Discussão durante a 71ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Defesa da rejeição da admissibilidade do impeachment da Presidente Dilma Rousseff, em razão da inexistência de crime de responsabilidade, e acusação de tentativa de golpe de Estado por parte do PMDB.

Autor
Vanessa Grazziotin (PCdoB - Partido Comunista do Brasil/AM)
Nome completo: Vanessa Grazziotin
Casa
Senado Federal
Tipo
Discussão
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Defesa da rejeição da admissibilidade do impeachment da Presidente Dilma Rousseff, em razão da inexistência de crime de responsabilidade, e acusação de tentativa de golpe de Estado por parte do PMDB.
Publicação
Publicação no DSF de 12/05/2016 - Página 81
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • DEFESA, REJEIÇÃO, ADMISSIBILIDADE, IMPEACHMENT, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, MOTIVO, AUSENCIA, CRIME DE RESPONSABILIDADE, ACUSAÇÃO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DO MOVIMENTO DEMOCRATICO BRASILEIRO (PMDB), TENTATIVA, GOLPE DE ESTADO, OBJETIVO, OBTENÇÃO, PRESIDENCIA DA REPUBLICA, ELEIÇÃO DIRETA.

    A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM. Para discutir. Sem revisão da oradora.) - Muito obrigada, Sr. Presidente.

    Srs. Senadores e Srªs Senadoras, quero aqui fazer um cumprimento especial à Bancada do meu Partido, na Câmara dos Deputados, os Deputados do PCdoB. Cumprimento todas e todos na pessoa da Deputada Luciana Santos, que é uma mulher guerreira, Presidente nacional do nosso Partido, o PCdoB.

    E, Sr. Presidente, quero fazer um breve registro, antes de iniciar o meu pronunciamento, de que ouvimos aqui desta tribuna o protesto do Senador Requião em relação à violência que está acontecendo ali do lado de fora. Quero dizer que, de fato, olhamos as fotografias, olhamos as mensagens recebidas e, infelizmente, a violência parece ser crescente do lado de fora. Mas já conversamos com o Senador Capiberibe, que ligou para o Governador Rodrigo Rollemberg, que está tomando providências para que, imediatamente, cesse a violência desnecessária que está acontecendo ali do lado de fora.

    Srs. Senadores e Srªs Senadoras: "A falta de justiça, Srs. Senadores, é o grande mal da nossa terra, o mal dos males, a origem de todas as nossas infelicidades, a fonte de todo nosso descrédito, é a miséria suprema desta pobre Nação". Essa frase, essas palavras que acabo de reproduzir foram ditas por Rui Barbosa nesta Casa, em 1914, e permanecem atuais até nos dias de hoje.

    O Senado da República, cujo patrono tanto nos orgulha, está prestes a cometer nesta noite uma grande injustiça com a história e, principalmente, com o povo brasileiro. Não podemos ser justos sem trilharmos o caminho da verdade. E a verdade que se avizinha é a aventura política, o personalismo em excesso, a ambição partidária desmedida e sem limites, que subverte a nobreza da própria política.

    Hoje, a Nação inteira aguarda a manifestação desta Casa sobre o afastamento ou não da Presidenta da República, cuja denúncia, frágil e manifestamente ilegítima, acusa-a de práticas de ilícitos de natureza administrativa-penal, práticas essas adotadas pelos ex-Presidentes Lula e Fernando Henrique Cardoso, assim como por grande parte dos governadores, sem que nenhum deles nunca tivesse recebido qualquer reprimenda dos tribunais de contas.

    Dilma Vana Rousseff, quando jovem estudante, foi torturada, julgada e condenada por um tribunal de exceção ditatorial. Quis o destino que os ventos da democracia a transformassem na primeira mulher Presidente da República do Brasil. E, hoje, essa destemida, brava e combativa Presidenta Dilma Rousseff é novamente submetida a julgamento, desta vez em um colégio que teria por obrigação defender o substrato da sua própria existência, ou seja, a democracia, mas que se revela, a um só tempo, desprovido da necessidade e seriedade e tomado por uma maioria de ocasião, transformando-se, portanto, em um colégio eleitoral de exceção, cujo objetivo é retirar a Presidente legitimamente eleita e colocar em seu lugar um Presidente que não obteve um voto sequer da população brasileira.

    Vimos e ouvimos, aqui, no desfile de pronunciamentos que se seguem e que deverão seguir-se à madrugada, Srªs e Srs. Senadores tentando justificar suas posições a favor do afastamento da Presidenta da República. Fala-se de tudo - e nós acabamos de ouvir o último pronunciamento. Fala-se de tudo: da crise econômica, da corrupção, da Lava Jato. Só não falam do crime. E por que não falam do crime? Porque crime não há, senhoras e senhores.

    Pois bem, é essa peça, contaminada pelo ódio e desprovida dos mais elementares fundamentos jurídicos, o que analisamos nesta noite. E digo, Srªs e Srs. Senadores, que, após extenuantes reuniões de mais de dez horas, eu saí da Comissão do Impeachment mais convencida do que entrei. O impeachment, sem a fundamentação jurídica que lhe dê legitimidade, é golpe.

    Valho-me de um saudoso tribuno, de suas sábias palavras, em um momento igualmente trágico da nossa história republicana - abro aspas: "É a própria debilidade da tese, é o próprio absurdo da pretensão que lhes anula os argumentos, lhes minimiza a presunção, lhes condiciona a formulação jurídica", fecho aspas. Essas foram as palavras do então Deputado Mário Covas, ao defender que a Câmara dos Deputados não se dobrasse ao peso e à força do arbítrio, em 12 de dezembro de 1968, na véspera da decretação do Ato Institucional nº 5 (AI-5). Covas, então Líder da oposição, sabia que a recusa ao irrefreável apetite autoritário do governo militar traria consequências políticas a ele e ao País. Mas ele, corajosamente, teve brios para enfrentar a sanha daqueles insaciáveis de poder, que sepultavam a esperança de um país livre, de um país democrático.

    Muitos acreditam que o sabor da aprovação popular momentânea pode suplantar o império da lei, mas saibam esses que jamais sepultará o julgamento da história.

    Srªs e Srs. Senadores, fora o princípio do Estado democrático de direito, nos restarão, Senador Renan Calheiros, somente o arbítrio, a intolerância e a insegurança institucional.

    Como bem destacou o Prof. Geraldo Luiz Prado ao citar o importante pensador brasileiro Nilo Batista - abre aspas -, "nesse tipo de situação em que o processo é mero ritual, em que questões podem estar previamente definidas, a acusação é só um pretexto" - fecha aspas. Senão, vejamos. A denúncia que resultou na autorização da Câmara dos Deputados para processar e julgar a Presidente da República por impeachment é um corolário de impressões, convicções e opiniões políticas. Tanto ali quanto no relatório do Senador Anastasia, falta a subsunção dos fatos aos elementos jurídicos, de que resulte, sem qualquer dúvida, a ocorrência de crimes de responsabilidade, na forma descrita na Constituição de 1988 e na Lei nº 1.079, de 1950.

    Caso este Plenário aprove a instauração do processo, estaremos diante de uma das maiores afrontas perpetradas à Constituição brasileira, uma das maiores fraudes ao Estado democrático de direito, um verdadeiro golpe parlamentar destinado a atender a interesses pouco republicanos de uma elite inconformada com o resultado das urnas em 2014.

    Presidente Renan - e aí vou repetir uma citação que V. Exª sempre faz, dirigindo esta Casa -, temos viva em nossa memória a figura do Senador Auro de Moura Andrade, que declarou vaga a cadeira de Presidente da República enquanto tínhamos o Presidente João Goulart em Território nacional. Sua atuação naquela triste noite de 1º de abril de 1964 não só ofendeu a sua memória, como manchou a história deste Senado Federal, o que redundou em 21 anos de ditadura militar.

    A nossa responsabilidade é avaliar se as denúncias elencadas se lastreiam ou não na realidade e no nosso ordenamento político e jurídico. Temos que decidir sobre esse parecer, oriundo de um processo viciado desde a sua origem, nascido a partir de uma denúncia encomendada pelo PSDB, que pagou R$45 mil, assinado por advogados e membros do PSDB, e aqui, no Senado, relatado por um Senador do mesmo Partido, o PSDB. Portanto, além da ilegitimidade que é patente, não há indícios mínimos sequer do cometimento de crimes de responsabilidade pela Presidente da República.

    Srs. Senadores, após me debruçar com atenção e afinco sobre a denúncia, sobre a defesa e o relatório, não tenho dúvidas nenhuma em afirmar, e o faço em alto e bom som: não há crime de responsabilidade. Senão, vejamos. Imputam dois fatos à Presidente Dilma.

    O primeiro são as pedaladas fiscais de um único programa, o Plano Safra, que é o pagamento de subvenção à agricultura para equalizar os juros em relação aos juros internacionais. Nesse ato, que ocorre por força de uma lei de 1992, não há uma assinatura da Presidente Dilma, não há a menor participação da Presidente, mas eles tinham que incluir a Presidente nesse tal crime que eles forjaram. E o que eles fizeram? Mudaram, criaram uma nova figura jurídica e passaram a dizer, afirmaram, escreveram e assinaram no relatório que contrato de prestação de serviço não é mais contrato de prestação de serviço, é operação de crédito. Vejam os senhores.

    O segundo item são quatro decretos - não são seis, Sr. Presidente, são quatro decretos, porque a Câmara dos Deputados já disse que dois dos seis não têm problema nenhum - de suplementação orçamentária. Primeiro, nenhum deles causou qualquer impacto ou feriu as metas estabelecidas para 2015, porque as metas são anuais, mas tinham que colocar a Presidente nesse crime. E o que fizeram nesse tal crime, pseudocrime? Novamente, criam uma nova figura jurídica. Metas, agora, Presidente Renan Calheiros, não são anuais, conforme diz a Constituição, conforme dizem todas as leis infraconstitucionais. As metas, agora, têm que ser quadrimestrais, têm que ser semestrais.

    Vejam os senhores: um relatório tão frágil e inconsistente que os próprios juristas citados vieram a público contestar o seu conteúdo, destacando que o Relator publicou, de forma deturpada, as suas citações aos comentários do art. nº 85 da nossa Constituição.

    Os juristas Lenio Streck, Marcelo Cattoni de Oliveira e Alexandre Bahia destacam - abro aspas:

O que se faz, ao fim e ao cabo, revela, justamente o que nós, e os demais autores aqui citados, temos dito desde o início: trata-se de uma flagrante inconstitucionalidade que sacrifica o caráter jurídico-político, portanto, constitucional, do instituto do impeachment para reduzi-lo apenas à vontade de uma maioria tardiamente formada.

    Avançar nesse processo, com a evidente falta de respaldo jurídico, é, sem dúvida alguma, um golpe de Estado, tão grave quanto aquele experimentado em 1964.

    E, para a realização desse objetivo, pouco importam os argumentos e se eles encontram respaldo na realidade. Esse arremedo de processo que começa nessa noite é um mero ritual, Srªs e Srs. Senadores, é um pretexto para que o Estado brasileiro abandone as políticas sociais e volte aos tempos do neoliberalismo, em que o patrimônio público, as empresas públicas eram vendidas a preços imorais, em que os direitos dos trabalhadores eram subtraídos e usurpados; um pretexto para que se restabeleçam as políticas de apartheid social, tão bem descritas no documento "Uma ponte para o futuro" que nós chamamos de "Um túnel para o passado" - uma versão contemporânea do "ame-o ou deixe-o", que contempla as propostas de governo de Michel Temer de retirada do direito dos trabalhadores, das mulheres e da juventude e de dilapidação do patrimônio nacional

    Apesar do incômodo, que eu sei que causa a tantos aqui presentes, não há outro nome a denominar o que pode ser feito esta noite. Tentar escamotear ou mudar o nome não muda a ação. A imprensa internacional já percebeu do que se trata. Há em curso a tentativa espúria de retirada de uma Presidente honesta, proba, legitimamente eleita em nosso País. Isso é um golpe, isso caracteriza um golpe. Quanto hipocrisia, quanta mentira!

    (Soa a campainha.)

    A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - O que eles querem, Sr. Presidente, é também acabar com a Lava Jato, porque disseram que a Presidente não teve pulso para acabar com isso que está atingindo frentes poderosas.

    O Senado deve assumir, neste momento extremamente delicado para a democracia, a sua missão histórica da Casa Legislativa de moderação e do equilíbrio e se negar a admitir esse processo falso, que não aponta nenhum crime. Não podemos permitir e nem fazer o que fizeram os Deputados. Temos que parar aqui esse verdadeiro ataque à democracia, esse verdadeiro ataque ao povo brasileiro, esse verdadeiro ataque às mulheres e à nossa juventude.

    Por isso, Sr. Presidente, também falo pelo meu Estado, que nunca viu tantas ações positivas como agora, e me posiciono a favor do povo brasileiro, a favor da democracia, contra o golpe.

    Muito obrigada. (Palmas.)

    (Soa a campainha.)

SEGUE, NA ÍNTEGRA, PRONUNCIAMENTO DA SRª SENADORA VANESSA GRAZZIOTIN.

    A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs Senadoras e Srs. Senadores, “a falta de Justiça, Srs. Senadores, é o grande mal da nossa terra, o mal dos males, a origem de todas as nossas infelicidades, a fonte de todo o nosso descrédito, é a miséria suprema desta pobre nação.”

    Esta frase, que acabo de reproduzir, foi dita por Rui Barbosa nesta casa em 1914 e permanece atual até os nossos dias.

    O Senado da República, cujo patrono tanto nos orgulha, está prestes a cometer nesta noite uma grande injustiça com a história e principalmente com o povo brasileiro!

    Não podemos ser justos sem trilharmos o caminho da verdade. E a verdade que se avizinha, é a aventura política, o personalismo em excesso, a ambição partidária desmedida e sem limites, que subverte a nobreza da própria política.

    Hoje a nação inteira aguarda a manifestação desta Casa sobre o afastamento ou não da Presidenta da República, cuja denúncia, frágil e manifestamente ilegítima, acusa-a de práticas de ilícitos de natureza administrativo-penal, práticas essas adotadas pelos ex-presidentes Lula e FHC, assim como grande parte dos governadores, sem que nenhum tivesse recebido qualquer reprimenda dos Tribunais de Contas.

    Dilma Vana Rousseff, torturada, julgada e condenada por um tribunal de exceção ditatorial. Quis o destino que os ventos da democracia a transformasse na primeira mulher Presidente da República do Brasil.

    Hoje, esta destemida e combativa Presidenta Dilma Rousseff é novamente submetida a julgamento, desta vez em um colegiado que teria por obrigação defender o substrato da sua própria existência - a democracia -, mas que se revela a um só tempo, desprovido da necessária serenidade e tomado por uma maioria de ocasião, transformando-se, portanto, num colégio eleitoral de exceção, cujo objetivo é retirar a presidente legitimamente eleita e colocar em seu lugar um presidente sem voto.

    Vimos e ouvimos, aqui no desfile dos pronunciamentos que se seguem, Senhoras e Senhores Senadores tentando justificar suas posições a favor do afastamento da presidenta da República. Fala-se de tudo, da crise econômica, corrupção, mas não falam do crime. Por quê? Porque crime não há.

    Pois bem, é essa peça, contaminada pelo ódio e desprovida dos mais elementares fundamentos jurídicos, o que analisamos esta noite.

    E digo, Srªs e Srs. Senadores, que após extenuantes reuniões de mais de 10 horas, sai da comissão do impeachment mais convencida do que entrei: o impeachment, sem a fundamentação jurídica que lhe dá legitimidade, é golpe!

    Valho-me de um saudoso tribuno, de suas sábias palavras em um momento igualmente trágico de nossa história republicana:

    "É a própria debilidade da tese, é o próprio absurdo da pretensão que lhes anuía os argumentos, lhes minimiza a presunção que lhes condicionam a formulação jurídica".

    Estas foram as palavras do então deputado Mário Covas ao defender que a Câmara dos Deputados não se dobrasse ao peso e à força do arbítrio em 12 de dezembro de 1968, na véspera da decretação do famigerado AI-5

    Covas, então líder da oposição, sabia que a recusa ao irrefreável apetite autoritário do governo militar traria consequências políticas a ele e ao país. Mas ele corajosamente teve brios para enfrentar a sanha daqueles insaciáveis de poder, que sepultavam a esperança de um país livre e democrático.

    Muitos acreditam que o sabor da aprovação popular momentânea pode suplantar o império da lei, mas saibam que jamais suplantará o julgamento da história.

    Srªs e Srs. Senadores, fora o princípio do Estado Democrático de Direito nos restará somente o arbítrio, a intolerância e a insegurança institucional.

    Como bem destacou o professor Geraldo Luiz Prado, ao citar o importante pensador brasileiro Nilo Batista, "nesse tipo de situação em que o processo é mero ritual, em que questões podem estar previamente definidas, a acusação é só pretexto".

    Senão vejamos: a denúncia que resultou na autorização da Câmara dos Deputados para processar e julgar a Presidenta da República por impeachment é um corolário de impressões, convicções e opiniões políticas.

    Tanto ali quanto no relatório do senador Anastasia, falta a subsunção dos fatos aos elementos jurídicos, de que resultem, sem qualquer dúvida, a ocorrência de crimes de responsabilidade, na forma descrita na Constituição de 1988 e na lei 1079/50.

    Caso este plenário aprove a instauração do processo, estaremos diante de uma das maiores afrontas perpetradas à Constituição Brasileira, uma das maiores fraudes ao Estado Democrático de Direito, um verdadeiro golpe parlamentar, destinado a atender a interesses pouco republicanos de uma elite inconformada com o resultado das urnas em 2014.

    Temos viva em nossa memória a figura do senador Auro de Moura Andrade, que declarou vaga a cadeira de Presidente da República, enquanto tínhamos o presidente João Goulart em território nacional.

    Sua atuação naquela triste noite de 1o de abril de 1964, não só ofendeu sua memória como manchou a história deste Senado, redundando em 21 anos de ditadura.

    A nossa responsabilidade é avaliar se as denúncias elencadas se lastreiam ou não na realidade e no nosso ordenamento jurídico.

    Temos que decidir se este parecer, oriundo de um processo viciado desde a origem, nascido a partir de uma denúncia encomendada pelo PSDB, que pagou 45 mil reais, assinado por advogados e membros do PSDB e aqui no Senado relatado por um senador do mesmo partido, o PSDB. Portanto, além da ilegitimidade que é patente, não há os indícios mínimos do cometimento de crimes de responsabilidade pela Presidenta da República.

    Após me debruçar com atenção e afinco sobre a denúncia, a defesa e o relatório, não tenho dúvidas: não há crime de responsabilidade.

    Senão vejamos:

    1. Pedaladas Fiscais (Plano Safra, Lei 1992, MF e MA sem participação da PR.

    * nova figura jurídica - contrato de prestação de serviço = operação de crédito.

    2. 4 Decretos de suplementação orçamentária

    * não alteraram metas

    * nova figura jurídica - metas não são anuais, são bimestrais ou quadrimestrais.

    Um relatório tão frágil e inconsistente, que os próprios juristas citados vieram a público contestar seu conteúdo, destacando que o relator publicou de forma deturpada as suas citações aos comentários ao art. 85 da Constituição.

    Os juristas Lenio Streck, Marcelo Cattoni de Oliveira e Alexandre Bahia destacam: "O que se faz, ao fim e ao cabo, revela, justamente o que nós, e os demais autores aqui citados, temos dito desde o início: trata-se de uma flagrante inconstitucionalidade que sacrifica o caráter jurídico-político, portanto, constitucional, do instituto do impeachment para reduzi-lo apenas à vontade de uma maioria tardiamente formada".

    Avançar nesse processo, com a evidente falta de respaldo jurídico é sem dúvida alguma, um golpe de Estado, tão grave quanto aquele experimentado em 1964,

    E para a realização desse objetivo pouco importam os argumentos e se eles encontram respaldo na realidade. Este arremedo de processo que começa nesta noite é um mero ritual.

    É um pretexto para que o Estado brasileiro abandone as políticas sociais e volte aos tempos do neoliberalismo onde o patrimônio público e as empresas públicas eram vendidas a preços imorais, onde os direitos dos trabalhadores eram subtraídos e usurpados.

    Um pretexto para que se restabeleçam as políticas de apartheid social tão bem descritas no documento "Ponte para o Futuro". Uma versão contemporânea do Ame-o ou Deixe-o, que contempla as propostas de Governo de Michel Temer.

    Apesar do incômodo que causa a tantos aqui presentes, não há outro nome a denominar o que pode ser feito esta noite. Tentar escamotear ou mudar o nome, não muda a ação.

    A imprensa internacional já percebeu do que se trata.

    Há em curso a tentativa espúria de retirada de uma Presidenta honesta, proba, legitimamente eleita, por questiúnculas contábeis que sequer caracterizam ilícitos fiscais, ou seja, está em curso não um processo de impeachment, mas um GOLPE.

    Tentativa essa em curso desde o fim das eleições de 2014. Não ganharam no voto mas seguiram seu propósito de tomar o poder a qualquer custo, aproveitando-se do momento de fragilidade do país, da dificuldade na economia, das revelações de atos de corrupção para tirar a presidenta Dilma. Espalham mentiras e vendem ilusões de que tudo é culpa da presidenta e sua saída vai melhorar a situação do país.

    Quanta hipocrisia, quanta mentira! O que eles querem é também acabar com a Lava Jato.

    O Senado deve assumir, nesse momento extremamente delicado para a democracia, sua missão histórica de Casa Legislativa da moderação e do equilíbrio e se negar a admitir a tramitação da Denúncia n° 1, de 2016, evitando-se assim uma ruptura institucional e o desrespeito à soberania popular.

    A aprovação deste relatório significará a abertura de precedente gravíssimo.

    Cassar um mandato dado pelo povo, outorgando a um Vice-Presidente por meio de um processo ilegítimo e repleto de vícios, certamente vai provocar uma fratura na democracia e na sociedade brasileira.

    O povo não aceitará um presidente ilegítimo, um presidente biônico. Temo que haverá uma ampla resistência popular e a inconcebível divisão do país.

    Gostaria de fazer um último apelo aos Senhores e Senhoras Senadores e Senadoras. Nestas horas que nos separam da votação, recolham-se alguns minutos, reflitam em silêncio e busquem olhar para além dessa disputa fraticida em que estamos envolvidos.

    É possível que o dia de hoje seja o mais importante da trajetória política de todos os que estão aqui.

    Ele estará nos livros de história de nossos netos e bisnetos. Pensem bem: de que lado vossas excelências irão ficar? Ao lado dos que defendem a soberania popular ou ao lado dos que menosprezam o voto e o sufrágio!

    Srªs e Srs. Senadores, reafirmo meu compromisso inalienável com a democracia e com a defesa intransigente dos direitos de nosso povo.

    Não voto apenas por lealdade a um governo que ajudamos a construir, com todos os seus acertos e seus erros, mas que sem dúvida é um governo que sempre procurou colocar os direitos do povo no centro das políticas públicas.

    Voto por compromisso com o novo projeto de Brasil que construímos ao longo dos últimos 13 anos, a favor dos mais pobres, das regiões menos desenvolvidas, a favor da Zona Franca de Manaus, da nossa Amazônia, do meu Amazonas.

    Antes dos governos Lula e Dilma a situação econômica no nosso Estado era de penúria. A mão-de-obra nas indústrias locais chegava ao patamar mais baixo: apenas 30 mil empregos contra a média atual de 100 mil. Os incentivos fiscais eram reduzidos periodicamente e apesar do apelo de todos não conseguimos prorrogar nosso modelo e que só veio com Lula e Dilma quando garantiram a prorrogação por mais 50 anos da Zona Franca. Avançamos na exploração do gás natural, em programas importantes como o Minha Casa Minha Vida, Luz Para Todos, Bolsa Família, Mais Médicos, a melhoria da qualidade de vida dos ribeirinhos, dos extrativistas, o respeito aos povos indígenas.

    A Universidade Pública e os Institutos Tecnológicos avançam cada vez mais para o interior do meu Amazonas: Coari, Parintins, Itacoatiara, Benjamin Constant, Humaitá, Eirunepé, Maués, Tabatinga, Tefé, Presidente Figueiredo, São Gabriel da Cachoeira, entre tantos outros.

    Tudo isso está em risco, pois existe a disposição desses que se arvoram ao poder de cassar todas essas conquistas.

    Iremos enfrentar de cabeça erguida todas as dificuldades vindouras. Não temos receio. Temos a certeza de que estamos do lado certo da história.

    As palavras do hino do Amazonas nos servem para ilustrar nossa disposição e nossa capacidade de luta:

    "Amazonas de bravos que doam Sem orgulho, nem falsa nobreza Aos que sonham, teu canto de lenda Aos que lutam, mais vida e riqueza!".

    E por fim, quero aqui ler uma mensagem que recebi hoje do Orlando Silva que sei não é só para mim, mas serve para todos nós, parlamentares e militantes do PCdoB que estão nas ruas defendendo a democracia, dizendo não ao retrocesso ao lado do povo brasileiro:

    Camarada Vanessa Grazziotin,

    Hoje será um dia duro, difícil.

    Você foi brava nos embates contra o golpe. Você encheu de orgulho o nosso Partido, e honrou nossa história.

    A sua voz no Plenário do Senado Federal será a de milhões de brasileiros que defendem a democracia. A sua voz será de Renato Rabelo, João Amazonas, Luís Carlos Prestes, Astrojildo Pereira.

    Você chegará à Tribuna conduzida pela energia dos nossos jovens que ocupam escolas nesse momento, com a força dos trabalhadores da cidade e do campo que constroem o Brasil, com o heroísmo de Maurício Grabois, Helenira Rezende, Osvaldão e tantos que tombaram no Araguaia.

    A história haverá de manter os comunistas no lugar de honra, e devemos isso a militantes como você.

    Bom combate, camarada!

    Deputado Orlando Silva


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/05/2016 - Página 81