Discussão durante a 123ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Defesa da rejeição do processo de impeachment da Presidente Dilma Rousseff em razão do não cometimento de crime de responsabilidade.

Autor
Ângela Portela (PT - Partido dos Trabalhadores/RR)
Nome completo: Ângela Maria Gomes Portela
Casa
Senado Federal
Tipo
Discussão
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Defesa da rejeição do processo de impeachment da Presidente Dilma Rousseff em razão do não cometimento de crime de responsabilidade.
Publicação
Publicação no DSF de 10/08/2016 - Página 84
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • DEFESA, REJEIÇÃO, PROCESSO, IMPEACHMENT, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, MOTIVO, LEGALIDADE, UTILIZAÇÃO, DECRETO FEDERAL, OBJETIVO, ABERTURA, CREDITO SUPLEMENTAR, AUSENCIA, AUTORIZAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, REGULARIDADE, OBTENÇÃO, EMPRESTIMO, ORIGEM, BANCO DO BRASIL, BENEFICIARIO, GOVERNO FEDERAL, DESTINAÇÃO, FINANCIAMENTO, PLANO, SAFRA.

    A SRª ANGELA PORTELA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RR. Para discutir. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Ministro Ricardo Lewandowski do Supremo Tribunal Federal, que preside esta sessão; Srs. Senadores, Srªs Senadoras, a marcha insensata do golpe parlamentar chega à sua reta final. O Plenário desta Casa vai julgar, em poucos dias, se a Presidenta Dilma voltará a exercer o seu mandato legítimo, conferido pelo voto direto de 54 milhões de brasileiros, ou se terá o seu mandato cassado.

    Por mais que os atuais ocupantes do poder, seus apoiadores no Congresso e a mídia chapa branca digam o contrário, o presente processo não respeita os ditames da Constituição.

    Ainda que a legalidade formal seja respeitada, durante a tramitação nas duas Casas Parlamentares, a inexistência de crime de responsabilidade da Presidenta Dilma, como exige a Constituição, desnuda a realidade desse processo.

    Trata-se de uma manobra bem urdida pelos derrotados nas eleições de 2014, em conluio com elites insatisfeitas e com políticos acusados de corrupção, desesperados por frear a apuração das irregularidades que cometeram.

    Os trabalhos da Comissão do Impeachment deixam bem clara essa realidade. Depois de análise cuidadosa e isenta dos técnicos do Senado, não restou prova de que Dilma cometeu crime, seja nas tais pedaladas fiscais, seja nos decretos orçamentários.

    O parecer do Ministério Público apontou na mesma direção. E o próprio Presidente interino, de certa forma, admitiu, ao dizer que o julgamento é político. O golpismo mais graduado confirmou o golpe.

    O desejo do interino Michel Temer, expresso nesse ato falho, exibe o que está por trás dessa ação: o golpe, puro e simples.

    Um processo de impeachment é certamente político, mas antes disso, é um processo jurídico, instaurado para o julgamento de um crime. É obrigatório que exista crime para justificar qualquer impeachment. A Constituição exige esse requisito e está sendo flagrantemente desrespeitado.

    Só nos regimes de exceção, na falência da democracia, um presidente pode ser impedido sem ter cometido crime. Apenas na ditadura um chefe de Estado pode ser derrubado pela violência política de seus adversários, com a manipulação do processo legal.

    A acusação de que a Presidenta Dilma teria violado a Lei Orçamentária de modo algum se sustenta. Não houve ampliação dos gastos previstos na Lei Orçamentária aprovada pelo Congresso, mas apenas remanejamento de despesas, a pedido de órgãos que nem fazem parte da administração direta. O que seria visto como ação rotineira em qualquer governo, foi convertido em pecado mortal no Governo da Presidenta Dilma.

    É importante frisar que, caso o Senado afaste Dilma, estará retirando da Presidência da República uma pessoa honrada, uma mulher honesta. Se fizer isso, estará desrespeitando a normalidade democrática.

    E, para agravar a situação, confirmará em seu lugar um Presidente - este sim - contra o qual pairam diversas suspeitas de atitudes não republicanas para alimentar a máquina de seu partido, o PMDB.

    Agora mesmo o empreiteiro Marcelo Odebrecht, em delação premiada na Lava Jato, declara que entregou R$10 milhões a Michel Temer. Dinheiro ilegal, não contabilizado, desviado dos cofres da Petrobras para financiar despesas de seu partido. O delator da Odebrecht, aliás, não implicou apenas o Presidente interino, implicou também o chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, e implicou o seu Ministro das Relações Exteriores, José Serra.

    Já vai se tornando difícil encontrar, no primeiro escalão do Governo golpista, quem não seja investigado, denunciado ou sempre suspeito de algum malfeito, no âmbito da Lava Jato e de outras operações judiciais.

    É absolutamente inaceitável, por quem tem apreço à moralidade, que o comando do País seja entregue definitivamente a este Governo interino. O País estaria adotando a cleptocracia como forma de governança. Já não é admissível que a democracia tenha sido ferida como foi em 17 de abril, quando a Câmara Federal votou por dar andamento a este impeachment absurdo.

    Já estamos sob o comando objetivo de uma plutocracia, um governo imposto pelos ricos para governar pelos ricos e para os ricos. Mais grave ainda é quando os plutocratas se aliam aos cleptocratas para espoliar o País às custas dos direitos da população trabalhadora.

    É ao que estamos assistindo nesses três meses de interinato e de democracia agonizante. Todos os dias temos notícias de ataques que o Governo golpista realiza ou prepara contra as conquistas sociais, econômicas e políticas duramente obtidas pelo povo brasileiro, ao longo de 13 anos das gestões petistas.

    Está sob forte risco um projeto de País que prevê inclusão, proteção das minorias, redução das desigualdades, crescimento econômico com justiça social.

    As primeiras áreas afetadas já se delineiam: direitos dos trabalhadores, Previdência Social, saúde e educação.

    A base mais conservadora deste Congresso se assanha pela aprovação de modificações na CLT, para eliminar ou mutilar direitos dos trabalhadores. Também prepara mudanças nas futuras aposentadorias e nos benefícios pagos às aposentadorias atuais.

    O Ministro da Saúde, volta e meia, declara seu desapreço ao SUS. Já criou grupo de trabalho com o objetivo de impor ao povo pobre um plano de saúde dito popular, mas pago, o que acabará com o SUS como sistema universal de saúde público e gratuito. Ou seja, uma das maiores conquistas da Constituição de 1988 corre o risco de se perder. Em vez de o Governo trabalhar para manter, ampliar e melhorar cada vez mais o SUS - o maior sistema de saúde pública do mundo -, faz exatamente o oposto: trabalha para fragilizá-lo e para fazer com que o povo brasileiro pague para ter um atendimento médico que a Constituição de seu País lhe assegurou gratuitamente.

    Na educação, como nas áreas de ciência e tecnologia, são claros os sinais de retrocesso, com o apoio à proposta de censurar professores. Sem falar nos cortes já promovidos nos programas de bolsas de estudos de nível superior, no Programa Ciência sem Fronteiras e nas verbas da Rede Nacional de Ensino e Pesquisa, ameaçando deixar sem acesso à internet mais de mil universidades do nosso País.

    O Governo também acena com a desvinculação constitucional dos gastos com saúde e com educação, o que nos levará a uma situação semelhante aos tempos do regime militar. Esse regime que não por acaso, Sr. Presidente, é evocado quase todos os dias, na brutalidade das polícias militares contra moradores das periferias e, agora também, contra manifestantes que repudiam o golpe parlamentar.

    Por essa razão é que reafirmo aqui o meu repúdio a esse golpe que ameaça a democracia e que compromete o futuro do povo brasileiro.

    Por isso, Sr. Presidente, eu digo "não" a esse impeachment e eu digo "sim" à democracia.

    Viva o povo brasileiro!

    Muito obrigada, Sr. Presidente. (Palmas.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/08/2016 - Página 84