Discussão durante a 123ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Defesa da rejeição do processo de impeachment da Presidente Dilma Rousseff em razão do não cometimento de crime de responsabilidade.

Autor
Paulo Paim (PT - Partido dos Trabalhadores/RS)
Nome completo: Paulo Renato Paim
Casa
Senado Federal
Tipo
Discussão
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Defesa da rejeição do processo de impeachment da Presidente Dilma Rousseff em razão do não cometimento de crime de responsabilidade.
Publicação
Publicação no DSF de 10/08/2016 - Página 46
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • DEFESA, REJEIÇÃO, PROCESSO, IMPEACHMENT, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, MOTIVO, LEGALIDADE, UTILIZAÇÃO, DECRETO FEDERAL, OBJETIVO, ABERTURA, CREDITO SUPLEMENTAR, AUSENCIA, AUTORIZAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, REGULARIDADE, OBTENÇÃO, EMPRESTIMO, ORIGEM, BANCO DO BRASIL, BENEFICIARIO, GOVERNO FEDERAL, DESTINAÇÃO, FINANCIAMENTO, PLANO, SAFRA.

    V. Exª está com a palavra.

    O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Para discutir. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente do Supremo Tribunal Federal Ricardo Lewandowski, senhoras e senhores, nos últimos meses, vários dos principais jornais do mundo criticaram o processo de impeachment da Presidenta Dilma.

    O americano The New York Times afirmou: "Dilma paga um preço desproporcionalmente alto, enquanto vários de seus maiores opositores são acusados de crimes". Outro jornal, o Los Angeles Times disse: "Não foi pessoalmente acusada de corrupção" e, infelizmente, "as rédeas estão nas mãos de homens que estão sendo acusados". O inglês The Guardian, em duro texto, avaliou que "o sistema político brasileiro é que deveria ser julgado, e não a Presidente da República". O Prof. Michael Mohallem, em entrevista ao espanhol El País, comparou a destituição de uma Presidenta à pena de morte. O crime é cometido; inocente, não terá mais volta.

    Fiz questão de ler aqui a avaliação de alguns veículos para mostrar que o mundo está acompanhando o que acontece no Brasil.

    O impeachment é um dispositivo que está na Constituição, mas, para que seja legalmente jurídico, precisa haver um fato que o justifique.

    Os decretos orçamentários foram legais, e todos sabem disso. No final de 2015, o Congresso aprovou uma mudança na meta fiscal. Leio aqui o que disse o professor de Direito Tributário Ricardo Lodi Ribeiro. Diz ele: "Antes do final do exercício financeiro de 2015, o Congresso aprovou o PLN 5, de 2015, que reduziu a meta primária". Portanto, "não há que se falar em meta fiscal estourada porque o Congresso alterou essa meta".

    As pedaladas fiscais são, na verdade, um contrato de prestação de serviços. Uma das principais ações do Governo consiste em transferência de renda: Previdência Social, idosos, seguro-desemprego, Bolsa Família, bônus e outros. Não tenho dúvida alguma de que a argumentação das pedaladas fiscais para o impeachment da Presidenta Dilma é totalmente inconsistente. As pedaladas foram utilizadas muitas vezes em outros governos, inclusive nas gestões anteriores da Presidenta Dilma. E mais: a maioria dos governadores e prefeitos também as utilizaram. A argumentação vai cair como um castelo de cartas.

    A questão, na verdade, é covardemente política, sendo usada como um cavalo de troia na batalha de ambições individuais, partidárias e oligárquicas. Sr. Presidente, é necessário dizer que desta forma a democracia brasileira está sendo atacada, atingida por uma enorme conspiração de uma maioria eventual. Quem vai pagar a conta é o povo brasileiro.

    Quando eu questiono alguns Senadores, eles me dizem: "Tudo bem, Paim, mas a questão é política". Vamos, então, a uma questão política, analisando, como eles dizem, o conjunto da obra: os partidos que hoje mais atacam o Governo Dilma sempre fizeram parte dele e fingem não ter memória, porque não querem lembrar os últimos 14 anos, em que estavam lá desfrutando do poder.

    Os peritos do Senado e o Ministério Público Federal já afirmaram que os atos da Presidenta Dilma não são crimes.

    Com apenas três meses no poder, o atual Governo editou 66 decretos e 18 medidas provisórias. É o Presidente que, em menos tempo, mais editou decretos. Uma medida acaba com o Ministério da Previdência, conquista do povo depois de cem anos de luta. Outra, a famigerada MP da Morte, é um ataque aos direitos dos trabalhadores e aposentados, por exemplo, na aposentadoria por invalidez e no auxílio-doença, que assim termina, no computador, após 120 dias. As políticas sociais estão sendo questionadas e atacadas.

    É bom lembrar que graças à política de cotas, negros, brancos e índios agora têm acesso à universidade.

    A cada semana temos denúncias envolvendo os ministros do atual Governo. A mais atual: Odebrecht, envolvendo o Ministro de Relações Exteriores, o da Casa Civil e o próprio Presidente interino. A denúncia é de R$37 milhões.

    Se a Presidenta for afastada, estaremos blindando quem recebeu a propina e condenando uma Presidenta por pedaladas e decretos, e todos aqui sabem: ela é inocente. É uma injustiça.

    Por tudo isso é que sou contra a pena de morte, porque quando se faz uma injustiça, e um inocente morre devido à pena de morte, não há mais volta. Pena de morte, eu sou contra. Haveremos de reverter, porque a Presidenta está viva.

    Na reforma da Previdência, querem agora dizer para se aposentar só com 65 anos. Significa, para quem começa a trabalhar cedo, 47 anos de contribuição.

    Querem desvincular o salário mínimo do PIB.

    Querem aprovar o negociado sobre o legislado. Isso rasga a CLT. Como é que ficam o décimo terceiro, as férias e todos os direitos que estão lá na CLT, como estampam os jornais de hoje?

    Querem aprovar a terceirização. Todo mundo sabe: terceirização fragiliza o direito dos trabalhadores e quebra de vez a própria Previdência.

    Querem regulamentar o trabalho escravo. Trabalho escravo, a gente não regulamenta; a gente proíbe.

    Querem desvincular as receitas da saúde e da educação.

    Acabaram com o Pronatec, avançam no pré-sal.

    Agora a Seguridade Social. Querem simplesmente que a DRU desvincule 30%. Serão R$120 bilhões a menos para a saúde, para a assistência e para a Previdência.

    Nem vou falar do nº 257, que arrebenta com os servidores públicos, mas vou falar daqueles que atacam a Justiça do Trabalho, inclusive diminuindo seu orçamento.

    Quero falar também daqueles que, por trás disso tudo, já falam que a jornada de trabalho tem que ser de 80 horas. Já falam que o certo é o trabalhador com uma mão comer e, com a outra, ficar trabalhando.

    Tudo isso está estampado nos jornais.

    Atacam o programa Mais Médicos e atacam o nosso SUS. Nem na ditadura houve tantas ameaças contra os trabalhadores e aposentados.

    Não precisamos disso. Se cobrássemos os grandes devedores da União, que devem R$1,5 trilhão... Por que não tributam as grandes fortunas? Por que não tributam as grandes heranças? Por que não convocam, como nós propusemos, uma assembleia exclusiva para a reforma política, partidária e eleitoral? Porque esse sistema está falido. Por isso nós estamos aqui hoje.

    No dia da votação do relatório da Comissão do Impeachment, dia 4, o jornalista brasileiro Jânio de Freitas disse, na Folha de S.Paulo: o "afastamento de Dilma" - Jânio de Freitas, não é Paulo Paim - "é [a maior] hipocrisia" que se viu na história deste País. Lá na frente ele diz que não precisava de 441 folhas; era só dizer "culpada, culpada, culpada," porque o Relator, parece que não ouvia os argumentos.

    "O caráter político é que explica a inutilidade" - diz ele. "O processo político de impeachment é uma grande encenação. Uma hipocrisia política de dimensões gigantescas, que mantém o Brasil em regressão descomunal, com perdas recompostas, se o forem, em muito tempo - [talvez] as econômicas, mas nunca mais as humanas."

(Soa a campainha.)

    O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Sr. Presidente, termino dizendo: o processo de impeachment da Presidenta Dilma é uma clássica peça de literatura latino-americana, ao estilo da escola do Prêmio Nobel Gabriel García Márquez, o realismo fantástico.

    Em "Cem Anos de Solidão", algumas personagens ficam surpresas ao se depararem com elementos fantásticos, mas agem como se aquilo tudo pudesse acontecer naturalmente, como se fosse comum. Entre as descrições feitas está a peste da insônia e do esquecimento que atinge as pessoas da pequena vila de Macondo. Refiro-me à vila Congresso.

    Ou seja - termino aqui, Presidente - o processo de impeachment da Presidenta é uma junção de fatos irreais e estranhos criados como algo habitual e corriqueiro, sem nenhuma explicação, totalmente à margem da verdade e da justiça.

    É uma injustiça!

(Interrupção do som.)

    O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Por isso, sou contra a pena de morte.

    Com a democracia, tudo. Sem a democracia nada.

    Termino aqui, Sr. Presidente. (Fora do microfone.)

    Nem um direito a menos! Não ao impeachment! Vida longa à democracia! (Palmas.)

    Obrigado, Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/08/2016 - Página 46