Discussão durante a 71ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Defesa da realização de novas eleições presidenciais, como forma de dar ao povo o poder de decidir a continuidade ou não do atual Governo, e apresentação de formas de a população auxiliar na erradicação da corrupção, por meio da Lei da Transparência.

Defesa da rejeição da admissibilidade do impeachment da Presidente Dilma Rousseff, em razão da inexistência de crime de responsabilidade.

Autor
João Capiberibe (PSB - Partido Socialista Brasileiro/AP)
Nome completo: João Alberto Rodrigues Capiberibe
Casa
Senado Federal
Tipo
Discussão
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Defesa da realização de novas eleições presidenciais, como forma de dar ao povo o poder de decidir a continuidade ou não do atual Governo, e apresentação de formas de a população auxiliar na erradicação da corrupção, por meio da Lei da Transparência.
GOVERNO FEDERAL:
  • Defesa da rejeição da admissibilidade do impeachment da Presidente Dilma Rousseff, em razão da inexistência de crime de responsabilidade.
Publicação
Publicação no DSF de 12/05/2016 - Página 110
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • DEFESA, REALIZAÇÃO, ELEIÇÃO DIRETA, PRESIDENCIA DA REPUBLICA, OBJETIVO, POPULAÇÃO, DECISÃO, ALTERAÇÃO, GOVERNO, APRESENTAÇÃO, FORMA, ERRADICAÇÃO, CORRUPÇÃO, UTILIZAÇÃO, LEGISLAÇÃO, REFERENCIA, TRANSPARENCIA ADMINISTRATIVA.
  • DEFESA, REJEIÇÃO, ADMISSIBILIDADE, IMPEACHMENT, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, MOTIVO, AUSENCIA, CRIME DE RESPONSABILIDADE.

    O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - AP. Para discutir. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Renan Calheiros, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, por onde começar?

    O Brasil vive um quadro extremamente preocupante. Todos nós presenciamos o acirramento político, o sectarismo que se alastra nas escolas, nas ruas, nos ambientes de trabalho, aqui mesmo, no Plenário do Senado, e até em nossas relações familiares e de amizades.

    Não consigo enxergar uma porta aberta para sairmos da crise. O impeachment não é a solução, é a opção pelo confronto; não resolve, só aprofunda a crise.

    Quando o Presidente desta Casa abrir o painel e revelar o resultado da votação, teremos um foguetório em todo o País, e também vencedores e vencidos. Aí a situação se complica de vez.

    Não se sai de uma crise tão grave quanto essa pelo confronto. É preciso aplainar as arestas, buscar uma saída pela política, negociar e compatibilizar interesses em busca de uma solução pactuada e definitiva. O País tem hoje 10,4 milhões de desempregados e milhares de empresas fechando as portas. É para trabalhar por esses cidadãos e para o povo brasileiro que ganhamos nossos salários. Buscar solução racional e duradoura para a crise deveria ser nossa maior preocupação.

    Adianto que, independentemente do resultado do impeachment, daqui a dois ou três meses, vamos continuar mergulhados na crise. Esta é uma briga pelo poder, é uma briga entre dois Partidos que governaram juntos durante cinco anos. Andavam de mãos dadas pela Esplanada dos Ministérios, ocupando os espaços de poder. De repente, confrontam-se e levam-nos a essa situação sem esperança. Repito: eu não tenho esperança em sair da crise pela condução que nós estamos dando nesse momento.

    É importante que todos saibam: nossa decisão de hoje pelo afastamento da Presidente Dilma vai criar uma situação inusitada, para não dizer absurda, beirando a ficção. O Brasil vai acordar amanhã com dois Presidentes: Dilma Rousseff, afastada, possivelmente entrincheirada no Palácio da Alvorada; e Michel Temer, interino, sob desconfiança geral, tentando governar no Palácio do Planalto. Isso é solução que se apresente? Claro que não, só existe uma saída. Os responsáveis pela situação atual, ou seja, a Presidente Dilma e o Vice-Presidente Temer, o PT e o PMDB deveriam reconhecer que fracassaram e apoiar novas eleições.

    A partir da decisão de hoje, a meu ver, encolhe nossa capacidade de resolver o problema do País. O Supremo Tribunal Federal, o Senado e a Câmara Federal deixaram escapar a oportunidade para debelar a crise. Agora precisamos do povo como juiz mediador e árbitro definitivo no desentendimento que sua representação política provocou.

    Lembro, aqui, a crise política que levou a transição da ditadura para a democracia. No dia 25 de abril de 1984, com a rejeição da Emenda Dante de Oliveira pela Câmara Federal, que propunha eleições diretas, o povo ficou fora do acordo de bastidores das elites que levou à formação da aliança democrática, reunindo a Frente Liberal, que apoiava a ditadura, e o PMDB, que lutava pela democracia. Essa estranha aliança, sustentada no loteamento de cargos públicos, atravessou o tempo, chegou aos nossos dias, e tudo indica que vai continuar. Esse presidencialismo franciscano, inaugurado na transição, apodreceu nas mãos da Presidente Dilma, e ela não se deu conta. E o Vice-Presidente Michel Temer, tudo indica, não aprendeu a lição. Pelo que se lê e se ouve na imprensa, ele também caminha na direção do fracasso, com um agravante: além de compor o seu governo na base do é dando que se recebe, provocou críticas duras da OAB, que apoiou o impeachment, mas não aceita uma equipe de ministros investigados na Lava Jato.

    Por essas razões, volto a repetir o que tenho dito em vários pronunciamentos aqui desta tribuna: um impeachment fundamentado numa lei quase senil é a opção pelo confronto, promove sectarismo político, ressentimento e aprofunda a divisão na sociedade.

    Nós, aqui, infelizmente, vamos continuar olhando para o cidadão desempregado e para os empresários falidos sem lhes dar uma resposta capaz de lhes devolver a esperança.

    Ao apelar para a negociação e o entendimento em torno da soberania do voto popular, não o faço apenas por desacreditar na eficácia do processo de impeachment. Na verdade, trato de reverberar neste plenário a voz rouca das ruas, desejosa em decidir pelo voto o impasse criado por sua representação política.

    Segundo pesquisa realizada pelo instituto Ipsos, publicada ontem na coluna "Radar", sete em cada dez brasileiros desejam um novo processo eleitoral. Repito: 70% dos brasileiros e das brasileiras querem uma nova eleição. Esse desejo da sociedade confirma a desconfiança em relação ao encaminhamento que estamos dando à crise, daí por que insisto em considerarmos a urgência do pacto por nova eleição para Presidente e Vice-Presidente da República a ser realizada em outubro, junto com as eleições municipais.

    Estou convencido de que em pouco tempo o povo vem bater em nossa porta, exigindo a sua participação como juiz imparcial dessa disputa. Afinal, o povo não é bobo, o povo não quer trocar seis por meia dúzia, o povo quer escolher.

    Não posso deixar de lhes falar de uma doença congênita das instituições públicas brasileiras: a corrupção. Sobretudo, quero falar de como combatê-la. Para tanto, permitam-me antes uma palavrinha sobre as instituições republicanas encarregadas de fiscalizar a aplicação dos nossos impostos, que, aliás, cresceram muito nos últimos anos. Batemos em um pouco mais de 35% do PIB, ou seja, quase cinco meses de tudo o que ganhamos termina nas mãos do governo, aliás nas mãos do Estado.

    Dessas instituições, cito especialmente os onerosos Legislativos municipais, estaduais e federal e seus braços técnicos, também caríssimos, autodenominados tribunais de contas, que, ressalvadas as exceções, fazem qualquer coisa, menos cumprir sua função de fiscalizar e garantir a correta aplicação do dinheiro dos impostos que pagamos.

    As pesquisas de opinião e o envolvimento em escândalos de corrupção levaram a sociedade a não mais confiar nessas instituições. Por isso aproveito para lembrar que a cidadania dispõe de outros mecanismos de controle.

    Temos leis que nos permitem acompanhar e controlar os gastos públicos com muita eficiência. Entre outras, cito a Lei Complementar nº 131/2009, de minha autoria, conhecida como Lei da Transparência. Essa lei obriga a exposição, em tempo real, pela rede mundial de computadores, das receitas e despesas de todos os entes públicos brasileiros, seja municipal, estadual ou federal, do Executivo, Legislativo e do Judiciário.

    Portanto, temos a nossa disposição um verdadeiro antídoto contra a corrupção. Mas não basta a lei. É preciso que você, cidadão, você que nos acompanha neste momento dramático da vida política brasileira, é preciso que você, cidadão, se mobilize e se organize em pequenos grupos para acompanhar, pelos portais da transparência, os gastos de sua prefeitura, da escola ou da universidade pública em que seu filho ou você estuda. Experimente entrar no portal da transparência da Assembleia Legislativa do seu Estado ou mesmo aqui do Senado e saiba quanto e em que é gasta uma parcela dos impostos que você paga. Isto posto, retomo o fio da meada.

    A acusação de que a Presidente incorreu em crime de responsabilidade, do meu ponto de vista, não se sustenta. Na verdade, a acusação que deu origem ao processo carece de comprovação, mas nada disso interessa neste momento. O julgamento é político. O formalismo processual funciona como uma espécie de cortina de fumaça para tentar justificar a rebelião política que deverá levar, ainda esta noite, ao afastamento da Presidente Dilma por até 180 dias.

    Concluo reafirmando que esse processo nos empurra para o confronto, a profunda crise política e econômica e poderá inclusive comprometer as investigações em curso que pela primeira vez alcançam a elite política e econômica do nosso País.

    Por isso, meu voto é contra a admissibilidade do impeachment, na esperança - e renovo sempre essa esperança - de que a Presidente Dilma, na condução, possa nos levar à mais importante das decisões, que é a realização de novas eleições. O mesmo apelo faço ao Vice-Presidente Michel Temer. Ao tornar-se Presidente, que chame novas eleições. Esse é o único caminho que temos para resolver essa crise histórica que o nosso País está vivendo.

    Por último, o povo, repito, não quer trocar seis por meia dúzia. O povo quer escolher. O povo decide eleições já.

    Obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/05/2016 - Página 110