Discussão durante a 71ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Defesa da admissibilidade do processo de impeachment da Presidente Dilma Rousseff, em razão das "pedaladas fiscais" e da publicação de decretos federais para abertura de crédito suplementar sem autorização do Congresso Nacional.

Autor
Fernando Bezerra Coelho (PSB - Partido Socialista Brasileiro/PE)
Nome completo: Fernando Bezerra de Souza Coelho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discussão
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Defesa da admissibilidade do processo de impeachment da Presidente Dilma Rousseff, em razão das "pedaladas fiscais" e da publicação de decretos federais para abertura de crédito suplementar sem autorização do Congresso Nacional.
Publicação
Publicação no DSF de 12/05/2016 - Página 113
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • DEFESA, ADMISSIBILIDADE, IMPEACHMENT, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, ILEGALIDADE, PUBLICAÇÃO, DECRETO FEDERAL, OBJETO, ABERTURA, CREDITO SUPLEMENTAR, AUSENCIA, AUTORIZAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, DESCUMPRIMENTO, LEI FEDERAL, REFERENCIA, ATRASO, PAGAMENTO, BANCOS, MOTIVO, REPASSE, BENEFICIO, PROGRAMA DE GOVERNO.

    O SR. FERNANDO BEZERRA COELHO (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - PE. Para discutir. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, depois de mais de 20 dias, após o início dos trabalhos da Comissão Especial do Impeachment, aqui, no Senado, chegamos hoje, neste momento tão importante da vida nacional, ao momento de nos posicionarmos sobre a admissibilidade da denúncia por crime de responsabilidade apresentada em desfavor da Presidente da República.

    Em primeiro lugar, acusa-se a Presidente da República de abrir créditos suplementares por decretos presidenciais sem autorização prévia do Congresso Nacional, fato que infringe, em tese, as normas do art. 85, inciso VI, e do art. 167, inciso V, da Constituição Federal, além do art. 10, item 4, e do art. 11, item 2, da Lei nº 1.079, de 1950.

    A Presidente da República, Srªs e Srs. Senadores, publicou seis decretos não numerados de abertura de créditos suplementares nos meses de julho e de agosto de 2015. Todos nós sabemos que abertura de créditos suplementares, ao contrário dos créditos especiais, pode ser previamente autorizada na Lei Orçamentária Anual, não sendo necessário que sua abertura se dê por meios de envio de projeto de lei ao Congresso Nacional. A explicação para essa sistemática chega a ser óbvia, já que os créditos suplementares têm justamente a finalidade de reforçar dotações orçamentárias preexistentes, mas que se revelaram insuficientes.

    Nessa linha, a Lei Orçamentária Anual para o ano de 2015, a Lei nº 13.115, em seu art. 4º, autorizou, é verdade, a abertura de créditos suplementares, mas não o fez de maneira irrestrita. Pelo contrário, a lei somente permitiu a abertura de créditos, caso observadas algumas condições fiscais, entre as quais a de que as alterações promovidas, na programação orçamentária, fossem compatíveis com a obtenção do resultado primário de 2015.

    E foi, exatamente nesse ponto, que houve a violação da Lei Orçamentária. Quando a Presidente publicou os decretos, o cenário fiscal já demonstrava, de modo inequívoco, a impossibilidade de se atingir o resultado primário previsto na Lei Orçamentária Anual de 2015, o que se confirmou ao final do exercício financeiro.

    Conforme robustamente demonstrado nos trabalhos da Comissão Especial, o cenário daquela época já era de clara e profunda frustração de receitas públicas. O quadro de recessão econômica era tanto do conhecimento do Poder Executivo, naqueles meses de julho e agosto de 2015, que, no próprio mês de julho de 2015, a Presidente da República encaminhou ao Congresso Nacional o Projeto de Lei nº 5/2015, com a finalidade de reduzir o superávit de R$55,3 bilhões para aproximadamente R$6 bilhões.

    E todos nós aqui lembramos que, após novos pedidos da Presidenta da República, a meta foi ainda mais reduzida pela Lei 13.199, de 3 de dezembro de 2015, que estabeleceu como meta de resultado primário da União para 2015 um déficit de quase R$52 bilhões, que poderia chegar a quase R$120 bilhões. Ao final do exercício, esse desastre na condução da política fiscal se confirmou, e chegamos à expressiva cifra de R$118,4 bilhões de déficit.

    Ora, como era possível, na contramão de todos esses elementos negativos, de toda a realidade fiscal de déficit, editar legitimamente os seis decretos presidenciais? Simplesmente, não era possível. Em outras palavras, a Presidente da República fez exatamente o contrário do que impõe a legislação.

    Srªs Senadoras, Srs. Senadores, o segundo ponto analisado na Comissão do Impeachment diz respeito à denúncia de contratação ilegal de operações de crédito pela União, imputando à Presidente da República a prática do crime de responsabilidade, tipificado no art. 11, item 3, da Lei nº 1.079, de 1950, isto é, contrair empréstimo, emitir moeda corrente ou apólices ou efetuar operação de crédito sem autorização legal.

    As contratações de operações de crédito se referem a financiamentos obtidos pela União junto ao Banco do Brasil, ao BNDES e à Caixa Econômica. Nesses empréstimos, quanto à ilegalidade da operação de crédito, para mim, fica clara, pois o art. 36 da Lei de Responsabilidade Fiscal proíbe que o ente da Federação seja beneficiário de operação de crédito junto à instituição financeira estatal por ele controlada. E aqui evidenciamos as operações de crédito da União, justamente com o Banco do Brasil, o BNDES e a Caixa Econômica.

    Essas operações de crédito, além de ilegais, distorceram significativamente as estatísticas fiscais oficiais relativas à dívida e ao déficit público, uma prática que ficou conhecida popularmente como pedaladas fiscais. Para se ter noção do quão nociva para a contabilidade pública é essa prática, o Tribunal de Contas da União apontou que as pedaladas fiscais ocasionaram um subdimensionamento de aproximadamente R$40 bilhões na dívida da União e de aproximadamente R$7 bilhões no resultado primário do exercício, ao final de 2014.

    Tudo isso ficou oculto, mascarando as contas públicas. Exemplo disso são os financiamentos feitos pela União junto ao Banco do Brasil, que diferiu os pagamentos devidos no âmbito do Plano Safra. Nesse caso, o Governo editou a Portaria nº 315, de 2014, que definiu que o período de apuração seria semestral, mas, deixou em aberto a data do pagamento, ou seja, o Governo paga quando puder.

    Segundo o TCU, desde 2013, a União não vinha efetuando seus pagamentos em prazos razoáveis. Em termos práticos, isso significa que o Banco do Brasil vinha financiando a União, também em ofensa ao art. 36 da Lei de Responsabilidade Fiscal. Para piorar, a União sequer registrava tempestivamente o seu endividamento junto ao Banco do Brasil, que, de quase R$11 bilhões, em dezembro de 2014, chegou a R$12,5 bilhões em 2015. Todas essas práticas são verdadeiras operações de crédito, empréstimos que ofendem claramente a Lei de Responsabilidade Fiscal, enquadráveis, na minha opinião, portanto, como crimes de responsabilidade.

    Como se não bastasse a tentativa de mascarar a verdadeira contabilidade do Governo, a falta de diálogo político levou o País a um cenário de ingovernabilidade, tendo a Presidente da República perdido autoridade e o apoio político. A Presidente da República, tenho certeza, continuará a exercer, como o fez até agora, a sua ampla defesa numa próxima fase. A Casa, sob a Presidência do Senador Renan Calheiros, garantirá o devido processo legal.

    Aproveito, Sr. Presidente, para cumprimentá-lo pela condução de V. Exª desde que o processo de impeachment chegou ao Senado Federal, procurando, de forma equilibrada, isenta, dar oportunidade tanto aos que acusam como, sobretudo, àqueles que defendem a Senhora Presidente da República. V. Exª está à altura da tradição do Senado Federal da República do Brasil, que, neste ano, completa 190 anos.

    Mas, neste momento, Srªs e Srs. Senadores, não há como não me posicionar pela admissibilidade da denúncia. O relatório da Comissão Especial do Impeachment, de autoria do Senador Antonio Anastasia, deixa claro que existem indícios suficientes de autoria e materialidade, que a denúncia é plausível e que foram devidamente atendidos os pressupostos formais do processo.

    Não bastasse isso, ressalto ainda que o País também precisa avançar para a superação do impasse político, precisa buscar uma alternativa que torne possível enfrentar o atual cenário de crise política e econômica, algo que o atual Governo já se mostrou incapaz de fazer.

    Concluo, Sr. Presidente.

    Por tudo isso, o meu voto é favorável à admissibilidade da denúncia apresentada em desfavor da Presidente da República.

    Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/05/2016 - Página 113