Discurso durante a 133ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Inquirição do Sr. Geraldo Luiz Mascarenhas Prado sobre o cometimento de crime de responsabilidade pela Presidente Dilma Rousseff.

Autor
Lídice da Mata (PSB - Partido Socialista Brasileiro/BA)
Nome completo: Lídice da Mata e Souza
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Inquirição do Sr. Geraldo Luiz Mascarenhas Prado sobre o cometimento de crime de responsabilidade pela Presidente Dilma Rousseff.
Publicação
Publicação no DSF de 27/08/2016 - Página 58
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • INQUIRIÇÃO, TESTEMUNHA, GERALDO LUIZ MASCARENHAS PRADO, ASSUNTO, CRIME DE RESPONSABILIDADE, AUTORIA, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, REFERENCIA, UTILIZAÇÃO, DECRETO FEDERAL, OBJETIVO, ABERTURA, CREDITO SUPLEMENTAR, AUSENCIA, AUTORIZAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, OBTENÇÃO, EMPRESTIMO, ORIGEM, BANCO DO BRASIL, BENEFICIARIO, GOVERNO FEDERAL, DESTINAÇÃO, FINANCIAMENTO, PLANO, SAFRA.

    A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA) - Sr. Presidente, caro Dr. Geraldo Prado, o debate sobre a aplicação do Processo Penal ao processo de impeachment ocorre todo o tempo. A Lei nº 1.079, de 1950, prevê, em seu art. 38, a aplicação subsidiária do Código de Processo Penal. Na sua balizada opinião, quais as garantias do processo penal que são imprescindíveis ao processo de impeachment?

    O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski) - Pois não. A Testemunha com a palavra.

    O SR. GERALDO LUIZ MASCARENHAS PRADO - Presidente, em primeiro lugar, a Corte Interamericana de Direitos Humanos já firmou posição de que as garantias do Processo Penal são aplicáveis a processos de impeachment. Essa orientação valeu para vários casos que foram levados à Corte e valerá, certamente, para o caso brasileiro se eventualmente isso chegar a ocorrer. As garantias são as básicas associadas ao direito de defesa e ao contraditório.

    Portanto, as decisões dos diversos julgadores, desde a Câmara dos Deputados até o Plenário do Senado, deverão sempre estar orientadas àquilo que foi solicitado pela acusação e admitido nas diversas etapas. A decisão não pode extrapolar aquilo que foi requerido pela parte, delimitado, eventualmente, em alguma decisão anterior. As questões de natureza material devem cingir-se, de forma rigorosa, aos tipos do crime de responsabilidade previstos na Constituição. Portanto, embora essa pareça ser uma questão de menor importância, não é, no caso concreto, porque a Constituição da República é rigorosa na definição de crimes de responsabilidade, não dando abertura a isso.

    Eu queria intercalar, nessa minha explicação, uma observação que considero fundamental. O Supremo Tribunal Federal tem competência para o controle de eventuais violações da garantia e do devido processo legal em todas as etapas do processo do impeachment - em todas as etapas. Portanto, decisões não fundamentadas, decisões que não se fundamentam em crimes de responsabilidade efetivamente apontados e demonstrados, matéria debatida para além das questões que acabei de mencionar, todas elas podem ser levadas ao Supremo Tribunal Federal. E, evidentemente, o direito de defesa em todas as etapas.

    (Soa a campainha.)

    O SR. GERALDO LUIZ MASCARENHAS PRADO - São basicamente essas.

    O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski) - Senadora Lídice, para repergunta.

    A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA) - V. Sª entrou em uma parte que vou lhe perguntar agora. O debate que eu vejo como contraditório no roteiro dos defensores do impeachment é que uma hora o debate tem fundamento jurídico e na outra hora é resultado do conjunto da obra. Alguns chegam a dizer que ele pode ser motivado, inclusive, por uma questão de foro íntimo. Foi apresentada essa versão na Comissão Especial. Dito de outro modo, para que se peça o impeachment de um Presidente da República, vale qualquer coisa, desde que se tenha a maioria parlamentar.

    Como um especialista em Processo Penal, como V. Exª, enquadra essas categorias nos requisitos para o pedido de impeachment? Ele é apenas político, como se tem falado tanto aqui neste plenário? Pode ser feito por tipificação aberta? Existe uma tipologia penal chamada de conjunto da obra? É possível alegar foro íntimo para pedir o impedimento de uma Presidente da República sem agredir direitos e garantias fundamentais? Em síntese, um julgamento por exercício de maioria sem a demonstração de crime de responsabilidade fere ou não o ordenamento jurídico brasileiro e a Constituição Federal?

    O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski) - A testemunha com a palavra.

    O SR. GERALDO LUIZ MASCARENHAS PRADO - Obrigado, Presidente. Obrigado, Senadora.

    A primeira resposta de todas é que, no regime parlamentarista, o Congresso pode emitir um voto de desconfiança, uma moção de desconfiança à ação de quem governa. É uma forma de deixar de lado, momentaneamente, a vontade da maioria dos eleitores e substituir o governo.

    No presidencialismo, isso não pode ocorrer em hipótese alguma. O presidencialismo é diferente do parlamentarismo, é uma escolha constitucional. No caso brasileiro, uma escolha sufragada também pela maioria da população consultada se preferia o presidencialismo ou o parlamentarismo. E o presidencialismo, nesse ponto, protege os detentores de mandatos, que foram escolhidos pela maior parte dos eleitores, contra julgamentos, durante o curso do processo, durante o curso do seu mandato, de natureza de oportunidade e conveniência - julgamentos de mau governo. Esse é um mau governo.

    Julgamento de mau governo, claro, tem que fazer parte o debate parlamentar, será objeto da consideração da opinião pública, mas ele somente será definitivo numa eleição posterior. E nesta eleição, sim, essas pessoas, os eleitores são os juízes do mau ou do bom governo.

    Relativamente ao conjunto da obra, tipicidade fechada, eu vou usar um exemplo que eu tenho usado em sala de aula a respeito do processo de impeachment. A Presidenta da República é uma locatária de um imóvel por quatro anos. E querem desalojá-la desse imóvel não porque não pagou aluguel, não porque não pagou as taxas, mas porque está se discutindo, ou discutiu, no ano de 2015, quatro meses de condomínio. Mas pagou. Apesar de discutir, pagou os quatro meses de condomínio. Então, o que se faz para desalojá-la desse imóvel? Ela é acusada de homicídio. Pede-se a pena do homicídio.

    (Soa a campainha.)

    O SR. GERALDO LUIZ MASCARENHAS PRADO - Não há corpo, não há vítima, não há nada. Como se pretende provar o homicídio? Demonstrando que ela atrasou quatro meses de condomínio para discutir isso.

    Essa absoluta desproporção, essa absoluta desvinculação a Constituição da República não permite. Ela estabelece, de maneira fechada, os tipos que caracterizam os crimes político-administrativos para dizer: olha, se não gostamos da maneira como aquela locatária está governando o imóvel, não vamos permitir que ela volte a governar aquele imóvel quatro anos depois, mas não podemos, em hipótese alguma, aplicar a ela uma sanção de homicídio, uma pena de homicídio, se não há homicídio, se não há corpo, se não há cadáver, se o que há é uma discussão sobre mau governo.

    Nesse contexto, eu acrescentaria, em resposta à sua pergunta, que o foro íntimo, em qualquer julgamento, quer seja dos jurados, quer seja dos Senadores, quer seja...

    (Interrupção do som.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/08/2016 - Página 58