Discurso durante a 133ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Inquirição do Sr. Geraldo Luiz Mascarenhas Prado sobre o cometimento de crime de responsabilidade pela Presidente Dilma Rousseff.

Autor
Jorge Viana (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Jorge Ney Viana Macedo Neves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Inquirição do Sr. Geraldo Luiz Mascarenhas Prado sobre o cometimento de crime de responsabilidade pela Presidente Dilma Rousseff.
Publicação
Publicação no DSF de 27/08/2016 - Página 75
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • INQUIRIÇÃO, TESTEMUNHA, GERALDO LUIZ MASCARENHAS PRADO, ASSUNTO, CRIME DE RESPONSABILIDADE, AUTORIA, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, REFERENCIA, UTILIZAÇÃO, DECRETO FEDERAL, OBJETIVO, ABERTURA, CREDITO SUPLEMENTAR, AUSENCIA, AUTORIZAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, OBTENÇÃO, EMPRESTIMO, ORIGEM, BANCO DO BRASIL, BENEFICIARIO, GOVERNO FEDERAL, DESTINAÇÃO, FINANCIAMENTO, PLANO, SAFRA.

    O SR. JORGE VIANA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC) - Queria cumprimentar o Prof. Geraldo Prado e dizer que eu fiz algumas intervenções me questionando e compartilhando com os colegas Senadores e, no caso, com o informante e com as testemunhas presentes, porque nós estamos fazendo uso - V. Sª já se referiu ao longo de algumas respostas -, nós estamos fazendo uso de dois artigos especialíssimos da nossa Constituição. É muito grave fazer uso desses dois artigos. Para tirar alguém que está no Poder, poder dado pelas urnas, tem que ter uma motivação explícita, materializada, no meu senso comum.

    Não sou jurista. V. Exª foi desembargador, é professor, pelo menos duas grandes questões que a sociedade brasileira pergunta - de um lado, alguns dizendo: "Não, cometeu crime de responsabilidade!" E nós estamos dizendo: "Não conseguimos ver a materialização desse crime!" É mais do que um crime; é um atentado à Constituição que a Presidente Dilma tem que ter cometido. Atentar contra a Constituição. Eu queria que V. Sª pudesse comentar: é possível...

(Intervenção fora do microfone.)

    O SR. JORGE VIANA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC) - É possível...

    Querido colega Moka, V. Exª está um pouco impaciente, mas V. Exª tem nos ajudado a transmitir paciência para os demais colegas; nós precisamos, aqui é um tribunal, passa...

(Intervenção fora do microfone.)

    O SR. JORGE VIANA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC) - Eu sei, Moka, você é um companheiro que está ajudando no processo. Sério mesmo. Estamos juntos.

    Eu queria só... Eu só queria que V. Sª pudesse passar. É possível, com a tentativa de tipificação de crime...

(Soa a campainha.)

    O SR. JORGE VIANA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC) - ... para a Senhora Presidente, ela ter feito esse atentado à Constituição a ponto de abrir-se um processo de impeachment e tirar-lhe o Poder que as urnas lhe deram - 54 milhões de brasileiros - sem nenhum cúmplice? Sem a colaboração de nenhum outro ordenador de despesa? Porque, quando se trata dos decretos, ela recebia parecer das autoridades competentes - da Fazenda, do Planejamento -, dizendo que eles não estavam ferindo metas. Ela, então, publicava os decretos. Ela recebia solicitação de ordenadores de despesa de outros Poderes. E, agora, está-se colocando que ela foi a única, entre 204 milhões de brasileiros, a cometer um crime, um atentado contra a Constituição. É possível haver um impeachment em que só a Presidenta, com base no Plano Safra e em três decretos, ser ela a que paga toda a conta desse processo?

    Primeiro...

(Interrupção do som.)

    O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski) - Com a palavra a testemunha.

    O SR. GERALDO LUIZ MASCARENHAS PRADO - Muito obrigado.

    Muito obrigado, Senador. É possível, é; não seria constitucional. Não seria constitucional.

    A questão que V. Exª coloca, como já mencionou, já foi abordada por mim, mas eu agora vou abordá-la por outro enfoque: um crime de responsabilidade, ele protege um determinado bem jurídico. E este bem jurídico é a Constituição. É a integridade constitucional.

    Os comportamentos que são atribuídos à Presidente da República, alguns dos quais ela não praticou, efetivamente não praticou. No caso do Plano Safra, não há comportamento da Presidente da República.

    No caso dos três decretos, esses comportamentos não se caracterizam por atentado à Constituição. Eu não posso pegar uma lei de 1950 e impor uma interpretação dela à Constituição de 1988. A ordem jurídica não funciona assim. Nós não deixamos para trás a ditadura para que a Constituição da democracia ficasse abaixo de uma lei de 1950, cuja história eu vou me poupar de contar aqui, não se justifica. A Constituição é que determina o que valem as leis anteriores a ela. E, neste campo, com todo o respeito, o bem jurídico de um crime de responsabilidade, que tem que ser avaliado à luz da Constituição, é um atentado à própria ordem constitucional e não está caracterizado. Ainda que tudo ficasse provado no que foi imputado à Presidente da República, não há caracterização de crime de responsabilidade.

    O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski) - Senador Jorge Viana, para a réplica.

    O SR. JORGE VIANA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC) - Muito obrigado, Sr. Presidente.

    Eu tenho uma visão de que o Senado Federal pode estar escrevendo uma página muito triste de sua história se levar adiante esse processo. É parte do jogo político? Do jogo político, sim, mas esta é a Casa de Rui Barbosa e tem 190 anos.

    Eu queria que V. Sª, se pudesse, dissesse, do ponto de vista de quem tem conhecimento das leis, da Constituição, que consequências, que pedagogia podemos estar criando aqui, caso levemos adiante este impeachment, sem a tipificação do crime de responsabilidade. Como isso pode gerar precedente? Por exemplo, os Estados brasileiros. Eu fui Governador oito anos, executava Orçamento, editava decretos, tinha Secretário de Planejamento e da Fazenda; recebia, todo ano, cartinha do Secretário do Tesouro, dizendo que eu estava cumprindo a minha responsabilidade fiscal. Usando esses argumentos para tirar a Senhora Presidente do poder, um crime não tipificado, se essa modelagem, se essa narrativa, se um processo igual a esse for aplicado nos demais Estados da Federação, algum governador fica imune de um processo como este, que, para mim, é de exceção? Isso, na Europa, nos países vizinhos da América Latina, que consequência teria, caso os países das democracias resolvessem adotar um processo de impeachment de seus governantes baseado nos fatos que este processo está trazendo para o Senado contra a Presidente Dilma? Que consequências teríamos?

    Era esse o questionamento.

    E agradeço o Sr. Geraldo Prado, Sr. Presidente.

    O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski) - Agradeço a V. Exª.

    Com a palavra a testemunha.

    O SR. GERALDO LUIZ MASCARENHAS PRADO - Muito obrigado, Senador.

    A consequência imediata é a insegurança jurídica. E eu vou dar dois exemplos. Um, que V. Exª já deu, diz respeito aos gestores, aos governadores dos Estados, aos prefeitos dos Municípios. Todos eles ficariam vulneráveis, porque, independentemente de seguir, com todo o rigor, com todo o cuidado, a orientação dos seus corpos técnicos, uma maioria de oposição eventual poderia cassar os seus respectivos mandatos.

    E não é só isso. Eu recentemente escrevi um texto. Falei do aprendiz de feiticeiro. O aprendiz de feiticeiro quebra a vara. Quando se quebra a vara... (Pausa.)

    O SR. JORGE VIANA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC. Fora do microfone.) - Sr. Presidente, está muito tumultuado. Sr. Presidente, está muito barulho. Nem eu ouço, nem a testemunha pode falar.

    E o tempo?

(Soa a campainha.)

    O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski) - Srs. Senadores, é preciso um pouco de colaboração de V. Exªs para ouvirmos a testemunha.

    A testemunha retoma a palavra.

    O SR. GERALDO LUIZ MASCARENHAS PRADO - Obrigado, Sr. Presidente.

    Agradeço aos Senadores e às Senadoras a atenção.

    Como eu mencionava, eu falei do aprendiz de feiticeiro. Quando se quebra uma varinha, que é a Constituição, que são as proteções constitucionais, ninguém está mais seguro. Também os Ministros do Supremo Tribunal Federal podem sofrer um processo de impeachment. Vamos imaginar que um determinado grupo de pessoas entenda que um ministro vive todo tempo decidindo contra a opinião dos demais ministros e resolva transformar esse entendimento dele, que é legítimo, que é justo - certo ou errado -, em crime de responsabilidade. Nós estaríamos diante da possibilidade de os Ministros do Supremo Tribunal Federal ficarem fragilizados pela fragilização da noção de crime de responsabilidade. A mesma coisa se dá em relação aos Parlamentares. Os Parlamentares têm uma imunidade material. Se nós começarmos a flexibilizar a interpretação dessas garantias, os Parlamentares, um dia, poderão perder seu mandato, apesar da imunidade que lhes é garantida pela Constituição.

    Esse é um terreno extremamente perigoso, um território extremamente perigoso, Senador, porque é um território em que quem, eventualmente, tem o poder de violar a Constituição imagina que ela nunca será violada contra si, mas é um erro. A história ensina que é um erro. Ninguém domina esse leviatã quando alguém resolve abrir as portas. E vimos isso recentemente com o próprio Presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha.

    Basicamente era isso, Presidente.

    Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/08/2016 - Página 75