Comunicação inadiável durante a 76ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentários acerca de possíveis semelhanças entre Marechal Deodoro da Fonseca e Michel Temer, Presidente da República em exercício.

Autor
João Capiberibe (PSB - Partido Socialista Brasileiro/AP)
Nome completo: João Alberto Rodrigues Capiberibe
Casa
Senado Federal
Tipo
Comunicação inadiável
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Comentários acerca de possíveis semelhanças entre Marechal Deodoro da Fonseca e Michel Temer, Presidente da República em exercício.
Publicação
Publicação no DSF de 19/05/2016 - Página 20
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • COMENTARIO, POSSIBILIDADE, SEMELHANÇA, DEODORO DA FONSECA, MARECHAL, MICHEL TEMER, EXERCICIO, PRESIDENCIA DA REPUBLICA.

    O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - AP. Para uma comunicação inadiável. Sem revisão do orador.) - Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ouvintes da Rádio Senado, telespectadores da TV Senado, hoje vou começar lá detrás, colocando na roda do mundo presente o Marechal Deodoro da Fonseca, que, no dia 15 de novembro de 1889, liderou uma quartelada e destronou o amigo, o Imperador do Brasil Dom Pedro II.

    Senador Humberto, é aquele barbudo sisudo que aparecia nos compêndios de História quando éramos crianças. Dizem os historiadores que isso lhe aconteceu porque sua filha, a Princesa Isabel, contrariando a turma do agronegócio daquela época, assinou uma lei apelidada de Lei Áurea, que pôs fim à escravidão no Brasil. A turma do agronegócio daquela época não gostou.

    Um dia desses, ao saber que a primeira Constituição Republicana, a de 1891, tinha proibido o voto aos analfabetos, fiquei curioso, fui à cata de informação. Quis saber quantos eram os analfabetos que naqueles idos perderam os seus direitos políticos, em 1891. Vejam só que achado! Primeiro descobri que, no tempo do Brasil Colônia e durante quase todo o tempo do Império, eles votaram, os analfabetos. Verdade, era-lhes assegurado esse direito. Isso já me deixou ensimesmado, afinal passei um tempão da minha vida acreditando que a República era mais democrática que a Monarquia. Segundo, descobri que os letrados naquele período eram pouquíssimos! O censo demográfico de 1890, o segundo realizado no Brasil, revela-nos a existência de 14.333.915 milhões de brasileiros e brasileiras vivendo por essas belas paisagens tropicais.

    Desse total, informa-nos o censo que apenas 14%, ou seja, 2.006.748 de habitantes, eram alfabetizados - apenas 14% eram alfabetizados. Considerando que metade eram mulheres - portanto, sem direito a voto -, restaram apenas 1.003.374 ou 7% de homens letrados, todos brancos. Na primeira eleição popular, na primeira eleição pelo voto popular para Presidente da República, realizada em 1894, votaram 356.000 eleitores ou 2,2% da população. Prudente de Morais, sabe Deus como, deu um banho de votos em seus adversários, obtendo 290.883 votos ou 88,38%. É um banho de votos. Acho que nunca mais aconteceu isso. Agora, como ele fez isso só Deus sabe. Bom, eu digo Deus, mas a história conta.

    Pois bem, foram esses poucos homens brancos e letrados que se ocuparam da vida política. Foram eles e somente eles que, zelosamente, organizaram a governança da Nação brasileira, para si e para os seus, excluindo os demais. Não é de se admirar que até hoje se sintam senhores absolutos dos anéis...

(Interrupção do som.)

    O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - AP) - Não é de se admirar que até hoje se sintam senhores absolutos dos anéis, com direito a se apropriar do que é público de maneira privada, como se tivessem ordenamento divino para assim proceder.

    No entretempo que se estende do final do século XIX aos nossos dias, tendo o Marechal Deodoro como marco inicial, exaltando a ordem e o progresso na alvorada da República, e, na outra ponta, na ponta de hoje, Michel Temer, ameaçando pôr ordem no progresso, muita água rolou por debaixo da ponte. Nesse ínterim, os excluídos foram à luta. As mulheres, Srª Presidente, em 1932, conquistaram direitos políticos plenos, passaram a votar e ser votadas. Já os analfabetos tiveram que aguardar, digamos assim, um pouco mais, cerca de meio século depois das mulheres, para influenciar os destinos da Nação, ainda assim, meia boca, pois a Emenda Constitucional nº 25, de 15 de maio de 1985 - não faz tempo -, garantiu-lhes o direito de votar, mas não o de ser votado. Vejam só, isso se passou 97 anos depois da abolição da escravatura - 97 anos depois, com relação aos analfabetos - e, como se sabe, os escravos excluídos da política atravessaram o século XX, os negros.

    Nos últimos dias, pelo menos eu, noto um aperto de mão inusitado entre Temer e Deodoro. A aproximação não fica apenas no slogan coincidente, exaltando a ordem e o progresso. Sem muito esforço, outras afinidades serão identificadas. Por exemplo, o Marechal não queria ver mulher por perto, pelo menos compondo sua equipe ministerial. É, sim, Presidenta, nenhuma mulher na equipe ministerial do Marechal Deodoro da Fonseca. Temer, sem tirar nem pôr, imitou o presidente militar nesse quesito, com uma diferença: ele admite que elas sejam belas, recatadas e do lar.

    Não são poucas as semelhanças, a começar pelos atalhos para chegar ao Poder. Tanto um como o outro não precisaram de votos para sentar-se no trono de ferro da Presidência, ou no trono dourado da Presidência, enfim. O Marechal, além do apoio irrestrito da poderosa oligarquia rural da época, que jamais perdoou o imperador por tê-los deixado sem seus escravos, dispunha de outro argumento convincente: a força das armas. Nesse aspecto, Temer se diferencia, não precisou delas - menos mal. No entanto, contou e conta com o irrestrito apoio do mesmo setor social que seu colega sem voto do passado obteve. Também recebeu integral apoio, a adesão da sua representação política aqui do Parlamento, daqueles que hoje certamente não pretendem, claro, revogar a Lei Áurea, mas tentarão por todos os meios fragilizar direitos sociais e trabalhistas, regras ambientais, impedir as investigações sobre corrupção em curso e se preparam para avançar sobre as Terras Indígenas.

    São tantas as semelhanças entre Deodoro e sua turma, lá do século XIX, e a turma do Temer, aqui do século XXI, que fico sem entender quem cruzou a barreira do tempo, se o Marechal, que chegou de volta ao futuro, ou o Temer, que mergulhou profundamente no passado.

    Fica aí a dúvida com os senhores e as senhoras.

    Muito obrigado, Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/05/2016 - Página 20