Discussão durante a 71ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Defesa da rejeição da admissibilidade do impeachment da Presidente Dilma Rousseff, em razão da inexistência de crime de responsabilidade; comentário sobre a situação atual da economia nacional, e apreensão referente às propostas apresentadas pelo Vice-Presidente Michel Temer a fim de recuperar a economia.

Autor
Roberto Requião (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PR)
Nome completo: Roberto Requião de Mello e Silva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discussão
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Defesa da rejeição da admissibilidade do impeachment da Presidente Dilma Rousseff, em razão da inexistência de crime de responsabilidade; comentário sobre a situação atual da economia nacional, e apreensão referente às propostas apresentadas pelo Vice-Presidente Michel Temer a fim de recuperar a economia.
Publicação
Publicação no DSF de 12/05/2016 - Página 74
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • DEFESA, REJEIÇÃO, ADMISSIBILIDADE, IMPEACHMENT, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, MOTIVO, AUSENCIA, CRIME DE RESPONSABILIDADE, COMENTARIO, SITUAÇÃO, ECONOMIA NACIONAL, APREENSÃO, REFERENCIA, PROPOSTA, AUTORIA, MICHEL TEMER, VICE-PRESIDENTE DA REPUBLICA, OBJETIVO, RECUPERAÇÃO.

    O SR. ROBERTO REQUIÃO (PMDB - PR. Para discutir. Sem revisão do orador.) - Há minutos, Presidente, recebi pelo telefone celular um apelo que transmito a V. Exª e ao Plenário do Senado Federal; um apelo de mulheres que participavam e participaram de um encontro em Brasília, reclamando da agressividade despropositada da Polícia Militar de Brasília, na Esplanada dos Ministérios. Faço aqui o registro. Não é isso o que queremos e não é isso o que esperamos neste momento delicado por que passa o nosso País.

    Presidente, dezenas de vezes vim a esta tribuna criticar a política econômica do Governo Federal. Talvez eu tenha sido o único Senador persistente e insistente na crítica, anunciando um déficit que chegava a mais de 3%, quase 5%, diante do silêncio do Plenário e da concordância dos Senadores que disciplinadamente votavam as medidas do arrocho fiscal, da despropositada política de contenção.

    Então, eu me sinto muito confortável hoje para conversar sobre este processo de impeachment, que tem duas naturezas: uma política e outra legal. No aspecto político, nós temos que observar que o arrocho fiscal, somado à crise internacional e a uma série de erros na condução da política econômica do Governo brasileiro, levaram a uma brutal insatisfação popular; uma insatisfação potencializada pela extraordinária agressão da imprensa, embalada por interesses geopolíticos dos países que disputam no mundo a hegemonia, o desespero pela posse das reservas minerais do Brasil, do petróleo, a utopia neoliberal, que é a moderna fantasia que toma conta da nossa mídia e que embala alegremente uma boa parte do Congresso Nacional. Essa insatisfação foi também alicerçada por uma relativa inabilidade da nossa Presidente da República nos seus contatos com o Congresso Nacional.

    Então, em determinado momento, surge esse movimento político do impedimento, que é uma espécie de referendo revogatório por parte do Congresso Nacional e que, como referendo revogatório, não está previsto na nossa legislação.

    A visão liberal sempre quis aprofundar o arrocho fiscal. Não há a menor sombra de dúvida de que se contrapõem, de uma forma programática, filosófica e decisiva, as políticas anticíclicas que surgem a partir do Keynes, e que tiveram início, na verdade, com Hjalmar Schacht, na República do Weimar, e depois, mesmo, na Alemanha de Hitler, resolvendo, por exemplo, o problema inflacionário numa semana.

    É a intervenção e a participação do Estado na contenção do processo inflacionário, o que na Alemanha se resolveu com as letras avalizadas pelo Banco Central em uma semana.

    Então, os remédios anticíclicos são os remédios que deveriam ser aplicados no Brasil, mas toda essa visão liberal que repousa no Congresso Nacional, no Senado e que estava incrustada no Governo da República, de uma hora para outra, Senador Anastasia, se transforma no suporte decisivo do impedimento da Presidente da República.

    Eu lembro que eu protestava aqui e os Ministros do meu Partido defendiam a política do arrocho. Tinham como única solução o aperto, que, num processo recessivo, só poderia levar o Brasil aonde levou: ao aumento da recessão, à queda do Produto Interno Bruto e a uma crise de insatisfação popular realmente de proporções enormes.

    Mas o que acontece é que a solução disso era a mudança da política econômica. E o presidencialismo brasileiro não contempla o remédio do recall ou do referendo revogatório.

    Outro aspecto é o aspecto legal. O impeachment está inscrito na Constituição brasileira, mas ele depende de um crime de responsabilidade. E é evidente, Senadores, que esse crime de responsabilidade não ocorreu e, se ele tivesse ocorrido, teria ocorrido em 16 Estados brasileiros, inclusive no Estado do Relator. Mas não ocorreu, e o Tribunal de Contas de Minas Gerais convalida todos os decretos de suplementação de verba emitidos pelo Governo, e, a meu ver, convalida legalmente, porque isso não se constituiu em nada mais que um artifício contábil para resolver um problema num momento de dificuldade. O Senado Federal solicita o mesmo tipo de decreto. O mesmo faz o Supremo Tribunal Federal e o Tribunal de Contas.

    Então, é uma prática consolidada no Brasil, feita anteriormente por muitos presidentes da República, mas se utiliza o artifício do impeachment constitucional para estabelecer o recall de um governo, que - ai eu acho que nós concordamos todos, Senador Jereissati -, tem uma dificuldade enorme de subsistir por falta de apoio, por falta de apoio pelos seus erros, por falta de apoio pela circunstância política internacional, por falta de apoio pelo arrocho fiscal fundamentalmente e pela falta rigorosa de habilidade na condução das coisas da República.

    Então, nós estamos diante de um impasse, mas esse impasse pode ser resolvido por um processo de impedimento sem base legal, pela quebra de um processo democrático que se consolida nos últimos anos? A mim parece que não. Mas eu fico mais preocupado ainda, a minha preocupação se magnifica quando eu vejo que nós estamos num processo sem esperança. Qual é a alternativa do sucesso do impeachment? O meu amigo Michel Temer, Vice-Presidente da República, Presidente do meu Partido, assume a condução dos negócios da República - Presidente Michel Temer -, mas assume suportado por uma série de ideias que foram publicadas em Uma Ponte para o Futuro e reveladas em entrevistas dos seus auxiliares mais próximos, que são as ideias vinculadas à utopia neoliberal: vamos reduzir a idade para a aposentadoria! Magnífico, Senador Renan! Eles propõem 65 anos para viabilizar uma aposentadoria. Sabem vocês, Senadores, qual é a idade média dos homens no Estado do Presidente Renan, em Alagoas? É 65 anos e 8 meses. Então, os alagoanos estariam condenados, se sobrevivessem, na média, a terem 8 meses de uma aposentadoria depois de uma contribuição na vida inteira.

    O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. PMDB - AL) - Senador Requião, sem interrupção.

    Já que V. Exª citou o meu Estado de Alagoas, eu queria, em favor do Senado Federal, fazer um registro histórico: o Senado não assina esse tipo de decreto.

    O Senado, todos os anos, nos últimos anos, tem devolvido dinheiro, inclusive à própria Presidente da República, para que ela possa fazer uso desse dinheiro em programas do Governo, inclusive em programas sociais.

    Em 1997, o Senado Federal - só um registro para a história - gastava exatamente igual à Câmara dos Deputados. Hoje o Senado Federal, com absoluta transparência, gasta apenas 70% do que gasta a Câmara Federal. E nós aqui fizemos o dever de casa, cortamos despesas, e talvez seja o Senado a única instituição da República, nesse quadro de fanatismo, de ódios, de corporativismo, de seitas, de grupos, que tem feito a sua parte com relação ao controle do seu gasto público.

    O SR. ROBERTO REQUIÃO (PMDB - PR) - E nesse triste episódio aqui, no Senado, eu não vi ninguém invocar a mãe, o cachorro e a madrinha, pelo menos até agora. Além disso, o Senado permite que um orador na tribuna consiga conversar com o Plenário, mantendo um relativo silêncio e uma atenção respeitosa, o que dificilmente acontece na Câmara. E quando os Deputados chegam aqui nos obrigam a ver o Presidente do Senado pedir um pouco de silêncio respeitoso. Tem vantagens o poder moderador da República, e essas vantagens provavelmente derivam da idade média dos Senadores, com exceção do menino Randolph Frederich, que está aqui na primeira fila.

    Mas vejam vocês, então, toda a proposta arquitetada pela assessoria do Michel Temer é uma proposta neoliberal, que fala em cortes. É a mesma proposta que desgraçou a Europa, que trouxe a crise na Itália, em Portugal, na Espanha e que praticamente liquidou a Grécia. Senador Tasso, em 2010, quando a Grécia utilizou esse remédio neoliberal, da forma como é proposto para o Brasil agora, o déficit público era 104% do PIB. Era um desespero para os gregos e o temor de toda a Europa. Privatizaram tudo, cortaram na saúde, cortaram na educação, cortaram na previdência, liquidaram aposentadorias. Em 2015, que é o último dado oficial que eu tenho, o déficit tinha ido para 184% do PIB, e a crise havia se aprofundado.

    Anunciam: "Não. Derrubamos a Dilma nesse recall parlamentar, e o Temer tomará medidas para abrir a economia", como deseja e sonha o meu velho amigo Blairo Maggi. Não vai acontecer isso, não. O Michel Temer tem uma história de conciliação; ele foi Presidente da Câmara três vezes porque ele concilia os interesses. Não é um radical, embora as propostas colocadas tenham sido até agora propostas radicais para encantar o mercado, viabilizar a fascinação dos banqueiros e dos rentistas. Não vai acontecer isso no Brasil.

    E as soluções que nós tínhamos que tomar são as antigas e conhecidas soluções anticíclicas. Não podemos revogar Keynes. Temos que aprender com Hjalmar Horace Greeley Schacht e com o que ele fez na Alemanha. Temos que retomar um processo de desenvolvimento com financiamento das empresas brasileiras, com proteção do mercado interno. Essa abertura, esse sonho de abertura total é o sonho que desgraçou a Europa.

    Precisamos construir um projeto de nação, mas esse projeto, apesar de qualidades e defeitos que têm os nossos últimos governos, porque são nossos, sou do PMDB do Paraná, fui cabo eleitoral da Presidente Dilma e eu me sinto igualmente frustrado pelo fato puro e simples de que os compromissos de campanha não foram cumpridos. Mas ela cumpriu o quê? O compromisso de campanha de nossos adversários do PSDB. O Governo da Dilma é o Governo do arrocho fiscal prometido pelo PSDB na campanha eleitoral. Mas hoje vejo todo o grupo de oposição dizendo: "Não, a Dilma errou, quebrou o Brasil, e vamos consertá-lo com os remédios". Quais são os remédios? São os remédios da Dilma, que são iguais aos remédios do PSDB, elevados à décima potência. Isso só pode nos levar a um desastre muito maior.

    A solução para esse problema, na minha forma de ver, não é o referendo revogatório, não é esse recall parlamentar. A solução seria o entendimento, um governo de coalizão nacional ou a discussão pelos partidos políticos, primeiro internamente, de um programa de recuperação do Brasil, de desenvolvimento econômico, social, perfeitamente inteligível, factível e de fácil realização. Depois, esse programa seria oferecido à população num referendo ou numa nova eleição. Estamos todos num caminho absolutamente errado.

    Quando vejo o entusiasmo de pessoas mais inocentes e desinformadas da economia com o que vai acontecer no dia seguinte da derrubada da Dilma, eu fico imaginando que são todos uma espécie de meninos a aprender a jogar xadrez pela primeira vez, não conseguindo raciocinar sobre um segundo, um terceiro ou um quarto lance. Vejo a inocência do meu amigo Ferraço, o seu ânimo na mudança, a sua esperança na modificação, mas vejo o desastre se aproximando, porque ninguém conserta este País com o liberalismo que arrebentou a economia da Europa.

    Nós estamos no fim de um ciclo: o ciclo da soja e o desenvolvimento econômico, e a satisfação da população viabilizada pelo Lula, com seu financiamento, com seus empréstimos consignados e o aproveitamento de um excedente da economia das commodities, que se encerra com a retração da China. Mas estamos com um entusiasmo que não sei de onde vem, a não ser que venha realmente da ignorância sobre a economia e sobre o que acontece no mundo, imaginando que vamos derrubar a Presidente da República e iniciar uma mudança com um Ministério que tem algumas figuras notáveis, mas uma maioria de pessoas absolutamente inadequadas para o comando da República.

    O meu voto, que anuncio neste momento, em nome do País, dos meus eleitores, dos 75 anos de vida e dos anos que me debrucei sobre o estudo da economia no mundo, é contra a besteira, a monumental asneira do impeachment da Presidente da República neste momento.

    Muito obrigado, Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/05/2016 - Página 74