Discussão durante a 123ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Defesa da aprovação do processo de impeachment da Presidente Dilma Rousseff em razão do cometimento de crime de responsabilidade.

Autor
Fernando Collor (PTC - Partido Trabalhista Cristão/AL)
Nome completo: Fernando Affonso Collor de Mello
Casa
Senado Federal
Tipo
Discussão
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Defesa da aprovação do processo de impeachment da Presidente Dilma Rousseff em razão do cometimento de crime de responsabilidade.
Publicação
Publicação no DSF de 10/08/2016 - Página 76
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • DEFESA, APROVAÇÃO, PROCESSO, IMPEACHMENT, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, MOTIVO, ILEGALIDADE, UTILIZAÇÃO, DECRETO FEDERAL, OBJETIVO, ABERTURA, CREDITO SUPLEMENTAR, AUSENCIA, AUTORIZAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, IRREGULARIDADE, OBTENÇÃO, EMPRESTIMO, ORIGEM, BANCO DO BRASIL, BENEFICIARIO, GOVERNO FEDERAL, DESTINAÇÃO, FINANCIAMENTO, PLANO, SAFRA.

    O SR. FERNANDO COLLOR (Bloco Moderador/PTC - AL. Para discutir. Sem revisão do orador.) - Exmo Sr. Presidente, Ministro Ricardo Lewandowski; Exmo Sr. Presidente do Congresso Nacional, Senador Renan Calheiros; Srªs e Srs. Senadores, o juízo do impeachment é político, preventivo, incontrastável e irrecorrível, palavras do jurista Paulo de Lacerda, que formam o consenso no meio jurídico.

    O processo que hoje apreciamos chega à fase intermediária, porém decisiva para sua sequência. Atuamos como tribunal de pronúncia, e, mais uma vez, com desconforto, venho cumprir um dever: o dever de analisar o mérito de uma acusação. Sofri processo análogo e conheço os infortúnios, as amarguras, a solidão e o desgosto de um governante nessa situação.

    Condenaram-me politicamente. Penalmente, fui absolvido pela Suprema Corte. 

    Reconheço o quão prejudicial ao País é um processo como este. A partir da ressurreição de uma lei como a 1.079, nenhum governo, a rigor, está livre de acusação. A depender de forças políticas, o processo se agrava pela morosidade do rito, pelas incongruências da lei e suas instáveis interpretações, além da injustificável diferença de quóruns entre suas intrincadas fases. É procedimento que deteriora as expectativas e que gera, desde o início, fragilidades de poder, incertezas políticas, desequilíbrios institucionais e instabilidades econômicas.

    Mas reconheço ainda ser inegável que, na gestão do País nos últimos anos, houve infrações legais. Portanto, há elementos determinantes de um tipo de crime: o crime de responsabilidade; responsabilidade no sentido de dever e sensatez na forma de agir. Responsabilidade como culpa de um insucesso, com dolo de um flagelo. Este é o cerne do desalinho jurídico e do desastre político de um poder que se esvaiu.

    No campo legal, responsabilidade é a capacidade de entendimento ético jurídico e determinação volitiva adequada, que constitui pressuposto penal necessário da punibilidade. No plano filosófico da moral, responsabilidade é a situação de um agente consciente com relação aos atos que pratica voluntariamente'. Assim, na condução de um governo, crime de responsabilidade é a irresponsabilidade por tudo de ilegal enquanto ato de ofício, ou de desídia enquanto ação política.

    Tal como já vigoram outras leis específicas de responsabilidade, especialmente a fiscal, precisamos de uma moderna e realista lei de responsabilidade política ou de governança, na qual à ação administrativa agregue-se a ação política. Por isso, dizia Paulo Brossard: "A responsabilidade é inseparável da democracia."

    O atual processo de impeachment baseia-se em pontos já analisados, discutidos e materializados como atos ilegais. Se a participação da Chefe do Executivo foi comissiva ou omissiva, culposa ou dolosa, explícita ou tácita, há de se ter o juízo.

    No processo de 1992, alegou-se o art. 8º, item 7, da Lei nº 1.079, que diz: "São crimes contra a segurança interna do País: (...) permitir, de forma expressa ou tácita, a infração de lei federal de ordem pública".

    Desde 2013, as infrações fiscais e orçamentárias eram apontadas publicamente por órgãos de controle, técnicos do próprio governo e por todos os meios. O Palácio do Planalto tinha ciência dos avisos. Na dúvida, e por isso mesmo, era necessário averiguar os atos da equipe econômica.

    Na omissão, permitiu-se, de forma tácita, a infração de lei federal. É disso que se trata também. Talvez, coubesse até tipificar outras infrações, como improbidade administrativa, prevaricação e o ilegal emprego do dinheiro público.

    Nossa primeira Constituição, a de 1824, já previa que o Chefe do Executivo - naquele caso, o imperador - era o responsável direto pela nomeação e atos ministeriais. E a maior prova está na carta de D. Pedro II, com recomendações, em 1876, à filha, Princesa Isabel.

    Escreveu ele: "Terei incomodado alguns ministros com o cumprimento do dever que tenho, como Chefe do Poder Executivo, pela Constituição, de apreciar os atos dos ministros".

    Já, naquela época, D. Pedro II se preocupava com as contas públicas. Há 140 anos, ensinava nessa carta o mais básico princípio orçamentário: "Toda e qualquer outra despesa não autorizada claramente em lei deve ser impedida. Se é preciso, proponha-se no projeto de orçamento ou em projeto de lei, caso tenha o motivo da despesa aparecido depois de o orçamento ter sido votado". Ou seja, nada tão antigo, nada tão atual. Nada tão imperial, nada tão republicano.

    O fato é que o resultado dos últimos anos do governo afastado foi um autêntico portfólio de desastres: o desastre fiscal, financeiro, orçamentário, econômico, político e, tudo junto, o desastre social. É um catálogo que supera qualquer motivo para o que seria, no parlamentarismo, um mero voto de desconfiança ou um eventual desfazimento de gabinete.

    Mais grave ainda é que, em 2010, o governo recebeu o País em razoável ordem nos fundamentos econômicos para o progresso, além de estabilidade político-institucional e, principalmente, motivação social, mas, desde o início daquela gestão, o Brasil entrou numa arena movediça, tanto no trato político como na insistência com a matriz econômica, que já mostrava sua inviabilidade e incapacidade.

    A partir de 2013, ao desprezar a voz pura das ruas, ao menosprezar as experiências anteriores e ao levitar acima da obviedade das crises, o governo tornou-se apartado da população, desconectado da realidade.

    Nesse sentido, o Professor Marco Aurélio Nogueira alerta: "A disjunção entre Estado e sociedade jamais favorecerá a democracia e o bom governo". Para ele, a sociedade parece anestesiada, à espera de atos que ajudem a se reposicionar e, eventualmente, a se repactuar com a política e os políticos. Daí a sua expressão de sociedade sem eixo, ou seja, uma sociedade submissa a um Estado errático e petrificado pelo governo.

    Na mesma linha, assinala o Almirante Mário César Flores: "O drama nacional decorre basicamente do déficit de qualidade na condução do nosso Estado gigante e complexo". Para ele, essa condução e o excesso de intervencionismo estatal são um "convite à crise, se não ao desastre". E mais: "Quando a participação no poder se impõe à revelia de ideias sobre o presente e o futuro (...), a esperança na redenção se fragiliza".

    Em sintonia, o editor Carlos Andreazza resume: "Neste País em que a produção cultural e a circulação de ideias foram saqueadas pela ideologia, difícil é ser indivíduo, homem livre, falar o que se pensa, dar campo ao contraditório, ter compreensão prática do que seja pluralidade, e, contra a correnteza, ser bem-sucedido".

    Sr. Presidente, este ambiente distorcido, dicotomizado é a maior razão para questionarmos o estatismo e escoarmos de vez a demagogia progressista, que, não raro, ladeiam a tirania populista.

    Como ensina Hayek, "precisamos acreditar mais em fatos e realidades do que em cismadoras e inatingíveis utopias".

    Para ele, não foi a democracia que falhou,...

(Soa a campainha.)

    O SR. FERNANDO COLLOR (Bloco Moderador/PTC - AL) - ... e sim a forma de se pensar, outorgando-se todo o poder ao Estado, cada vez mais avassalador, sem submeter o governo às mesmas leis que regem os cidadãos. Pensando em criar mais democracia, criou-se menos liberdade, mais autoritarismo, mais totalitarismo.

    E sentencia: "Ao querer distribuir a torto e a direito, apenas seguindo desejos ou dogmas irreais, o que se fez, na realidade, foi destruir estruturas sociais inteiras".

    Por isso, Sr. Presidente, encerrando agora o meu pronunciamento - pulando uma parte que gostaria de falar -, como já se falou em algum momento, "quando forças se removem, esperanças se concretizam". Mas, antes, é preciso virar esta página. Só assim viveremos a máxima de Alvin Toffler: "Mudança" -diz ele - "é o processo no qual o futuro invade nossas vidas."

    Muito obrigado.

SEGUE, NA ÍNTEGRA, PRONUNCIAMENTO DO SR. SENADOR FERNANDO COLLOR.

    O SR. FERNANDO COLLOR (Bloco Moderador/PTB - AL. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, ministro Ricardo Lewandowski, Srªs e Srs. Senadores, “O juízo do impeachment é político, preventivo, incontrastável e irrecorrível”..., palavras do jurista Paulo de Lacerda, que formam o consenso no meio jurídico.

    O processo que hoje apreciamos chega à fase intermediária, porém decisiva para sua sequência. Atuamos como tribunal de pronúncia e, mais uma vez, com desconforto, venho cumprir um dever. O dever de analisar o mérito de uma acusação.

    Sofri processo análogo e conheço os infortúnios, as amarguras, a solidão e o desgosto de um governante nessa situação. Condenaram-me politicamente. Penalmente, fui absolvido pela Suprema Corte.

    Reconheço o quão prejudicial ao País é um processo como este. A partir da ressurreição de uma lei como a 1.079, nenhum governo, a rigor, está livre de acusação. A depender de forças políticas, o processo se agrava, pela morosidade do rito, pelas incongruências da lei e suas instáveis interpretações, além da injustificável diferença de quóruns entre suas intrincadas fases. É procedimento que deteriora expectativas e que gera, desde o início, fragilidades de poder, incertezas políticas, desequilíbrios institucionais e instabilidades econômicas.

    Mas reconheço ainda ser inegável que, na gestão do País nos-últimos anos, houve infrações legais. Portanto, há elementos determinantes de um tipo de crime: o Crime de Responsabilidade. Responsabilidade, no sentido de dever e sensatez na forma de agir. Responsabilidade como culpa de um insucesso, como dolo de um flagelo.

    Este é o cerne do desalinho jurídico e do desastre político de um poder que se esvaiu.

    No campo legal, responsabilidade é a “capacidade de entendimento ético-jurídico e determinação volitiva adequada, que constitui pressuposto penal necessário da punibilidade.” No plano filosófico da moral, responsabilidade é a “situação de um agente consciente com relação aos atos que pratica voluntariamente”. Assim, na condução de um governo, Crime de Responsabilidade é a irresponsabilidade por tudo de ilegal - enquanto ato de ofício - ou de desídia - enquanto ação política.

    Tal como já vigoram outras leis específicas de Responsabilidade, especialmente a Fiscal, precisamos de uma moderna e realista “Lei de Responsabilidade Política”, ou de Governança, na qual, à atuação administrativa agregue-se a ação política. Por isso, dizia Paulo Brossard: “a responsabilidade é inseparável da democracia.”

    O atual processo de impeachment baseia-se em pontos já analisados, discutidos e materializados como atos ilegais. Se a participação da Chefe do Executivo foi comissiva ou omissiva, culposa ou dolosa, explícita ou tácita,... há de se ter o juízo.

    No processo de 1992, alegou-se o art. 8º, item 7, da Lei 1.079, que diz: “São crimes contra a segurança interna do país (...) permitir, de forma expressa ou tácita, a infração de lei federal de ordem pública.”

    Desde 2013, as infrações fiscais e orçamentárias eram apontadas publicamente por órgãos de controle, técnicos do próprio governo e por todos os meios. O Palácio do Planalto tinha ciência dos avisos. Na dúvida - e por isso mesmo -, era necessário averiguar os atos da equipe econômica. Na omissão, permitiu-se, de forma tácita, a infração de lei federal. É disso que se trata, também. Talvez coubesse até tipificar outras infrações, como improbidade administrativa, prevaricação e o ilegal emprego do dinheiro público.

    Nossa primeira Constituição, a de 1824, já previa que o chefe do Executivo - naquele caso, o Imperador - era o responsável direto pela nomeação e atos ministeriais. E a maior prova está na carta de Dom Pedro II com recomendações, em 1876, à filha Princesa Isabel. Escreveu ele: “Terei incomodado alguns ministros com o cumprimento do dever que tenho, como chefe do Poder Executivo pela Constituição, de apreciar os atos dos ministros.”

    Já naquela época, Dom Pedro II se preocupava com as contas públicas. Há 140 anos, ensinava nesta carta o mais básico princípio orçamentário: “Toda e qualquer outra despesa não autorizada claramente em lei deve ser impedida. Se é preciso, proponha-se, no projeto de orçamento, ou em projeto de lei, caso tenha o motivo da despesa aparecido depois do orçamento sido votado.”

    Ou seja, nada tão antigo, nada tão atual... Nada tão imperial, nada tão republicano.

    O fato é que o resultado dos últimos anos do governo afastado foi um autêntico portfólio de desastres: o desastre fiscal, financeiro, orçamentário, econômico, político e, tudo junto, o desastre social. É um catálogo que supera qualquer motivo para o que seria, no parlamentarismo, um mero voto de desconfiança ou um eventual desfazimento.de gabinete.

    Mais grave ainda é que, em 2010, o governo recebeu o País em razoável ordem nos fundamentos econômicos para o progresso, além de estabilidade político-institucional e, principalmente, motivação social.

    Mas desde o início daquela gestão, o Brasil entrou numa arena movediça, tanto no trato político como na insistência com a matriz econômica que já mostrava sua inviabilidade e incapacidade.

    A partir de 2013, ao desprezar a voz pura das ruas, ao menosprezar experiências anteriores e ao levitar acima da obviedade das crises, o governo tornou-se apartado da população, desconectado da realidade.

    Nesse sentido, o professor Marco Aurélio Nogueira alerta: “a disjunção entre Estado e sociedade jamais favorecerá a democracia e o bom governo.” Para ele, “a sociedade parece anestesiada, à espera de atos que a ajudem a se reposicionar e, eventualmente, a se repactuar com a política e os políticos.” Daí a sua expressão de “sociedade sem eixo”. Ou seja, uma sociedade submissa a um Estado errático e petrificado pelo governo.

    Na mesma linha, assinala o Almirante Mário César Flores: “o drama nacional decorre basicamente do déficit de qualidade na condução do nosso Estado gigante e complexo.” Para ele, essa condução e o excesso de intervencionismo estatal são um “convite à crise, se não ao desastre.” E mais: “Quando a participação no poder se impõe à revelia de ideias sobre o presente e o futuro (...), a esperança na redenção se fragiliza.”

    Em sintonia, o editor Carlos Andreazza resume: “(...) neste país em que a produção cultural e a circulação de ideias foram saqueadas pela ideologia, difícil é ser indivíduo, homem livre - falar o que se pensa, dar campo ao contraditório, ter compreensão prática do que seja pluralidade e, contra a correnteza, ser bem-sucedido."

    Sr. Presidente, esse ambiente distorcido, dicotomizado, é a maior razão para questionarmos o estatismo e escoarmos de vez a demagogia progressista, que não raro ladeiam a tirania populista.

    Como ensina Hayek, “precisamos acreditar mais em fatos e realidades do que em cismadoras e inatingíveis utopias.” Para ele, “não foi a democracia que falhou, e sim a forma de se pensar, outorgando-se todo o poder ao Estado, cada vez mais avassalador, sem submeter o governo às mesmas leis que regem (...) os cidadãos. Pensando em criar mais democracia, criou-se menos liberdade, mais autoritarismo, mais totalitarismo.” E sentencia: “Ao querer distribuir a torto e a direito, apenas seguindo desejos ou dogmas irreais, o que se fez na realidade foi destruir estruturas sociais inteiras.”

    É esse, Sr. Presidente, o processo por que passa o Brasil: a silenciosa destruição de estruturas. Para que não restem apenas escombros sociais, precisamos suplantar as crises, estabilizar as instituições, avançar na democracia, remodelar o Estado, reaglutinar a sociedade para, então sim, purificar a atmosfera de ressentimentos. Como já se falou, “quando forças se removem, esperanças se concretizam.” Mas antes, é preciso virar esta página. Só assim, viveremos a máxima de Alvin Toffler: “Mudança - diz ele - é o processo no qual o futuro invade nossas vidas.”

    Multo obrigado!


Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/08/2016 - Página 76