Discurso durante a 92ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Manifestação sobre a ilegalidade do processo de impedimento da Presidente Dilma Rousseff e críticas à gestão do Governo interino de Michel Temer.

Autor
Gleisi Hoffmann (PT - Partido dos Trabalhadores/PR)
Nome completo: Gleisi Helena Hoffmann
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Manifestação sobre a ilegalidade do processo de impedimento da Presidente Dilma Rousseff e críticas à gestão do Governo interino de Michel Temer.
Publicação
Publicação no DSF de 11/06/2016 - Página 30
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • DECLARAÇÃO, ENTENDIMENTO, ILEGALIDADE, PROCESSO, IMPEACHMENT, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, MOTIVO, INEXISTENCIA, CRIME DE RESPONSABILIDADE, OBJETIVO, FAVORECIMENTO, GRUPO, POLITICO, SITUAÇÃO, INVESTIGAÇÃO, OPERAÇÃO, POLICIA FEDERAL, CRITICA, GESTÃO, MICHEL TEMER, GOVERNO FEDERAL, INTERINO.

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Apoio Governo/PT - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Eu queria apenas me somar à Senadora Ana Amélia na solidariedade às famílias e às vítimas desse acidente que tirou a vida de muitos jovens.

    Srª Presidenta, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, quem nos acompanha pela TV Senado, quem nos ouve pela Rádio Senado, desde o momento em que, motivado por vingança e pelo interesse de se salvar da Justiça, o então Presidente da Câmara dos Deputados, Deputado Eduardo Cunha, aceitou o pedido de impeachment da Presidenta Dilma, nós denunciamos ao Brasil e ao mundo que estávamos diante de um golpe parlamentar.

    Muita gente não gosta dessa expressão "golpe"; muitos Senadores, colegas nossos aqui, sentem-se desrespeitados quando falamos que é golpe, mas não há outro nome para que possamos qualificar o que está acontecendo hoje na República brasileira, não há outro nome para que possamos definir o que nós estamos passando no Brasil. Tiraram a Presidenta legitimamente eleita, colocaram um Presidente interino - que está mudando um programa de governo eleito nas urnas, em 2014, e tomando todas as medidas para impedir a continuidade de investigações - e dizem que a afastaram por crime de responsabilidade. Pois bem, nós não vemos outro conceito, a não ser dizer que esse processo é um golpe.

    Além do evidente desvio de finalidade praticado pelo Deputado Eduardo Cunha, outros motivos foram denunciados com o objetivo do golpe que tenta retirar do poder a Presidenta legitimamente eleita, que não cometeu nenhum crime, sequer o crime de responsabilidade, como está sendo acusada.

    Desde sempre, denunciamos que o impeachment de Dilma se tratava de uma estratégia para parar a Operação Lava Jato. Não fomos considerados, não fomos respeitados nessa nossa posição.

    Desde sempre, falamos que se tratava de ação para implementar um projeto de governo contra os mais pobres, que buscava desmontar todos os avanços sociais obtidos nos mais de 13 anos de governos do PT - aliás, não só os direitos obtidos em 13 anos desses governos do Presidente Lula e do Governo da Presidenta Dilma, mas também os direitos previstos desde a Constituição de 1988 -, com a retomada da agenda neoliberal, afastada do País desde a saída de Fernando Henrique Cardoso e dos tucanos do poder. Falamos várias vezes, mas também não nos deram ouvido, dizendo que era choro de quem estava perdendo o processo.

    Desde sempre, denunciamos que se tratava de uma desesperada tentativa de alguns voltarem ao poder através de um atalho, porque, afinal, não conseguiriam, pelas urnas, reconquistar a Presidência da República. Ou alguém tem dúvidas de que as propostas que o Presidente interino Michel Temer está fazendo ao Brasil ganhariam apoio popular? Por exemplo, a desvinculação do salário mínimo dos benefícios da Previdência ou o não reajuste do salário mínimo pelo valor real ou a redução de programas sociais, como o fim do Minha Casa, Minha Vida e a redução do Bolsa Família. Será que esses programas, colocados assim, como estão sendo colocados pelo Presidente, ganhariam a eleição? Claro que não! Só um golpe, só uma eleição indireta, só uma tomada de poder é capaz de colocar em prática propostas tão antipopulares como essa que agradam - a não ser quem? - o mercado financeiro.

    Enfim, é uma lista de objetivos nada republicanos em que nunca esteve presente o que exige a Constituição Federal para afastar uma Presidente da República: o crime de responsabilidade.

    Todos acompanhamos a evolução desse processo espúrio - estamos acompanhando. O Brasil e o mundo assistiram, com perplexidade, àquela sessão de baixo nível, escandalosa, da Câmara dos Deputados, que, mais uma vez, evidenciou o tanto que se tratava de um golpe. A maioria dos Deputados não sabia por que estavam votando ali, não tinha conhecimento do processo, não sabia sequer definir crime de responsabilidade. O mundo condenou aquela sessão. Foram vários editoriais de jornais muito qualificados, de jornais que são respeitados no mundo inteiro e que não têm linha editorial de esquerda ou de centro-esquerda, em que todos, unanimemente, questionaram aquela sessão e denunciaram que o que estava acontecendo no Brasil era um atentado à democracia.

    No Senado, houve um pouco mais de discrição e cuidado com as aparências, porém, depois da definição de um prazo no mínimo curto para a conclusão da admissibilidade, ouvimos da boca de inúmeros Senadores que votaram favoravelmente que aquela era apenas uma etapa para autorizar o início do processo. Muitos nesta Casa disseram que, em virtude dos indícios, votariam favoravelmente para que pudessem aprofundar a análise e assim comprovarem ou não o crime de responsabilidade. Por isso, a maioria aqui votou pelo afastamento. Mas nós dizíamos desde sempre: essa é a fase mais cruel do processo, porque ela retira o direito do exercício do poder da Presidenta eleita legitimamente, ela afasta essa Presidenta do poder. E foi isso o que aconteceu. É a maior agressão que nós podíamos ter a nossa democracia: afastar a Presidenta por 180 dias para que esta Casa pudesse fazer o seu julgamento, um julgamento - daqui a pouco, quero falar sobre ele - tão cheio de problemas, tão cheio de vícios, com tantas ações para inviabilizar a defesa ampla da Senhora Presidenta.

    Desde que chegou ao poder, as ações do Presidente interino ilegítimo comprovam a cada dia mais que se tratou de um golpe. Tudo que denunciamos antes foi feito desde o afastamento da Presidenta Dilma. Vejamos: a agenda neoliberal voltou, com medidas que buscam cortar programas e benefícios sociais, preservando intocados os direitos das camadas mais ricas da população. Inclusive, há os reajustes daqueles servidores públicos que ganham mais, como é o caso dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, já que o Presidente mandou para esta Casa um reajuste. Será que, em tempo de crise, nós temos que reajustar o salário de quem ganha mais e cortar a aposentadoria de quem ganha menos? Os juros da dívida não foram mexidos, e não há um projeto que veio a esta Casa para tratar sobre tributação progressiva, ou seja, cobrar a conta dos mais ricos. Não. Todos os projetos que vieram aqui foram para tirar dos mais pobres. É isso a que nós assistimos.

    Por isso, eu disse: esse é um programa que não ganharia a eleição. Nunca! Nunca! Ele só pode se concretizar através de um golpe, um golpe parlamentar, em que a maioria da Casa Legislativa se compromete a retirar direitos dos trabalhadores do povo, se compromete a dar reajuste para quem já tem salário alto e se compromete a resguardar os interesses do mercado financeiro. O PSDB e o Democratas voltaram ao poder depois de estarem afastados por quase 14 anos e foram afastados pela vontade popular, pois não conseguiram voltar na última eleição. Voltaram como? Através de um golpe. Apoiaram o golpe aqui, apoiaram o afastamento da Presidenta Dilma, num processo espúrio de impeachment, e voltaram juntos com o PMDB, com o Presidente interino Michel Temer, para governar o País.

    O Deputado e Presidente afastado da Câmara Eduardo Cunha conseguiu se manter por mais tempo no seu cargo e ainda agora goza do apoio explícito do Governo Temer para evitar a cassação. Ele dá as cartas, manda. Aliás, a Presidenta Dilma, na entrevista que deu ontem, deixou claro isto: o Governo do Presidente interino Michel Temer é orientado pelo Eduardo Cunha. E ele mantém todos os seus direitos, privilégios e regalias de Presidente da Câmara dos Deputados; não lhe foi tirado nem limitado o uso de aviões da FAB, não lhe foi limitado o uso de alimentação. Por que é que para a Presidenta Dilma foi limitado? A Presidenta Dilma não pode utilizar os aviões da FAB, a não ser para ir para Porto Alegre. Isso não foi definido para o Presidente afastado Eduardo Cunha.

    Tiveram o desplante de suspender o cartão alimentação para comprar alimentos no Palácio do Alvorada e ainda divulgaram dizendo que se gastava mais. Por que não divulgaram as contas do Palácio do Jaburu? Eu duvido que a Presidenta tenha gasto mais no Alvorada do que o Vice interino Michel Temer gastou no Jaburu durante esses últimos meses, inclusive com os convescotes e com as reuniões com Deputados e Senadores, sempre regados a jantares. Era importante que o Presidente colocasse as contas do Jaburu também e talvez, em uma ação que realmente lhe desse condições de ser sério, cortar também as suas despesas; mas não, ele continua recebendo um monte de gente, fazendo jantares, oferecendo vinhos. Por que reclamar da Presidenta? O Presidente da Câmara, também. São dois pesos e duas medidas que nós temos nessa gestão espúria.

    E pior de tudo: depois que foram reveladas as conversas do Senador Romero Jucá com o ex-Presidente da Transpetro Sérgio Machado, ficou claro que o objetivo de parar a Lava Jato também era um dos motivos do impeachment. Nós dizíamos isso: "Eles querem parar a Lava Jato." Aí diziam: "Não, são vocês que querem." Como nós que queremos? Essa Operação só foi possível porque nós tivemos na Presidência da República duas pessoas que tinham compromisso com a República brasileira, que tinham compromisso com a democracia, que tinham compromisso com a transparência. Só houve Operação Lava Jato porque nós votamos aqui, no Congresso Nacional - e veio por iniciativa do Executivo -, a Lei de Organizações Criminosas, que deu possibilidade de as delações premiadas serem realizadas; porque nós votamos aqui a Lei do Colarinho Branco; porque os governos do Lula e da Dilma fizeram o Portal da Transparência e a Lei de Acesso à Informação. Nós demos condições, ainda que doesse na nossa própria carne, que afastasse petistas, que prendesse pessoas. Por quê? Porque isso é importante para a democracia.

    O Brasil não pode ser uma república de banana e ser considerado um País em que a corrupção grassa, mas nós dizíamos lá atrás: "Vão abrir um processo de impeachment não é para analisar crime responsabilidade, é para tentar barrar essas operações de investigação." Não deu outra. Teve que sair uma fita gravada mostrando as conversas que se tinham para isso acontecer.

    Chama ainda a atenção nesse golpe o fato de que, por se tratar de um Presidente sem votos e, portanto, sem ter que prestar contas a ninguém, tenha escolhas tão ruins: um Ministério só de homens, quando 52% da população brasileira são mulheres, e, pelo simples fato de estarmos no ano de 2016, nós teríamos que ter representatividade feminina na gestão de um Governo brasileiro; um Ministério só de brancos, como se a maioria da população fosse branca, quando nós sabemos que a maioria da população não é branca, é negra, é mestiça, é parda.

    A SRª PRESIDENTE (Vanessa Grazziotin. Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - V. Exª me permite um aparte, Senadora?

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Pois não, Senadora Vanessa.

    A SRª PRESIDENTE (Vanessa Grazziotin. Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - O Brasil tem sido alvo de matérias extremamente negativas no mundo inteiro porque, diferente do que acontece aqui, os meios de comunicação de todos os países analisam que o que vem ocorrendo no Brasil é um golpe. Então, eles se incomodam não pelo fato de nós falarmos só, mas de o mundo dizer também em alto e bom som que é isso que está acontecendo,

    Mas o Brasil também tem sido criticado exatamente por isso: o Vice-Presidente, que assumiu interinamente, está fazendo tudo diferente do que prometeu fazer, tudo diferente, e está retrocedendo.

    Sobre essa questão das mulheres, no encontro que nós tivemos, foi aprovado por unanimidade, por aclamação, um comunicado repudiando esse fato.

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Em Portugal.

    A SRª PRESIDENTE (Vanessa Grazziotin. Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - Em Portugal. Repudiando o fato de, desde a década de 70, ser a primeira vez que um Governo é constituído sem que haja uma mulher no primeiro escalão. Isso é inadmissível. Isso aconteceu lá na época da ditadura, do General Geisel. Generais posteriores até colocaram mulheres; agora, este Presidente não. Mas o que é pior: além de acabar com o Ministério das Mulheres, Igualdade Racial e Direitos Humanos e de colocar um puxadinho - como diz V. Exª - no Ministério da Justiça, indicou lá uma mulher que tem posições contrárias às posições democraticamente aprovadas pelas mulheres brasileiras e que votou contra um projeto de lei que garantia igualdade salarial entre homens mulheres. É lamentável, Senadora.

    Nós dizemos isso, porque é necessário que se diga, é necessário que o povo tenha clareza do que estão fazendo com o nosso País.

    Parabéns!

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Obrigada, Senadora Vanessa. São muito bons os seus esclarecimentos. De fato, é um Ministério que não representa a maioria do povo brasileiro: homens brancos e um Ministério de ricos, de classe média alta, quando a maioria do povo é pobre; e um Ministério de pessoas antigas na política. Ainda que haja jovens, os jovens são filhos ou sobrinhos de políticos que já atuam há muito tempo no Brasil.

    É um Governo que extinguiu Ministérios, como disse aqui a Senadora Vanessa. Ele extinguiu o Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos e o colocou em um puxadinho do Ministério da Justiça. Com todos esses crimes bárbaros acontecendo com as mulheres e havendo programas que foram estruturados pela Presidenta Dilma e que poderiam ser acionados, o Presidente interino tira da cartola uma proposta de colocar a Polícia Federal, que é diminuta, que não tem efetivo, para fazer o acompanhamento de crimes contra as mulheres nos casos de estupro e de violência, desconhecendo completamente tudo que nós já tínhamos construído no país, em relação à defesa dos direitos das mulheres.

    É um Governo que extingue o Ministério da Cultura. Aí, só depois de muita pressão, depois que apanhou muito, voltou com o Ministério da Cultura. Mas mostrou para o povo brasileiro que não está nem aí com a cultura, que acha que a cultura é de segunda, de quinta categoria; que não precisa de política pública nem de Ministério. É um Ministério que, neste momento em que ciência e a tecnologia são tão importantes para o desenvolvimento de um país e de um povo, acaba também com o Ministério da Ciência e Tecnologia! Como pode não colocar como prioridade algo que é fundamental para o nosso desenvolvimento? Um Ministério que coloca a Previdência Social abaixo do Ministério da Fazenda, submetida à Receita Federal, como se Previdência Social fosse um problema de contabilidade pública, desconhecendo o que isso significa para a sustentação da maioria das famílias brasileiras pobres deste País! O que significou o aumento real do salário mínimo? O que significou você ter salário mínimo para remunerar com decência os aposentados brasileiros?

    Enfim, é uma tristeza só nós olharmos para o quadro desse Ministério. Sabem por que é isso? Porque não é um Ministério comprometido com o povo; porque não entrou pelo voto popular; entrou pelo voto dos Deputados, pelo voto dos Senadores. Então, é um Ministério que vai fazer o que esta Casa quiser; é um Ministério que vai fazer o que os Deputados quiserem.

    Eu fico me perguntando se nós temos hoje um Congresso Nacional que está à altura da representação da maioria do povo brasileiro pelo que nós estamos vendo em termos de comportamento e principalmente em termos de desmanche de direitos sociais. É um Governo que, depois de tantas manifestações do povo contra a corrupção, indica vários Ministros que são investigados. Aliás, todos nós vimos que dois ministros já caíram, e, por isso, outros devem cair também.

    Como se nada disso bastasse, como se não bastasse o fato de que o mundo inteiro, como disse a Senadora Vanessa, já atentou para isso e criticou, através dos principais jornais do Planeta, o golpe que está em curso no País, nós chegamos agora ao momento em que a Comissão Especial do Impeachment passou a adotar o tempo - o tempo - como única preocupação necessária, e não a defesa da Senhora Presidenta, não o conteúdo, não as provas. O tempo! Quer se terminar o mais rápido possível, porque isso é um desconforto para o Parlamento, é um desconforto para aqueles que estão no Governo.

    Quero fazer justiça, é claro - não poderia deixar de fazê-lo -, ao Presidente da Comissão, Senador Raimundo Lira, que tem tentado dar um tratamento correto ao assunto, cuja gravidade é a maior que existe na República hoje, pois se trata de afastar uma mulher que foi eleita por 54 milhões de pessoas e que tem responsabilidade com essas pessoas, e não só com o Parlamento brasileiro.

    A maioria dos membros da Comissão tem demonstrado muita pressa em encerrar o processo. Era isso que eu falava aqui com a Senadora Ana Amélia, era isso que a Senadora Vanessa falava aqui, é isso que temos tentado falar naquela Comissão. Como pode não nos deixarem produzir provas para mostrar que a Presidenta não praticou esses atos, esse crime de responsabilidade?

    Nós temos o prazo constitucional de 180 dias para fazer o julgamento da Presidenta. Quiseram nos dar 45. Depois que brigamos muito, talvez cheguemos a 80, mas eles querem acelerar. Querem colocar oito testemunhas para falar por dia e dizem que estão assegurando o direito de defesa porque nós temos 40 testemunhas. São 40 testemunhas que só podem falar por três minutos sobre as perguntas que nós fazemos. Eu posso fazer pergunta objetiva, mas a testemunha, às vezes, não pode responder, em três minutos, tudo que é perguntado.

(Soa a campainha.)

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Tentei perguntar a esse Procurador do Tribunal de Contas da União, Júlio Marcelo, que, aliás, a Senadora Ana Amélia confirmou que é um representante da instituição... Vou aqui dizer de novo, Senadora Vanessa, um representante da instituição não poderia ser testemunha de acusação. A instituição é auxiliar do Congresso Nacional para julgar contas, e não para fazer acusação. Então, tentei perguntar objetivamente ao Júlio Marcelo questões em relação ao orçamento, em relação ao julgamento das contas, em relação ao processo que nós estávamos vivendo, mas não me deixaram fazê-lo. Disseram que eu estava induzindo as respostas. Mas era pelo menos isso que nós precisávamos fazer para ocupar os seis minutos - tristes seis minutos - que nos deram em relação à arguição de testemunhas.

    Correu muito forte na Comissão e no Congresso Nacional que o objetivo é terminar o processo na Comissão antes das Olimpíadas, Senadora Vanessa...

(Interrupção do som.)

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Apoio Governo/PT - PR) - ... a pedido do Presidente Michel Temer, Presidente interino. Sabe por quê? Porque os Líderes internacionais não querem vir para as Olimpíadas, pois não reconhecem o Governo ilegítimo do Michel Temer e acham que a situação do impeachment não está definida e que a Presidenta Dilma quer voltar. Então, ele está desesperado por buscar a legitimidade internacional.

    O Ministro José Serra, que agora é Ministro interino das Relações Exteriores, não conseguiu se relacionar com nenhum chanceler, nem receber nem visitar, a não ser o Chanceler do Paraguai, porque não há reconhecimento desse Governo.

    Então, há pressa! Querem que votemos até 15 de julho, independentemente de se vamos defender a Presidente, de se ela vai ter direito de defesa. Têm que afastá-la. É uma barbaridade o que está acontecendo!

    E há um complô naquela Comissão. Vamos ver aqui quais foram os últimos acontecimentos da Comissão do Impeachment, lembrando que inúmeros Senadores anunciaram seu voto favorável à admissibilidade do impeachment para que, nessa fase, efetivamente pudéssemos aprofundar as investigações para, então, definir o voto. Nós temos observado, agora, uma tentativa cada vez mais evidente de cerceamento do direito de defesa, para que não possamos fazer o convencimento dos Senadores.

    Eu pergunto: como não aprovar uma perícia? O que haveria de problema em se aprovar uma perícia?

    Vou dizer aqui novamente: a decisão da Srª Presidente da República sobre qualquer matéria é uma decisão de caráter complexo, porque ela é Presidenta em um sistema complexo, ou seja, de vários assuntos. Ela, pessoalmente, não é obrigada e nem pode, humanamente, conhecer sobre tudo. Por isso nós temos técnicos, por isso há os ministérios, por isso há os departamentos especializados.

    Então, quando ela assina um decreto... Eu fui Chefe da Casa Civil e sei que é assim que acontece. Quando ela assina um decreto, esse decreto, antes de ela assinar, vem cheio de pareceres: parecer do Ministério da Fazenda, parecer do Ministério do Planejamento, parecer do Ministério fim - de cuja finalidade se está ali querendo mudar alguma coisa no Orçamento ou em alguma matéria legislativa. Depois, ainda há os pareceres dos técnicos da Casa Civil, da assessoria da Presidência da República. Ela ainda chama esse pessoal lá e pergunta: "É isso mesmo? Como é?" Sem tem dúvidas, manda refazer. Ela só assina quando o corpo técnico diz que está o.k., porque ela não tem obrigação, não só como Presidente, mas como ser humano, de conhecer tudo.

    Por isso, dizemos que isso é um sistema complexo de decisão. E, em sistemas complexos de decisão, não se pode avaliar a responsabilidade de forma objetiva simples. Tem de se avaliar essa responsabilidade objetiva de forma complexa. Ou seja, a responsabilidade da Presidenta não é só dela.

    Por isso, queríamos a perícia; para provar que ela assinou esses decretos, pelos quais está sendo julgada, de acordo com o que a legislação vigente disse, sempre disse - dizia e ainda diz -; de acordo com os pareceres do Tribunal de Contas em relação a contas de outros Presidente da República, em que eles podem ter feito ressalvas, mas não negado as contas, não dito que as contas não estavam aptas a serem aprovadas, não desaprovado as contas. Foi por isso que nós pedimos. Nós não temos um documento do Tribunal de Contas da União que explique como se dão as decisões da Presidente da República em relação aos decretos. Por isso a perícia seria importante.

    Nós teríamos um perito - não quiseram um internacional, tudo bem, ia ser nacional; nós temos conselhos de contabilidade pública, temos pessoas com capacidade no Brasil - que ia atestar isso. Atestaria que esses decretos assinados por ela estavam de acordo com tudo que foi feito antes, por outros Presidentes e pelo Tribunal de Contas. Mas está valendo o quê? A palavra de um procurador do Tribunal de Contas da União, o Sr. Júlio Marcelo, que, aliás, foi lá fazer exposição pelo Tribunal de Contas e, depois, agora, foi como testemunha de acusação, de denúncia. Isso não pode! Está errado!

    Nós queríamos perícia, para a perícia dizer que não há um ato sequer da Presidência da República na gestão do Plano Safra, junto ao Banco do Brasil; que ela não tem nenhuma responsabilidade sobre o atraso de repasse das subvenções dos juros para esse plano.

    Porque hoje dizem que a Presidenta da República é responsável. Mas onde está a assinatura dela? Onde está a determinação dela em que ela disse que era para atrasar? Ela lançou o Plano Safra e disse: olha, nós queremos colocar tantos bilhões para subvencionar os juros dos nossos agricultores. A lei que regulamenta esse Plano Safra é de 1992, e quem administra é o Conselho Monetário Nacional, quem administra é o Ministério da Fazenda, o Ministério da Agricultura. Mas isso, nenhum membro do Tribunal de Contas da União diz. Isso, o Sr. Júlio Marcelo não deixa claro; quando perguntamos, tergiversa, sai, fala de outra coisa.

    Por isso queríamos um perito que trouxesse à Comissão uma certidão dizendo: é assim que funciona. A Comissão poderia até decidir contrariamente à Presidenta e dizer: não aceito essa perícia. Mas isso ficaria registrado para a história, e a história não compactua com a mentira. A mentira pode durar um determinado tempo, mas não dura pela eternidade. E nós queremos que a história redima a Presidenta Dilma e esta situação que estamos vivendo.

    Negaram a perícia. Lembro, inclusive, que o Senador Cristovam Buarque votou favoravelmente à realização de perícia e afirmou de maneira simples: não vai ter atraso e nem custo alto para o processo, e só pode agregar no convencimento dos Srs. e Srªs Senadoras. Aliás, uma boa perícia poderia servir também à Acusação. E sabe por que não quiseram a perícia? Porque têm medo, medo de saberem que estão errados, medo de a verdade vir à tona. Não há outra justificativa! E querem apressar o quanto antes. Aí dizem: mas vocês têm testemunhas, têm 40 testemunhas. São 40 testemunhas, que, para cada pergunta, para cada inquirição de Senador, têm apenas três minutos para falar? De que forma vamos evidenciar o processo? De que forma vamos fazer produção de provas? Está muito difícil esta Comissão, está muito difícil fazermos argumentação. A cada dia que nós estamos lá somos desrespeitados. Dizem que fazemos chicanas, que queremos atrasar o processo, que falamos demais, que ficamos histéricas. Aliás, é histéricas a palavra que geralmente usam quando se referem às Senadoras.

    A última reunião da Comissão foi terrível. Tivemos que ouvir do Senador Caiado que estávamos ansiosas. Estávamos eu e a Senadora Vanessa fazendo o debate com ele, mas também estavam o Senador Lindbergh e outros Senadores, homens, e ele disse: "V. Exªs estão muito ansiosas." Para quê? Para tentar desconstruir? Para dizer que mulher não tem argumento? Que é por ansiedade? Muitas vezes, temos que gritar na Comissão e não é porque gostamos de gritar, gente! É porque não nos ouvem, cortam o microfone, não nos dão a palavra, não nos dão o tempo. Eles estão em 15 pessoas, estamos em cinco. Revezam-se para falar, para fazer questão de ordem, e, quando fazemos mais de uma questão de ordem, dizem que estamos querendo interromper os trabalhos da Comissão. Só que eles fazem várias questões de ordem por Senadores e Senadoras diferentes.

    Então, eu queria falar ao público que está nos ouvindo agora para não achar que estamos lá querendo fazer chicana e atrapalhar. Estamos lá numa minoria, resistindo, defendendo a democracia, defendendo o Estado de direito e defendendo a Presidenta, que tem direito a ser defendida pela Constituição Federal. Porque, se nós não exercermos o direito de defender a Presidenta, como manda a Constituição, que outros cidadãos terão condições de recorrer à Constituição para ter também a sua defesa assegurada?

    Por isso é importante, para quem nos está ouvindo: nós precisamos ter espaço nesta Comissão. O que estão fazendo não é correto; estão tratorando a gente lá. Não nos estão deixando falar; não nos estão deixando produzir provas; não nos estão deixando produzir perícia; não nos estão deixando, inclusive, inquirir as testemunhas, como nós devíamos fazer.

    Enfim, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, sabemos que o julgamento é jurídico e político, mas é jurídico também e não só político. Tem que observar os ritos minimamente razoáveis para assegurar o direito de defesa num processo que se trata do que há de mais importante no presidencialismo que é a perda de mandato de uma Presidenta democraticamente eleita.

    Esta é a decisão mais difícil num sistema democrático: tirar do Poder alguém legitimado pelo voto. É possível? É possível. A Constituição prevê? Prevê. Mas a Constituição prevê também um processo legal, um processo que tem todas as suas fases delineadas, delimitadas, um processo que não está sendo respeitado no Senado da República. Apesar de o Presidente da Comissão, Raimundo Lira, esforçar-se, a maioria que está lá não está deixando que o devido processo legal se dê para defender a Presidenta e para poder legitimar qualquer afastamento dela.

    Nós vamos recorrer, sim. E, se não conseguirmos recorrer junto ao Supremo Tribunal Federal - que infelizmente ultimamente tem tido posicionamentos muito questionáveis -, nós vamos recorrer para a história, e, lamentavelmente, vai ficar manchada na história do nosso País a violência que se está fazendo.

    Se não tivermos os cuidados mínimos com esse processo de demonstrar à sociedade brasileira e mundial que estamos diante de um julgamento sério que busca efetivamente provar ou não a culpa da Presidenta pelos crimes de responsabilidade que foram denunciados, nós estaremos, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, a meu juízo, confirmando ainda mais que se trata de um golpe, gostem de ouvir ou não, mas será um golpe agora e para a história.

    Obrigada, Srª Presidenta.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/06/2016 - Página 30