Pronunciamento de José Medeiros em 11/05/2016
Discussão durante a 71ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal
Defesa da admissibilidade do processo de impeachment da Presidente Dilma Rousseff, em razão das "pedaladas fiscais" e da publicação de decretos federais para abertura de crédito suplementar sem autorização do Congresso Nacional; comentários sobre a situação política e social do país, e críticas à conduta da Presidente da República.
- Autor
- José Medeiros (PSD - Partido Social Democrático/MT)
- Nome completo: José Antônio Medeiros
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discussão
- Resumo por assunto
-
GOVERNO FEDERAL:
- Defesa da admissibilidade do processo de impeachment da Presidente Dilma Rousseff, em razão das "pedaladas fiscais" e da publicação de decretos federais para abertura de crédito suplementar sem autorização do Congresso Nacional; comentários sobre a situação política e social do país, e críticas à conduta da Presidente da República.
- Publicação
- Publicação no DSF de 12/05/2016 - Página 24
- Assunto
- Outros > GOVERNO FEDERAL
- Indexação
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- DEFESA, ADMISSIBILIDADE, IMPEACHMENT, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, ILEGALIDADE, PUBLICAÇÃO, DECRETO FEDERAL, OBJETIVO, ABERTURA, CREDITO SUPLEMENTAR, AUSENCIA, AUTORIZAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, DESCUMPRIMENTO, LEI FEDERAL, REFERENCIA, ATRASO, PAGAMENTO, BANCOS, MOTIVO, REPASSE, BENEFICIO, PROGRAMA DE GOVERNO, COMENTARIO, SITUAÇÃO, POLITICA NACIONAL, CRITICA, CONDUTA, PRESIDENTE.
O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - MT. Para discutir. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, cidadãos e cidadãs brasileiras, a presente sessão tem por objeto o exame de admissibilidade da denúncia oferecida contra a Presidente Dilma Rousseff por crimes de responsabilidade. Em outras palavras, o que compete ao Senado Federal julgar no dia de hoje é a existência de indícios suficientes, e não exatamente de provas prontas e acabadas de que a Presidente da República cometeu crime de responsabilidade quando abriu créditos suplementares sem a autorização do Congresso Nacional e quando passou a contrair dívidas com bancos públicos, indícios esses que, caso conhecidos por esta Casa, permitirão o prosseguimento do processo até o julgamento final de mérito.
Portanto, como em todo processo de impeachment, o presente debate gira em torno da responsabilidade, mais precisamente daquele tipo de responsabilidade que, numa República, se põe como pressuposto para todo e qualquer exercício de poder. E é exatamente por estar ligada ao poder que a figura da responsabilidade reveste-se, neste processo, de caráter essencialmente político, não propriamente penal ou criminal, ainda que o noticiário nacional, nos últimos tempos, tenha sido tomado pelas mais repugnantes notícias de corrupção e de sofisticados esquemas de desvio de dinheiro público por parte do Governo. Mas não é isso que estamos aqui a julgar.
Srªs e Srs. Senadores, brasileiras e brasileiros, faço essa observação inicial, pois acredito que, antes de qualquer outra coisa, é preciso deixar muito claro para o povo brasileiro que os tempos atuais são tão difíceis quanto democráticos. Com isso, eu quero dizer que é preciso aqui jogar o jogo da verdade com a consciência coletiva da Nação, sem chicana, sem manobras. Mais do que isso, é preciso enfatizar até não poder mais que se está jogando o jogo da verdade constitucional, que este Parlamento não tem, em hora alguma, arredado pé dos trilhos democráticos traçados soberanamente pela nossa Constituição da República, ainda que alguns tenham ido mundo afora - foram até o Papa - dizer que aqui existe um golpe. Mas não é o que acontece.
Isso tudo, Srªs e Srs. Senadores, naquela linha da mulher de César, a quem não compete ser só honesta, tem que parecer honesta sempre.
Pois bem, a dificuldade dos tempos atuais é evidente e de sabença generalizada. Nem mesmo se quiséssemos conseguiríamos dourar a pílula ou, ao contrário, poderíamos artificializar ou inflar os problemas. A realidade se impõe e é soberana. E o cenário atual não é outro senão de uma terrífica mescla de crise econômica e política. Esse é o momento: estamos numa terrível crise econômica e política.
Senhoras e senhores que nos acompanham em todo o Brasil, já não é de agora que testemunhamos a deterioração dos nossos pilares econômicos. Estamos em plena recessão. Nossa economia tem se retraído, diminuído, e menos riquezas têm sido geradas no País. O desemprego e a inflação, por suas vezes, parecem ter dado as mãos numa escalada da mais alta crueldade com o povo brasileiro, que a cada dia perde fonte de renda e poder de compra.
Quando todas essas manobras são feitas aqui no plenário, feitas na Casa coirmã, pela Base do Governo, essas pessoas não entendem o que está acontecendo nas ruas.
Há uma verdadeira irritação nas pessoas, porque, enquanto esse processo se delonga, a economia derrete e os empregos ficam cada vez mais escassos. Essas, Srªs e Srs. Senadores, são circunstâncias que não dá para esconder.
A crise política não fica atrás. Em verdade, o caos econômico bem revela a inaptidão do Governo para ditar os rumos do País. Essa é que é a verdade. O Governo acabou e está parado há mais de ano.
E olhem que a Presidente Dilma ultrapassou os limites já alargados do presidencialismo de coalizão. Sempre na linha de que os fins justificam os meios, tentou-se de tudo: foram liberadas emendas por decreto e a toque de caixa para alteração da meta fiscal; organizou-se uma verdadeira dança das cadeiras no comando da articulação política; fez-se reforma ministerial por encomenda, com delivery de cargos à minguada Base aliada, em total desrespeito à Nação; Ministros saiam dos Ministérios a toda hora, até para fazer votação e voltar, um desrespeito total. Contudo, nem em uma perspectiva pragmática, a estratégia deu o retorno esperado. O Governo continuou a experimentar o dessabor de frequentes derrotas neste Parlamento. A toda hora, apregoavam a paz, e, então, vinha repentina destruição.
O fato é que o Governo continuou a não funcionar; revelou-se uma verdadeira tragédia, sem conseguir apontar os rumos e saídas para os problemas nacionais, muitos dos quais ele próprio criou; permaneceu, enfim, num estado de paralisia típica das lideranças desprovidas de legitimação popular substancial.
Nesse ponto, nobres colegas, não se pode negar que todo processo de legitimação política começa pelo voto, pelo sufrágio, pelas eleições, mas a sua consolidação se dá mesmo pela conquista permanente da confiança da população e, principalmente, pelo desempenho escorreito do poder. Daí se falar em legitimidade pelo exercício da função, que é aquela legitimidade posta à prova todos os dias, permanentemente, pois a nenhum governo é dado o direito de desviar-se, nem por um milímetro, da ordem constitucional, sem que o voto se traduza em uma espécie de blindagem ou salvo-conduto para que o governo eleito dê as costas para a Constituição. Dizer que 54 milhões de votos dão legitimidade à Presidente para fazer o que quiser não é verdade. A Presidente está adstrita a cumprir, ela está debaixo do guarda-chuva legal deste País, ao qual tem, no ápice, a Constituição Federal. É somente debaixo da Constituição que se percorre o mandato presidencial, tanto é assim que lá estão as figuras do crime de responsabilidade e do impeachment.
Nessa medida, Srªs e Srs. Senadores e demais brasileiros e brasileiras, a retórica de que haveria um golpe em curso não para em pé, não resiste a um minuto sequer de conversa séria e comprometida com o bem do País. Onde já se viu golpe num ambiente de imprensa livre, com pessoas nas ruas, intensa movimentação nas redes sociais e nos diversos foros de debates políticos e parlamentares, com plena possibilidade de atuação?
Como se falar em golpe, num quadro de normalidade institucional e de cidadania plenamente ativada? Como se falar em golpe, quando várias comissões foram montadas, quando houve liberalidade além do que pedia a lei? Mesmo agora, no início desta sessão, o Presidente, tendo toda paciência, dá amplo direito até para chicanas. Extrapolaram o direito de defesa.
Bem pensadas as coisas. Esse discurso de golpe apenas demonstra um novo episódio de irresponsabilidade institucional do Governo, que prefere inflamar aqueles que ainda lhe apoiam. Em vez de buscar acalmar os ânimos e debater com substância o mérito das imputações, apenas inflama o País, apenas busca irritar.
Essa tática do tumulto, da falácia ou da cortina de fumaça talvez se explique pela contundência da denúncia oferecida pelos juristas Miguel Reale, Janaina Paschoal e Hélio Bicudo. Estão lá muito bem descritas as aberturas de crédito suplementar sem autorização legislativa, bem como as pedaladas fiscais.
No primeiro ponto, dos decretos, o que se tem são evidências claras de que a Presidente Dilma pretendeu aumentar ou turbinar dotações orçamentárias sem que estivesse cumprindo a lei, a meta fiscal prevista na Lei de Diretrizes Orçamentárias. Vale dizer, o Governo já gastava mais do que a lei autorizava e decidiu gastar mais. Houve por bem suplementar gastos, que já eram excessivos, e, o que é pior, sem que pedisse autorização necessária para fazer isso. Teria que pedir autorização ao Parlamento, como determina a Constituição. Um acinte! De uma só vez, o Governo afrontou regras essenciais às finanças públicas e à própria separação dos Poderes.
Já as pedaladas significam nada mais nada menos do que a tentativa de esconder esse excessivo e ilegal gasto. Com as pedaladas, o Governo tentou varrer a sujeira para debaixo do tapete, contraindo, e não contabilizando, dívidas ilegais com bancos públicos. Desse modo, o Governo transferia sorrateiramente alguns dos seus encargos aos bancos públicos, que passavam a pagar por eles. Escondia, dessa forma, sua real situação de penúria fiscal, o que já é bastante para indicar que esse Governo solapava as bases da nossa economia e, mais do que isso, enganava descaradamente o povo pela maquiagem das contas.
Acontece que essas manobras espúrias e irresponsáveis não foram descritas e debatidas somente na denúncia. Não. Elas foram amplamente discutidas na Câmara dos Deputados, debaixo de regras e procedimentos fixados pelo STF, pelo Supremo Tribunal Federal. Houve manifestação de defesa na Comissão Especial e na sessão plenária da Câmara. Com a autorização acachapante dada pelos Deputados, formou-se aqui também uma Comissão Especial. Diferentemente do caso Collor, a Comissão do Senado ouviu e questionou a acusação, especialistas indicados por ambas as partes e, por duas vezes, o Advogado-Geral da União.
Por fim, como resultado dos trabalhos, a Comissão aprovou, pela sintomática maioria de dois terços de seus membros, o brilhante relatório do Senador Antonio Anastasia, este Parlamentar que concilia magistralmente o mais alto saber jurídico com a mais aflorada vocação política.
Por isso, parabenizo-o novamente, nobre Relator, pelo trabalho profícuo que produziu, ao mesmo tempo em que estendo os parabéns ao Presidente da Comissão, que tão bem conduziu os trabalhos.
O Senador Anastasia enfocou todos os pontos controvertidos.
O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. PMDB - AL) - Só para permitir o planejamento de V. Exª, V. Exª dispõe de um minuto e quarenta segundos.
O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - MT) - Estarei dentro do tempo, Presidente.
Foi minudente e preciso, Senador Anastasia. O seu relatório foi impecável. Era necessário um Parlamentar da sua estatura conduzindo aqueles trabalhos. A necessidade de se admitir a denúncia contra a Presidente Dilma ficou cabal em seu relatório.
Senhoras e senhores, atendido o figurino legal, traçado pelo Supremo, chegamos a este momento decisivo; decisivo pois significará, com a admissibilidade da denúncia, o afastamento da Presidente Dilma.
(Soa a campainha.)
O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - MT) - Por um lado, não podemos ignorar a responsabilidade política envolvida num ato dessa magnitude. Por outro, devemos manter a consciência tranquila de que não chegamos a este ponto de um dia para outro, não fomos açodados no reconhecimento do problema e no encaminhamento da resposta adequada.
Recordo-me do artigo publicado no Estadão, há um ano, pelo ex-Ministro Ayres Britto, cujo título já veiculava uma advertência: "Reinventa-te ou te devoro", dizia o texto, numa paráfrase do famoso enigma da esfinge. Já naquele momento se reconhecia a necessidade de a Presidente elevar-se de Presidente a líder.
Mas, Sr. Presidente, é nos marcos da Constituição da República que esse processo se encerra, e, neste momento, esta Casa cumpriu todos os requisitos de que precisava. Prezaremos, com certeza, pela lei e aqui deixamos claro para a Nação que o processo foi bem conduzido.
Por isso, encaminho e declaro que vou votar pelo afastamento da Presidente da República.