Discussão durante a 71ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Crítica ao caráter eminentemente político do processo de impeachment da Presidente Dilma Rousseff e considerações sobre a conspiração entre políticos, juízes e mídia para derrubada do Partido dos Trabalhadores e assunção de Michel Temer à Presidência da República.

Autor
Regina Sousa (PT - Partido dos Trabalhadores/PI)
Nome completo: Maria Regina Sousa
Casa
Senado Federal
Tipo
Discussão
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Crítica ao caráter eminentemente político do processo de impeachment da Presidente Dilma Rousseff e considerações sobre a conspiração entre políticos, juízes e mídia para derrubada do Partido dos Trabalhadores e assunção de Michel Temer à Presidência da República.
Publicação
Publicação no DSF de 12/05/2016 - Página 93
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • ACUSAÇÃO, TENTATIVA, GOLPE DE ESTADO, MOTIVO, MICHEL TEMER, VICE-PRESIDENTE DA REPUBLICA, POSSE, PRESIDENCIA DA REPUBLICA, AUSENCIA, ELEIÇÃO DIRETA, CRITICA, JUDICIARIO, DIVULGAÇÃO, INFORMAÇÃO, PROCESSO JUDICIAL, IMPRENSA, SELEÇÃO, PUBLICAÇÃO, OBJETIVO, INICIO, PROCESSO, IMPEACHMENT, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA.

    A SRª REGINA SOUSA (Bloco Apoio Governo/PT - PI. Para discutir. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs Senadores, Srs. Senadores, telespectadores da TV Senado, ouvintes da Rádio Senado, antes de tudo, eu quero manifestar aqui o meu repúdio ao tratamento que a polícia está dando lá fora à manifestação, uma manifestação essencialmente de mulheres. Uma delegada do meu Estado, Elisângela, foi ao hospital com suspeita de fratura na perna.

    Nós fizemos manifestações imensas nesse local, duas adversárias ao mesmo tempo, e não houve nenhum conflito. Será que esse já é o jeito Temer de tratar manifestação? Porque até agora não tinha havido isso.

    Eu não vou, aqui, falar de pedaladas ou de decreto; se houve crime, ou se não houve crime - para nós não houve. Eu vou falar de política, porque este processo é essencialmente político.

    Foi a política que decidiu que a Presidenta Dilma não governaria. Tomada a decisão, ou seja, depois de apontar quem seria a criminosa, partiu-se para achar o crime. E não venham apontar aqui a economia, porque este País já passou por várias crises graves, e não se depôs governante.

    Quantas vezes o Brasil foi ao FMI de 1998 a 2002, para poder fechar as contas? De quanto era a inflação? A taxa de juros? Alguém disse que o Lula pegou um país redondinho. Taxa de juros de 25,5%. Era um país redondinho?

    O desemprego? E os saques dos famintos nas estradas, saqueando caminhões? Esqueceram? Ou será que eu estava em outro país?

    Havia grau de investimento? Aqui há os viúvos do grau de investimento. Que eu saiba, não havia. Houve com o Lula. Perdemos, lamentavelmente. Estamos perdendo, e vamos recuperar.

    Valia tudo no propósito de derrubar a Dilma. Dizia-se da necessidade de um ajuste fiscal. Quando ele veio, dificultou-se a sua aprovação. Discurso sindicalista na boca de escravocratas cheirava mal. Diziam que era preciso combater a corrupção. A Presidenta enviou para o Congresso um pacote anticorrupção, que sequer foi lido. Não aprovaram, em 2014, o orçamento; boicotaram. Foram aprovar no começo de abril de 2015.

    Aproveitavam o quanto podiam da Operação Lava Jato, para paralisar o País, com o devido apoio de setores do Judiciário, do Ministério Público, da Polícia Federal, dos empresários e principalmente de uma grande rede de TV, além de jornais e revistas conhecidamente golpistas.

    Os vazamentos seletivos eram direcionados a um único partido, o Partido dos Trabalhadores.

    Acabou-se o segredo de justiça. Os depoimentos, na mesma hora, estavam na Rede Globo - depoimentos em segredo de justiça.

    Grampeou-se e divulgou-se a vida pessoal de um ex-Presidente, expondo-o na sua intimidade. Grampeou-se a Presidenta da República, mas ninguém quis saber da lista do HSBC. Está aí uma finada CPI que vai acabar melancolicamente.

    O listão da Odebrecht, ou o Panama Papers. O Juiz Sergio Moro chegou a celebrizar uma frase: "Não vem ao caso." E eu completo essa frase: "Não vem ao caso o Lula não estar lá." Porque ele é encegueirado no Lula. Encegueirado é uma expressão nordestina, viu?

    O direcionamento dos interrogatórios é de envergonhar uma magistratura que se diz isenta. Não vou usar a palavra golpe, porque sei o quanto alguns aqui se incomodam e se constrangem por estarem contribuindo para o que um golpista de primeira linhagem chamou de golpe democrático, lá na Câmara. O Deputado Heráclito Fortes, um dos mentores da conspiração, palavra que usarei daqui para a frente.

    Aliás, a história da humanidade está cheia de golpes travestidos de democráticos. Quem não ouviu, na ditadura, que iriam implantar a ditadura para preservar a democracia?

    Pois bem, a conspiração começou a tomar forma em meados de abril de 2015, três meses depois da posse. No mês seguinte, o PSDB encomendou o parecer da Drª Janaína Paschoal, que recebeu R$45 mil.

    Reuniões semanais aconteciam no QG do impeachment para construir o processo de afastamento da Presidenta, três meses depois, com direito à aula de estratégias dada pelo Senador Nelson Jobim, que orientava as ações nas três vertentes, que eu suponho que seriam as vertentes jurídica-judiciária, política e midiática, porque esses setores trabalharam tão em sintonia pelo impeachment da Presidente com uma sincronia digna de ginastas bem treinados.

    Nas reuniões, recebiam visitas especiais: Armínio Fraga, Senador José Serra e a mais importante delas, o Vice-Presidente Temer. O que ia fazer lá o Vice-Presidente, senão dar a sua contribuição para a conspiração?

    O comando da conspiração, intitulado de G8, era formado pelos Deputados Heráclito Fortes, Jarbas Vasconcelos, José Carlos Aleluia, Raul Jungmann, Marcus Pestana, Tadeu Alencar, Rubens Bueno e Mendonça Filho, que era chamado o cérebro da conspiração. Isso não sou eu que está dizendo, não, foi a entrevista do Heráclito no Estadão, e, talvez, por isso, ele vá ser Ministro da Educação. Não é?

    Mensalmente, havia reuniões ampliadas, chegando ao pleno de, mais ou menos, 80 pessoas. "Lá, não teve vazamento", gaba-se o anfitrião. Semanalmente, a reunião; mensalmente, a plenária.

    Incitaram a classe média a ir às ruas bater panelas sob a bandeira do combate à corrupção. Pura falácia. O que havia de gente corrupta naquelas manifestações não dá nem para contar: vestiram a camisa da corrupta CBF; dono de posto de gasolina que adultera combustível; médico que cobra cirurgia do SUS e do paciente; empresário que adulterou leite, o leite que a gente bebe; o líder do Movimento Brasil Livre, que tem 60 processos nas costas, inclusive de sonegação fiscal; e políticos muitos com um histórico, com um passado que se condena.

    Fez parte do jogo também manter Eduardo Cunha, reconhecidamente sem condições de dirigir a Câmara, até que ele cumprisse a tarefa que lhe cabia na conspiração. A votação do impeachment na Câmara, resultado dessa conspiração, foi aquele espetáculo dantesco de que o Brasil e o mundo se envergonharam. Com raras exceções, o voto não foi pelo País, o voto foi pelos filhos e filhas, pelos parentes e aderentes. Certamente, alguns desses se envergonham. Só faltou o voto pelo direito da cachorrinha comer ração importada dos Estados Unidos. O debate de ideias foi o que menos importou.

    Na Comissão do Senado, também, apesar do debate mais qualificado, tivemos vários momentos de desdém beirando o deboche. Alguns repetiam o mesmo discurso cada vez que se manifestavam. Outros usavam de metáforas risíveis. Pesquisando o passado de alguns, confirma-se o dito popular: macaco não olha para o rabo.

    Não poderia deixar de mencionar o componente sexista e misógino dessa conspiração. É como se nos dissessem que mulher não pode, principalmente a Dilma. Imaginem uma terrorista presidindo o Brasil! Foi assim que rotularam ela os torturadores.

    Reafirmo que esse era, desde o início, um jogo jogado, decidido. Já estava escrito que a casa-grande, por descuido, deixou os escravos chegarem à sala, mas ia devolvê-los à senzala.

    Existe aquela fábula do lobo e do cordeiro. O lobo tinha decidido comer o cordeiro. E, aí, foi buscar motivo. Chegou ao riacho, o cordeiro estava bebendo, e ele disse:

- Cordeiro, eu vou te comer!

- Por que, Seu Lobo?

- Porque você está sujando a minha água.

- Não, eu estou aqui embaixo, Seu Lobo, e você está em cima. E a água vem daí.

- Ah! Então, foi ontem.

- Não, ontem eu não estive aqui.

- Ah! Então, foi o seu pai.

- Eu não tenho mais pai.

- Não interessa, eu vou te comer!

    Porque é da natureza do lobo comer o cordeiro. Não adianta oficina técnica de convivência, não adianta colocar o lobo no Ministério. Ele vai, cedo ou tarde, criar motivo para comer o cordeiro.

    Esse golpe democrático não é pela moral, não é pela ética, não é contra a corrupção, não é pela boa prática de governança. Que boa prática de governança, se ainda agora um Senador daqui teve que sair para se filiar a outro partido para poder assumir um ministério? Se fosse boa prática de governança, ele assumiria o ministério no partido em que ele está. Então, foi um rateio, ele não podia assumir.

    Os atores desse golpe não afiançam esses motivos. É, sim, para a elite retomar o poder sob a batuta de setores do grande empresariado, simbolizado na Fiesp, nos banqueiros, no agronegócio e na mídia para reimplantar o seu projeto de exclusão social: o Brasil para poucos.

    Logo, logo vai ficar claro quem vai pagar o pato: negros, indígenas, mulheres, população LGBT, religiões de matriz africana, política de quotas, Bolsa Família, Minha Casa, Minha Vida, Luz para Todos. Aguardem. Não faz parte do programa dos que estão usurpando do poder subsidiar programa para mais pobre.

    A Lava Jato acaba para alguns, faz parte da negociação. Vai continuar, sim, para o PT, para tirar Lula do jogo, porque a elite conservadora brasileira neste País não se sente capaz de jogar e ganhar no campo aberto no tempo regulamentar. Seremos, nos próximos 180 dias, oposição responsável. Isso não significa oposição boazinha. Sabemos que o nosso voto não será necessário diante do bloco aparentemente hegemônico que se forma, mas é bom não nos subestimar.

    Temos a certeza de que, em algum momento, a postura do Ministério Público, da Justiça Federal, da Polícia Federal e de outros vai mudar. A população vai cobrar a parcialidade, os dois pesos e duas medidas. Uma hora dessas, os Demóstenes, os Carlinhos Cachoeiras, os Jovelinos, os Olavinhos e outros, os pilotos de helicóptero vão falar.

    O Juiz Sergio Moro foi o Juiz do Banestado, junto com o mesmo Procurador que persegue Lula em São Paulo, um escândalo maior que a Lava Jato, dizem alguns, e ele engavetou. É também o juiz de um processo de um Senador nesta Casa, a famosa operação Concórdia, uma chuva de dinheiro que aconteceu na capital deste País. Está há quatro anos sem se pronunciar - a Ministra Rosa Weber tinha dado 90 dias desde 2012.

    Ontem, noticiou-se uma fazenda que o Michel Temer usa, 1,5 mil hectares - cabem seis sítios de Atibaia lá dentro. É de um amigo, coronel João Batista Lima, o mesmo a quem o delator da Engevix disse ter entregue R$1 milhão para Temer.

    Olha o destino começando a conspirar! Por fim, quero dizer que nesses 180 dias estaremos aqui combatendo um bom combate e também estaremos no nosso front original, as ruas. Lutaremos para recolocar as coisas no seu lugar certo e original e vamos recontar a história como de fato ela aconteceu. Se há algo que aprendemos é que a deslealdade e traição não tem perdão. Dilma foi traída pelos que compartilharam o poder com ela. Dilma estará conosco dando força com o seu coração valente.

    No tempo que me resta eu queria me dirigir a dois companheiros da minha Bancada: Ciro, não sei se está aqui, meu ex-aluno, a quem dei muita nota 10, merecidas. Era um excelente aluno.

    Quero te dar outra nota dez, Ciro. Por favor, vote com a gente.

    Meu "veinho" trabalhador, que está ali, Senador Elmano, caminheiro de longas caminhadas. Quero continuar caminheira com o senhor, Dr. Elmano, por muito tempo ainda.

    Espero o seu voto com a gente.

    Muito obrigada, Sr. Presidente.

    Era o que eu tinha a dizer. (Palmas.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/05/2016 - Página 93