Comunicação inadiável durante a 120ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Comparativo entre o governo interino do Presidente Michel Temer com o governo do ex-Presidente José Sarney com ênfase na política de relações exteriores, dos direitos e garantias trabalhistas e do Sistema Único de Saúde.

Defesa da realização de plebiscito como solução para resolução da crise política envolvendo o impeachment da presidente Dilma Rousseff.

Autor
Roberto Requião (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PR)
Nome completo: Roberto Requião de Mello e Silva
Casa
Senado Federal
Tipo
Comunicação inadiável
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Comparativo entre o governo interino do Presidente Michel Temer com o governo do ex-Presidente José Sarney com ênfase na política de relações exteriores, dos direitos e garantias trabalhistas e do Sistema Único de Saúde.
SISTEMA POLITICO:
  • Defesa da realização de plebiscito como solução para resolução da crise política envolvendo o impeachment da presidente Dilma Rousseff.
Publicação
Publicação no DSF de 04/08/2016 - Página 7
Assuntos
Outros > GOVERNO FEDERAL
Outros > SISTEMA POLITICO
Indexação
  • COMPARAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, MICHEL TEMER, PRESIDENTE DA REPUBLICA, INTERINO, JOSE SARNEY, EX PRESIDENTE, ENFASE, POLITICA EXTERNA, DIREITOS E GARANTIAS TRABALHISTAS, SISTEMA UNICO DE SAUDE (SUS).
  • DEFESA, REALIZAÇÃO, PLEBISCITO, ASSUNTO, ANTECIPAÇÃO, ELEIÇÕES, PRESIDENCIA DA REPUBLICA, OBJETIVO, SOLUÇÃO, CRISE, IMPEACHMENT, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA.

    O SR. ROBERTO REQUIÃO (PMDB - PR. Para uma comunicação inadiável. Sem revisão do orador.) - A título de epígrafe, Senador Paim, eu inicio esse meu pronunciamento com uma frase tuitada outro dia por Wallace de Mello e Silva, meu irmão: a melhor forma de prever o futuro é trabalhar para construí-lo.

    E para construir o futuro, nós temos que conhecer em profundidade o passado, cotejá-lo então com o presente, para aí iniciarmos o trabalho duro da construção do futuro, e no caso do pronunciamento que vou fazer, o futuro do País em que vivemos.

    Para que os brasileiros, Senador Paim, mais jovens não tomem a desastrosa interinidade presidencial como expressão do velho MDB de guerra - e eu falo aqui neste momento como Senador filiado número um do PMDB do Paraná e como Presidente do Diretório Regional do PMDB do meu Estado -, para que os jovens não tomem essa interinidade presidencial como a verdadeira expressão do nosso partido como se fosse uma manifestação pronta e acabada do que seja o nosso PMDB, vou relembrar hoje uma outra presidência do PMDB, igualmente circunstancial, herdada ao sabor dos acontecimentos, mas da qual, ao contrário da presente, nós velhos emedebistas temos motivo para nos orgulharmos.

    E faço essa relembrança não apenas para cotejar a oposição aos princípios básicos do programa do PMDB pelo Governo de hoje, com a fidelidade dos princípios do governo de José Sarney, mas também faço este registro para homenagear o ex-Presidente tão exposto ao desrespeito, como tem sido usual nesses tempos de prejulgamento da sentença antes do processo de supressão do pressuposto de inocência, nesses tempos em que a mídia transforma-se em tribunal popular aos moldes dos regimes de exceção, sob a batuta de promotores e juízes que consideram feio o que não é a sua imagem no espelho.

    Vamos ao cotejo entre a interinidade do PMDB de Temer, de Padilha, de Jucá, de Moreira Franco, de Eduardo Cunha, de Henrique Alves com o PMDB de Sarney, de Celso Furtado, de Dante Mendonça, de Luís Henrique da Silveira, de Marcos Freire, de Paulo Brossard, de Pedro Simon, de Renato Archer, de Rafael de Almeida Magalhães, de Bresser Pereira, de Waldir Pires, de Fernando Lira, de Ulysses Guimarães.

    De saída, vamos comparar a política de relações exteriores de um e de outro governo.

    O Itamaraty de Sarney fundava-se no princípio da autodeterminação dos povos, recusava o alinhamento automático às grandes potências, defendia a multipolaridade, a integração e a cooperação regional. Sarney, Senador Paim, com o Presidente argentino Raul Alfonsín, criou o Mercosul. Recusando-se a submeter o Brasil aos interesses geopolíticos norte-americanos, Sarney normalizou nossas relações com Cuba e aproximou o nosso País dos países do Leste Europeu e com a China.

    Quando o Fundo Monetário Internacional, Senador Lasier, quis impor seu receituário de recessão, de cortes de gastos públicos, de arrocho salarial, Sarney optou pela moratória, em nome de nossa soberania.

    E hoje, Senador Paim, o que temos?

    Temos o Itamaraty retrocedendo às trevas, à política de linha auxiliar da agenda norte-americana. Voltamos a tirar os sapatos para o falido consenso de Washington. O Brasil perfila ao que existe de mais atrasado e obtuso na América Latina e conspira contra o Mercosul, montado por Sarney e Alfonsín.

    Enquanto os dois candidatos à Presidência dos Estados Unidos de hoje convergem na oposição acordos bilaterais que prejudiquem seu país, Temer e Serra parecem querer ressuscitar a Alca e acorrentar o Brasil ao proveito da globalização neoliberal. O Itamaraty concede asilo a um modelo de economia e de relações internacionais que está sendo escorraçado no mundo. Vide o que acontece na Europa hoje.

    Eis aí, opondo-se como a água ao óleo, o PMDB de Sarney e o PMDB de Temer.

    Em relação aos direitos dos trabalhadores e dos aposentados, aos direitos sociais, aos programas sociais de amparo aos mais pobres, à proteção dos excluídos, como agiu o PMDB de Sarney e como age, Senador Paim, o PMDB de Temer?

    Hoje, a conta da crise cai pesadamente sobre o lombo já lanhado dos trabalhadores e dos aposentados. A reforma da Previdência pretende aumentar a idade para a aposentadoria a um patamar que supera a expectativa de vida média de alguns Estados brasileiros. É a chamada aposentadoria "pá, buf!": aposentou, morreu.

    A reforma trabalhista quer revogar a CLT, porque, dizem, ela é muito antiga. Nesse passo, vão querer revogar também a Lei Áurea, que é mais antiga ainda. Querem impor a prevalência do negociado sobre a legislado. Em uma situação de crise como hoje, com o desemprego em alta, com os sindicatos enfraquecidos e com algumas centrais sindicais enfraquecidas e apelegadas, verdadeiras cúmplices do golpe, vão acabar impondo corte de salários, aumento de horas trabalhadas, fim do décimo-terceiro, redução das férias e do descanso remunerado e assim por diante.

    Ora, já não houve um líder empresarial falando em aumento da jornada para 80 horas semanais?

    Enquanto isso, o patético Ministro interino da Saúde desanca o SUS, ofende os clientes do SUS e acena com a privatização da saúde pública. Ameaça ainda o cancelamento do Programa Mais Médicos e profere sandices, como um arremedo de Trump, contra os médicos estrangeiros.

    Estivesse vivo Stanislaw Ponte Preta, com toda a certeza, Ricardo Barros seria o protagonista desse novo festival de besteiras que assola o País.

    Na mesma toada, o Ministro "responsável" pelos programas sociais revela toda sorte de preconceitos contra os beneficiários das bolsas compensatórias. E também quer cortar "abusos" dessa pobretada mal-acostumada que depaupera as finanças públicas.

    A reforma agrária e os movimentos que a empalma voltam a frequentar o índex dos serviços de informação e segurança. Os movimentos urbanos pela moradia são igualmente satanizados e colocados na mira dos guardiões da segurança nacional. Afinal, a nova lei contra o terrorismo abre imensas possibilidades para a repressão de qualquer manifestação de revolta e inconformismo ou meramente reivindicatória. Os serviços dos caçadores de comunistas são bem-vindos novamente.

    A lista de retrocessos, em menos de 60 dias do Governo interino, sob a batuta da atual cúpula peemedebista, alonga-se.

    Relacionemos agora algumas iniciativas nessas áreas do governo do PMDB do velho José Sarney: universalização da assistência médica, com a implantação do SUS; criação do seguro-desemprego; criação do vale-transporte; extensão da Previdência Social ao campo; impenhorabilidade da casa própria; Programa Nacional do Leite, gênese das políticas compensatórias; reconhecimento e respeito aos direitos da mulher; iniciativas pioneiras de garantia aos direitos dos deficientes; retomada da política de reforma agrária; direito de voto para os analfabetos; garantias à organização sindical; liberdade e respeito às manifestações sociais; respeito aos direitos trabalhistas elencados na CLT.

    Depois de mais de duas décadas de ditadura militar, tempo em que os partidos e organizações de oposição, os sindicatos, os movimentos sociais e as expressões culturais populares foram perseguidos e criminalizados, Sarney trouxe de volta o povo brasileiro e suas demandas ao centro das atenções governamentais. Não: Sarney não presidiu uma transição lenta e gradual para uma democracia, como alguns queriam, especialmente os setores mais conservadores das nossas elites. O PMDB de Sarney escancarou as portas para que a democracia e suas manifestações iluminassem cada canto escuro deste nosso Brasil. Mencione-se ainda que José Sarney convocou a Assembleia Nacional Constituinte, restabeleceu as eleições diretas para a Presidência da República e legalizou os partidos comunistas. Um democrata, sem a menor sombra de dúvida.

    Na área econômica, o governo pemedebista de Sarney enfrentou as pressões dos interesses financeiros globais. Não se submeteu ao Fundo Monetário Internacional e colocou em prática o primeiro e grande ensaio para romper com os pressupostos ortodoxos da política econômica: o Plano Cruzado. Um ensaio bombardeado e sabotado por todos os lados, porque não atendia prioritariamente, como hoje, sob Temer e Meirelles, se atende às demandas da banca dos especuladores e do capital financeiro global.

    Coisa diversa aconteceu com o Plano Real, tão acolhido pelos rentistas e pela mídia monopolista. E, porque não arranhava os privilégios de classe, não foi sabotado. Ao mesmo tempo, quando os organismos financeiros internacionais pressionaram para que o País adotasse um amplo programa de privatizações e concessões, Sarney resistiu mais de uma vez. Defendeu a intocabilidade da Petrobras, entendendo-a como um dos pilares da soberania nacional, do desenvolvimento brasileiro.

    E hoje? O que o PMDB apresenta ao País na área econômica? A capitulação, em regra, ao mercado, aos interesses financeiros globais, à geopolítica imperial. As privatizações, as concessões, a entrega desavergonhada do petróleo voltaram à ordem do dia. Fazem tudo com a colaboração sempre prestimosa e atenta da mídia monopolista, para abater a autoestima e a dignidade nacional.

    Quando imaginávamos fosse coisa do passado as manifestações explícitas de entreguismo, as reverências sabujas, servis, adulatórias aos interesses imperiais, eis que este Governo surpreende-nos, retrocedendo aos tempos dos governadores-gerais, a serviço da metrópole. Mas da metrópole não mais sediada em Lisboa, Senador Lasier.

    Parece que o ideal hoje é transformar o Brasil em um Estado associado ao império, uma espécie de Porto Rico.

    As preocupações em iniciativas de Sarney para a construção de um País soberano, defensivamente forte, bem equipado, que recusasse e rompesse a camisa de força imposta pela bipolaridade - preocupações nem sempre reveladas, por óbvio -, contrastam com a sofreguidão com que o atual Governo do PMDB, que não é PMDB, submete-se e enquadra-se à pauta da geopolítica das grandes potências.

    Srªs e Srs. Senadores, cidadãos brasileiros que nos escutam através da TV Senado, esse é o cotejo que faço entre um e outro governo do meu Partido, do PMDB. É uma homenagem que presto a José Sarney. É um tributo, é o desagravo que registro ao ex-Presidente da República, diante da ligeireza irresponsável e suspeita daqueles que hoje o acusam. Não estou canonizando José Sarney, mas rejeito, refuto e combato toda iniciativa estúpida que quer condená-lo ao fogo do inferno. O PMDB de Sarney era muito diferente desta aventura do Temer, em parceria com os interesses geopolíticos de potências poderosas, e da banca instalada no Brasil e sôfrega por retirar direitos dos trabalhadores.

    Esse é o pronunciamento que eu queira fazer. Em adendo, quero, num bate-papo aqui com o Senador Paim e o Senador Lasier, que são os dois únicos que estão no plenário neste momento, falar sobre a tal securitização das dívidas públicas. Minas Gerais já fez isso. Cria-se uma empresa estatal não estatal, não subordinada à fiscalização do Tribunal de Contas e completamente autônoma. Essa empresa emite debêntures e estabelece o valor dos juros que essas debêntures terão, para serem resgatados em quatro, cinco, oito, dez anos. Ela estabelece o valor dos juros. E a garantia, supostamente, é a divida ativa. Mas não é bem assim. Isso já foi feito na Grécia e, na Grécia, como no Brasil, já há uma medida provisória determinando que se coloque no Orçamento recursos para garantir o pagamento das debêntures. Então, na verdade, é uma empresa sem nenhuma fiscalização, que emite títulos com juros absurdos que vão ser pagos pela União, pelos Estados e pelos Municípios. Isso quebrou a Grécia, Senador Lasier. É um absurdo total!

    E a outra loucura contra os trabalhadores é o Fundo de Garantia dado em garantia aos empréstimos consignados, porque, a par disso, já vem a proposta de acabar com a retirada do Fundo de Garantia no momento de uma demissão, deixando o Fundo na guarda dos bancos privados e só passível de ser resgatado na aposentadoria do trabalhador. São medidas notadamente para favorecer o mercado financeiro, que patrocinou o golpe.

    E hoje, Senador Paim, nós estamos falando aqui no plenário sem a transmissão direta, garantida pelo Regimento Interno do Senado, porque está tudo lá no circo da cassação, no circo do impeachment da Presidente Dilma. Está ao vivo o impeachment. O plenário, não.

    O circo e a farsa do impeachment sem crime de responsabilidade, que, na verdade, é um referendo revogatório que está sendo negociado - sejamos verdadeiros - com ministérios, com favores, com propostas, com verbas, com liberação de emendas. Mas, atrás disso tudo, como um deus ex machina do teatro grego, está o interesse geopolítico dos grandes países, as conversas nos gabinetes das embaixadas e as determinações da banca que patrocina o espetáculo do golpe.

    O ideal seria, a meu ver, a volta da Presidente Dilma, com o compromisso muito sério de plebiscito e eleições diretas, avalizado por um grupo de personalidades brasileiras ligadas à economia, às empresas, aos trabalhadores, que, com ela, garantissem o patriotismo e a unidade de um governo provisório, até que o plebiscito se estabelecesse. E nós estaríamos livrando o Brasil de um momento futuro extraordinariamente difícil, quando o povo na rua se revoltar e o Governo, escudado na lei do terrorismo, lançar, sobre as manifestações populares, o Exército, a polícia, num conflito armado, como o que ocorre na Europa, mas do qual o Brasil pode prescindir, se este Senado tiver reservas de civilidade, de civismo, de dignidade e de patriotismo, para, a fim e a cabo, derrubar esse raio de impeachment. Não é "volta, querida" nem "fora, Temer"; é uma manifestação a favor da dignidade e da construção de um projeto democrático desenvolvimentista e soberano no nosso País, no nosso Brasil.

    Obrigado pelo tempo, Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/08/2016 - Página 7