Pronunciamento de Randolfe Rodrigues em 08/06/2016
Pela Liderança durante a 90ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
Satisfação com os resultados alcançados pela Operação Lava Jato no combate à corrupção mediante a utilização do instituto da colaboração premiada.
- Autor
- Randolfe Rodrigues (REDE - Rede Sustentabilidade/AP)
- Nome completo: Randolph Frederich Rodrigues Alves
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Pela Liderança
- Resumo por assunto
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CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PUBLICA E IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA:
- Satisfação com os resultados alcançados pela Operação Lava Jato no combate à corrupção mediante a utilização do instituto da colaboração premiada.
- Publicação
- Publicação no DSF de 09/06/2016 - Página 45
- Assunto
- Outros > CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PUBLICA E IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA
- Indexação
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- ELOGIO, OPERAÇÃO, AUTORIA, POLICIA FEDERAL, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL, OBJETIVO, COMBATE, CORRUPÇÃO, COMENTARIO, IMPORTANCIA, LEGALIDADE, DELAÇÃO PREMIADA.
O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco Socialismo e Democracia/REDE - AP. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Agradeço a V. Exª, Senador Paulo Paim, que preside esta sessão, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, aqueles que nos assistem e os que nos ouvem pela Rádio e TV Senado. Sr. Presidente, de todas as instituições brasileiras, talvez a pior para a nossa história e a mais duradoura seja a instituição da corrupção. O nosso organismo político tem sido, ao longo destes 500 anos de história, foco persistente em estado febril e foco de infecção que tem origem crônica por dentro das estruturas do Estado brasileiro.
De fato, Sr. Presidente, foi sempre assim, continua sendo assim, mas, pela primeira vez, parece-me que não será mais assim. Tudo isso graças ao mais retumbante, eficaz e inspirador movimento que tem surgido no País, no sentido do combate à corrupção, que é a Operação Lava Jato. O abrangente trabalho de investigação que a Força Tarefa do Ministério Público Federal, em Curitiba, e do próprio Juiz da 13ª Vara Criminal, realiza há dois anos, desvendando as entranhas dos esquemas de corrupção, presentes na administração pública brasileira.
Esta Operação contraria, Sr. Presidente, uma velha tradição de uma justiça que se tinha por preconceito, preconceito de classe, uma justiça que era tida por lenta, seletiva e improdutiva. Essa lógica desta justiça, na 13ª Vara Criminal de Curitiba, não tem se consumado. Esta Operação devolveu aos brasileiros a crença perdida nos tribunais e nos juízes: tinha-se uma máxima de que a justiça era só para os ricos, perdão, que a justiça beneficiava os ricos e só era aplicada contra os pobres.
São os números, Sr. Presidente, da Lava Jato, em apenas dois anos de atuação, que impressionam os brasileiros mais descrentes. O que fez, até agora, a Operação Lava Jato? Os números são impressionantes. Apurou o desvio de quase R$43 bilhões de corrupção, Sr. Presidente. Já identificou propinas no valor de R$6,4 bilhões, além de estimar outros R$10 bilhões de subornos variados. A Operação Lava Jato já teve como resultado 108 pedidos de cooperação internacional com 36 países, muitos destes paraísos fiscais. O Ministério Público Federal, Sr. Presidente, já recuperou para o nosso País R$5,3 bilhões, R$5,3 bilhões de dinheiro do contribuinte brasileiro já foram repatriados, quase R$659 milhões, enquanto outros R$2,4 bilhões estão bloqueados em contas nacionais e estrangeiras e aguardam procedimentos para retornarem aos cofres do Estado brasileiro.
Já ocorreram mais de 1.200 procedimentos judiciais instaurados, gerando 608 buscas e apreensões, com 161 mandados de condução coercitiva cumpridos.
Na investigação, Sr. Presidente, foram formuladas 41 acusações criminais contra 207 pessoas. Nesse grupo, 160 pessoas acabaram presas, com 73 prisões preventivas decretadas, além de outras 87 prisões temporárias. Estão envolvidas nos processos da Operação Lava Jato dezesseis empresas, entre elas as nove maiores e mais influentes empreiteiras do País. Quem poderia imaginar que o príncipe dos empreiteiros, da empreiteira Odebrecht, poderia algum dia ir para a prisão. Já está há um ano em Curitiba.
Essa operação desvendou um esquema de cumpliciamento entre privado e público e demonstrou as entranhas do funcionamento lastimável do sistema político brasileiro. Demonstrou como eram capturados contratos superfaturados, que dilapidavam nossa principal empresa estatal, a Petrobras. Dos presos investigados, 105 já foram condenados, somando até hoje em penas 1.140 anos, 9 meses e 11 dias. Isso não tem precedente na história nacional.
Mas tudo isso, Sr. Presidente, só ocorreu devido e principalmente a 52 acordos de colaboração premiada com corruptos que se arrependeram e passaram a colaborar com a Justiça e passaram a colaborar, dessa forma, com o Estado brasileiro. Com outros cinco acordos de leniência firmados com as maiores empreiteiras do País, as maiores construtoras e os principais executivos dessas construtoras, foi abalado por essa operação o centro do poder político nacional, os principais partidos, o Parlamento. Todas as instituições estão no olho desse furacão.
É por isso, Sr. Presidente, dessa dimensão da Operação Lava Jato, é exatamente por isso, justamente por isso, que nesta hora decisiva, em que o Brasil espera muito e cada vez mais da Operação Lava Jato, que surgem comentários de todas as formas e ameaças à operação. A maior ameaça que existe à Operação Lava Jato não ocorre como ocorreu contra a Operação Mãos Limpas, lá na Itália, onde ocorriam as ameaças contra os juízes e contra os membros do Ministério Público. A principal ameaça, lamentavelmente, vem do Legislativo. São as ameaças para alterar o instituto da colaboração premiada.
Sr. Presidente, ao contrário do que se diz, a colaboração premiada não é um instituto de estado de exceção, é um instituto do Estado democrático de direito. É óbvio que, no Estado democrático de direito, há o princípio da ampla defesa, do contraditório, da presunção de inocência, que são princípios não somente do Estado de direito moderno, mas são princípios de fundação do Estado de direito, presentes inclusive nos primeiros movimentos de democracia liberal existentes no mundo no século XVIII. É um princípio fundante dos direitos humanos esses princípios que aqui citei.
Mas o Estado de direito também é alicerçado sobre outros princípios como é a nossa Constituição. É também princípio do Estado de direito, na Administração Pública, não roubar, não deixar roubar, pôr na cadeira quem rouba. Quem disse isso não fui eu. Quem disse isso foi Ulysses Guimarães, na promulgação da nossa Constituição em 1988.
O que ocorre, Sr. Presidente, é que o principal instituto que alicerça a Operação Lava Jato, o da colaboração premiada, tem sido atacado de forma subterrânea, de forma envergonhada. Na verdade, se tramam mudanças na lei, a princípios de defender o Estado de direito e com o objetivo concreto de atingir o sucesso da Operação Lava Jato e atingir a continuação e os passos futuros da operação. São gravações que revelam isso, são movimentos, às claras, inclusive, no Parlamento que revelam isso, que revelam uma mobilização para que o instituto da colaboração premiada, lamentavelmente, não triunfe, não continue alicerçando a maior operação da história do País de combate à corrupção.
Os inimigos da Operação Lava Jato se multiplicam na justa medida e na medida diretamente proporcional a que ela avança sobre a corrupção. A hostilidade a essa operação e ao instituto da colaboração premiada, neste momento, eu me atrevo a dizer dessa tribuna, é uma hostilidade ao Brasil, é uma hostilidade às instituições do Estado democrático de direito, é uma hostilidade ao passo fundamental que nós devemos viver na vida nacional, que é o passo do enfrentamento à corrupção. Não somente à corrupção pequena, àquela que se dá, às vezes, corrompendo guarda de trânsito, mas à grande corrupção: à grande corrupção dos ladrões de colarinho branco, à grande corrupção que triunfou neste País durante 500 anos. Por isso, é graças a essa operação que nunca se recuperou tanto dinheiro em tão pouco tempo na história deste País, no decorrer de uma investigação.
O instituto da colaboração premiada é um instituto que ocorre em todas as democracias sérias deste mundo. Os países civilizados sustentam, estimulam a colaboração premiada, porque ela traz o criminoso de volta ao Estado de direito. A ideia da colaboração premiada é tirar o criminoso do crime, dar uma oportunidade a ele de ressocialização e colocá-lo de volta ao Estado de direito, colaborando, contribuindo com a Justiça para o desmantelamento da atuação de organizações criminosas.
A colaboração premiada surge em países como a Itália, Sr. Presidente, e Espanha, na década dos anos 1960-1970 do século passado. Surge como instituto para combater o terrorismo. Nos anos seguintes, a colaboração premiada evoluiu para o combate à corrupção como uma forma de atacar com vigor uma praga que se espalha pelo Estado nacional, que ameaçava implodir a credibilidade dos governantes e a credibilidade da política. E, Sr. Presidente, quando a credibilidade da política é abalada se estabelece o regime de exceção. A política é o regime da democracia, então é indispensável o combate à corrupção como sustentáculo da defesa da democracia.
Nos Estados Unidos, Sr. Presidente, o trinômio simplicidade-celeridade-eficiência explica, em boa parte, o respeito que a Justiça conquistou, uma fórmula que é a mesma que ocorre com a Operação Lava Jato.
Na Justiça americana, estimativas indicam que cerca de 90% das pessoas investigadas ou acusadas optam por se declararem culpadas, escapando de julgamentos e penas maiores pelo recurso da delação. É clássico, em qualquer julgamento nos Estados Unidos, antes, o réu declarar-se culpado ou inocente. Repito, 60% se declaram culpados em função de quê? Em função de colaborarem com a Justiça a partir dali.
É um recurso - a colaboração premiada, Sr. Presidente - tão eficaz que, na Itália se estabeleceu um atenuante para criminosos de extorsão mediante sequestro sempre que sua colaboração premiada ajudasse a vítima a readquirir a liberdade, sem o pagamento de resgate. Nesse caso, penas que poderiam ser de prisão perpétua podem ser convertidas em penas de 12 a 20 anos de prisão.
Há um clássico caso na Itália, Sr. Presidente, do mafioso Tommaso Buscetta, que foi preso no Brasil em 1983, como um dos chefes mais importantes da Cosa Nostra siciliana. Extraditado para a Itália, Tommaso ajudou a desmontar a máfia italiana colaborando com as investigações do Juiz Giovanni Falcone, uma versão italiana de juiz decente e honesto. Sua delação, a delação de Tommaso, possibilitou que 475 mafiosos, na Itália, fossem para o banco dos réus, dos quais 350 foram condenados pelo Juiz Giovanni Falcone. O chamado Maxiprocesso da máfia produziu um total de 2.665 anos de cadeia - mais do que o dobro da Operação Lava Jato até agora -- e outras 19 penas de prisão perpétua.
Esse episódio da realidade da Operação Mãos Limpas, na Itália, será discutido e debatido, essa experiência, aqui no Brasil, nos próximos dias 27, 28 e 29, por uma iniciativa do Conselho Nacional do Ministério Público, da Procuradoria-Geral da República, do Supremo Tribunal Federal. Essas instituições realizarão o Seminário Internacional Brasil-Itália sob a experiência da Operação Lava Jato do Brasil e a experiência da Operação Mãos Limpas lá na Itália. Nesse seminário se buscará, em especial, que não ocorra no Brasil o que, lamentavelmente, após a Operação Mãos Limpas, ocorreu na Itália. Na Itália, após a Operação Mãos Limpas, ocorreu um retrocesso na legislação penal italiana por força e obra do Parlamento, que se viu atingido pelas investigações que mostravam as relações dos membros da máfia siciliana com os membros da política italiana.
Isso o que ocorreu lá não pode ocorrer no Brasil. Aqui no Brasil nós temos de caminhar no sentido oposto, fortalecendo o instituto da colaboração premiada, por um lado, e avançando em aprovação, aqui no Parlamento, como por exemplo, de iniciativas das dez medidas propostas pelo Ministério Público.
Dentre elas, uma das que eu considero a principal de todas é a criminalização do caixa dois de campanha, porque não basta, Senador Telmário, apenas acabar com o financiamento privado de campanhas. É fundamental, além do fim do financiamento privado de campanhas, criminalizar aquele que incorrer na pena, aquele que subverter a lei, aquele que subverter a norma e insistir em receber financiamento de empresas em campanhas.
O conceito de colaboração premiada não é algo novo. Ela vem desde o governo do Presidente Fernando Collor, quando a Lei nº 8.072, de 1990, a chamada Lei dos Crimes Hediondos, permitiu a redução em 2/3 da pena de delatores que permitissem o desmantelamento, pela polícia, de quadrilhas engajadas em crimes como tortura, tráfico de drogas e terrorismo.
Uma lei posterior, a Lei nº 8.137, beneficiou delatores de crimes contra o sistema financeiro e a ordem tributária.
Em 1998, no governo Fernando Henrique, a Lei nº 9.613 estendeu a colaboração premiada ao combate à lavagem de dinheiro e, no ano seguinte, a Lei nº 9.807 regulamentou a proteção a testemunhas que fizessem a colaboração.
Em 2006, no governo do Presidente Lula, foi assinada a Lei nº 11.343, ampliando os benefícios da colaboração contra o crime de tráfico de drogas.
A Presidente Dilma firmou a Lei nº 12.529, em 2011, ainda em seu primeiro mandato, e ali já se previa a instituição do acordo de leniência para aceitar a delação, colaboração premiada nos crimes contra a ordem econômica, especificamente nos arts. 86 e 87 da respectiva lei.
Portanto, Sr. Presidente, a colaboração premiada é um instituto legal na história do nosso direito que, há pelo menos 20 anos, tem sido aperfeiçoada. Não pode ser aceito, Sr. Presidente, em um momento com esse que se tenha ofensivas contra essa conquista do nosso Estado democrático de direito.
A colaboração premiada é uma conquista do aperfeiçoamento do nosso Direito Penal. Não é simplesmente a colaboração premiada, como alguns tentam aventar, um instituto da acusação. A colaboração premiada é um instituto da defesa. Por meio dela, a pena pode ser reduzida e, em alguns casos, a pena pode, inclusive, ser extinta.
Com a colaboração premiada é possível que aquele criminoso seja restaurado ao Estado de direito, saindo da condição de réu, saindo da condição de investigado para, diante da sua colaboração, passar a ser um agente que colabora com o desmantelamento de organizações criminosas.
Não tem paralelo tentar assemelhar a colaboração premiada com delação, com delatores, com traidores. Não tem paralelo, como já foi feito, comparar o colaborador, o delator a Joaquim Silvério dos Reis. A situação é inversa a essa. No caso de Tiradentes e de Joaquim Silvério dos Reis, o traidor, naquele caso específico e em todos os casos assemelhados a este, é um canalha que delata os mocinhos aos bandidos.
Na colaboração premiada, aquele que colabora com a Justiça desmantela os bandidos para os mocinhos, neste caso o Estado brasileiro.
Portanto, Sr. Presidente, eu vim aqui à tribuna para fazer esse testemunho e relatar a história deste instituto em nosso Direito Penal nos últimos 20 anos, em especial para destacar que este instituto não tem origem em nosso País, este instituto tem origem em todas as nações democráticas que aperfeiçoaram o seu ordenamento jurídico penal. Este instituto é o principal alicerce responsável pelo sucesso da maior operação de combate à corrupção em nosso País.
Portanto, em um instituto deste, que aperfeiçoa nosso Estado de Direito, um instituto deste que melhora a nossa democracia e que melhora o nosso sistema penal não pode, em nenhuma hipótese, ser aceita qualquer tipo de ofensa, seja ofensa a detratar o instituto, seja ofensa a tentar modificá-lo por qualquer um dos projetos que tramitam aqui no Congresso Nacional ou por qualquer iniciativa nesse sentido.
Ao invés de andarmos para trás, como foi feito na Itália pós Mãos Limpas, nós temos que andar para frente, aperfeiçoando, garantindo a integridade do instituto da colaboração premiada e aprovando medidas...
(Soa a campainha.)
O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco Socialismo e Democracia/REDE - AP) - ...propostas pelo Ministério Público, como é o caso das Dez Medidas de Combate à Corrupção.
Agradeço a V. Exª.