Pronunciamento de Gleisi Hoffmann em 20/05/2016
Discurso durante a 78ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal
Relato da participação da delegação brasileira de parlamentares no encontro da Assembleia Parlamentar Euro-Latino-Americana (EuroLat), em Portugal, e defesa do posicionamento de alguns senadores que repudiaram publicamente o processo de impeachment da Presidente Dilma Rousseff.
Crítica a Michel Temer, Presidente da República em exercício, por propor alterações substanciais em programas de governo.
- Autor
- Gleisi Hoffmann (PT - Partido dos Trabalhadores/PR)
- Nome completo: Gleisi Helena Hoffmann
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
GOVERNO FEDERAL:
- Relato da participação da delegação brasileira de parlamentares no encontro da Assembleia Parlamentar Euro-Latino-Americana (EuroLat), em Portugal, e defesa do posicionamento de alguns senadores que repudiaram publicamente o processo de impeachment da Presidente Dilma Rousseff.
-
PODER EXECUTIVO:
- Crítica a Michel Temer, Presidente da República em exercício, por propor alterações substanciais em programas de governo.
- Publicação
- Publicação no DSF de 21/05/2016 - Página 13
- Assuntos
- Outros > GOVERNO FEDERAL
- Outros > PODER EXECUTIVO
- Indexação
-
- REGISTRO, PARTICIPAÇÃO, GRUPO PARLAMENTAR, ORIGEM, BRASIL, CONFERENCIA, PARLAMENTO, AMERICA LATINA, EUROPA, DEFESA, DEPOIMENTO, GRUPO, SENADOR, ASSUNTO, PROCESSO, IMPEACHMENT, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, APOIO, GOVERNO FEDERAL, LIDERANÇA, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT).
- CRITICA, COMENTARIO, AUTORIA, MICHEL TEMER, PRESIDENTE DA REPUBLICA, INTERINO, MOTIVO, ALTERAÇÃO, PROGRAMA DE GOVERNO, GOVERNO FEDERAL.
A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Apoio Governo/PT - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, quem nos ouve pela Rádio Senado, quem nos acompanha pela TV Senado, meu bom dia.
Eu queria começar, Sr. Presidente, por onde V. Exª terminou: a participação da delegação brasileira de Parlamentares, tanto de Senadores como de Deputados, no encontro da EuroLat, em Portugal, o encontro dos Parlamentos europeus e latino-americanos, um evento importante, que se realiza sempre, para discutir questões que estão afetando as relações internacionais e também problemas comuns aos países. Foi importante - não tenho dúvida nenhuma - a presença da delegação brasileira, até porque quem preside o componente latino-americano do EuroLat é o Senador Roberto Requião, um Senador brasileiro.
Eu queria dizer a V. Exª, Senador José Medeiros - estávamos já discutindo isso quando V. Exª aqui se pronunciava -, e também aos demais Senadores e a quem nos ouve que a delegação brasileira, ou parte dela, eu diria a maior parte dela, não foi a Portugal apenas para denunciar o golpe ou falar da situação brasileira, do que se está desenvolvendo no nosso País. Fomos lá, sim, para falar sobre isso, não podíamos deixar de falar sobre isso. Só que, chegando lá, não precisamos de esforço algum para tocar nesse tema. Todos nos perguntavam o que acontecia no Brasil, o que estava acontecendo em relação ao nosso Governo, ao afastamento da Presidenta Dilma e o porquê desse processo de impeachment, sendo que as pessoas tinham questionamento sobre o fundamento do impeachment.
Dizer que não podemos falar da situação brasileira em eventos internacionais ou que não podemos falar para o mundo sobre as questões que aqui acontecem e, inclusive, denunciar o que nós avaliamos ser incorreto e o que fere a nossa democracia não é propício, até porque a democracia brasileira, o que acontece no Brasil interessa ao mundo, interessa aos outros países, particularmente interessa à América Latina.
Nós temos uma história no Brasil que preocupa o mundo em termos de consolidação da democracia. Nós não vivemos uma democracia plena durante a nossa história. Nós vivemos períodos democráticos intercalados com períodos em que a democracia não foi respeitada ou por uma ditadura militar ou por governos que desrespeitavam a maioria. Então, é óbvio que, se acontece algo no Brasil que é fora da normalidade, isso preocupa, sim, os demais países.
Portanto, eu queria deixar claro que os informes que demos nessa viagem e as conversas que tivemos se deram exatamente porque nos procuraram e tiveram muito interesse no que estava acontecendo no Brasil.
Não preciso dizer que não somos nós que estamos fomentando isso no mundo, não é a Bancada do PT, não é a esquerda brasileira, não é a Presidenta Dilma, não é o Presidente Lula, não são os nossos Senadores e os nossos Deputados. Basta pegar os principais jornais mundiais. Na semana após a votação do afastamento da Presidenta Dilma - esta em que viajamos -, todos os editoriais de jornais importantes do mundo, todos, inclusive aqueles jornais que são considerados de centro e centro-direita, que têm posição conservadora, diziam que a situação do Brasil não era de normalidade institucional. Muitos falavam em golpe, sim! Por quê? Porque a Presidenta Dilma foi afastada sem ter cometido crime de responsabilidade. Esta era a maior pergunta que nos faziam em Portugal não só os portugueses, mas também Parlamentares de outros países, não só latino-americanos, mas de outros países europeus: "Qual foi o crime que a Presidenta cometeu para ser afastada? Os decretos que fizeram a suplementação orçamentária? As operações em relação ao Banco do Brasil?" Ninguém conseguia entender essa situação. E é isso que está repercutindo no mundo.
Desculpa, Senador, V. Exª pode ficar incomodado, pode achar que é ruim, e V. Exª estava no debate do Componente Latino-Americano. Aliás, as únicas vozes que se levantaram para falar de uma legitimidade desse Governo ou de o processo aqui estar legalmente embasado foram as de V. Exª e do Deputado Hiran. Nenhum outro falou isso, de nenhuma outra delegação, volto a dizer. Inclusive, os venezuelanos, os da oposição da Venezuela, que tanto receberam o apoio deste Parlamento, de grupos que hoje apoiam esse Governo interino do Vice-Presidente Michel Temer, eles mesmos não quiseram entrar no mérito nem defender esse Governo, porque sabem que ele não tem a legitimidade das urnas.
Aliás, não é uma questão de legitimidade das urnas. V. Exª pode me dizer que o Vice-Presidente foi eleito junto com a Presidenta. Estou falando da legitimidade do programa que foi aprovado nas urnas. O programa que foi aprovado nas urnas não é o programa que o Vice-Presidente está querendo colocar em prática, um programa liberal na economia e conservador nos costumes e nas políticas. Por isso, há ilegitimidade. Não foi esse o programa aprovado!
Então, temos de entender que o que está repercutindo no mundo não vem do esforço da Senadora Gleisi de ir para um evento internacional como a Eurolat, ou da Senadora Vanessa, do Senador Lindbergh, do Senador Requião, da Senadora Lídice. A nossa voz no mundo é muito pequena. O que está repercutindo é o fato em si, o que aconteceu aqui, é o golpe que foi dado no País, o golpe institucional, que fere a Constituição e que tem deixadas atônitas as lideranças mundiais, as principais lideranças!
Quero dizer a V. Exª que falei com algumas lideranças internacionais que são reconhecidas no cenário e que representam Partidos importantes. Quero começar por Portugal. Sabemos que hoje Portugal tem um governo de centro-esquerda. É o Partido Socialista português que tem o Primeiro-Ministro. Mas o Partido Socialista, por não ter a maioria, não fez aliança com o Partido da social democracia portuguesa, optando por fazer aliança com a esquerda portuguesa, com o Partido Comunista Português e também com o bloco de esquerda, e está governando Portugal, fazendo questionamentos ao que o Banco Central Europeu determina em termos de austeridade aos países da Europa, assim como a Grécia e a Espanha também tentaram fazer enfrentamento. Por quê? Porque não é concebível que, em um momento em que o mundo precisa de desenvolvimento sustentável, os países façam política de austeridade cortando salários, cortando previdência social, cortando direitos dos trabalhadores. Então, optou o Partido Socialista português por fazer uma aliança com a esquerda.
Tive oportunidade de conversar com o Secretário Nacional para as Relações Internacionais do Partido Socialista, o Deputado Porfírio Silva, assim como conversei com outros dois Deputados do Partido Socialista - aliás, não só eu, mas a nossa comitiva -, um deles, inclusive, o Vice-Presidente da Assembleia Nacional Portuguesa.
É importante dizer que o Partido Socialista português sempre teve uma relação mais próxima com a social democracia brasileira, ou com o PSDB, mais especificamente com o ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso. Sempre foi essa a relação. Com o Presidente Lula, essa relação começou mais no governo do Primeiro-Ministro José Sócrates. Mas até lá era com o Partido da Social Democracia Brasileira que o Partido Socialista português tinha mais contato.
Pois bem, conversando com esses Deputados, que são da direção do Partido e que, portanto, estão ajudando o Governo português, pude ver que eles estão estranhando muito o que acontece no Brasil, estão estranhando, inclusive, a posição do PSDB de apoiar um governo que, como eles dizem para nós, não reconhecem como legítimo, não por conta do processo eleitoral, de o Vice-Presidente não ter tido votos na eleição, mas exatamente por conta de que o programa que se está colocando para a execução no Brasil nada ter a ver com o programa que foi vitorioso no processo eleitoral de 2014.
Para eles, a democracia é um valor importantíssimo. A preocupação do Partido Socialismo e, inclusive, do Deputado Porfírio é exatamente com isto: como que se justifica para o Brasil, para o mundo e para a América Latina que temos um Governo que não está chancelado pelas urnas e que uma Presidenta foi afastada, sem ter cometido crime de responsabilidade, por um conjunto principalmente da Câmara - o que é pior -, dirigido por um Parlamentar que tem problemas muito grandes em termos de processo de corrupção e de investigação? Aliás, todos com quem conversamos, todos, todos nos disseram que acharam vexatória a sessão da Câmara dos Deputados, que ficou muito mal para a imagem do Brasil aquela sessão em que os Deputados demonstraram que não tinham conhecimento exatamente do processo que estavam discutindo e estavam votando. Pareceu que estavam ali muito mais por uma maioria de ocasião, por um interesse de grupos a tomar o poder, do que efetivamente para discutir com seriedade um processo de impeachment.
Então, Senador Medeiros, não sou eu que estou falando isso, não é a nossa delegação, é o mundo que está vendo isso. Está vendo isso através dos jornais, está vendo isso através de posicionamentos de liderança. Aliás, é interessante que não houve uma notícia, uma notícia, pelo menos que eu tenha visto, na imprensa brasileira e na imprensa internacional, de um chefe de Estado ter ligado para o Vice-Presidente Michel Temer cumprimentando-o por ter assumido a Presidência do Brasil nessa circunstância. Nenhuma! Isso é sintomático, porque isso está incomodando as relações internacionais do Brasil, está incomodando a comunidade internacional. Está causando desconforto a forma como o Brasil encaminhou a solução para um problema de crise política. Nós não estamos tapando o sol com a peneira, dizendo que não há crise política e que não há problemas econômicos. Agora, utilizar-se da instituição do impeachment, que é excepcionalíssima, para fazer isso está causando desconforto, sim, e isso vai afetar as relações internacionais do Brasil, não tenham dúvidas.
Nós tivemos também a oportunidade de estar com alguns articulistas políticos de Portugal, com escritores da imprensa, com pessoas que fazem colunas e que fazem avaliação, como Miguel Sousa Tavares, que é uma pessoa que se tem dedicado muito às avaliações sobre o Brasil. Ele não é uma pessoa ligada a governos de esquerda, não admirava o Governo da Presidenta Dilma. Aliás, fez várias colunas criticando o governo da Presidenta Dilma. Ele nunca foi alinhado com o Governo do PT, com o Governo de centro-esquerda que tivemos aqui, mas também se disse estarrecido com o que aconteceu no Brasil, dizendo que não era possível que aquele grupo de Deputados, todos envolvidos, sem qualificação, tivesse afastado uma Presidenta que não tinha cometido crime de responsabilidade. Ele fez comentários na TV portuguesa sobre isso, escreveu coluna.
Na quarta-feira, outro articulista, Álvaro Vasconcelos, no jornal Público, de Portugal, faz uma coluna exatamente questionando a situação e dizendo: "É a contrarrevolução social brasileira que está acontecendo? Estamos indo no caminho contrário do que estamos construindo em Portugal?" Ou seja, vamos acabar com os direitos sociais, vamos intervir nos processos que melhoraram a vida do povo brasileiro?
Então, é importante a gente ter clareza de que esse não é um esforço do Governo ou de integrantes do Governo da Presidenta Dilma, do PT, da esquerda brasileira. O mundo está vendo isso, a gente apenas está passando os informes do que efetivamente acontece aqui, e as pessoas querem saber.
Nós estivemos também com o ex-líder do Bloco de Esquerda em Portugal Francisco Louçã. Foi muito interessante a conversa com Francisco Louçã. De fato, o Bloco de Esquerda hoje ajuda o Partido Socialista, que é dirigido por uma mulher, e logo quero falar sobre isso. Francisco Louçã nos disse que a imagem do Brasil vem se deteriorando no cenário internacional por conta exatamente da forma como o País está resolvendo seus problemas políticos e está querendo enfrentar seus problemas econômicos, o que mostra a imaturidade ainda da nossa democracia, das nossas instituições, e, pior do que isso, evidencia a força da oligarquia brasileira, de setores atrasados, de uma elite que nunca se preocupou com a maioria do povo, que nunca teve generosidade e que, quando questionada, quando colocada para realmente abrir mão de certas garantias, não o faz e reage como está reagindo no Brasil.
Estivemos também com o Partido Comunista português, que hoje dá apoio ao governo de Portugal, que faz parte do governo de Portugal. O Partido Comunista português fez um evento de solidariedade à América Latina e também aos países do Caribe, e nós falamos lá que, hoje, uma das intenções das relações exteriores do Brasil é reduzir as embaixadas que temos nos países caribenhos, aliás, no Caribe e na África, o que também é uma tristeza muito grande para as relações internacionais brasileiras. Fizeram um evento, cujo principal foco foi o Brasil, embora vários países latino-americanos estivessem nele presentes, porque preocupa o mundo a situação que estamos vivendo aqui, o retrocesso político, o retrocesso na democracia e o retrocesso nas conquistas sociais.
Estivemos também com a direção do Bloco de Esquerda do Parlamento português, com a Deputada Catarina Martins, que é a líder do Bloco de Esquerda; e com a Deputada Joana Mortágua, que fez um discurso muito, muito importante, muito bom no Parlamento português sobre a situação no Brasil. São mulheres que estão à frente da política portuguesa e que têm compromisso com o desenvolvimento do seu País, mas têm compromisso com o desenvolvimento baseado em justiça social, e não nos acordos de austeridade que outrora se fizeram em Portugal ou em países europeus. Elas disseram a mesma coisa: não é possível olhar para o Brasil, um País que nós, até há pouco tempo, tínhamos como referência em termos de conquistas sociais, em termos de avanços para acabar com a pobreza e com a fome e em termos de políticas econômicas que não se submetiam àquilo que o capital financeiro internacional queria, um País que mostrava autodeterminação, e ver que agora temos de conviver com esses retrocessos. Não fomos nós que falamos isso, foram elas que falaram isso. Manifestaram-se já publicamente, inclusive, nos meios de comunicação de seus países, na tribuna do Parlamento.
Nós estivemos também com a social-democracia europeia, que é a segunda maior bancada parlamentar do Parlamento europeu. Estivemos com o Sr. Carlos Zorrinho e com o Sr. Francisco Assis, Presidente da Delegação do Parlamento Europeu para as Relações com o Mercosul. O Sr. Carlos Zorrinho é o Coordenador da Social-Democracia para a EuroLat.
Disse-nos ele também que nunca foi tão alinhado ao Partido dos Trabalhadores, ao governo do PT. Sempre teve mais relações com o PSDB. Disse-nos ele também que estava estarrecido com o que acontecia no Brasil, com a participação do PSDB neste governo, que eles viam isso de forma muito ruim, que isso repercutia de forma ruim na Europa, porque o Brasil, que havia se posicionado tão altivamente durante os últimos anos no cenário internacional, inclusive ajudando a resolver conflitos externos, sendo referência de políticas de combate à fome, de políticas de desenvolvimento social, de infraestrutura sustentável, de políticas de meio ambiente, agora passava por um retrocesso desses.
Quem falou isso para nós foram os líderes do segundo maior bloco parlamentar europeu. Então, não dá para dizer que somos nós que estamos agitando o cenário internacional e levando os nossos problemas, até porque, num mundo globalizado, os problemas enfrentados pelo Brasil, pela Argentina, por qualquer país interessam a todos os países. Estamos todos interligados, seja pela economia, seja pelas relações diplomáticas, seja pelos acordos comerciais que fazemos. Então, não dá para dizer que nós estamos conspirando contra o Brasil, porque o mundo está vendo o que está acontecendo aqui. E é lamentável o que está acontecendo aqui, porque o que estamos tendo é um retrocesso.
Eu queria, inclusive para mostrar isso, apenas ler algumas notícias da primeira semana do Governo Temer. São notícias que não nos deixam nada para comemorar. Acompanhei de Portugal o que acontecia aqui e também agora, quando cheguei ao Brasil, procurei ter um relato mais pormenorizado do que aconteceu.
Em uma semana de Governo Temer, quais são as principais manchetes dos jornais? "MEC apoiará cobrança de mensalidades se universidades públicas quiserem." "Tamanho do SUS precisa ser revisto, diz novo Ministro da Saúde."
(Soa a campainha.)
A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Apoio Governo/PT - PR) - "Ministro revoga a construção de 11.250 unidades do Minha Casa, Minha Vida". "Equipe de Temer demite garção, símbolo do Planalto, acusado de ser petista". "Temer nomeia advogado de Cunha para cargo na Casa Civil". "A habilidade de Temer para aprovar reformas não é clara, diz a Moody's", que foi uma empresa cantada em verso e prosa aqui, querendo que a Presidenta Dilma saísse para melhorar a economia. "Bruna Lombardi é a quarta mulher que diz ter recusado a Secretaria de Cultura".
Aliás, essa situação da Cultura é vexatória. É vexatória! Dos temas mais discutidos com os europeus, com os latino-americanos nesse encontro da EuroLat sobre o novo Governo Temer, dois saltaram aos olhos: a questão da Cultura e a questão das mulheres. Como pode um Governo, nessa altura do desenvolvimento brasileiro, achar que o Ministério da Cultura não é importante para o Brasil e fazer dele um puxadinho do MEC, uma secretaria, e aí não conseguir inclusive pessoas para poder dirigi-lo, porque ninguém quer ser coveiro do Ministério da Cultura no Brasil?
Aliás, hoje há uma matéria que traz uma fala da atriz Fernando Montenegro, que é uma atriz premiadíssima no Brasil, que tem 70 peças, mais de 30 programas de TV, que todos conhecem, 87 anos, que sempre lutou pela cultura:
A Cultura é o caráter de um país, e restringir a alma de um país a uma secretaria é uma visão destrutiva do que se possa ter como nacionalidade. O fato de a Cultura ter menor dotação orçamentária não diminui a importância dela quando é traída [ressalta a atriz, que tem em sua história profissional 70 peças, mais de 30 programas de TV e uma indicação ao Oscar de melhor atriz por sua atuação no filme Central do Brasil].
É triste nós estarmos vivendo essa situação; é triste nós estarmos tendo que explicar e justificar por que estamos tendo esse retrocesso, por que a cultura para nós não tem importância.
E nós estivemos, sim, com artistas portugueses, com artistas brasileiros em Portugal. Fizemos um excelente evento na Casa do Brasil, em Portugal, muito cheio; fomos lá falar sobre a situação do Brasil. Todos que estavam lá - e quero dizer aqui que não eram petistas -, brasileiros que moram em Portugal, portugueses que estavam lá, artistas, todos olhando para a situação do Brasil com muito pesar e com muita crítica ao que se fez ao Ministério da Cultura.
Como pode o Brasil tratar sua cultura assim? Algo que é fundamental para a alma de uma nação, para a construção da sua identidade; colocar como um puxadinho? Aí vai para o Ministério da Educação, não; então vai para a Presidência da República...
E pior: para tentar dar uma resposta a sociedade da presença feminina no Governo, quer se pôr, nessa Secretaria de Cultura - porque perdeu o status de ministério -, uma mulher. É vergonhoso, é vexatório! Na modernidade em que nós estamos, no século XXI, como é que pode? Nós não tínhamos como explicar.
Aliás, o retrato do Governo interino do Vice-Presidente Temer falava por si só. Não precisava de nenhum esforço nosso para mostrar o retrocesso que era aquilo; um Governo de homens brancos e ricos, sem diversidade, sem participação de mulheres, sem participação de negros, e a juventude desse Governo era a segunda ou terceira geração daqueles que fazem política neste País - filhos ou netos.
Como justificar isso? O que é? Um Governo parlamentarista em um sistema presidencialista: fez para agradar a Câmara, que tem um perfil conservador e que levou ao impeachment da Presidenta Dilma em uma sessão que ficou ridicularizada no mundo inteiro. Muito difícil de explicar. Então, não tem que haver esforço nosso nenhum para mostrar o que é esse Governo em termos de retrocesso e o que ele vai significar para o Brasil, o que é muito triste. E é triste para as conquistas que nós tivemos.
Mas, continuando aqui, inclusive nas manchetes, porque eu parei na cultura. Quatro mulheres se negaram a assumir a Secretaria de Cultura. Uma delas disse: "Eu não vou ser coveira do Ministério da Cultura." E todas as manifestações de artistas no País têm sido nesse sentido.
A outra manchete: "Bolsa cai 2,7% com exterior e espera por medidas de Meirelles; dólar sobe". Aliás hoje de novo está dito que a Bolsa caiu e o dólar subiu. O que deu errado? Não era só tirar a Dilma que consertava a economia? Porque era isto que nos vendiam aqui: que o problema era a Dilma, era o governo do PT, que o problema eram os rombos de orçamento, que o problema eram as pedalas, que, portanto, ela tinha que ser afastada. E, se isso acontecesse, por si só, nós já teríamos uma ótima solução. Onde é que está a solução com o dólar subindo e a Bolsa caindo?
"Previdência: Governo vai propor alterar regras para trabalhador na ativa." Já há uma movimentação grande para a reforma previdenciária. Dizem que os direitos adquiridos vão ser mantidos. Será que vão ser mantidos? Será que a definição de uma idade mínima simples para todos, tendo homens e mulheres a mesma idade mínima para aposentadoria, tendo trabalhadores rurais, trabalhadores urbanos, trabalhadores braçais, trabalhadores intelectuais a mesma idade, é justa? É certo?
É isso que vem para cá. Além, é claro, de uma tentativa, que ainda não foi colocada de forma clara - mas será -, de desvincular o salário mínimo dos benefícios previdenciários.
Outra manchete: "Temer escolhe aliado de Cunha para ser Líder do Governo." "Governo Temer passa a tesoura nos programas sociais."
Não há nada para comemorar em uma semana deste Governo. Aliás, nós já dizíamos isso. Nós já dizíamos a que viria este Governo. É um Governo que muda o programa que foi eleito nas urnas. Portanto, não é um programa desenvolvimentista, de caráter social. É um Governo que tem uma política liberal, uma política contracionista, que vai ter uma política fiscal que será mais importante do que qualquer programa social. Vai tirar, sim, das áreas como saúde, educação, combate à pobreza para pagar conta de juros, que é isso que está colocado em primeiro lugar. É um Governo que vai desmontar programas, a começar pelo desmantelamento da cultura. Mas também já vemos a tentativa de reduzir o SUS, de modificar a linha da educação pública no Brasil. É isso o que vai acontecer.
Não tenho dúvida. Este Governo foi colocado pela elite brasileira para cumprir esse papel. Vai ser muito ruim para o conjunto da população brasileira e muito ruim para o posicionamento do Brasil em termos internacionais, o Brasil que foi tão respeitado nos últimos anos, que foi tão referenciado, que serviu de exemplo e de modelo para tantas políticas.
Por isso é que nós ficamos muito tristes. Ao participar de um evento como esse, do EuroLat, vemos as manifestações em relação ao nosso País. Não foram manifestações que nós fomos levar até lá, para desmerecer a imagem do Brasil. Não é isso. Aliás, quando um país tem problema, isso tem que ser discutido no âmbito internacional, sim, porque, como eu disse, estamos todos interligados. Mas nós não precisamos fazer isso, porque eles já tinham essa avaliação. Apenas fomos lá informá-los e falar da preocupação que nós temos, para que nós possamos impedir que esses retrocessos aconteçam.
É triste ter uma presidenta afastada. Eu não sou contra que se faça nenhuma investigação, não sou contra nenhuma verificação, mas essa lei de 1950, que regulamenta o nosso impeachment, precisa ser urgentemente alterada. Como pode uma presidenta ser afastada, como foi a Presidenta Dilma, para se fazer essa investigação?
No processo de impeachment nos Estados Unidos, contra o Bill Clinton, ele não foi afastado. Ele continuou no cargo. E dizer que a Presidenta Dilma tinha que ser afastada porque ela iria praticar obstrução da investigação? Isso é uma barbaridade. Aliás, a Presidenta Dilma foi a que mais deu condições para se fazer investigação neste País, que mais avançou em termos de legislação, para que este País pudesse ter mecanismos para investigar. E eu não estou falando só da Operação Lava Jato, que deu autonomia plena à Polícia Federal, ao Ministério Público, ao Judiciário, doa a quem doer, inclusive a membros do seu Partido. Estou falando, por exemplo, das leis que vieram para esta Casa: a lei da organização criminosa; a lei do colarinho branco, que foi alterada; a lei que deu condições para fazer as delações, o acesso à informação.
Quer dizer, como é que se pode dizer que precisava afastar a Presidenta para se fazer uma investigação? Conversa! Afastaram porque queriam colocar um governo que tinha outro compromisso, outro propósito, outra proposta e que está causando tudo isso que nós estamos vendo; e que vai ser pior, vai causar mais problemas ao Brasil e ao povo brasileiro. Não tenham dúvidas disso. Não tem salvação da Pátria. Não tem! Não tem salvação da Pátria com o Ministro Meirelles; não tem salvação da Pátria com o Vice Michel Temer; não tem salvação da Pátria com o afastamento da Presidenta Dilma, principalmente com o programa que estão colocando para o Brasil.
E aí, Sr. Presidente, eu não podia terminar o meu pronunciamento sem falar de algo que me chamou a atenção ontem nos jornais, que é a proposta ou a disposição do Presidente Michel Temer de fazer um pronunciamento à Nação, falando de uma herança maldita, ou seja, tentando justificar que ele não vai dar conta do recado ou que não vai conseguir implementar aquilo que ele prometeu e que os golpistas que o apoiaram prometeram, quando fizeram o impeachment da Presidenta, e que este Senado corroborou para que ela fosse afastada. Ele vai falar sobre a herança maldita.
Pergunto: o Vice-Presidente Michel Temer foi eleito para poder falar sobre herança maldita? Ele teve um programa de governo que foi colocado para a população debater e discutir e foi votado na urna e, por isso, ele pode chegar e dizer que tem uma herança maldita e que tem dificuldade de colocar esse programa de governo em prática? Ou ele participou do Governo que ele ajudou a golpear, sendo Vice-Presidente, inclusive com o seu Partido tendo pelo menos sete Ministérios nessa fase final e ajudando em medidas ou não ajudando em medidas que eram importantes para resgatar o equilíbrio fiscal do orçamento brasileiro? Como pode ter a coragem de dizer que vai falar de herança maldita? Uma herança que ele ajudou a fazer, uma herança da qual ele participou!
Eu fico realmente estarrecida quando vejo certos posicionamentos, e aí quero fazer aqui alguns comentários: primeiro, o Governo interino do Vice-Presidente Michel Temer não foi eleito pelas urnas. Ele foi eleito como Vice-Presidente da Presidenta Dilma; o seu Partido, o PMDB, tinha sete Ministérios nesta reta final do Governo da Presidenta Dilma (Ministério da Saúde, Ministério de Minas e Energia, Ministério do Turismo, Ministério de Aviação, de Portos, da Agricultura, de Ciência e Tecnologia), Ministérios importantes, que fizeram política, que executaram orçamento, que intervieram nas linhas do Governo.
Então, não pode o PMDB, agora, dizer que herdou uma herança maldita. Se herança maldita tem, ele ajudou a construir. Ajudou a construir, ou então, com o seu posicionamento nesta Casa, mas principalmente na Câmara dos Deputados, através do Deputado Eduardo Cunha, que é do PMDB, aliado de primeira hora do Presidente Michel Temer, não permitiu que a Presidenta Dilma, que o Governo pudesse fazer as medidas, para impedir uma deterioração maior nas contas do Governo.
E aí eu preciso fazer um balanço rápido do que significaram as medidas que a Presidenta tomou desde o início da sua gestão.
Em 2011, quando a Presidenta Dilma assumiu o Governo, e eu fui para a Casa Civil da Presidência da República logo em junho, nós tivemos um dos maiores cortes orçamentários dos últimos anos que aconteceram no Brasil: foram R$50 bilhões de contingenciamento.
Por quê? Porque nós estávamos saindo da crise de 2008 e 2009, o Brasil começava a se recuperar, e nós víamos que era necessário ter a política anticíclica. Ou seja, no aprofundamento da crise, o governo tinha que gastar mais, mas como já estava havendo uma melhora, precisávamos fazer economia, e assim o fizemos. E fizemos, naquela época, um superávit primário relevante de 3%, conseguimos, portanto, baixar nosso serviço da dívida, pagar os encargos e melhorar a situação.
Em 2012, mesmo com mais dificuldades, continuamos a fazer cortes orçamentários: mais R$50 bilhões. Em 2013, já tínhamos mais dificuldade, não somente por questões internas, mas principalmente porque a economia internacional havia entrado novamente em uma rota ruim, em uma rota de crise. Portanto, os cortes de 2013 foram de R$30 bilhões. Mas, ainda assim, fizemos corte.
(Soa a campainha.)
A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Ainda assim, fizemos ajuste. Ainda assim, fizemos uma política fiscal muito segura e fizemos superávit.
Apenas em 2014, com a piora da crise Internacional... É importante termos claro que a crise econômica brasileira não é feita apenas do componente nacional. A crise econômica brasileira é sobretudo feita do componente internacional. Os países com quem temos comércio, principalmente os países europeus, entraram em uma das maiores crises de sua história. Quem aqui não assistiu à crise da Espanha, da Itália, da Grécia? Quem aqui não assistiu à crise de Portugal? Depois, dos Estados Unidos e da própria China? Ou seja, pararam de comprar produtos brasileiros, a começar pelas commodities minerais, e isso teve um impacto grande. As commodities agrícolas também tiveram preços minorados, e isso também teve um impacto grande.
Então, o que o Brasil fez em 2014? Retomou a sua política anticíclica, ou seja, o Estado brasileiro precisava garantir investimentos, precisava garantir programas sociais, precisava garantir gastos para que o Brasil não parasse, para que as pessoas não sofressem com o que estava se desenhando de crise mais dura que nós viveríamos.
E isso é tão verdade que, em 2014, quando a Presidenta mandou para cá um projeto para alterar a meta orçamentária, ou seja, o resultado primário de 2014, quem relatou essa alteração da meta é o Senador Romero Jucá, atual Ministro do Planejamento do Governo interino do Vice-Presidente Michel Temer.
Ele diz, em seu relatório - olha que interessante -, para justificar a alteração da meta, que não podemos, entretanto, desconhecer que nossas dificuldades econômicas internas têm raízes profundas no exterior, que dificuldades como as atuais já enfrentamos inúmeras vezes, quase sempre ao custo da deterioração de nossos indicadores econômicos mais básicos. E que as medidas de estímulo adotadas pelo Governo, a despeito do seu custo econômico, podem ter cumprido, sim, importante função anticíclica, inclusive evitando desdobramentos adversos noutras esferas, como a rápida deterioração dos indicadores sociais do País.
Os senhores acham que, em um momento de crise como aquele, que começou a se desenhar em 2014 e se aprofundou em 2015 e que hoje ainda estamos vivendo, seria correto, por exemplo, reduzir o Bolsa Família dos 5% mais pobres da população, sendo que a população começava a entrar em um processo de desemprego ocasionado principalmente por uma crise internacional?
Os senhores acham correto não ter aumento real do salário mínimo e deixar o povo ter o maior impacto da crise que vinha com a inflação? Ou mexer na Previdência? Ou reduzir o SUS? Ou desvincular os programas de saúde e educação? É assim que se governa num processo em que se tem uma crise econômica, deixando os que mais precisam ao léu, deixando os que mais precisam no meio do caminho?
Isso é o que sempre pensou a elite brasileira, é o que pensa esse grupo que está aí, porque sempre, em momentos de crise, ao longo da nossa história, os mais pobres foram deixados à beira do caminho, os mais pobres foram relegados. Aliás, aconteceu isso com os escravos. Quem não se lembra? O Brasil, além de ter o maior número de escravos entre todos os países, mais de 10 milhões de africanos vieram para cá, foi o último que aboliu a escravidão. E o que fez com seus escravos? Procurou prepará-los, para que eles se inserissem na economia brasileira como mão de obra qualificada? Não, deixou-os morrer aos montes, empurrou para os morros, para as favelas, para o interior. Foi buscar na Europa mão de obra mais qualificada. É assim que age essa elite, é assim que vai agir agora o Vice-Presidente interino Michel Temer, exatamente porque não tem compromisso.
Mas o que nós fizemos no momento de crise? Nós mantivemos os programas sociais. Fizemos ajustes, sim, mas mantivemos os programas sociais. E aí, quando a Presidenta Dilma quis fazer ajustes, quis fazer os equilíbrios, e precisava desta Casa, não teve apoio. Então, como vai falar o Presidente Michel Temer em herança maldita, se o partido dele, que tem maioria no Congresso Nacional, tem a Presidência da Câmara, não deixou votar medidas importantes que ajudariam no equilíbrio fiscal brasileiro? Não deixou ajudar. Quem não se lembra das pautas bomba que foram colocadas na Câmara dos Deputados? A mudança na remuneração do FGTS, a PEC 443, de alteração dos salários da AGU, as propostas que criaram as carreiras...
(Soa a campainha.)
A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Apoio Governo/PT - PR) - ... de analistas do Ministério Público, semelhantes às do Judiciário, a gratificação dos servidores da Justiça Eleitoral, a vinculação dos salários da AGU ao Supremo, a remuneração de cargos de confiança do TCU, o fim da multa adicional de 10% para a demissão sem justa causa? Essas foram as pautas bomba! Patrocinadas por quem? Por Eduardo Cunha. Quem é Eduardo Cunha? Aliado de primeira hora do Vice-Presidente Michel Temer. Quem é hoje o Vice-Presidente Michel Temer? O Presidente interino, resultado de um golpe, que diz que herdou uma herança maldita. Mas quando era Vice-Presidente não se esforçou para que a sua bancada na Câmara não tivesse pautas bomba, para que a sua bancada na Câmara aprovasse as medidas da Presidenta Dilma. Seis medidas de MPs tributárias enviadas à Câmara foram todas modificadas, inclusive com emendas de Senadores, para minorar seus efeitos fiscais. MPs de mudança de gastos que também não foram aprovados, como deveriam ser. A PEC do abono permanência, o PL do teto do salário. Ao invés de aprovar o teto salarial, o que fez o Congresso Nacional? Com o apoio da Bancada do PMDB, que é a bancada do Vice-Presidente Michel Temer, que hoje diz que herdou uma herança maldita, aumentou o teto. A DRU, que só foi aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça.
E agora, o que quer o Vice-Presidente Michel Temer? Aumentar a Desvinculação de Receitas da União. E não apenas da União, mas para Estados e Municípios, tirando recursos da saúde e da educação. A CPMF, que todo mundo contestou, agora querem recriar, mas não deixaram votar, assim como não deixaram votar a mudança da meta em 2016. Está até agora lá. Uma meta em que prevíamos, sim, um déficit de R$96 bilhões.
Agora quer o Vice-Presidente da República mudar para quanto? Para R$130 bilhões. Estão falando em R$150 bilhões. Por que criticaram tanto quando nós queríamos mudar esse resultado da meta? Porque dizíamos: precisamos mudar. Agora não é hora de fazer resultado primário para pagar serviço de dívida. Agora é hora de ter recursos para os programas sociais e para o desenvolvimento do País, para recuperar a economia. Agora querem fazer. E, para justificar que estão aumentando mais do que nós mandamos aqui, que a Presidenta Dilma mandou, que foi de R$96 bilhões, estão dizendo que há uma herança maldita - uma herança maldita que eles patrocinaram, ao não votar as medidas de ajuste fiscal que a Presidenta mandou para este Congresso Nacional, que mandou para a Câmara dos Deputados, as pautas bombas, que foram feitas por eles, pelo Presidente da Câmara, que é o aliado de primeira hora do Vice-Presidente Michel Temer.
Então, para! Tem que ter vergonha na cara. Não pode vir a público dizer que há herança maldita, porque, se há herança maldita, quem ajudou a construir e tem mais responsabilidade é o PMDB, é o partido do Vice-Presidente Michel Temer, que hoje assume o Governo deste País, em um processo golpista, que retirou uma Presidenta que foi legitimamente eleita, e agora não está conseguindo entregar ao País o que prometeu.
Então, Sr. Presidente, é importante que essas questões fiquem registradas. O Brasil não merece passar pelo que está passando, não merece o que está acontecendo no âmbito internacional, na avaliação que estão tendo sobre a democracia brasileira, não merece reduzir os seus programas sociais.
Chega à minha mão agora que o Governo Temer suspende todas as novas contratações do Minha Casa, Minha Vida, não só as contratações como modo entidades, em que foram contratadas 11 mil casas. Porque eles acham que as entidades sociais brasileiras não conseguem fazer política social. São entidades ligadas só à esquerda, ao PT, aos partidos que eram da Presidenta Dilma, que não merecem respeito no País. Aliás, o Ministro da Justiça disse que vai haver pouca tolerância com os movimentos sociais. Estamos assistindo a um retrocesso imenso. Agora está aqui: o Vice-Presidente Michel Temer vai suspender todas - todas - as contratações do Minha Casa, Minha Vida.
É assim que se retoma a economia de um país? Sabe quantos empregos gera um programa como esse, de construção civil? Quantos empregos são gerados para fazer casa no Brasil? Quanto de material de construção é comercializado? Quantas empresas estariam aqui fazendo as casas? Como ele vai recuperar a economia? Cortando isso, pagando juro da dívida, fechando o Ministério da Cultura, não colocando mulheres no seu Governo?
É esse o Governo que está se desenhando no Brasil.
(Soa a campainha.)
A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Eu lamento muito, muito mesmo que estejamos passando por isso, e lamento muito a repercussão internacional que está tendo. E não é uma repercussão internacional que nós estamos levando. Muito pelo contrário, nós estamos falando dela sim, mas é uma repercussão internacional que acontece por si só, pelo que o mundo está vendo no Brasil hoje.
Muito obrigada, Sr. Presidente.
O SR. PRESIDENTE (José Medeiros. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - MT) - Se a Senadora Gleisi jogasse futebol, seria um Neymar com as palavras. Ela está para as palavras como está o Neymar para o futebol. Faz aqui uma defesa intransigente e muito firme da Presidente.
Cabe esclarecer também, Senadora, que acabo de ver aqui uma matéria em que o Paraguai, a Argentina e os Estados Unidos também se posicionaram a respeito do processo que está ocorrendo no Brasil, e todos eles dizendo que é um processo legítimo, que é questão interna brasileira e que o Brasil vai conseguir resolver.
Na verdade, Senadora, o que eu sinto é que o modelo bolivariano que havia na América do Sul está, de certa forma, acabando, e acabando porque não foi aprovado. Isso é o que eu sinto no momento.
Sobre os Presidentes não terem ligado para reconhecer o Governo do Presidente em exercício, não teriam que ligar mesmo, porque é como se a Presidente estivesse viajando, ela se afastou. Houve uma vacância. E um Presidente não liga dizendo: "Olha, você que está aí no lugar da Presidente, eu estou te ligando para parabenizar por estar ocupando o governo hoje". Nós estamos num processo, a Presidente foi afastada momentaneamente, enquanto se verifica se há crime ou não. É isso que está acontecendo. Líder nenhum tinha que ligar para dizer que o Governo é legítimo ou não. Evidentemente, após o término do processo de impeachment, cabe, sim, aos Presidentes ligarem ou não, mas, neste momento, não penso que caiba, Srª Senadora.
A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Senador Medeiros, não se trata de um afastamento corriqueiro de viagem não. Nós utilizamos um dos institutos mais excepcionais da nossa Constituição para fazer o julgamento de uma Presidenta. Ela está em processo de julgamento.
Uma das maiores violências é tirar ou afastar um Presidente da República eleito legitimamente pelo voto popular. Isso é uma das dificuldades maiores da nossa democracia.
Ele assumiu como governo interino, apresentando um programa de governo diferenciado, no lugar do programa do governo eleito em 2014 com a Presidenta Dilma. É muito sintomático que não tenha havido essas manifestações, porque ele é o governante hoje, ilegítimo como nós consideramos, mas é o governante hoje. Então, não houve.
E os reconhecimentos de que V. Exª fala eu desconheço. Vi que, se não me engano, o embaixador americano fez um comentário na OEA sobre isso, o que para mim não é nenhuma surpresa, porque os Estados Unidos sempre apoiam os governos que melhor lhes apetecem, venham eles de golpe ou não. Os Estados Unidos, em 1964, estavam dentro do Brasil, apoiando os militares. Eles vão sempre aprovar aqueles que melhor lhes digam respeito, principalmente aos seus interesses econômicos. E o que nós estamos vendo agora é que parece que o Ministério Relações Exteriores está exatamente querendo mudar a política multilateral que o Brasil vinha fazendo por uma política bilateral. Com certeza, eles têm esses interesses.
Por isso que é importante, é sintomático, sim, Senador Medeiros. É uma tristeza ver o País nesta situação e com essa avaliação externa.
E, só para corrigir, eu prefiro ser comparada à jogadora Marta a ser comparada ao jogador Neymar.
Muito obrigada, Senador.
O SR. PRESIDENTE (José Medeiros. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - MT) - Perfeito. Eu não tenho dúvida, seria uma Marta, jogando futebol.
Mas, Senadora, eu vejo que esse drama todo do PT faz parte da retórica, porque o impeachment está sendo bom para o PT, não tenho dúvida disso.
Primeiro, porque tinha perdido os movimentos sociais, tinha perdido as ruas, e, com esse discurso agora, neste momento, agora sim, estou vendo o PT defender o funcionalismo, os movimentos sociais e o Minha Casa, Minha Vida com unhas e dentes. Até a semana passada, havia cortes. E havia cortes por quê? Cortes legítimos? Porque não existe bom pagador sem dinheiro.
Boa parte das construtoras que começaram nesses programas está quebrando. Elas não conseguem receber. Com relação à saúde, a esses CRAS e PSFs, o governo não conseguia mais fazer frente. A grande verdade é que há uma crise, sim. Independentemente de Dilma ou de Temer, o País chegou a um momento de crise.
Eu penso que, talvez, o pecado da Presidente Dilma foi não dizer para o País que havia crise.
Mas existe, e não é só da Presidente Dilma: as prefeituras estão em dificuldade, alguns governos estaduais não estão conseguindo nem pagar a folha. Então, isso existe e é normal. Agora, nós vamos passar por momentos de ajustes fortes, seja com Temer, seja com a Presidenta Dilma voltando. Eu não tenho dúvida disso.
Só finalizando - estou fazendo este contraponto aqui, que acho interessante -, sobre o fechamento de embaixadas, Senadora Gleisi, tive a oportunidade de viajar, no ano passado, para algumas embaixadas e vi que elas estão em dificuldades. O Presidente Lula fez um amplo programa de abrir embaixadas, mas ocorre que o Brasil não está conseguindo pagá-las. Conversei com alguns funcionários. Em algumas embaixadas, os funcionários estavam fazendo vaquinha para pagar a luz. Nos países ocidentais, isso até se tolera, vamos dizer assim, aquele calote branco; mas, nos orientais, a informação que tive é que estava ficando muito ruim, porque a cultura desses países não tolera o nó cego. Eles não conseguem enxergar que um país não pague suas contas, estava ficando uma imagem muito ruim para o Brasil. Então, num caso como esse, é melhor fechar do que não conseguir arcar com as despesas.
Sobre o garçom, Senadora Gleisi, permita-me dizer, li agora há pouco que não se tratava de um garçom, tratava-se de um assessor técnico, mas sabidamente foi colocado, vendido para a população que o Temer está despedindo até o garçom da Presidente Dilma.
A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Apoio Governo/PT - PR) - O Catalão.
O SR. PRESIDENTE (José Medeiros. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - MT) - Finalizando mesmo, esse programa todo, V. Exª colocou - por isso eu a comparei com o Neymar e com a Marta, porque é uma habilidade tremenda com as palavras e, se não fizermos o contraponto, fica isso como verdade -, veja bem o que a senhora colocou: agora, todos aqueles programas, toda a parte da pedalada, toda a parte das operações, aquele atraso todo foi para fazer frente, pagar o Minha Casa, Minha Vida e pagar os programas sociais. Mas, lógico, com a habilidade que tem, a senhora não explicou que grande parte disso foi para o PSI, que é um programa justamente para favorecer quem? Para favorecer as elites. Eu não tenho preconceito contra as elites. Sinceramente, venho de uma família muito pobre, mas tenho de confessar: se não fossem as elites, se não fossem esses grandes empregadores, nós não teríamos vivido, porque precisávamos de emprego.
Agora, esse discurso é contraditório, porque o Presidente Lula e a Presidente Dilma se relacionaram muito bem, aliás, parte do conselho que havia no Planalto é formado por esses players nacionais. Aliás, o BNDES fez aporte, na grande maioria, para os chamados players, para os chamados campeões. Então, é um discurso retórico, por um lado, para justificar, mas o grande rombo que houve nessas contas foi para o programa de apoio à indústria. Não vou entrar no mérito. Penso que a indústria precisa de apoio. A grande pergunta é se podíamos ou não fazer isso.
A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Eu não quero fazer um pingue-pongue, mas, como temos esta oportunidade de fazer o debate, acho importante, inclusive...
O SR. PRESIDENTE (José Medeiros. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - MT) - Temos tempo.
A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Sim, temos tempo.
Acho importante inclusive dizer para a população que está nos ouvindo pela Rádio Senado e assistindo pela TV Senado, primeiro, que não é uma questão de negar a crise. Nós temos uma crise, que não é só brasileira, é uma crise internacional. Isso ninguém desconhece. Divergimos é sobre como enfrentar a crise. É diferente. Enquanto este Governo interino que está aí quer enfrentar a crise num programa de austeridade, cortando tudo, para pagar o serviço da dívida, deixando grande parte da população descoberta em seus direitos, nós entendemos diferente. É verdade que a Presidenta Dilma fez certos ajustes, mas não acabou com programas, não acabou com o Minha Casa, Minha Vida e, mesmo atrasando alguns pagamentos, colocou-os em dia. Hoje estão em dia os pagamentos do Minha Casa, Minha Vida. E ela soltou mais três milhões de casas e disse: "Nós vamos começar a trabalhar".
A construção civil é importantíssima para a garantia de empregos neste País. Muito me admira... Eu queria saber como está agora o pessoal da construção civil, das associações deles que apoiaram o impeachment da Dilma, soltaram nota afirmando que realmente tinha de impedir, que era um absurdo. Eu queria saber como eles vão se posicionar agora em relação a essa suspensão total do Minha Casa, Minha Vida. E não deve parar por aí, porque vai haver suspensão de outros programas.
Então, nós estamos falando da forma, de como nós vamos enfrentar a crise. Não é cortando o Bolsa Família, não é diminuindo salário. Por isso, falamos em política anticíclica. Por isso, nós defendemos fazer um déficit.
O Governo Temer sabe, esse Governo interino, que tem de fazer um déficit, só que quer fazer um déficit maior. Aí, para justificar fazer um déficit maior, porque antes tinha batido na Presidenta, que já tinha proposto fazer um déficit, está dizendo que é uma herança maldita. É muita falta de caráter! Participaram junto do governo! Então, não dá para admitir situações como essa.
(Soa a campainha.)
A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Apoio Governo/PT - PR) - A questão das embaixadas é injustificável. É claro que está passando por dificuldades, como todo o Orçamento da União, mas por que fechar embaixada na África? Não está fechando embaixada no Oriente Médio, está fechando as africanas. Porque existe preconceito, Senador Medeiros, porque acha que o Brasil tem de fazer uma política externa apenas com foco nas relações comerciais, e não em relações que possam construir outros programas e projetos. Sabe por que o Brasil está na FAO hoje? Por que o Brasil conseguiu estar em importantes posicionamentos em organismos internacionais? Porque ampliou suas relações externas, porque fez relação externa com os países africanos, fez com o Oriente Médio, fez com os países caribenhos. E agora querem cortar onde? Nesses países. Tem de ter um mínimo de mediação. Quer sair de uma política multilateral para uma política bilateral.
Para encerrar agora, mesmo que V. Exª termine fechando o pronunciamento, eu quero dizer o seguinte: o Catalão, que foi demitido, era garçom da Presidenta. Eu trabalhei com a Presidenta durante quase três anos, ele não era assessor técnico, era um garçom. Eu não entendo por que ele foi demitido. Qual é a razão? Por que essa perseguição?
Não adianta tentar justificar o injustificável, Senador Medeiros. Está muito ruim para o Brasil essa situação toda, muito ruim. Nós não queremos incendiar o País, não queremos que o País não dê certo. Agora, para o País dar certo, não pode ser com essa política, não pode ser com esse posicionamento, não pode ser com essa forma de tratar as pessoas e de tratar a democracia brasileira.