Pronunciamento de João Capiberibe em 09/08/2016
Discussão durante a 123ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal
Defesa da rejeição do processo de impeachment da Presidente Dilma Rousseff em razão do não cometimento de crime de responsabilidade.
- Autor
- João Capiberibe (PSB - Partido Socialista Brasileiro/AP)
- Nome completo: João Alberto Rodrigues Capiberibe
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discussão
- Resumo por assunto
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GOVERNO FEDERAL:
- Defesa da rejeição do processo de impeachment da Presidente Dilma Rousseff em razão do não cometimento de crime de responsabilidade.
- Publicação
- Publicação no DSF de 10/08/2016 - Página 61
- Assunto
- Outros > GOVERNO FEDERAL
- Indexação
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- DEFESA, REJEIÇÃO, PROCESSO, IMPEACHMENT, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, MOTIVO, LEGALIDADE, UTILIZAÇÃO, DECRETO FEDERAL, OBJETIVO, ABERTURA, CREDITO SUPLEMENTAR, AUSENCIA, AUTORIZAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, REGULARIDADE, OBTENÇÃO, EMPRESTIMO, ORIGEM, BANCO DO BRASIL, BENEFICIARIO, GOVERNO FEDERAL, DESTINAÇÃO, FINANCIAMENTO, PLANO, SAFRA.
O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - AP. Para discutir. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, Srªs Senadoras.
Por onde começar, Sr. Presidente? É o que venho me perguntando ao longo desses últimos dias: por onde começar a abordar a marcha da insensatez que avança sem produzir os resultados pretendidos por aqueles que embarcaram nessa nau errante e que não nos leva a porto algum? Gente de boa-fé engrossou essas fileiras na expectativa de reduzir a angústia e os temores dos que estão a caminho do desemprego, e, claro, alimentar com esperança milhões de desempregados que se desesperam sem garantir o sustento de suas famílias.
Reafirmo o que venho dizendo desde o começo desse processo: o impeachment não resolve a crise, aprofunda-a. Convenhamos, trata-se de uma encenação grotesca para encobrir nossa falta de cultura democrática. Infelizmente, em perda de valores essenciais como justiça, honestidade, lealdade e dignidade, a pantomina vai nos custar os olhos da cara como sociedade.
E quem vai saldar o passivo financeiro desse atraso? Os de sempre, claro - os de sempre! Os trabalhadores em geral, mas, primeiramente, os que, entre 2002 e 2012, ascenderam ao consumo.
Trata-se, segundo dados do PNUD, de 22,5 milhões de pessoas que deixaram de ser pobres no Brasil, mas que, por nossa incompetência em debelar a crise política e econômica que corrói o País, esse enorme contingente de seres humanos, um pouco maior do que as populações do Chile e do Uruguai reunidas, descem ladeira abaixo voltando ao estágio de pobreza anterior.
Pergunto-lhes: essas pessoas vão aceitar pacificamente retornar à pobreza extrema da qual saíram? É isso que me preocupa. Nosso País está demais violento: o Brasil lidera em número de homicídios no mundo; batemos os 60 mil assassinatos em 2014. É mais do que qualquer guerra que possa existir no mundo.
Isso é um claro sintoma de uma sociedade dilacerada, que está dando errado e que precisa corrigir rumos. Mas, para nós aqui, é como se isso não fosse da nossa conta. É como se este Plenário não tivesse nada com isso, infelizmente.
Eu, particularmente, sinto-me responsável pelo transe histórico que estamos vivendo. Sim, eu bem que poderia ter conversado mais, articulado mais, influenciado mais, enfim, ter feito mais, para evitar tanta incerteza, tanto retrocesso. E eu bem que tentei.
Chegamos a formar um grupo de Senadores independentes. Não teve vida longa, mas, ainda, assim, tentamos diálogos com os dois lados. Cada lado ouvia de nós o que queria ouvir, e nos dizia o que queríamos ouvir, mas, da porta para fora, nada acontecia.
Mas a vida lá fora não está nada fácil. Dá a sensação de que o Brasil literalmente está encolhendo, que milhões de pessoas estão hibernando. Vejam esses dados.
A Confederação Nacional do Comércio informa que este ano, até julho, foram para o espaço 67.900 lojas. É isso mesmo, fecharam as suas portas. Deixaram mais de meio milhão de desempregados, e as expectativas não são nada alvissareiras.
Elas fecharam porque as compras entraram em queda livre. Uma pesquisa nacional recente feita pelo Serviço de Proteção ao Crédito (SPC Brasil) e pela Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas revela que, diante da crise econômica que tem deixado o orçamento das famílias mais apertado, o brasileiro optou por abrir mão dos gastos com atividade de lazer: 35,4% deixaram de frequentar bares e restaurantes - estou entre eles -; 30,9% suspenderam as viagens; roupas, acessórios e sapatos perderam 29,2% dos seus clientes; TV por assinatura perdeu 19,7% dos clientes. Por último, para não cansá-los, no setor de telefones fixos e de celulares, a queda foi de 18,8%. Agora, imaginem o tamanho da retração econômica, imaginem o impacto disso na cadeia de empregos?
E pasmem, pois, ainda que os brasileiros estejam consumindo menos e, inclusive, comendo menos, a inflação continua subindo: de junho para julho, pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA-15), a inflação saltou de 0,4% para 0,54%, segundo o IBGE. Essa alta, infelizmente, foi puxada pelos preços dos alimentos, que ficaram 1,45% mais caros do que no mês anterior, infelicitando ainda mais os lares dos trabalhadores. E o Governo o que faz? Aumenta a taxa de juros, alegando sabem o quê? O controle da inflação. Foi assim com Dilma, e assim continua com Temer.
Por falar em dívida pública, vejam só o que aconteceu no ano passado: apesar do cenário de enorme escassez em 2015, a dívida interna federal triplicou, deu um salto, cresce todo o tempo. Os brasileiros estão endividados. Como vamos sair disso?
Nem aqui podemos discutir e debater a dívida pública! Há um dispositivo constitucional que nos impede de alterar a dívida pública. Então, tenho muita razão de me queixar da pouca representatividade nossa.
Assim não dá! Eu lhes pergunto: em que condição sobreviveria uma família pagando tantos juros? Não sobreviveria, certamente. Com a metade de sua renda, era impossível sobreviver.
Olhem, nós trabalhamos cinco meses por ano para entregar para o Governo, e, desse dinheiro, o Governo entrega 2,5 meses para os bancos. E é essa situação que nos aflige e que nos amarra ao atraso.
Srs. Senadores, Srªs Senadoras, Sr. Presidente, encomendei um levantamento com base no que é noticiado diariamente pela imprensa sobre o envolvimento de Senadores e de Senadoras em procedimentos investigatórios da Lava Jato e congêneres. Foi-me apresentada uma lista com 17 nomes de Senadores e de Senadoras pertencentes aos maiores partidos da Casa, governistas e não governistas, que, nesta sessão plenária, atuam como magistrados e magistradas.
Nós somos juízes. Vamos julgar se a Senhora Presidente afastada, Dilma Rousseff, cometeu crime de responsabilidade. Como todos estão cientes, exige-se que os juízes sejam probos, imparciais, honestos e equilibrados em suas decisões. Eu lhes pergunto: nós, neste plenário, preenchemos essas exigências? Mesmo aqueles que por acaso estejam condenados pela Justiça podem atuar como juízes? Talvez fosse o caso de levantar uma questão de ordem para esclarecer essa dúvida. No entanto, prefiro deixar que cada um decida por sua consciência, tal qual o fazem os magistrados que se declaram impedidos de julgar ao se sentirem desconfortáveis em algum processo.
Talvez me respondam que esse processo é jurídico e político. Pelo que entendi e pelo que veio a público, a auditoria do Senado isentou a Presidente Dilma Rousseff de responsabilidade em relação aos decretos de suplementação orçamentária, e um Procurador Federal da Justiça, que entende do assunto, mandou para o arquivo a denúncia...
(Soa a campainha.)
O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - AP) - ...contra a Presidente, dizendo que o que foi feito no Plano Safra não constitui crime de responsabilidade. Portanto, o processo é exclusivamente político, o que me leva a repetir o que havia dito no começo: o impeachment nada mais é que uma encenação grotesca para justificar nossa falta de cultura democrática.
Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, concluo, dizendo-lhes: voto pela democracia. Não há melhor juiz que os 54 milhões de brasileiros que sufragaram o nome de Dilma Rousseff em 2014. Meu voto é contrário ao relatório.
Muito obrigado, Sr. Presidente.