Discurso durante a 106ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Relato de audiência pública na Comissão de Infraestrutura referente ao projeto da construção da Ferrovia Transcontinental Bioceânica Brasil-Peru.

Autor
Jorge Viana (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Jorge Ney Viana Macedo Neves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
TRANSPORTE:
  • Relato de audiência pública na Comissão de Infraestrutura referente ao projeto da construção da Ferrovia Transcontinental Bioceânica Brasil-Peru.
Publicação
Publicação no DSF de 30/06/2016 - Página 15
Assunto
Outros > TRANSPORTE
Indexação
  • REGISTRO, REALIZAÇÃO, AUDIENCIA PUBLICA, LOCAL, COMISSÃO, INFRAESTRUTURA, OBJETIVO, DEBATE, ASSUNTO, ESTUDO PREVIO, AUTORIA, EMPRESA, ORIGEM, PAIS ESTRANGEIRO, CHINA, REFERENCIA, CONSTRUÇÃO, FERROVIA, LIGAÇÃO, RIO DE JANEIRO (RJ), OCEANO PACIFICO, PAIS, PERU, BENEFICIO, MEIO AMBIENTE, EXPORTAÇÃO, COMERCIO, ALIMENTOS, PRODUTO AGRICOLA, PRODUTO MINERAL, PRODUTO INDUSTRIALIZADO, REDUÇÃO, CUSTO, TRANSPORTE.

    O SR. JORGE VIANA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Senadora, V. Exª é a segunda para uma comunicação.

    Bem, cumprimentando a Srª Presidente, Fátima Bezerra, os demais colegas aqui presentes, as Senadoras, os Senadores, todos que me acompanham pela Rádio e TV Senado, venho à tribuna, para relatar e celebrar uma audiência que fizemos hoje, na Comissão de Infraestrutura, aqui, do Senado.

    O Senador Cidinho Santos já fez um registro, o Senador Lasier, e eu, como um dos proponentes dessa audiência, sinto-me no dever, na obrigação de, aqui, da tribuna do Senado, prestar contas dos trabalhos que temos feito.

    Às vezes, nós temos que trabalhar intensamente, sem divulgar, sem que aquilo nos dê alguma projeção, para poder colher alguns frutos tempos depois.

    Eu me refiro à audiência que fizemos hoje na Comissão de Infraestrutura - aliás, muitíssimo concorrida; passaram por lá perto de vinte Senadores -, uma audiência para a apresentação do primeiro estudo de viabilidade do projeto ou do propósito da construção da Ferrovia Transcontinental Bioceânica Brasil-Peru.

    É algo que ainda fica no plano do sonho, mas o trabalho já está sendo feito, energia já foi despendida, recursos já foram gastos.

    Mesmo nesse período de turbulência, de crise econômica, de crise política, alguns projetos que dizem respeito ao interesse nacional, à estratégia de crescimento do Brasil precisam seguir em frente.

    Hoje nós tivemos a apresentação do estudo de viabilidade. É uma primeira aproximação. Nesse estudo, foram gastos US$40 milhões, recursos do governo chinês. E nós tivemos exposições de representantes do Ministério dos Transportes, da Empresa Brasileira de Logística, da Valec, do Ministério do Planejamento e, é claro, dos representantes nomeados pelo governo chinês, responsáveis pela elaboração do estudo de viabilidade.

    Na qualidade de um dos coordenadores da Frente Parlamentar em Defesa da Ferrovia Transcontinental Bioceânica, eu fiquei muito feliz, ao lado do Senador Acir Gurgacz, do Senador Wellington Fagundes, do Senador Valdir Raupp, de Parlamentares - hoje acompanhou praticamente toda a audiência o Deputado Leo de Brito, mas foram dezenas de Senadores que passaram na Comissão. Já citei o Senador Lasier e o Senador Cidinho. Eu não queria aqui cometer ato falho, mas foi muito importante a presença dos colegas Senadores.

    Esse projeto de se fazer essa ferrovia teve o início mais formal em 2014, quando o Presidente chinês Xi Jinping esteve aqui no Brasil e nomeou um consórcio para iniciar as tratativas de pensar a elaboração desse projeto.

    Em novembro de 2014, foi assinado o memorando de entendimento criando um grupo de trabalho trilateral para a Ferrovia Transcontinental Brasil-Peru, envolvendo, obviamente, a Comissão Nacional de Desenvolvimento e Reforma da República Popular da China, o Ministério dos Transportes do Brasil e o Ministério do Transporte e Comunicação do Peru.

    Em março de 2015, foi assinado o memorando de entendimento para o estudo básico conjunto sobre a viabilidade da ferrovia. Então, em março de 2015, assinou-se o memorando, e hoje nós tivemos já a apresentação do estudo preliminar.

    Claro que agora ele é objeto de uma discussão com os órgãos dos governos brasileiro e peruano.

    Em maio de 2015, o primeiro-ministro chinês visitou o Brasil e assinou com a Presidente Dilma o convênio de negócios, investimento e cooperação com o propósito de aplicarem US$53 bilhões nas áreas de agricultura, aeronáutica, automotiva, bancária, energia, transporte, estradas, portos e siderurgia. Dentre eles, a cooperação entre o Ministério dos Transportes e a Comissão Nacional de Desenvolvimento e Reforma, para o início dos estudos de viabilidade para a construção da Ferrovia Transoceânica, ou Transcontinental, como chamamos.

    É importante ressaltar que o primeiro aspecto que alguns colocam é: "Ah! É mais uma obra para começar, e temos tantas outras paralisadas". Um país como o nosso, que já perdeu tanto tempo, tem que seguir em muitas frentes, com as dificuldades que o momento impõe. Mas estão aí sendo feitas as obras da transposição do São Francisco. Vi de perto. É uma realidade! Por que não começar agora a preparação de um projeto que vai precisar de tempo, de muitos investimentos, e o Governo brasileiro, nem agora, nem no curto prazo terá condições de reunir os recursos necessários para iniciar.

    Mas o que dizer do governo chinês, grande beneficiário e interessado neste projeto? O governo chinês conseguiu implementar no país, o mais importante, o mais amplo e o maior programa de ferrovias do mundo. Nunca um país construiu tantas ferrovias em tão pouco tempo como a China. E é esse governo que tem interesse de fazer essa ferrovia, para não ficar na dependência do Canal do Panamá, que direta ou indiretamente tem a influência dos Estados Unidos.

    Eles querem, para comprar mais do Brasil, vender mais para o Brasil e para os nossos vizinhos, um modal de transporte, e acho que o modal ferroviário é um dos mais importantes para um país continental como o nosso.

    Lamentavelmente, há cem anos, o Brasil estava certo, priorizando ferrovias - há 200 anos -, e depois abandonou e seguiu o caminho das rodovias. Estamos pagando caro por isso!

    Agora existe a possibilidade de retomarmos. Essa ferrovia implica 5,3 mil quilômetros; 2,9 mil quilômetros dentro do território brasileiro. O traçado passa pelo Centro-Oeste, por Goiás e Mato Grosso, segue para Rondônia, passa pelo Acre e vai atravessar o Peru até o Pacífico. No Acre, há três possibilidades de traçado: um por Assis Brasil; outro, central; e um outro passando por Cruzeiro do Sul.

    Alguns podem perguntar: "Mas por que os chineses estão interessados?" Ora, eu teria como responder rapidamente. Há dez anos, a compra de produtos agrícolas brasileiros por parte dos chineses não chegava a US$7 bilhões; agora passa dos US$20 bilhões. Estou me referindo exclusivamente a produtos da agropecuária. Temos mais a mineração e até produtos industrializados.

    Sobre o comércio Brasil-China em 2015, eu posso passar aqui alguns rápidos números: só exportando para a China foram US$35 bilhões por parte do Brasil; quase 19% de tudo o que exportamos para o mundo foi para China. Mas também as importações brasileiras feitas da China para o Brasil...

(Soa a campainha.)

    O SR. JORGE VIANA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC) - ... foram no montante de US$30 bilhões. Ou seja, US$35 bilhões de exportações e US$30 bilhões de importações. Quase 18% de tudo o que o Brasil importou também foi da China. O crescimento foi vertiginoso nos últimos anos. E é esse um ponto fundamental para esclarecermos.

    A soja, um dos mais importantes produtos de interesse dos chineses, sai hoje do Brasil para a China por dois portos: o do Pará e o de Santos. E ambos usam a rota que passa pelo Canal do Panamá.

    Com essa ferrovia, é óbvio que não queremos apenas a saída de commodities, porque mais de 80% de tudo o que importamos da China - e pagamos US$30 bilhões por ano - são produtos industrializados. E eu posso dizer que também mais de 80% do que exportamos são commodities sem valor agregado. Essa é uma mudança que queremos e devemos fazer.

    Os portos da Ásia são os que têm maior potencial de crescimento, e o Brasil tem que estar com os olhos voltados para a Ásia, como o mundo inteiro está. Mas não é só isso. A ferrovia chegando ao Pacífico, além do mercado asiático, coloca-nos diante da costa oeste americana.

    No mês passado, o Estado da Califórnia alcançou o PIB de US$2,4 trilhões, passando o PIB brasileiro e o PIB francês. E, agora, um dos estados dos Estados Unidos - refiro-me a Califórnia - tem o sexto PIB maior do mundo. É isso que vai fazer com que tenhamos, nessa ferrovia, uma ação, um projeto estratégico para o nosso País, além da integração dentro do Brasil, além de entendermos que ela corta a Amazônia com uma infraestrutura que causa muito menor dano, incomparável menor dano do que o rodoviário para o meio ambiente.

    Com isso, nós podemos ter uma infraestrutura adequada para aquilo que eu acredito que é a exploração sustentável e o desenvolvimento do que eu chamo de bioindústria, uma indústria do século XXI, com a exploração da nossa biodiversidade. Conhecer, pesquisar, usar todas as ferramentas do conhecimento humano para trabalhar e transformar, a partir do conhecimento, essa biodiversidade em negócios sustentáveis. Esse é um espaço importante.

    E por que eu sou otimista em relação a isso? Porque o Brasil - eu tive a honra de ser Relator - aprovou a Lei da Biodiversidade, aprovou uma lei que reconhece e valoriza o conhecimento tradicional. Mas o Brasil também aprovou - e eu fui Relator, junto com o Senador Cristovam - a nova lei de ciência, tecnologia e inovação.

    São duas ferramentas que fazem com que o Brasil reúna condições de trabalhar tanto a biodiversidade quanto a inovação, a ciência e a tecnologia para poder se firmar como uma das maiores nações do Planeta.

    O Brasil tem 20% da biodiversidade do mundo. Cito um dado: um quilo de soja vale US$0,23, mas o Brasil exporta soja para China e - pasmem! - importa plantas medicinais. Como um país que tem 20% da biodiversidade do Planeta importa plantas medicinais? Só que um quilo de plantas medicinais importada da China custa US$41 e um quilo de soja, que exportamos aos milhões de toneladas, custa US$0,23.

    Essa é a diferença! O nosso país é muitíssimo rico, mas não valoriza essa riqueza, não agrega conhecimento, não agrega a ciência, a tecnologia e a inovação, e, por isso, paga caro. Nós temos, então, 25 milhões de habitantes na Amazônia vivendo em situação, grande parte deles, precária.

    Mas essa realidade pode mudar. Eu não tenho dúvidas de que nós podemos fazer uma grande transformação na geografia econômica da América do Sul, em nosso continente, a partir dessa ferrovia.

    Queria, então, dizer que é com satisfação que eu, junto com outros colegas Senadores, coordeno o grupo misto de Parlamentares, da Câmara e do Senado, em defesa da Ferrovia Transcontinental.

    Estou certo de que o primeiro passo foi dado hoje. Muitos podem duvidar, mas eu sou daqueles que gosto de crer para depois ver.

    Com trabalho, com dedicação, nós podemos, sim, ajudar o Brasil a mudar a sua geografia econômica, a fazer algo que possa ser compatível com o meio ambiente, estimulados nessa cooperação que envolve uma decisão do governo chinês, uma decisão do governo peruano e uma decisão do Governo do Estado brasileiro.

(Soa a campainha.)

    O SR. JORGE VIANA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC) - Essa não é uma obra que depende da vontade do Governo do Brasil, de empresas brasileiras; depende do cumprimento de um acordo firmado pelo Estado brasileiro, porque há uma disposição - e, ainda em julho, uma comissão de alto nível de funcionários, de técnicos, de Congressistas do Brasil, a convite do governo chinês, vai fazer uma viagem que vai dar um passo adiante da apresentação desse estudo de viabilidade que nós ouvimos hoje, a que nós assistimos hoje na Comissão de Infraestrutura, que nós debatemos hoje, e que é o primeiro passo que estamos dando para materializar esse projeto de construção da Ferrovia Bioceânica, em realidade.

    Temos que trabalhar nos momentos de dificuldades, transformar as crises em oportunidades, mas sempre acreditando que melhor do que lamentar, do que ficar criticando e pondo defeito é gastar energia na construção de algo que possa ajudar o Brasil a superar esses tempos difíceis.

(Soa a campainha.)

    O SR. JORGE VIANA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC) - Muito obrigado, Srª Presidente.

    Eu queria aqui dizer que o Governador Tião Viana, os Governadores de Rondônia e do Mato Grosso, e os Senadores de Mato Grosso e de Rondônia, nos quais também me incluo, como Senador do Acre, estamos empenhados e irmanados em fazer com que esse projeto possa caminhar para se tornar realidade.

    Eu agradeço a todos que participaram da audiência hoje. Cumprimento o Presidente da Comissão, Senador Garibaldi Alves, que nos ajudou a fazer uma das mais interessantes audiências de que participei na Comissão de Infraestrutura do Senado Federal.

    Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 30/06/2016 - Página 15