Discurso durante a 133ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Inquirição do Sr. Júlio Marcelo de Oliveira, Procurador do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União, sobre o cometimento de crime de responsabilidade pela Presidente Dilma Rousseff.

Autor
Jorge Viana (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Jorge Ney Viana Macedo Neves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Inquirição do Sr. Júlio Marcelo de Oliveira, Procurador do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União, sobre o cometimento de crime de responsabilidade pela Presidente Dilma Rousseff.
Publicação
Publicação no DSF de 26/08/2016 - Página 99
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • INQUIRIÇÃO, INFORMANTE, PROCURADOR, MINISTERIO PUBLICO, TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO (TCU), ASSUNTO, CRIME DE RESPONSABILIDADE, AUTORIA, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, REFERENCIA, UTILIZAÇÃO, DECRETO FEDERAL, OBJETIVO, ABERTURA, CREDITO SUPLEMENTAR, AUSENCIA, AUTORIZAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, OBTENÇÃO, EMPRESTIMO, ORIGEM, BANCO DO BRASIL, BENEFICIARIO, GOVERNO FEDERAL, DESTINAÇÃO, FINANCIAMENTO, PLANO, SAFRA.

    O SR. JORGE VIANA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC) - Sr. Presidente Ricardo Lewandowski, queria, primeiramente, cumprimentar V. Exª, inclusive, por essa última tirada. O Senado tem essas surpresas. O Presidente Renan trata muito bem isso. Queria cumprimentar o Presidente Renan e todos os colegas Senadores e Senadoras.

    O Senado é a Casa da Federação, a instituição mais antiga da República, Sr. Júlio Marcelo. O senhor sabe muito bem disso. Aqui está cheio de ex-governadores, ex-prefeitos, ministros, gestores públicos. Nós sabemos o que é a execução de um orçamento, o que é a montagem de um orçamento, a execução de um orçamento, a Lei de Responsabilidade Fiscal. Mas eu lamento, sinceramente, que baseado, com todo o respeito, porque eu fui governador e prefeito e sei que, se não fossem os técnicos nos auxiliando, eu não teria tido o sucesso que tive... Devo muito a eles. Sinto-me muito mais técnico até do que político. Mas, hoje, nós estamos acionando os arts. 85 e 86 da Constituição Federal, talvez os artigos mais sensíveis na democracia, por conta de manifestações de técnicos como V. Sª.

    No começo desta sessão, nós tivemos aqui uma suspeição do seu trabalho, dos seus pareceres, da sua postura. A decisão foi do Presidente. Isso não o desqualifica; apenas estabelece que o senhor havia adotado em algum momento uma postura absolutamente parcial. Tanto é que está como informante e não mais como testemunha. E sei que um informante pode até mentir - e eu não estou dizendo que V. Sª é capaz disso -, mas é bom que se diga: testemunha é obrigada a falar a verdade; o informante, não.

    Eu consigo pegar a minha vivência de execução orçamentária e, quando eu vejo V. Sª ...

(Soa a campainha.)

    O SR. JORGE VIANA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC) - ... desqualificar o Orçamento no Brasil, V. Sª está desqualificando do Congresso, porque quem elabora o Orçamento brasileiro.... Quem elabora o Executivo, mas quem o faz e transforma em lei é a Câmara e o Senado. Eu não acho isso bom.

    Mas eu queria aqui fazer um questionamento, porque não existe possibilidade de um governante assinar um decreto sem ter cúmplices. No caso do Plano Safra, sequer a Presidente Dilma participa de sua elaboração. Isso é feito pelo ministro da Fazenda com outros ministros. No caso de decretos, eu pergunto a V. Sª: não há cúmplices para o crime que a Presidente Dilma cometeu? Foi ela que bolou tudo e só ela é a responsável? Não há nenhum ministro, nem um ordenador de despesa, inclusive, de outros Poderes solicitando que ela editasse os decretos?

    Esse é o primeiro questionamento que eu faço a V. Sª.

    O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski) - Sr. Júlio Marcelo com a palavra.

    O SR. JÚLIO MARCELO DE OLIVEIRA - Obrigado, Sr. Presidente. Obrigado, Senador Jorge Viana.

    Quero registrar o meu mais profundo respeito ao Congresso Nacional, ao Senado. Fui servidor do Senado, fui Consultor Legislativo, me orgulho disso, conheço as vicissitudes do processo orçamentário, as demandas que são apresentadas pela sociedade, pelos diversos órgãos, a dificuldade que os Srs. Parlamentares têm de procurar a melhor equação, o melhor equilíbrio para atender todas essas demandas.

    Não; de maneira alguma, procuro desqualificar o orçamento no Brasil, mas apontar falhas que existem e que podem superadas pela adoção de previsões mais realistas do crescimento da receita para que, depois, na execução, não tenhamos que fazer contingenciamentos e frustrações da execução da despesa prometida e que não poderá ser concretizada pela insuficiência da arrecadação. Tenho o mais profundo respeito ao Congresso Nacional.

    A minha atuação em relação a tudo isso decorre das minhas competências funcionais. Essa questão dos decretos surge em notícias da Imprensa, e àqueles que tentam me responsabilizar por tudo que está acontecendo, eu digo: a grande responsável é a Imprensa livre brasileira, o jornalismo investigativo que apontou a ocorrência de situações de desconformidades que não haviam aparecido nos radares, nos monitoramentos que nós do Tribunal de Contas tínhamos.

    Os decretos e as pedaladas, essas tomadas de empréstimos surgem primeiro em matérias de jornalistas como Ribamar Oliveira, João Villaverde, Fábio Fabrini, em veículos que despertaram a atenção: "Opa; tem alguma coisa acontecendo! A própria Caixa está pedindo uma arbitragem entre a AGU...

(Soa a campainha.)

    O SR. JÚLIO MARCELO DE OLIVEIRA - ... e o Tesouro porque não está recebendo valores que devia estar recebendo. O que está acontecendo?" E, na auditoria, é que se verificou a magnitude do problema que estávamos enfrentando.

    Então, coisas absolutamente graves. Não é pela dificuldade que o gestor tem de gerir o País que ele está autorizado a cometer esse tipo de ilegalidade. Existem formas legais de atuar. Os Presidentes anteriores atuaram de forma legal. Essa ilegalidade cometida é extremamente surpreendente e extremamente grave.

    Evidentemente que há outros agentes públicos envolvidos no cometimento dessas ilegalidades e há processo no TCU que estão justamente tratando da responsabilização de outros servidores públicos envolvidos.

    No limite das competências do Tribunal de Contas e do...

(Interrupção do som.)

    O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski) - Senador Jorge, V. Exª prossegue.

    O SR. JORGE VIANA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC) - Sr. Presidente, eu falei em relação ao respeito ao Congresso, que transforma proposta orçamentária em lei, porque o senhor usou palavras como "fraudes" e outros adjetivos para o que vivemos no País.

    Eu, particularmente, lamento porque esse processo, o uso desse artigo da Constituição vem tentando, inclusive, desmontar muitas das conquistas que o País alcançou graças à ação do Governo do Presidente Lula e da Presidente Dilma.

    Falam o que o País faliu, que está falido, mas, quando o Presidente Lula assumiu, o orçamento brasileiro era de R$1,4 trilhão e, agora, chega a quase R$6 trilhões. E fomos nós que falimos o Brasil.

    Obviamente que a execução desse orçamento requer melhorias e aperfeiçoamentos. Mas eu pergunto a V. Sª: o técnico, a pessoa que era responsável, um dos responsáveis, pela elaboração do Orçamento no Brasil era o Sr. Dyogo Oliveira. Hoje é Ministro do Planejamento do Governo Temer. Era ele que elaborava, junto com outros técnicos, com o Ministro da Fazenda, e apresentava para a Presidente o Orçamento e também proposta de decretos. E é a Presidente que tem que ser criminalizada? Ela sofre a pena maior sem nenhum cúmplice? Será que isso é o certo?

    O Supremo esta semana tomou uma medida falando que, na Lei da Ficha Limpa - e é muito grave - não são os tribunais que decidem o afastamento do gestor público, e, sim, as Câmaras Municipais. Aqui, em vez de um Conselheiro, com todo o respeito a V. Exª, do Tribunal de Contas da União, nós temos um técnico, com todo o respeito - volto a afirmar o meu respeito aos técnicos. Não está havendo uma inversão, não? Nós não estamos vivendo aqui um ambiente que pode criar um precedente muito ruim? Quantos governantes repetiram essa atitude da Presidente Dilma, dos governos dos Estados e de outros governos que a antecederam?

(Soa a campainha.)

    O SR. JORGE VIANA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC) - Dizer que a Presidente Dilma era flexível na execução orçamentária! Conheci muitos Presidentes da República, nenhum tão rigoroso quanto a Presidente Dilma, nesse caso.

    Queria concluir, Sr. Presidente, e caro Sr. Júlio Marcelo. Eu vou fazer uma leitura aqui de algo que talvez seja uma recomendação: "A política não deve submeter-se à economia, e esta não deve submeter-se aos ditames e ao paradigma eficientista da tecnocracia." O Brasil, perigosamente, está se subordinando à tecnocracia. Quem escreveu isso aqui foi o Papa Francisco. Eu lamento.

    Queria encerrar dizendo que alguns tecnocratas no nosso País hoje pensam que são Deus, outros têm certeza.

    Obrigado, Sr. Presidente.

    O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski) - Sr. Júlio Marcelo, por favor.

    O SR. JÚLIO MARCELO DE OLIVEIRA - Muito obrigado, Sr. Presidente, Sr. Senador Jorge Viana. Eu utilizei a expressão "fraude" para qualificar uma conduta do Poder Executivo, não do Poder Legislativo, de tomar empréstimos ilegais, não registrá-los, de forma ilegal, no Banco Central. Não atribuí nenhuma conduta fraudulenta ao Congresso Nacional.

    Em relação ao Sr. Dyogo Oliveira, no parecer que emiti sobre a responsabilização de agentes que atuaram no cometimento dessas ilegalidades, no Ministério Público de Contas - do parecer posso falar, foi um parecer da minha lavra -, pedi a responsabilização e aplicação da sanção prevista na Lei Orgânica do Tribunal de Contas de inabilitação para o exercício de função pública por oito anos. Cabe ao Tribunal avaliar, aquilatar a conduta de cada agente e estabelecer a pena adequada. De minha parte, penso que estou sendo coerente com a visão que tenho em relação à conduta da Presidente e dos outros agentes públicos que participaram dos mesmos fatos.

    Não é a minha opinião de técnico que vai efetivamente determinar o futuro da Presidente da República nem se as contas recebem parecer pela rejeição ou pela aprovação. Sou apenas mais uma pessoa num conjunto de pessoas que estão atuando e que estão tendo uma visão que está levando a esta conclusão, atuando dentro daquilo que me cabe como servidor do Ministério Público, ao qual tenho orgulho de pertencer.

    Então há todo um trabalho da auditoria do Tribunal, há a visão dos Ministros, e é o Congresso Nacional que vai decidir. Nunca é o técnico.

    Eu não me considero Deus, não tenho certeza de que sou Deus. Sou apenas um servidor público, mais um servidor público deste País.

(Soa a campainha.)

    O SR. JÚLIO MARCELO DE OLIVEIRA - O que eu tenho certeza é de que a minha missão é servir ao País. Toda vez que eu me defrontar com ilegalidades deste jaez, seja qual for o governo, seja qual for o partido, eu vou tomar a iniciativa de provocar o Tribunal de Contas para que ele se manifeste e vou pedir, dentro da minha esfera de atuação, as penalidades, a responsabilização que couber dentro do ordenamento jurídico.

    Isso não me faz melhor do que ninguém. Apenas me faz cumpridor dos meus deveres como servidor público. Fui admitido mediante concurso para isso. O que se espera de um agente público do Ministério Público é que atue, e não que seja leniente diante de situações de ilegalidade com que ele se depara.

    Então, agradecendo a pergunta, eu encerro

    Obrigado, Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 26/08/2016 - Página 99