Discussão durante a 71ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Defesa da rejeição da admissibilidade do impeachment da Presidente Dilma Rousseff, em razão da inexistência de crime de responsabilidade, e defesa da realização de novas eleições presidenciais, como forma de dar ao povo o poder de decidir a continuidade ou não do atual Governo.

Autor
Lídice da Mata (PSB - Partido Socialista Brasileiro/BA)
Nome completo: Lídice da Mata e Souza
Casa
Senado Federal
Tipo
Discussão
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Defesa da rejeição da admissibilidade do impeachment da Presidente Dilma Rousseff, em razão da inexistência de crime de responsabilidade, e defesa da realização de novas eleições presidenciais, como forma de dar ao povo o poder de decidir a continuidade ou não do atual Governo.
Publicação
Publicação no DSF de 12/05/2016 - Página 111
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • DEFESA, REJEIÇÃO, ADMISSIBILIDADE, IMPEACHMENT, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, MOTIVO, AUSENCIA, CRIME DE RESPONSABILIDADE, ACUSAÇÃO, TENTATIVA, GOLPE DE ESTADO, OPOSIÇÃO, COMENTARIO, IMPORTANCIA, REALIZAÇÃO, ELEIÇÃO DIRETA, PRESIDENCIA DA REPUBLICA, OBJETIVO, POPULAÇÃO, DECISÃO, ALTERAÇÃO, GOVERNO.

    A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA. Para discutir. Sem revisão da oradora.) - Obrigada, Sr. Presidente.

    Srªs e Srs. Senadores, é, sem dúvida nenhuma, muito grave o momento que nós estamos vivendo no País e no Senado hoje. Mais do que grave, o Senado se prepara para uma tomada de decisão no mínimo dramática. Nós nos preparamos para uma decisão que poderá afastar uma Presidente da República eleita pelo voto de 54 milhões de brasileiros, que ninguém, por mais esforço que tenha havido ao longo desta sessão e em todo o processo anterior na Câmara dos Deputados, conseguiu até o momento comprovar de forma cristalina e juridicamente incontestável ter cometido crime de responsabilidade.

    Em vários discursos e manifestações dos favoráveis à admissibilidade do impedimento, o que menos se ouve é a comprovação do cometimento de crime de responsabilidade, a essa altura já substituído pelo falacioso argumento do conjunto da obra, aí incluída a crise econômica, o cruel desemprego, a difícil personalidade, a falta de humor e de diálogo da Presidente da República, entre outros motivos, num flagrante desrespeito aos princípios constitucionais, até porque, tratando-se do chamado crime de responsabilidade, igualzinho àquele que se acusa a Presidente de ter cometido, todos os outros presidentes cometeram e dezenas de governadores, incluindo o nosso respeitado e querido Relator desse processo no Senado.

    O processo, no entanto, é político. E, além de político, contaminado por um grave e irreparável pecado original, o de ter sido urdido, iniciado, conduzido por um gesto de vingança pessoal pelo Presidente afastado da Câmara dos Deputados, réu no Supremo Tribunal Federal por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, num flagrante e evidente desvio de finalidade, e aprovado num clima de euforia por um Parlamento onde Parlamentares e partidos são citados na já famosa Operação Lava Jato.

    Assistimos na Câmara a um espetáculo dantesco, de arrivismo, traições, em que ministros ainda ontem no Governo de Dilma e Parlamentares que integravam a chamada Base do Governo desde sempre apareciam em plenário com discursos inflamados e indignados por atos dos quais eles mesmos foram autores ou partícipes.

    Nunca, é verdade, um governo foi tão sordidamente traído como este por Deputados e partidos que até ontem dele participavam e usufruíam de suas benesses e cargos, como alguém que tritura a cana, tira todo o seu sumo e joga o bagaço fora.

    Queiram ou não admitir os defensores da admissibilidade do impeachment, este processo se caracteriza como um golpe jurídico, parlamentar e midiático.

    Para os defensores do impedimento da Presidente, no entanto, isso pouco está importando. O que importa é aproveitar o momento político e econômico grave e difícil, a fragilidade política e gerencial do Governo, a sua eventual impopularidade para, neste dito momento, usurpar-lhe o poder e redividi-lo com seus aliados. Aliás, os mesmos aliados que compunham o governo que se pretende destronar.

    O presente processo tem outro componente igualmente corrosivo da atividade política e condenável, o da conspiração, a mais aberta.

    Ao contrário do que fez no passado, há 24 anos, o Vice-Presidente Itamar Franco quando do impeachment do Presidente Collor, que se recolheu ao silêncio e à discrição até o julgamento final do Senado Federal, o Vice-Presidente atual transformou o Palácio do Jaburu num comitê eleitoral pró-impeachment, arregimentando votos de Deputados a favor da admissibilidade do processo em troca de promessas, de benesses, espaços e cargos, como hoje nós assistimos nos jornais e nos meios de comunicação.

    Os anúncios de montagem deste novo governo, uma verdadeira e escandalosa feira de cargos antes mesmo da manifestação desta Casa é uma clara atitude reveladora da conspiração que faria corar o famoso personagem Frank Underwood da série House of Cards, em que um Vice-Presidente dos Estados Unidos conspira nas sombras para derrubar o Presidente eleito e tomar-lhe o lugar.

    Aqui, diferentemente, tudo se dá às claras. Grande parte desse amplo movimento, que envolve e envolveu o bastião do reacionarismo brasileiro representado por entidades empresariais, pelo monopólio da mídia, por políticos com amplo histórico de envolvimento em escândalos, malfeitos e também de velhos golpes, incluindo o Golpe de 64, representa, sim, uma velha e surrada pauta neoliberal derrotada nas últimas quatro eleições e de eficácia duvidosa no resto do mundo. Significa uma reação, sim, às conquistas sociais obtidas no Governo Lula/Dilma, que reduziram a desigualdade social, ampliaram o direito dos trabalhadores, tiraram 33 milhões de brasileiros da pobreza, ampliaram o acesso das camadas mais pobres da população à universidade, aumentaram os recursos para investimento no Nordeste e no Norte deste País e significaram políticas de inclusão e empoderamento para mulheres, negros e outros segmentos marginalizados pela ordem conservadora.

    Ao contrário de muitos Srs. e Srªs Senadores e Senadoras, Deputados e Deputadas que hoje se pronunciaram aqui e ontem, na Câmara dos Deputados, ovacionaram uns aos outros, convictos, condenatórios e plenos de retórica constitucional, eu nunca indiquei ou exerci cargos no Governo da Presidente Dilma. E, apesar das críticas que tenho ao Governo, que tornei públicas, que o meu Partido tornou públicas desde a campanha de Eduardo Campos para Presidente em 2013, posições reafirmadas em novembro de 2014, quando o PSB reiterou sua posição de independência propositiva, não deixamos de votar no que achávamos correto.

    E alertamos o Governo Dilma sobre a necessidade de mudanças na condução, principalmente, de uma política econômica que tinha como centro o ajuste fiscal e, portanto, não apontava para a retomada do crescimento econômico em nosso País.

    Chegamos, inclusive, com um grupo de Senadores independentes, a ir visitar e entregar à Presidente Dilma sugestões para o seu Governo e saídas para a crise. Fizemos críticas às alianças, como foram feitas, quem foram os privilegiados e a forma como foi feito esse processo de troca partidária com a combinação de ocupação dos espaços de poder, Senador Capi, Senador Randolfe, que estavam conosco nesse processo. No entanto, de nada adiantou.

    Mas não será, por isso, nem por outra razão que se equipare a isso, que vou adotar uma tese de um crime claramente não cometido e, se cometido, partilhado pelo Vice-Presidente da República, rasgando a minha história, a minha trajetória política e ideológica. Sempre fui uma defensora da democracia, uma militante da esquerda brasileira, eleita a primeira mulher Senadora pela Bahia, numa coligação com o PT e outros partidos que libertaram a Bahia do atraso e do coronelismo político. Todas as críticas - e as tenho muitas - não podem me fazer abraçar uma posição adotada e promovida pelo pensamento conservador e de direita, que não aceita, nem a perda das eleições, nem as conquistas realizadas pelo povo brasileiro.

    As elites empresariais do Brasil, elites preconceituosas, incapazes, ao longo da nossa História, de resolver minimamente as desigualdades sociais; não suportam a ideia de uma sociedade que combata o racismo, com cotas, permitindo que os negros acessem à universidade. As elites empresariais do Brasil, não acreditam, Sr. Presidente, caras Srªs e Srs. Senadores, ser possível o chamado equilíbrio das contas públicas, mantendo os custos dessas conquistas sociais. E, agora, num golpe de mão, preparam-se para reduzi-las, e um golpe de mão tipicamente daqueles em que um juiz que não é sério faz para tirar a diferença de um time que pode ser ganhador.

    A quantas partidas nós não assistimos, torcendo pelo nosso time, em que se gritou: "Esse juiz é ladrão!"? É isso que acontece neste momento; é isso que acontece popularmente neste momento. O que há é um pretexto jurídico, para dar continuidade a um processo que é absolutamente político, porque se aliaram e chegaram à conclusão a elite empresarial e a grande mídia desta Nação, com parte do Parlamento brasileiro, de que era necessário tirar a Presidente da República. Essa que é a verdade dura e crua!

    E eu sinto muito que alguns Senadores aqui, ingênuos ou menos ingênuos, alguns Senadores que estão, na verdade, Senador Paim, verdadeiramente preocupados com o destino do nosso povo e com a economia nacional, pensem, Senador Capi, que o impeachment pode ser a solução, e, como muitos aqui dizem, amanhã todos os problemas da economia do País estarão resolvidos. Isso não é verdade. O impeachment é a opção pelo caminho do confronto, como aqui ressaltou o Senador João Alberto Capiberibe,...

    (Soa a campainha.)

    A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA) - ... jamais o do entendimento - já vou finalizar, Sr. Presidente - e da conciliação nacional.

    Os defensores do impedimento argumentam que o fazem, mas também o fazem em respeito à voz das ruas. Desconhecem, no entanto, que as ruas, desta vez, não são uníssonas; reverberam um País dividido, onde parte considerável da população condena o impeachment. As ruas sempre, não é novidade, sempre foram presentes na cena política brasileira e no famoso movimento de milhões de pessoas pelas Diretas Já, em que foram traídas pelo Congresso Nacional naquele momento.

    A crise política só se resolverá, Sr. Presidente, buscando os caminhos de uma nova pactuação social, que só a legitimidade da soberania popular poderá nos devolver. Por isso, a saída da crise não é o... 

    (Interrupção do som.)

    A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA. Fora do microfone.) - ... impeachment, mas a autorização de novas eleições presidenciais. Num contexto de um presidencialismo absolutamente esgotado, em que não há reformas políticas que realmente transformem o Estado brasileiro, votar e aceitar o impedimento da Presidente, como solução para a crise, é uma mentira, é uma falácia.

    E, por isso, voto “não” à falácia de aceitar o impeachment da Presidente. (Palmas.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/05/2016 - Página 111