Discurso durante a 75ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Preocupação com as políticas adotadas pelo Governo interino do Presidente Michel Temer e suas consequências.

Elogio ao ex-Presidente Lula e à Presidente Dilma Rousseff, em especial ao destacado combate à corrupção, e registro de reportagem do The New York Times sobre membros do Congresso Nacional suspeitos de crimes responsáveis pelo julgamento do processo de impeachment.

Autor
Humberto Costa (PT - Partido dos Trabalhadores/PE)
Nome completo: Humberto Sérgio Costa Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Preocupação com as políticas adotadas pelo Governo interino do Presidente Michel Temer e suas consequências.
ATIVIDADE POLITICA:
  • Elogio ao ex-Presidente Lula e à Presidente Dilma Rousseff, em especial ao destacado combate à corrupção, e registro de reportagem do The New York Times sobre membros do Congresso Nacional suspeitos de crimes responsáveis pelo julgamento do processo de impeachment.
Aparteantes
Hélio José.
Publicação
Publicação no DSF de 18/05/2016 - Página 71
Assuntos
Outros > GOVERNO FEDERAL
Outros > ATIVIDADE POLITICA
Indexação
  • CRITICA, MEDIDAS ADMINISTRATIVAS, GOVERNO FEDERAL, EXERCICIO, MICHEL TEMER, PRESIDENTE DA REPUBLICA, INTERINO, MOTIVO, AUSENCIA, MULHER, NEGRO, CARGO, MINISTRO DE ESTADO, EXTINÇÃO, PREVIDENCIA SOCIAL, MINISTERIO, CULTURA, PAGAMENTO, UNIVERSIDADE FEDERAL, REDUÇÃO, SISTEMA UNICO DE SAUDE (SUS), PROGRAMA ASSISTENCIAL, PROGRAMA MINHA CASA MINHA VIDA (PMCMV), REVOGAÇÃO, DECRETO FEDERAL, AUTORIA, DILMA ROUSSEFF, DESTINAÇÃO, FAMILIA, BAIXA RENDA, COMENTARIO, DESAPROVAÇÃO, GOVERNO, AMBITO INTERNACIONAL.
  • ELOGIO, GESTÃO, LUIZ INACIO LULA DA SILVA, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, DILMA ROUSSEFF, GOVERNO FEDERAL, ENFASE, COMBATE, CORRUPÇÃO, REGISTRO, ARTIGO DE IMPRENSA, PERIODICO, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), THE NEW YORK TIMES, ASSUNTO, CRITICA, MEMBROS, CONGRESSO NACIONAL, RESPONSABILIDADE, JULGAMENTO, IMPEACHMENT, PRESIDENTE DA REPUBLICA.

    O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Apoio Governo/PT - PE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srª Senadora, Srs. Senadores, telespectadores da TV Senado, ouvintes que nos acompanham pela Rádio Senado, o Brasil acordou mais uma vez escandalizado com as trágicas políticas adotadas pelo Governo interino do golpista Michel Temer. Ontem vi aqui alguns Senadores nos pedirem calma porque é um Governo que está apenas começando - e vai acabar logo, tenho certeza - e que, pelo fato de ter somente cinco dias, nós deveríamos ter mais condescendência. Vi ontem alguns Senadores que pediram essa condescendência.

    Mas que condescendência nós temos que ter com um governo que, em sendo interino, tem a proeza de, em menos de uma semana, cortar a presença de mulheres e negros nos ministérios; extinguir a Previdência Social, jogando aposentados e pensionistas em profunda incerteza; acabar com o Ministério da Cultura; colocar em risco os direitos dos indígenas e dos quilombolas; propor cobrança de mensalidade em universidades públicas; desmontar órgãos de controle, como a CGU; propor a recriação da figura do engavetador-geral da República; e, nesta terça-feira, vem assombrar os brasileiros com a revogação de atos do Minha Casa, Minha Vida e com a informação de que pretende reduzir o Sistema Único de Saúde e eliminar em até 30% o número dos beneficiários do Bolsa Família?

    Como ter condescendência com essa junta provisória, cujos primeiros atos se assemelham a um roteiro de filme de terror? O que querem os seus defensores?

    Aliás, eu não os vejo aqui, Senador Randolfe, Senador Armando Monteiro. Até hoje, desde ontem, eu não vi nenhum defensor do Governo aqui assumir o apoio a essas medidas esdrúxulas.

    O que é querem os defensores deste Governo? Que nós silenciemos até que todas as políticas públicas que retiraram o Brasil de um atraso secular e de uma miséria desumana sejam destruídas por completo? Não, nós não vamos nos calar, porque não haverá transigência com o desmonte do Estado que está sendo perpetrado por este Governo nefasto.

    Vejam, por exemplo, o que diz hoje o Ministro da Saúde, Ricardo Barros, o mesmo Parlamentar que, como Relator do Orçamento Geral da União no ano passado, quis cortar 40% dos recursos do Bolsa Família. Ele diz que o Brasil, a partir de Michel Temer, não tem jeito: vai ter de suprimir direitos constitucionais dos cidadãos. Olhem bem: o Ministro da Saúde de Temer diz que, a partir de agora, direitos assegurados pela Constituição Federal de 1988 serão retirados. Entre eles, o acesso e a cobertura universais ao sistema de saúde, à saúde, na verdade. Ou seja, o Ministro da Saúde deste Governo golpista vem anunciar o início do fim do SUS.

    E ele diz o seguinte - abro aspas: "Quanto mais gente puder ter planos de saúde, melhor, porque vai ter atendimento patrocinado por eles mesmos, o que alivia o custo do Governo em sustentar essa questão" - fecho aspas.

    Observem bem a visão do Ministro: "Quanto mais gente pagar plano de saúde, melhor." O cidadão paga imposto não para melhorar o sistema público, mas para depender de um plano privado. Essa é a lógica do governo ilegítimo que muitos ajudaram a chegar, sem voto, ao Palácio do Planalto.

    E não admira que o Ministro da Saúde tenha essa visão em favor dos planos privados. Então, ele acaba atendendo a Michel Temer, que propôs, naquele entulho ideológico chamado Ponte para o Futuro, o que classifica como reorganização do SUS.

    É um escárnio completo. O Ministro diz ainda - abro aspas: "A Constituição só tem direitos, não tem deveres. Não vamos conseguir sustentar o nível de direitos que lá existem. Vamos ter que repactuar, como aconteceu na Grécia, que cortou as aposentadorias" - fecho aspas. Vejam bem: este é um Governo que fala em corte de aposentadorias, e o Ministro da Saúde diz que, no fundo, essa questão do fim do SUS não é com ele. "São assuntos da área econômica em que não quero interferir", entende Ricardo Barros.

    Então, é um escândalo. É a destruição, a passos largos, de anos de políticas sociais exitosas, é a marcha acelerada do retrocesso que mostra a sua mais perversa face, que entrega nas mãos dos tecnocratas políticas sociais sensíveis.

    Em vez de fortalecer o SUS, garantir a manutenção de todas as conquistas e buscar novas, promovendo uma interação equilibrada entre os setores público e privado, este Governo chega para destruir o primeiro em favor do segundo, deixando à míngua mais de 150 milhões de brasileiros que hoje são dependentes unicamente do SUS.

    É uma vergonha! E vai na contramão de tudo que acontece hoje em termos internacionais. Até mesmo nos Estados Unidos, um país cuja seguridade social sempre se caracterizou por um padrão liberal, na área da saúde, nós tínhamos mais de 25% da população sem qualquer tipo de atendimento à sua saúde, porque não podiam pagar planos de saúde e não eram pobres nem idosos o suficiente para poderem usufruir do sistema público de atendimento aos mais pobres e aos mais velhos. Portanto, 25% morriam praticamente à míngua. No entanto, no Governo Obama, com a implantação do chamado ObamaCare, todos os norte-americanos passaram a ter direito a um plano de saúde subsidiado pelo Governo.

    É, pela via americana, a chegada a um sistema universal. E nós, que lutamos tanto por um sistema universal, vemos agora o único que não poderia defender isso, que é exatamente o Ministro da Saúde, defender que nós passemos para um sistema com limitações ao acesso universal à saúde da população, Sr. Presidente.

    O Sr. Hélio José (PMDB - DF) - Nobre Senador, depois, eu queria um aparte, por gentileza.

    O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Apoio Governo/PT - PE) - Agradeço a V. Exª.

    O Sr. Hélio José (PMDB - DF) - É realmente lamentável uma atitude como essa. É inadmissível, por sinal. O SUS é uma grande conquista dos brasileiros, e acho que de todos nós. E falo como Senador do PMDB. Todos nós temos que unir forças e não permitir, jamais, um retrocesso dessa monta. Acho que o Presidente em exercício atualmente, Temer, não concordará com uma atitude como essa do Ministro. Acho que temos que fazer audiências públicas, deixar claros discursos como esse de V. Exª, porque essa é a voz do nosso povo brasileiro. Todo mundo depende do SUS para ter uma saúde mínima, inclusive os planos de saúde. Em relação a isso, nós devemos apresentar uma CPI aqui para poder discutir os planos de saúde que não cumprem aquilo que é contratado. Nós passamos essa míngua de ver amigos e colegas morrerem em filas por causa da enrolação de planos de saúde que vendem uma coisa e, depois, na hora de agir, não agem. O SUS é a única instituição que ainda nos socorre e dá uma atenção aos doentes do nosso País, principalmente da população pobre, das classes C, D e E. Não podemos admitir uma situação como essa. Então, quero colaborar com V. Exª, parabenizá-lo pela fala, dizer que todos nós precisamos fazer uma cruzada para frente em defesa do SUS e jamais permitir que essa sanha privatista ou que essa sanha destrutiva das conquistas brasileiras possa prevalecer neste momento tão importante que nós vivemos em nosso País.

    O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Apoio Governo/PT - PE) - Senador Hélio José, agradeço o aparte de V. Exª e o incorporo ao meu pronunciamento.

    Digo que, por exemplo, hoje, no Brasil, as desonerações na área da saúde somam, segundo estudos, um total próximo de R$20 bilhões por ano.

    Lógico que é importante que haja desonerações da Previdência Social para organizações filantrópicas. Consideramos que seja importante garantir, continuar a garantir para a classe média que ela possa deduzir, das suas declarações de Imposto de Renda, aquilo que gastam com planos de saúde ou com o pagamento direto do próprio bolso. Mas nós queremos que a população vá contrair, vá contratar toda ela planos de saúde para que o setor público gaste menos? É uma questão de prioridade, Sr. Presidente. Não estamos pedindo que haja uma estatização de todos os setores econômicos e da sociedade, mas as áreas públicas, as áreas sociais, as políticas sociais têm que ser garantidas e estendidas a todos como uma ação do Estado.

    Isso é o que nos difere exatamente da concepção liberal ou neoliberal. Nós entendemos que o Estado é importante existir para garantir condições de igualdade de oportunidades e garantir os direitos de cidadania mais elementares. Ele vai se desculpar, se desmentir. E aí fala uma coisa pior: cita a PEC apresentada pelo Deputado Eduardo Cunha, que propõe exatamente que as empresas sejam obrigadas, todas elas, a garantir plano de saúde para os seus empregados - não sei se nesse negócio aí já há alguma coisa que se consegue na hora da eleição, não sei. Conhecendo o Eduardo Cunha, tudo é possível -, mas, do ponto de vista de política de saúde, isso é um aborto, isso é um equívoco, isso é uma visão absolutamente atrasada.

    Ninguém é obrigado, sendo ministro de saúde, a conhecer tudo, a saber tudo da área da saúde, mas deve saber as coisas mais essenciais, como quais são os princípios do SUS. Por que é que neste País se garante atendimento a todo mundo? É porque o SUS só aparece naquilo em que há problemas. Mas as pessoas vão incorporando também ao seu cotidiano aquilo que é bom: o Farmácia Popular, que ele já disse que não pode continuar; o SAMU, para o qual ele já disse que não vai haver dinheiro; políticas como o Brasil Sorridente; a política das Upas; o Mais Médicos, que ele também já está dizendo que vai diminuir.

    A população, muitas vezes, não vê isso, as coisas que foram construídas. Ela está vendo a fila no hospital; ela está vendo o atendimento de urgência, que não está sendo bom. É verdade. Mas vamos nos lembrar que o Brasil é um dos primeiros países a garantir atendimento integral às pessoas com AIDS; um dos países que garantem medicamentos de alto custo para sua população. Às vezes no País existem duas, três centenas de pessoas que têm uma doença rara cujos medicamentos o SUS garante. Como é que nós vamos tirar recursos desse sistema porque o Governo, segundo ele, não tem dinheiro para colocar nesse sistema? Não, nós não vamos aceitar isso.

    E para aqueles da área da saúde, os usuários, os servidores, os movimentos sociais? Nós temos que nos erguer em uma grande rebelião contra isso. A última vez que falaram nisso foi no governo Fernando Henrique Cardoso, quando eles pensaram em mandar aqui para o Congresso Nacional uma emenda constitucional que substituiria o artigo da Constituição que diz que "a saúde é direito de todos e dever do Estado", para dizer: "A saúde é direito de todos e dever do Estado, segundo a lei." Ou seja, procurava relativizar o Direito Constitucional e subordiná-lo a uma lei com menor poder que a Constituição.

    Não que não haja exageros, que não haja absurdos, sim, é possível se discutir. Todo sistema universal tem as suas limitações, estabelece o que deve ou o que não deve ser garantido a todos, mas isso é feito de maneira pontual. Não se pode discutir, como princípio formador do sistema, a mudança da universalidade.

    O Minha Casa, Minha Vida é outra vítima. Hoje também duas portarias do Ministério das Cidades revogaram R$300 milhões destinados, pela Presidenta Dilma Rousseff, ao financiamento direto de moradias para famílias de baixa renda organizadas em cooperativas habitacionais ou associações sem fins lucrativos.

    Das duas, uma: ou o Ministro já começou prejudicando Pernambuco, porque Pernambuco tinha 836 dessas casas para Jaboatão, para Petrolina, para Lagoa do Ouro, para Recife; ou, então, ele já quer jogar isso para que as empresas venham a fazer, demonstrando uma absoluta e total falta de compreensão do que é o modelo do Minha Casa, Minha Vida.

    Nenhuma empresa vai construir casa nos distritos, no interior, porque economicamente não traz retorno. Por isso as comunidades se organizam, entidades se organizam, sindicatos se organizam para produzir quase artesanalmente casas da maior qualidade. E eu tive a oportunidade de conhecer várias dessas casas. Mas aí, qual é a ideia? Não, aí é CUT, é PT - PT não, partidos não podem -, MST, Fetape, é não sei o quê. Mostrando claramente que querem começar a desmontar...

    (Soa a campainha.)

    O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Apoio Governo/PT - PE) - ... também esse sistema habitacional tão importante.

    Eu nunca vi um governo, ainda que interino como este, oferecer um pacote de misérias tão absurdas à população em tão pouco tempo. Parece até que contrataram assim: "Vamos fazer o mal! Escolha ministros, secretários, assessores especializados em fazer o mal!". Se eles tivessem tomado essa decisão, não teriam conseguido fazer tão bem o mal que fizeram em menos de uma semana de Governo.

    O que vale é que o povo não vai ficar calado com isso. É maldade atrás de maldade. A gente toma conhecimento pela manhã e, logo à tarde, os próprios autores ou o chefe correm para tentar desmentir, desfazendo o mal-estar. A gente até acha que é uma versão renovada daquele programa Os Trapalhões que anda sendo gravada, tão grande é o bate cabeça dentro da junta provisória.

    Não é à toa que o nosso País, que chegou a uma grande dimensão mundial a partir do Presidente Lula e a uma destacada atuação contra a corrupção, reconhecida internacionalmente no Governo da Presidenta Dilma, vira agora motivo de ridicularia global.

    Uma reportagem, de hoje, do The New York Times chama este Congresso Nacional de circo onde se encontram suspeitos de homicídio, de narcotráfico e de pedofilia. E pontua que uma Casa nessas condições morais foi a responsável pela remoção de Dilma Rousseff da Presidência da República.

    A relatora especial da ONU sobre direitos indígenas, Victoria Tauli-Corpuz, das Filipinas, criticou a extinção da Secretaria de Direitos Humanos e do Ministério da Cultura e apontou preocupação com o fato de interesses da elite brasileira serem beneficiados em detrimento dos direitos dos povos indígenas. E alertou para o risco de violências, violações de direitos e, inclusive, efeitos etnocidas.

    Em Cannes, durante o Festival Internacional de Cinema, a equipe e o elenco do filme Aquarius, filme do diretor pernambucano Kleber Mendonça, forte concorrência à Palma de Ouro, denunciaram hoje ao mundo o golpe pelo qual passa este País e a humilhação imposta à nossa jovem democracia.

    De forma que não há acordo, não há condescendência com este Governo interino, autor de um roteiro das páginas mais tristes que este País já viveu na sua história recente.

    Vamos bradar, seja neste Congresso Nacional, seja nas ruas, contra as atrocidades e aberrações que esses golpistas cometeram antes e que, tomado o poder de assalto, insistem em cometer contra o Estado democrático de direito e contra a população brasileira.

    Muito obrigado pela tolerância, Sr. Presidente. Muito obrigado, Srs. Senadores, Srªs Senadoras.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/05/2016 - Página 71