proposta de emenda à Constituição que apresentei já em 2013 e que hoje se encontra na Comissão de Constituição e Justiça, entregue ao Relator, Senador Roberto Rocha, que diz respeito ao fim do foro privilegiado. Se nós estamos falando no surgimento de uma nova Justiça, que é marco de novo rumo para o País, precisamos consolidar o conceito de que esta Justiça que se renova agora é a Justiça igual para todos. Aquele conceito antigo da Justiça só para os pobres está sendo destruído pela ação de investigadores e julgadores, tendo à frente a Operação Lava Jato. E, para que a Justiça seja realmente igual para todos, não há razão da prevalência do foro privilegiado, o chamado foro de prerrogativa.

    Nós sabemos que a população brasileira, certamente, não compreende por que há de se conferir a uma autoridade, a um Parlamentar, a um Ministro de Estado, ao Presidente da República o privilégio de ser julgado tão somente pelo Supremo Tribunal Federal. Por que essa distinção? Por que esse privilégio? Não vemos razão que justifique esse privilégio. Aliás, o mundo não vê razão.

    Eu fui buscar mesmo nas nossas Constituições, Senador Reguffe. Analisando o histórico das Constituições brasileiras, verifica-se que consta a proibição de foro privilegiado nos textos originais das Constituições de 1824, 1891, 1934, 1946 e 1967. Na Constituição do Império, de 1824, estava lá: "À exceção das causas que, por sua natureza, pertencem a juízes particulares, na conformidade das leis, não haverá foro privilegiado, nem comissões especiais nas causas cíveis, ou crimes."

    A Constituição de 1891 diz também: “À exceção das causas que, por sua natureza, pertencem a juízos especiais, não haverá foro privilegiado.” A de 1934: "Não haverá foro privilegiado nem Tribunais de exceção; admitem-se, porém, juízos especiais em razão da natureza das causas." A Constituição de 1946, de novo no §26 do art. 141: "Não haverá foro privilegiado nem juízes e tribunais de exceção." A Constituição de 1967, art. 150, §15: "A lei assegurará aos acusados ampla defesa, com os recursos a ela inerentes. Não haverá foro privilegiado nem tribunais de exceção."

    Mas nós fomos buscar no mundo, meu caro Senador Elmano, fomos buscar no mundo. No mundo, no âmbito internacional, o foro privilegiado com prerrogativa parlamentar inexiste, a não ser em um dos países - encontrei apenas na Espanha. Nos demais, na França, não há previsão constitucional de foro especial para parlamentares; Na Alemanha, não existe previsão constitucional de foro especial para parlamentares; na Itália, a Constituição também não prevê prerrogativa de foro para os congressistas; em Portugal, não há previsão constitucional de foro especial para parlamentares; nos Estados Unidos da América e na Inglaterra, o instituto da prerrogativa de foro para parlamentares também não encontrou guarida constitucional.

    Repito, apenas na Espanha a Constituição prevê no art. 71 regra muito semelhante à da Constituição brasileira. Das situações acima identificadas, das situações que identificamos, alguns países mantêm a prerrogativa de foro para Presidente da República, para parlamentares, repito, apenas a Espanha e nós pesquisamos. A minha assessoria pesquisou, Senador Reguffe, e não encontrou essa prerrogativa, a não ser na Espanha.

    Eu concedo a V. Exª o aparte com satisfação.

    O Sr. Reguffe (S/Partido - DF) - Senador Alvaro, eu já fiz um pronunciamento aqui nesta Casa defendendo essa proposta de emenda à Constituição que acaba com o foro privilegiado no Brasil. Então, V. Exª conte com meu voto aqui, e, quando for levado à apreciação desta Casa, o meu voto será favorável a essa proposta de emenda à Constituição. Eu penso que todos os brasileiros devem ser iguais perante a lei e todos devem ter tratamento igual. Alguns falam assim: "Ah, mas isso vai deixar na mão de um juiz de primeira instância?". Bom, mas todos os brasileiros estão na mão de um juiz de primeira instância. Que desconfiança é essa com juízes de primeira instância? Então, quer dizer que, se o juiz de primeira instância resolver criar uma vingança, vai poder criar com uma pessoa comum também? Não, nós temos que acreditar nas instituições brasileiras, nós temos que acreditar no Poder Judiciário, temos que respeitar e acreditar porque, se não acreditamos nas instituições, fica difícil esse para este País. E nós, como legisladores, temos que tentar aprimorar, aperfeiçoar a legislação brasileira, para torná-la mais justa e mais em sintonia com os anseios daqueles que nós representamos aqui, que é a população brasileira. Então, V. Exª conte com o meu voto nessa PEC, sei que somos minoria, mas conte com o meu voto favoravelmente a essa proposta de emenda à Constituição.

    O SR. ALVARO DIAS (Bloco Oposição/PV - PR) - Muito obrigado, Senador Reguffe. Eu não poderia esperar outra posição de V. Exª a não ser esta, sempre ligada aos interesses populares.

    Nós fizemos uma pesquisa - aliás, não tenho pesquisa, mas nesse domingo gravei um pequeno vídeo sobre essa questão, e, de ontem para hoje, na minha página do Facebook, foram mais de 1,5 milhão de pessoas que acessaram esse vídeo caseiro gravado no celular. Isso demonstra o apoio popular a essa medida: mais de 1,5 milhão de pessoas, de ontem até hoje, manifestando-se sobre essa questão do foro privilegiado.

    Mas qual é o fundamento desta medida? Teoricamente se tem pretendido justificar o privilégio alegando que as funções exercidas por aqueles que gozam de foro privilegiado exigem tal prerrogativa. Mas por que exigem tal prerrogativa? Nos países desenvolvidos onde não existe esse instituto da prerrogativa do foro para os parlamentares, o funcionamento das instituições ocorre dentro da normalidade democrática.

    A prerrogativa de foro é um expediente que deixa claro que se busca evitar o procedimento legalmente previsto para qualquer cidadão. Sua adoção ou manutenção não justifica a ruptura com o princípio da igualdade. Trata-se de um remédio que, no Brasil, tem-se mostrado mais danoso que a pretensa enfermidade que se buscou tratar.

    Na edição do dia 26 de fevereiro de 2012, em matéria especial, o jornal Folha de S.Paulo assombrou o Brasil com estatísticas sobre a falta de andamento dos processos envolvendo políticos com foro privilegiado junto ao Supremo Tribunal Federal.

    Aliás, Sr. Presidente, o número de ações, de processos que são encaminhados ao Supremo Tribunal Federal excede a capacidade de atendimento dos quadros existentes no Supremo Tribunal Federal. É um número exagerado de processos, de ações; é um acúmulo insuportável de trabalho. O próprio Ministro Gilmar Mendes, há poucos dias, fez referência a esse fato. O Supremo Tribunal Federal não tem condições de, com celeridade, dar resposta a todas as questões que envolvem os processos encaminhados...

(Soa a campainha.)

    O SR. ALVARO DIAS (Bloco Oposição/PV - PR) - ... ao Supremo Tribunal Federal.

    Antes de concluir, Sr. Presidente - serei rápido -, eu me refiro a essa edição da Folha de S.Paulo, em que o jornal encontrou o processo que teve início fazia mais de 15 anos e ainda não havia sido julgado. Encontrou situação onde o Supremo Tribunal Federal demorou seis anos para decidir se determinado político deveria ser investigado. De 258 processos analisados envolvendo 166 políticos, apenas dois estavam prontos para julgamento.

    Na mesma matéria publicada pelo jornal Folha de S.Paulo, o Ministro Celso de Mello, em entrevista, defendeu o fim do foro privilegiado para todos os políticos e autoridades em matéria criminal.

    Para o Ministro, poder-se-ia até ponderar a subsistência de foro privilegiado para o Presidente da República, o Presidente da Câmara dos Deputados e o Presidente do Senado.

(Soa a campainha.)

    O SR. ALVARO DIAS (Bloco Oposição/PV - PR) - Todavia, ressalta que seu entendimento é de que todos deveriam responder por matéria criminal perante o juiz de primeiro grau.

    Efetivamente os Tribunais não dispõem de estruturas adequadas para o processamento e dedicação aos pormenores de um processo criminal. A conciliação de competências já se mostrou não ser viável, e o Parlamento deveria corrigir o equívoco do foro privilegiado e retornar à tradição das Constituições do Brasil, cuja regra histórica é a não existência do foro privilegiado.

    Concluo, Sr. Presidente, pedindo o apoio dos colegas da Casa para essa proposta que tramita na Comissão de Constituição e Justiça. Eu espero que possa ser pautada brevemente.

    Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/05/2016 - Página 32