Discussão durante a 71ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Defesa da rejeição da admissibilidade do impeachment da Presidente Dilma Rousseff, em razão da inexistência de crime de responsabilidade, e acusação de tentativa de golpe de Estado.

Autor
Lindbergh Farias (PT - Partido dos Trabalhadores/RJ)
Nome completo: Luiz Lindbergh Farias Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discussão
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Defesa da rejeição da admissibilidade do impeachment da Presidente Dilma Rousseff, em razão da inexistência de crime de responsabilidade, e acusação de tentativa de golpe de Estado.
Publicação
Publicação no DSF de 12/05/2016 - Página 117
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • DEFESA, REJEIÇÃO, ADMISSIBILIDADE, IMPEACHMENT, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, MOTIVO, AUSENCIA, CRIME DE RESPONSABILIDADE, ACUSAÇÃO, TENTATIVA, GOLPE DE ESTADO.

    O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Apoio Governo/PT - RJ. Para discutir. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, as elites deste País nunca tiveram compromisso verdadeiro com a democracia. Repito de outra forma: as elites deste País jamais tiveram compromisso democrático. Basta olhar a nossa história, olhar para Getúlio, olhar para Juscelino Kubitschek, olhar para João Goulart. A frase de Carlos Lacerda está na história: “Getúlio não pode ser candidato; se for, não pode ser eleito; se eleito, não pode tomar posse; se tomar posse, não pode governar.” E a gente sabe o que fizeram com Getúlio, principalmente depois que ele criou a Petrobras, em 1953, e o monopólio estatal do petróleo. A história todos sabemos como terminou.

    Mas, com Juscelino Kubitschek, foi a mesma coisa: venceu a eleição em 1955; argumentaram que ele não conquistou maioria absoluta, e queriam impedir Juscelino Kubitschek de tomar posse. Se não fosse o General Lott, que era Ministro da Guerra, que tivesse se antecipado, eles não teriam permitido a Juscelino Kubitschek tomar posse.

    Depois, acusaram Juscelino e queriam o seu impeachment por ter tido o apoio do Partido Comunista, que era ilegal.

(Soa a campainha.)

    O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - A história de 1964 todo mundo conhece; a Marcha da Família com Deus pela Liberdade, antes do golpe de 1º de abril de 1964; aquela marcha, em São Paulo, com milhares de pessoas de classe média lutando contra a corrupção e contra o comunismo. E houve o golpe! E eles tentaram legitimar aquele golpe, como se fosse democrático, porque hoje todo mundo diz que foi uma ditadura, mas lá, naquele momento, não.

    Eu trago aqui a capa do Estado de S. Paulo do dia 2 de abril: “Vitorioso movimento democrático.” Era assim que eles tentavam legitimar o golpe.

    Trago a capa de O Globo do dia 2 de abril também. O que diz O Globo: “Empossado Mazzilli na Presidência. Ressurge a democracia.” Era assim que eles vendiam o golpe. Olhem aqui o editorial de O Globo:

Ressurge a Democracia.

Vive a Nação dias gloriosos. Porque souberam unir-se todos os patriotas, independentemente das vinculações políticas, simpatias ou opinião sobre problemas isolados, para salvar o que é essencial: a democracia, a lei e a ordem. Graças à decisão e ao heroísmo das Forças Armadas[...]

    Foi assim que a imprensa, que a mídia tentava legitimar um golpe como se fosse democrático. Mas não foi só a mídia, o Congresso Nacional, naquele dia que ficou conhecido como o Dia da Infâmia, o Presidente do Congresso Nacional, Senador Auro de Moura Andrade, declarou vago o cargo de Presidente da República quando o João Goulart estava no Brasil, estava em Porto Alegre - e vou falar depois do Senador Randolfe nesse caso.

    Naquele momento, Tancredo Neves - porque muitos não aprenderam com a lição de Tancredo Neves, mas Tancredo Neves sempre esteve contra os golpes; esteve com Getúlio, esteve com Juscelino, esteve com João Goulart -, sabe o que Tancredo Neves disse para Auro de Moura Andrade? “Canalha! Canalha!” Foi isso o que Tancredo Neves disse.

    E o Supremo Tribunal Federal? Sabe o que fez o então Presidente do STF, Alvaro Ribeiro da Costa? Foi ao Palácio do Planalto como Chefe do Poder Judiciário para legitimar a posse de Ranieri Mazzilli.

    Senhores, não se enganem! Eu quero falar aqui para cada Senador: eu não tenho a menor dúvida que, para a história do nosso País, isso aqui vai passar como um golpe parlamentar contra a democracia brasileira.

    Neste momento, os senhores têm de olhar para a história, têm de olhar para as suas biografias; não podem manchar sua biografia apenas pelo humor momentâneo porque, no seu Estado, a pesquisa de opinião está dando, no momento, que a maior parte quer o impeachment. Eu tenho certeza que esses humores mudarão e que a maioria da população em breve vai reconhecer este momento como momento de golpe contra a nossa democracia.

    Sr. Presidente, eu queria citar aqui um cientista político chamado Juan Linz, que é autor de um clássico: Autoritarismo e Democracia. Ele foi citado pelo Professor Geraldo Prado na Comissão do impeachment. Ele diz o seguinte: a tragédia das repúblicas acontece quando se perde o que ele chama de lealdade à Constituição. Diz ele que o que garante a estabilidade dos governos é a lealdade que a oposição tem à Constituição. Se a oposição não tem lealdade à Constituição, ela não garante processos justos e ela não garante a soberania popular. Abre-se assim um período de instabilidade e de crise política na República.

    Aqui, a oposição não teve lealdade à Constituição: 48 horas depois da vitória da Presidenta Dilma, o PSDB recorreu ao TSE pedindo auditoria especial na contagem de votos.

    Seis dias depois de a Presidenta Dilma vencer a eleição, fizeram um ato em São Paulo, com 2,5 mil pessoas, pedindo o impeachment da Presidenta Dilma. Depois, entraram na justiça, falando de fraude nas urnas eletrônicas. Depois de um papel ridículo - porque é ridículo -, pediu o PSDB para que fosse diplomado pelo TSE o Aécio no lugar da Presidenta Dilma.

    O fato é que eles decidiram antes que queriam afastá-la, decidiram antes que queriam seu impeachment, e foram atrás de fatos, e não acharam um fato que ferisse a honra da nossa Presidenta Dilma, porque eles reconhecem, na verdade, que a Presidenta Dilma é uma mulher honrada e uma mulher honesta.

    Foram para onde, então? Foram para pedaladas de 2015, decretos de créditos suplementares. Vamos falar a verdade aqui, eu participei de todo o debate na Comissão. Os senhores sabem que não há crime de responsabilidade. Estão votando a favor do impeachment, mas sabem que não há crime de responsabilidade.

    Presidente Renan, é um debate pobre. Eles estão querendo criminalizar qualquer possibilidade de política fiscal anticíclica. Um debate que, no mundo inteiro, é aberto, e está acontecendo aqui dessa forma. E eu falo que o PSDB no fundo se aliou com Cunha e Temer - porque esses são os capitães do golpe. Há capitães do golpe: o primeiro é Eduardo Cunha, Michel Temer e o Senador Aécio, que simboliza o PSDB nesse movimento.

    E o que eles queriam, Senador Jorge Viana? Eles diziam que, com esse movimento, eles achavam que iriam desmoralizar o PT e a esquerda. Não! Nós estamos aqui na luta, com altivez, sabendo que a Presidenta Dilma está sofrendo uma injustiça. Nós estamos lutando de cabeça erguida, sabe por quê? Porque nós temos uma causa. E sabe qual é a nossa causa? É inclusão, são os mais pobres. A nossa causa é o povo trabalhador.

    Eles sabem, nós não estamos... Estão afastando a Presidenta Dilma, não pelos nossos erros. Nós erramos! Nós tínhamos que ter feito a reforma política no primeiro ano do governo Lula, quando tínhamos força; nós deveríamos ter acabado com o financiamento empresarial no primeiro ano; nós deveríamos ter feito democratização dos meios de comunicação.

    Mas, Presidente Lula, eles querem fazer isso contra a Presidenta Dilma, por outros motivos. Eles não engolem o salário mínimo do trabalhador, eles não engolem o pré-sal, o regime de partilha que as multinacionais do petróleo nunca aceitaram. Presidente Lula, eles nunca aceitaram a política de cotas, ver essa juventude negra, da perifeira, estudando medicina nas universidades públicas brasileiras. Essa elite preconceituosa nunca engoliu o que nós fizemos com as empregadas domésticas, libertando desse regime de semiescravidão.

    Agora, há uma ironia da história, e a história é implacável. Não fomos nós. O maior derrotado nesse processo do impeachment se chama PSDB (Partido da Social Democracia Brasileira). É o maior derrotado. O Senador Aécio, em julho, tinha 35% das intenções de voto. Sabe quanto tem agora? Dezessete por cento. E sabe por que isso? Eles não tiveram coragem e altivez de demarcar campo com aqueles que defendiam a intervenção militar. Ficaram de braços dados com Bolsonaro. Não demarcaram um campo. Não demarcaram um campo com aqueles que, nas ruas, no campo dos valores, faziam um discurso preconceituoso, contra gays, contra lésbicas, um discurso machista, um discurso racista. Eles se perderam nisso tudo.

    Na verdade, estão acabando numa situação que é uma situação de sócio minoritário de um governo falido que vai ser esse governo de Michel Temer. Lamento, mas essa foi a postura, e eles abriram caminho para o fascismo aqui no País, com essa aliança que fizeram com esse pessoal.

    Agora, Sr. Presidente, por que existe esse golpe? O que eles querem com isso? Eles querem esse golpe por um motivo: eles querem, nessa crise, jogar a conta para ser paga pelos mais pobres e pelos trabalhadores.

    Paulo Skaf, da Fiesp: CPMF não. Você tem que mexer nos benefícios previdenciários, na política de valorização do salário mínimo. Está aqui: Uma ponte para o Futuro. Basta ler: fim da política de valorização do salário mínimo; terceirização; o negociado na frente do legislado - isso é rasgar a CLT -; fim das vinculações constitucionais à saúde e educação. Eles estão rasgando o legado do Lula, o legado de Ulysses Guimarães e o legado de Getúlio Vargas, Sr. Presidente. É isso que estão fazendo. Por que o golpe? Porque, com um programa como esse, nunca ninguém ganharia uma eleição presidencial.

    A restauração do neoliberalismo que eles querem só pode ser possível por um golpe, e foi assim. O primeiro país do mundo a aplicar o neoliberalismo foi o Chile, quando os economistas, discípulos de Milton Friedman, da Universidade de Chicago, foram para o Chile. Então é por isso que eles estão dando esse golpe aqui.

    Só quero... Finalizando, para concluir, Sr. Presidente, que nós vamos dizer aqui - nós sabemos o resultado de hoje. -, nós vamos fazer uma dura oposição, porque não vamos aceitar a retirada de direito de trabalhadores, não vamos aceitar perda dessas conquistas e dizemos também a esse que não vou me referir nunca como Presidente da República: nós não vamos reconhecer Temer como Presidente da República. Ele não passa de um golpista, um golpista, inclusive - a imprensa não divulga -, é o primeiro Presidente da história do País que vai assumir ficha suja inelegível. Está montando um Ministério com a cara da velha política. Nós não vamos reconhecer esse governo! É um governo fruto de um golpe. Michel Temer, por onde andar neste País, vai haver estudantes, professores, trabalhadores a levantar a voz e dizer: não aceitamos um governo com essas características.

    Acabo minha fala, Sr. Presidente...

    O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Apoio Governo/PT - PE. Fora do microfone.) - Tem dois minutos ainda. Manda pau!

    O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - Eu sei.

    Dirigindo-me novamente à Presidenta Dilma Rousseff. Eu quero me dirigir diretamente à Presidenta Dilma Rousseff, como fiz na Comissão: Presidenta Dilma Rousseff, saia amanhã daquele Palácio com a cabeça erguida, porque a história lhe absolverá com toda a certeza, como a história deu razão a Getúlio Vargas, como a história deu razão a Juscelino Kubitschek, como a história deu razão a João Goulart. Estão eles hoje no panteão dos heróis nacionais.

    Agora, eu pergunto: onde estão os Parlamentares que chancelaram aquele golpe? Como está o nome de Auro de Moura Andrade, de Ranieri Mazzilli, a que o Senador Randolfe, junto com o Senador Pedro Simon, teve a iniciativa fantástica, apoiado pelo Presidente Renan Calheiros, de anular aquela sessão vergonhosa do Congresso Nacional que deixou o cargo do Presidente João Goulart, que estava no Brasil, vago. Eles estão sabe onde, Sr. Presidente? Na lata do lixo da história.

(Soa a campainha.)

    Eu saio daqui com uma certeza... A nossa Bancada do PT, do PCdoB, do PDT - e eu vejo Senadores do PSB, da Rede -, nós vamos sair de cabeça erguida, nós vamos sair com muita força para continuar a nossa luta. E falo para a nossa militância, para as pessoas que estão nos Estados: a luta está só começando, pessoal. Não vamos desistir. Nós perdemos uma batalha, mas nós temos muita luta pela frente.

    E digo mais, eu tenho uma certeza: esse governo do Temer vai ser um governo de crise, um governo que vai retirar direitos dos trabalhadores. Se a popularidade dele... Porque a popularidade dele hoje é a seguinte: de 1% a 2% aprovam o possível governo Michel Temer; 58% rejeitam. Eu conheço este Senado Federal. Não durará. Daqui a três ou quatro meses, na hora do julgamento definitivo, nós colocaremos Temer, esse impostor, para fora do Palácio do Planalto.

    Muito obrigado. (Palmas.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/05/2016 - Página 117