Discurso durante a 91ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentários sobre a situação econômica do País; e outros assuntos.

Comentário sobre a situação de miséria em que vive o povo haitiano.

Autor
Jorge Viana (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Jorge Ney Viana Macedo Neves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ECONOMIA:
  • Comentários sobre a situação econômica do País; e outros assuntos.
POLITICA SOCIAL:
  • Comentário sobre a situação de miséria em que vive o povo haitiano.
Aparteantes
Cristovam Buarque, Magno Malta.
Publicação
Publicação no DSF de 10/06/2016 - Página 35
Assuntos
Outros > ECONOMIA
Outros > POLITICA SOCIAL
Indexação
  • COMENTARIO, CRISE, ECONOMIA NACIONAL, APREENSÃO, CRESCIMENTO, INFLAÇÃO, REGISTRO, DEBATE, COMISSÃO DE RELAÇÕES EXTERIORES (CRE), ASSUNTO, IMPORTANCIA, ACORDO DE COOPERAÇÃO ECONOMICA E INDUSTRIAL, AMBITO INTERNACIONAL, APROXIMAÇÃO, ARGENTINA, AUMENTO, LUCRO, UTILIZAÇÃO, MODELO ECONOMICO, CHINA.
  • APREENSÃO, SITUAÇÃO, MISERIA, POBREZA, POPULAÇÃO, HAITI, NECESSIDADE, ACOLHIMENTO, PESSOAS, PAIS, ELOGIO, ARTIGO DE IMPRENSA, AUTORIA, ARTISTA, TELEVISÃO, ASSUNTO, CRITICA, DESIGUALDADE SOCIAL, COMENTARIO, MENOR, REFUGIADO, ENTRADA, ESTADO DO ACRE (AC), REGISTRO, COOPERAÇÃO, GOVERNO BRASILEIRO, GOVERNO ESTRANGEIRO, OBJETIVO, EMBARQUE, PAIS ESTRANGEIRO, GUIANA FRANCESA.

    O SR. JORGE VIANA (Bloco Apoio Governo/PT - AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Senador Presidente Aloysio Nunes, eu queria fazer uma brevíssima ponderação sobre o comentário de V. Exª em relação ao episódio ocorrido na Venezuela.

    De pronto, independentemente de nós termos, aqui mesmo, posições diferentes - alguma coisa -, em uma convergimos: a de considerar inaceitáveis agressões a Parlamentares, porque saíram das urnas e têm uma representação dada pela democracia e pelo voto popular.

    Eu mesmo, Senador Aloysio, veja bem: o Brasil está vivendo um preâmbulo de intolerância com que eu não concordo, seja para que lado for. Amigos deixando de ser amigos, pessoas divergindo por conta dos problemas que temos pela frente.

    Só um breve comentário: nesta semana, saiu uma ação grave do Ministério Público Federal, envolvendo nosso Presidente Renan e outros colegas. Todos estamos - e o próprio Presidente, com serenidade, se posicionou - esperando uma decisão do Supremo. Mas isso já foi suficiente para que eu mesmo, que não tenho nenhuma pretensão de sentar-me nessa cadeira, porque acho que nós temos de trabalhar para que haja normalidade, e o Senado é parte da solução, não é parte da crise brasileira... Temos que cumprir bem isso. Então, eu quero crer que o Presidente Renan vai concluir o seu mandato até fevereiro, e eu apenas o papel de Vice. Mas, só em se aventar essa coisa, eu já virei alvo de coisas verdadeiramente absurdas, por conta desse confronto que a gente vive hoje. Se eu não fui Líder nesta Casa e se eu não ocupei outras funções é porque eu também quero aqui cumprir bem o mandato de representar o povo do Acre e ajudar o meu País, ajudar o Senado Federal a se firmar perante a sociedade. E é tão somente esse propósito que eu tenho.

    Portanto, acho que nós temos realmente que encontrar uma maneira de uma convivência com a divergência, mesmo nessa questão do impeachment, que envolve dois lados que têm possibilidades, pois é uma lei da década de 50, e aqui nós vamos decidir no voto o que entendermos ser melhor para o País. É grave ter uma Presidente afastada? É grave ter um Presidente interino? É muito grave.

    O Senador Armando fez um discurso brilhante. Ele conseguiu garimpar algo verdadeiro no meio desta crise, ou seja, que o Brasil, que o Governo Federal, por ter feito o dever de casa, por ter ajustado o câmbio - que pode ter danificado algumas empresas, é verdade, mas ele deixou de ser algo que prejudicava o País -, por ter ajustado especificamente isso, por ter construído um processo de estabelecer uma política para o setor industrial brasileiro - que V. Exª coordenou -, o resultado está vindo: fazia muitos anos que nós não tínhamos superávit na balança comercial, e podemos chegar a R$50 bilhões de superávit! Isso não é pouca coisa; é muita coisa no mês que tivemos uma inflação teimosamente se elevando e indo a 0,78%, a maior inflação.

    Então, não adianta nós tentarmos disputar e brigar com suas excelências os fatos. A inflação crescente nos preocupa a todos, porque mete a mão no bolso dos que menos podem. E é um desafio que o Presidente Michel Temer tem que encarar até que se tenha uma decisão final, e nós também, que acreditamos e esperamos que o Brasil volte à normalidade democrática.

    Mas a situação é tão crítica, como disse hoje aqui o Senador Requião, que penso que não temos mais como trabalhar, nem de um lado, nem de outro, num ambiente de plena normalidade. Nós temos que encontrar um caminho que nos ajude a achar uma saída para o Brasil e, pela via institucional e pela democracia, fazer essa travessia que a sociedade espera de todos nós. Eu acredito e espero que possamos vencer isso.

    Também queria, Sr. Presidente, Senador Aloysio, dizer por último que gostaria que constasse, no meu pronunciamento, o trabalho que fizemos hoje na Comissão de Relações Exteriores. Mesmo numa crise. Mesmo na dificuldade.

    Nós temos, no nosso País, 200 milhões de habitantes; na Argentina, são 43 milhões. Quando se juntam essas duas economias, elas são economias importantíssimas para o mundo. Eu fazia referência hoje a que - quem sabe? -, aproximando os Parlamentos, nós saiamos de um erro histórico.

    Senador Cristovam, V. Exª, que é da Comissão e que também sempre tem... Eu me referia hoje a um erro histórico nosso, nos debates que fizemos sobre a China. A China é um país que, cada vez mais, ganha influência na economia global em todos os aspectos, e ela tem uma relação com os seus vizinhos que é pedagógica: todos os vizinhos da China ganham dinheiro com ela na relação comercial. Todos.

    E como é que funcionam os Estados Unidos conosco? Os Estados Unidos ganham dinheiro com todos os vizinhos, mas o Brasil também ganha dinheiro com todos os vizinhos, Senadoras e Senadores, Senador Maranhão. Todos os vizinhos nossos perdem dinheiro na relação comercial conosco! Isso é uma maneira adequada de tratar os vizinhos? Eu falei aqui da tribuna essa semana.

    O apresentador Luciano Huck foi ao Haiti ontem. Ele estava fazendo um comentário, durante a transmissão, na Globo, do jogo Brasil x Haiti. E eu até faço aqui algo: meu Botafogo está na lanterna do Brasileirão; mal saiu da primeira divisão, já está em primeiro lugar da segunda divisão, porque é o último da primeira. Mas o Luciano Huck, naquele sete a um lá, comentou que ganhar do Haiti de sete a um no futebol é uma coisa, mas lembrou a derrota de sete a um para a Alemanha.

    O Sr. Magno Malta (Bloco Moderador/PR - ES) - Foi um a sete.

    O SR. JORGE VIANA (Bloco Apoio Governo/PT - AC) - Um a sete. Aquele valeu mais que sete.

    O Sr. Magno Malta (Bloco Moderador/PR - ES) - Aquele gol deles...

    O SR. JORGE VIANA (Bloco Apoio Governo/PT - AC) - Muito bem, eu assino embaixo, Senador Malta.

    Mas o Luciano Huck apresentou lá um vídeo, que eu já tinha comentado aqui, porque ele escreveu um belo artigo sobre a situação, Senador Aloysio, de absoluta miséria que o povo haitiano enfrenta a poucos quilômetros do território americano, a maior economia do mundo. Isso não é justo.

    Está lá o Brasil gastando uma enorme quantidade de recursos, com o nosso Exército presente, procurando ser solidário, e isso os haitianos agradecem. Só no meu Estado do Acre, passaram 37 mil haitianos entre 2010 e este ano! O Governador Tião Viana foi agredido, atacado, até de maneira preconceituosa, porque criou um campo de refugiados. O que é que nós íamos fazer? Chegavam cem haitianos, duzentos, todo dia. Você tinha que dar de comer, tinha que dar um abrigo. Nós não os tínhamos convidado. Eles chegaram pela estrada que vem pelo Equador e pelo Pacífico, pelo Peru, e depois queriam seguir para São Paulo. E nós fomos acusados de exportar haitianos para São Paulo, quando a gente, quando o Governador Tião Viana estava apenas fazendo um gesto humanitário, e um gesto humanitário que envolveu quase R$30 milhões, dos quais o Governo Federal pagou perto da metade; a outra metade foi paga pelo nosso Estado, que não tem nenhuma prerrogativa, nem constitucional, de cumprir essa missão, mas, quando a questão é humanitária, nós não temos que medir esforços.

    E o Luciano Huck falou uma frase muito forte. Ele repetiu ontem, escreveu no artigo dele: "Indo ao Haiti, eu tive a impressão e cheguei à conclusão de que a humanidade fracassou". Eu acho que se devem usar frases desse jeito.

    Estou fazendo um paralelo com a nossa relação com os vizinhos. A gente fala tanto do Paraguai, mas o Paraguai, por mais que a gente não assuma, sempre é tratado pelos brasileiros com preconceito nas conversas, nas relações, em tudo. É sempre assim.

    Acho que nós deveríamos nos espelhar na China. A China estabelece relações comerciais, põe cadeias produtivas nos vizinhos, compra produtos com alto valor agregado dos vizinhos, importa, paga por isso e ganha dinheiros dos países que estão longe dela. Se tem alguma coisa que a gente pode pegar como uma boa referência - e não estou excluindo outras - é isso.

    Talvez essa proximidade entre Brasil e Argentina possa nos permitir mudar também essa lógica secular de que quem pode mais explora quem pode menos. Não acredito que o mundo fique melhor numa relação assim. Quem pode mais ajuda mais, quem pode mais estende mais a mão. É isso que está faltando nessa geopolítica em que nós vivemos aqui.

    Os Estados Unidos são uma potência, mas eles talvez tenham passado para nós essa coisa que é inaceitável. Mesmo com Cuba, quantos anos ficaram? Agora o Presidente Obama fez o primeiro grande gesto para tentar acabar com aquele bloqueio. Quem sabe a gente possa ver.

    Então, era isso.

    O Senador Cristovam quer um aparte e concluo já, Sr. Presidente.

    O Sr. Cristovam Buarque (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Senador Jorge Viana, em primeiro lugar, fico satisfeito que o senhor esteja chamando a atenção de todos nós para essa frase especialmente do jornalista...

    O SR. JORGE VIANA (Bloco Apoio Governo/PT - AC) - Do apresentador Luciano Huck. É uma personalidade brasileira.

    O Sr. Cristovam Buarque (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Apresentador. É absolutamente conhecido no Brasil, uma grande personalidade, que tinha um programa que cheguei a elogiar aqui. Chamava-se "Soletrando". Era uma verdadeira... Como se faz a de Matemática, ele fazia com o soletrar palavras. Pois bem, essa frase é verdadeira, correta e oportuna a respeito do Haiti, onde ele esteve. Por isso ele tinha que fazer pelo Haiti. Mas o sentimento de fracasso da humanidade a gente vê olhando ao redor, muitas vezes perto de nós, com o fracasso pela droga espalhada...

    O SR. JORGE VIANA (Bloco Apoio Governo/PT - AC) - Na cidade em que a gente vive, não é?

    O Sr. Cristovam Buarque (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Na cidade em que a gente vive, dobrando a esquina da rua onde a gente mora, ao ver tanta pobreza, ao ver o noticiário sobre o que acontece com os migrantes...

    O SR. JORGE VIANA (Bloco Apoio Governo/PT - AC) - Os estupros...

    O Sr. Cristovam Buarque (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Os estupros. Dá a impressão mesmo de que fracassamos. E, na verdade, creio que tudo isso é o resultado do fracasso do sucesso. Nós tivemos um sucesso tão grande do ponto de vista tecnológico, científico e econômico que fracassamos com a desigualdade que foi criada. Por isso eu fico satisfeito. Mas quero retomar o assunto da Argentina e do Brasil. Hoje, na sabatina em que nós estivemos para escolher o Embaixador Danese, que está indo para a Argentina logo que seja aprovado aqui, nós discutimos que, em geral, se procura sempre, no Brasil, a cooperação econômica, quando existe outra cooperação mais simples, mais fácil e, às vezes, mais oportuna até do que a econômica. Por exemplo, entre Brasil e Argentina, se pudéssemos levar adiante um intercâmbio forte em ciência e tecnologia - nem falo em cultura, que é óbvio que a gente pode fazer - o Brasil e a Argentina dariam saltos em ciência e tecnologia. Chego a imaginar quase que uma espécie de ministério único da ciência e da tecnologia para os dois países ou, obviamente, os dois ministros trabalhando juntos na promoção da ciência e da tecnologia. Essa é uma cooperação que traria grandes resultados para os dois países. Espero que esse novo Embaixador na Argentina possa colaborar e que o Ministro da Ciência e Tecnologia no Brasil, separado ou não de Comunicações, possa também tentar. Eu creio que o senhor tem razão em trazer o tema. Temos que buscar cooperar e não explorar. É cooperar e não tirar vantagem. Quando cooperamos todos ganham. Isso se chama sinergia e vale mais do que explorar o outro, porque amanhã o outro vai nos explorar. É como um carrossel que parece uma gangorra. É como vemos a economia do Brasil e da Argentina. Quando um está bem o outro está ruim. Deveríamos cooperar mais em ciência e tecnologia, além de em outras áreas. Então, fico satisfeito de o senhor ter trazido esse assunto e quero dizer que fui um dos que defenderam aqui o Governador Tião Viana, quando ele tomou posições corretíssimas, primeiro pela solidariedade. Em nenhum momento ele repudiou haitianos, e eu sei o custo que isso tem diante da população em geral, que diz: "Por que dar comida para eles se temos os nossos pobres? Por que dar emprego para eles se temos os nossos desempregados?" Esse é o egoísmo natural que nós temos, e ele soube enfrentar isso, como a Angela Merkel está enfrentando na Alemanha, dizendo que vai receber um milhão de imigrantes, e a população não está querendo. Ele teve uma posição solidária. E, depois, inteligente foi ver que a solução seria criar o que se chamou de campo. Mas, na verdade, são alojamentos para eles. Então eu me congratulo com o senhor pelo seu discurso, pelos três pontos: lembrar a posição do Tião, a necessidade de cooperação com a Argentina e também a frase forte do Huck.

    O SR. JORGE VIANA (Bloco Apoio Governo/PT - AC) - Obrigado.

    Sr. Presidente, só para concluir, eu queria, nesse caso dos haitianos... Houve um episódio, Senador Magno, V. Exª que também se preocupa com o tema, em que nos deparamos com um menor de idade haitiano que chegou ao Acre, haitiano, sem nenhum parente. Veio com os coiotes e chegou. Depois a Polícia Federal descobre que era um menor. O que você faz com um menor estrangeiro no seu país, que veio procurando melhor sorte? Ele também não tinha pai; só tinha uma irmã. Tinham perdido os parentes no terremoto de 2010.

    Diante disso, eu fui para a Embaixada da França. Senador Cristovam, é o histórico de um garoto haitiano, menor, no meio dos 37 mil. Foram mais de quatro mil senegaleses e 37 mil haitianos que passaram pelo Acre de 2010 para cá. Agora, os abrigos foram fechados, é bom que se diga, porque o Governo do Brasil mudou e foi lá para Porto Príncipe. O Itamaraty gastou, depois de várias audiências. Montou uma estrutura para dar visto de vinda para o Brasil, ilimitado, um gesto de grandeza do nosso País. Isso evitou que os coiotes continuassem com a indústria de traficar pessoas para cá.

    Mas o que houve, Senador Cristovam Buarque, foi um jovem estudante. Nos deparamos com ele, a Polícia Federal não sabia o que fazer. Não podia deixá-lo seguir viagem, nem andar para trás nem para a frente. Ele foi acolhido em Epitaciolândia pelo pessoal da área social e, muito inteligente, aprendeu português rapidamente.

    Eu estive com ele algumas vezes e vim para cá - salvo engano era o Samuel -, para a Embaixada da França, porque ele tinha uma irmã que estava na Guiana Francesa. Foi feita uma operação envolvendo a diplomacia brasileira e a diplomacia francesa, para criar uma regra nova, porque o processo para mandar um menor de um país para outro é algo muito complexo, mas houve extrema cooperação.

    Nós fizemos um movimento, somando com o Governador Tião Viana. O governo francês criou excepcionalidade, o governo brasileiro criou excepcionalidade, e esse garoto já falava um português fluente depois de alguns meses morando conosco no Acre. Eu peguei um padre que falava francês e me envolvi diretamente nisso. E levamos o garoto até a Guiana, para entregar para a mãe. Ele falava para mim: "Senador, eu estou pensando em seguir estudando, porque quero fazer diplomacia para voltar para o meu país, ocupar alguma função pública e ajudar meu país a sair da crise", o garoto desse jeito.

    Eu não tive mais notícia dele, mas são exemplos que a gente viveu de que dá para fazer alguma coisa, mesmo no momento em que parece que não há nada a ser feito.

    Então eu concluo aqui esta fala, acreditando que é possível, também no nosso País, encontrar uma maneira de sair dessa crise econômica que a gente vive, como falou o Senador Armando, e ao mesmo tempo fazer um reencontro do Brasil com a democracia. Que isso possa ser uma obra dos que pensam diferente no Senado Federal brasileiro.

    Obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/06/2016 - Página 35