Discurso durante a 120ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Defesa da rejeição do impeachment da Presidente afastada Dilma Rousseff por ausência de crime de responsabilidade.

Autor
Humberto Costa (PT - Partido dos Trabalhadores/PE)
Nome completo: Humberto Sérgio Costa Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Defesa da rejeição do impeachment da Presidente afastada Dilma Rousseff por ausência de crime de responsabilidade.
Publicação
Publicação no DSF de 04/08/2016 - Página 5
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • DEFESA, REJEIÇÃO, IMPEACHMENT, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, MOTIVO, AUSENCIA, CRIME DE RESPONSABILIDADE.

    O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, telespectadores da TV Senado, ouvintes que nos acompanham pela Rádio Senado, nós estamos realizando hoje a sessão de leitura do relatório final do Senador Antonio Anastasia, do PSDB, bem como o início dos debates sobre o impedimento da Presidenta Dilma Rousseff.

    Será a última reunião da comissão - obviamente, amanhã teremos a votação - e, para nós que apoiamos a Presidenta e defendemos a democracia, nenhuma surpresa, nenhuma novidade. O Senador Anastasia, cumprindo a vontade do seu partido, que não consegue vencer o PT há quatro eleições presidenciais consecutivas, admitiu a pronúncia da Presidenta Dilma e propõe levá-la a julgamento.

    Estava dentro do previsto. Apesar do notório saber jurídico, o Senador tucano - que já foi vice de Aécio Neves, derrotado por Dilma em 2014 nacionalmente e também em sua terra, Minas Gerais - teve que fazer um verdadeiro contorcionismo jurídico para acomodar os interesses políticos da coalizão que representa, com a finalidade de tentar dar um verniz de legalidade a esse golpe.

    Imagino que o Senador não esteja se sentindo confortável. Imagino como deve estar lidando com tudo o que aprendeu como sendo o bom direito. Não deve ser fácil cumprir esse papel. O papel de desrespeitar a Constituição e de ignorar fatos para cumprir um objetivo que trucida a democracia ao submeter o Estado de direito às vontades políticas de um grupo.

    Também não é novidade para ninguém que seremos vencidos na Comissão Especial do Impeachment. Não adiantaram todas as verdades que foram trazidas à lume - mesmo pelas testemunhas arroladas pela própria acusação -, que desmontaram a farsa de que a Presidenta Dilma tenha cometido crimes de responsabilidade.

    Não cometeu. Isso ficou evidenciado em todos os depoimentos, em todos os recuos dos algozes de Dilma, que foram tentando remendar esse processo viciado para ver se reduziam a vergonha que ele representa. Um processo que começou com seis acusações e hoje já está em três, que poderiam ser reduzidas a pó se mais tempo tivéssemos para desmascarar as mentiras restantes.

    A auditoria independente do Senado isentou a Presidenta das chamadas pedaladas. O Ministério Público Federal mandou arquivar as acusações de crime que fizeram contra Dilma, alegando que não houve dolo por parte dela em qualquer ato praticado.

    Mas, aqui no Senado, fizeram ouvidos moucos a tudo isso para que o processo prosseguisse à revelia da verdade, mesmo com o Brasil sendo reiteradamente diminuído por governos, jornais, jornalistas, intelectuais e analistas estrangeiros, que enxergam com clareza o golpe parlamentar que está em curso.

    Apresentamos na Comissão do Impeachment um voto em separado para registrar para a história toda a desonra a que estão submetendo a nossa democracia. Não vamos deixar passar em branco esse golpe. Mesmo numericamente vencidos na Comissão, nós vamos lutar, tendo ao nosso lado a verdade e o bom direito.

    Em muitos momentos da trajetória brasileira, nem sempre esses valores venceram de imediato. Haja vista, por exemplo, o regime militar que se instaurou e nos jogou na escuridão por 21 anos. Mas, depois, a história tratou de separar o joio do trigo e de deixar cada um no seu devido lugar. E eu não tenho dúvida de que estamos do lado do trigo.

    Nosso voto em separado, lido pelas Senadoras Gleisi Hoffmann, Vanessa Grazziotin e Kátia Abreu, mostrou a lisura de Dilma Rousseff em todos os seus atos, a primeira Presidenta eleita do Brasil, uma mulher honesta, contra a honra de quem rigorosamente nada pesa que a desabone.

    Em razão disso e independentemente do resultado da Comissão, estamos absolutamente confiantes na batalha final que travaremos aqui neste plenário. Estamos conversando com muitos Senadores independentes, cujas consciências têm acompanhado detidamente o desenrolar dos fatos e sido confrontadas com tudo o que esse processo tem de picaresco e viciado.

    Desde o início, denunciamos o golpe que esse impeachment representava. Os aliados de Michel Temer e Eduardo Cunha se esforçaram muito para tentar contestar, mas, dia a dia, foram vencidos pela profusão de consistentes argumentos que corroboraram a nossa tese.

    Hoje, onde está Eduardo Cunha, que foi usado por Temer e seu grupo para arrombar as portas do Palácio do Planalto, com seus soldados da Câmara dos Deputados? Renunciou à Presidência da Câmara, está acuado pela Justiça, pelo Ministério Público e pela Polícia Federal, mas principalmente pela população brasileira.

    E quando ocorrerá a sua cassação? - perguntamo-nos todos. Os jornais trazem a informação de que Michel Temer quer que essa cassação só ocorra após a votação do impeachment de Dilma. Aliás, a ideia dos usurpadores da vontade popular é que o impeachment seja até abreviado, que aconteça imediatamente, rasgando descaradamente até mesmo os ritos e prazos desse processo forjado para atender a vontade de Temer.

    E essa pressa tem uma justificativa: Temer está com medo. Está com medo de que, se for cassado antes da votação do impeachment de Dilma, Eduardo Cunha provoque uma hecatombe no seu Governo biônico, denunciando todas as falcatruas que sabe sobre ele e seus integrantes. Então, a ideia qual é? Vota-se o impeachment de Dilma sem sobressaltos, impede-se a Presidenta legítima em definitivo, consolida-se o golpe e somente depois se trata de Cunha, que está preparando sua delação premiada com um imenso dossiê sobre todos os aliados políticos que ajudou nesses últimos anos, entre eles os atuais ocupantes do Palácio do Planalto.

    É mais uma evidência do golpe armado contra a democracia. Acusaram Dilma de criminosa, ela que lutou, foi presa e torturada pelo regime militar; ela que jamais se apropriou de dinheiro público; ela que não tem contas na Suíça. Depois inventaram crimes para tentar fundamentar a acusação que faziam contra a Presidenta da República. Incensaram o delinquente do Eduardo Cunha para abrir o processo, e, com uma Câmara dos Deputados em que mais da metade dos representantes responde a processos na Justiça, aprovaram a abertura do impeachment.

    Todos tomamos conhecimento depois da sequência de fatos dantescos: Deputados que votaram por um Brasil mais decente tendo familiares presos pela Polícia Federal por corrupção; Eduardo Cunha afastado do cargo e impedido de pisar na Câmara; os cargos da Administração Federal negociados num balcão de feira para dar sustentação a Temer; os prepostos desse Governo biônico assumindo que tudo não passou de um golpe, seja isso publicamente, seja quando pegos em gravações onde fizeram inconfidências aterradoras.

    Do ponto de vista fiscal, a farra de que Dilma era acusada virou uma brincadeira, uma ridicularia aos olhos da verdadeira orgia que esse Governo golpista tem feito com o Orçamento público. Aprovaram um déficit de R$170 bilhões para 2016, e para o ano que vem a previsão já é de R$140 bilhões, R$150 bilhões. Estão desmontando a Petrobras e vendendo o pré-sal a preço da banana, acabando com programas sociais extremamente relevantes, como o Ciência sem Fronteiras, o Pronatec e o Minha Casa, Minha Vida.

    Ao mesmo tempo, os argumentos levantados para condenar Dilma foram ruindo, um a um, tanto na Comissão de Impeachment quanto em outras esferas, como a judicial, em que o Ministério Público Federal mandou arquivar as acusações de crime ao atestar que as pedaladas fiscais não eram operação de crédito no Plano Safra de 2015.

    Internacionalmente, o Brasil ficou de joelhos, diminuído por essa manobra escancarada para apear uma Presidenta legitimamente eleita. Na França, nos Estados Unidos, na Alemanha, muitos foram os que classificaram esse impeachment como um vexame, como algo que abalará profundamente as nossas instituições e que, por muito tempo, vai nos colocar na história ao lado de países como Honduras e Paraguai, onde quarteladas civis dessa natureza tiveram êxito para vexame nacional e internacional.

    O Senado tem a responsabilidade histórica de corrigir esse erro. Esta Casa afastou a Presidenta da República do seu cargo para analisar com mais profundidade as acusações que lhe foram imputadas. Creio que tivemos essa oportunidade. E, para aqueles que realmente quiseram se dedicar de forma técnica ao processo, tenho a certeza de que foi possível chegar ao pleno convencimento de que Dilma Rousseff não cometeu qualquer crime de responsabilidade. E, sem crime, impeachment não existe. Se houver, é golpe.

    Nesse sentido, nós vamos seguir trabalhando arduamente para conseguir os votos necessários aqui dentro para enterrar esse processo viciado, que envergonha o Brasil e macula a nossa democracia.

    O Brasil é maior do que qualquer partido, é maior do que qualquer governo. Quem tem eleição na cabeça não é o PT nem é Dilma, que foi reeleita pela vontade da maioria dos brasileiros, em 2014, e não disputa eleição daqui a dois anos.

    Quem tem eleição na cabeça é o Presidente interino Michel Temer, que, mesmo ficha suja e impedido de se candidatar, já está trabalhando pela própria recondução ao cargo, golpeando também muitos dos que o ajudaram a entrar no Planalto pela porta dos fundos, imaginando que poderiam suceder, em 2018, esse golpista geral da República.

    Então, o que está em jogo aqui não é uma questão meramente eleitoral. Mas é a defesa da Constituição, da soberania popular, das instituições e da própria ordem democrática, que estão ameaçadas por esse golpe articulado em torno de interesses pessoais e partidários, em absoluto desapreço pelo Brasil e pelo Estado de direito.

    Srªs Senadoras, Srs. Senadores, senhores telespectadores e ouvintes, nós estamos hoje diante de um grande dilema: ou reafirmamos por este Senado a democracia brasileira ou a enterramos de forma definitiva. Afirmar a democracia brasileira é reconhecer aquilo que todos sabem: que não houve qualquer crime de responsabilidade praticado pela Presidenta Dilma. E, como tal, não cabe a esta Casa, não cabe ao Congresso Nacional retirar essa Presidenta.

    Estão errados, equivocados aqueles e aquelas que dizem o seguinte: nós estamos julgando a Presidenta pelo conjunto da obra. Não, Sr. Presidente. Nenhum Parlamentar, nem este Congresso, nem o Senado, nem a Câmara, nem o Poder Judiciário podem julgar a Presidenta Dilma pelo conjunto da obra. Só quem pode julgar a Presidenta Dilma pelo conjunto da obra é o povo no momento da eleição, quando disser que aprovou ou não o seu governo. Foi pelo conjunto da obra do Presidente Lula que ela foi eleita em 2010. Foi pelo conjunto da obra do governo dela que ela foi reeleita em 2014.

    Então, não pode o Congresso Nacional julgar dessa maneira. Tem de julgar pelos fatos, tem de julgar pelas acusações, tem de julgar pelos crimes pelos quais ela está sendo acusada. E, se julgarem dessa maneira, eu tenho absoluta convicção de que este Senado devolverá à Presidenta Dilma o cargo que não pode ser usurpado por um cidadão sem legitimidade, sem representatividade, sem legalidade para exercer essa função.

    Dessa forma, este Senado, Sr. Presidente, tem o dever moral, republicano e constitucional de defender a democracia e de dizer "não" a esse golpe urdido contra o povo brasileiro.

    Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/08/2016 - Página 5