Discurso durante a 133ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Inquirição do Sr. Ricardo Lodi sobre o cometimento de crime de responsabilidade pela Presidente Dilma Rousseff.

Autor
Vanessa Grazziotin (PCdoB - Partido Comunista do Brasil/AM)
Nome completo: Vanessa Grazziotin
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Inquirição do Sr. Ricardo Lodi sobre o cometimento de crime de responsabilidade pela Presidente Dilma Rousseff.
Publicação
Publicação no DSF de 28/08/2016 - Página 100
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • INQUIRIÇÃO, INFORMANTE, RICARDO LODI RIBEIRO, ASSUNTO, CRIME DE RESPONSABILIDADE, AUTORIA, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, REFERENCIA, UTILIZAÇÃO, DECRETO FEDERAL, OBJETIVO, ABERTURA, CREDITO SUPLEMENTAR, AUSENCIA, AUTORIZAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, OBTENÇÃO, EMPRESTIMO, ORIGEM, BANCO DO BRASIL, BENEFICIARIO, GOVERNO FEDERAL, DESTINAÇÃO, FINANCIAMENTO, PLANO, SAFRA.

    A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - Sim, perdi meu tempo. Estou falando. Então, peço desculpas a V. Exª. É a V. Exª que estou me dirigindo, Ministro Presidente Lewandowski.

    Quero cumprimentar o Dr. Ricardo Lodi e dizer que já estivemos juntos debatendo o mesmo tema na Comissão Especial do Impeachment.

    Aqui quero, Dr. Lodi, fazer um resumo bem básico, elementar, do que acontece. V. Sª, como eu, sabe perfeitamente, conhece o enredo e o resumo.

    A Senhora Presidente está sendo acusada de ter cometido dois crimes: as tais pedaladas, que é o Plano Safra, e a assinatura dos decretos. Nos decretos, eles questionam o quê? Que ela descumpriu a meta e que não tinha autorização legal. Aí viram que não tinha autorização legal porque o art. 4º dá autorização legal. Mas o art. 4º da LOA coloca um condicionante. Qual é? O atingimento da meta. Só que o art. 4º diz: "meta para o exercício de 2015". Eles inventaram a tal figura da meta orçamentária. Então queria que o senhor, como estudioso, como professor da área, dissesse qual é a lei, qual é o artigo que fala da tal meta orçamentária. Perguntei a todos e nenhum, até agora, pôde responder. Leio de trás para frente o relatório do nobre Relator e ele não responde a essa questão básica e elementar. Fala, fala, fala, arrodeia, arrodeia, arrodeia, mas não diz. Então, que o senhor nos diga. Traga luz para este debate para que eu e todo o povo brasileiro possamos, de fato, entender qual foi o crime, qual foi a lei que a Presidente desrespeitou.

    Em relação às pedaladas é a mesma coisa. Para dizer que é crime, que a Presidente infringiu a lei, ela fez uma operação de crédito. Aí a justificativa principal é o tempo, porque ela ficou devendo muito e por muito tempo. No âmbito do Direito, o período em que se deve e a quantidade que se deve, nobre Dr. Lodi, é isso o que caracteriza o crime? Então, são essas duas coisas. Não há mais o que discutir - nem em 2014, nem o conjunto da obra. Não é isso! Porque eles fogem do debate. Basta a gente discutir essas coisas simples!

    Então, são esses os questionamentos que eu faço a V. Sª.

    O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski) - O Sr. Ricardo Lodi com a palavra.

    O SR. RICARDO LODI - Obrigado, Presidente.

    Agradeço à Senadora Vanessa os dois questionamentos. Vou começar pelo primeiro.

    Essa ideia de que os créditos suplementares têm que ser compatíveis com a previsão abstrata, na Lei de Diretrizes Orçamentárias, da meta fiscal é algo que, a meu ver, com a devida vênia dos que pensam em contrário, não é admitido pelos sentidos literais possíveis do art. 4º da LOA. O art. 4º da LOA fala da compatibilidade dos créditos com a obtenção da meta.

    A obtenção da meta se pressupõe o atingimento da meta, o que tem um viés, evidentemente, financeiro, e não em relação à previsão abstrata da meta. Porque, se assim fosse, ainda que fora dos limites oferecidos pela norma, não seria possível utilizar o instrumento dos créditos suplementares nos momentos em que eles mais se fazem necessários, que são os momentos em que a imprevisibilidade, no exercício orçamentário, faz exigir alterações.

    Fato é que não só essa interpretação não se pode extrair do art. 4º da Lei de Orçamento, como ela nunca foi. Até o acórdão do TCU, de outubro de 2015, essa interpretação não existia no Direito brasileiro. É preciso lembrar que a norma jurídica não é só texto, a norma jurídica se revela no momento da sua aplicação. Portanto, o princípio da irretroatividade não se faz em relação ao texto abstrato da norma. Se nunca ninguém interpretou a norma daquele jeito, no momento da conduta, essa inovação no Direito Orçamentário, evidentemente, só pode se aplicar para os casos futuros.

(Soa a campainha.)

    O SR. RICARDO LODI - Em relação à questão das pedaladas, a pergunta é pertinente porque não há, na jurisprudência do Tribunal de Contas da União, antes de outubro de 2015, essa analogia entre inadimplemento de obrigação ex lege e operação de crédito. Ao contrário, há decisões do Tribunal de Contas no sentido de que o inadimplemento das contas de suprimento não se confunde com operação de crédito.

    Aqueles que procuram caracterizar o crime de responsabilidade com as pedaladas alegam que não é possível aplicar a jurisprudência anterior do TCU por causa do montante e do tempo de atraso. Mas o montante e o tempo de atraso do inadimplemento não transmutam a natureza jurídica de uma obrigação ex lege numa obrigação contratual. Nunca uma obrigação ex lege, pelo seu inadimplemento...

(Interrupção do som.)

    O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski) - Senadora Vanessa, para a complementação.

    A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - E aí V. Sª terá mais três minutos, Dr. Lodi.

    Mas, então, para mim ficou muito claro. Eu espero que esteja claro para todos aqueles que estão acompanhando, com muita atenção, esse processo. Não há lei que estabeleça meta no âmbito orçamentário. Aliás, a meta é fiscal e é para o exercício de 2015. Assim diz a Constituição, assim diz a LDO, assim diz a Lei de Responsabilidade Fiscal, assim diz a Lei de Orçamento. Todas as leis, nenhuma delas fala dessa tal meta que tem que ser cumprida a cada dois meses, a cada quatro meses. O que existe são balanços e acompanhamentos, relatórios de acompanhamento.

    Mas aqui a gente ouviu muito, Dr. Lodi, dizer o seguinte: "Então, se não existe essa obrigatoriedade da meta, qual seria a finalidade da condição estabelecida no art. 4º da Lei Orçamentária, segundo o qual as alterações promovidas na programação orçamentária devem ser compatíveis com a obtenção da meta de superávit primário fixada para o exercício de 2015?" Porque eles param a meta do superávit primário, eles esquecem o exercício de 2015, apesar de estar escrito na Constituição, na Lei de Responsabilidade Fiscal, em tudo.

    Então, faço este questionamento: qual a finalidade, como é que se pode fazer esse controle, para que a meta, ao final do exercício, seja atingia.

    Pergunto-lhe também, mas já aqui com o relatório do Tribunal de Contas da União relativo ao exercício de 2009 na mão. O Senador Lindbergh, todas as vezes, repetia as conclusões desse relatório, porque dizem que isso nunca aconteceu, que nunca nenhum presidente assinou decreto de complementação orçamentária, assinou decreto de suplementação orçamentária sem antes ter mudado a meta.

(Soa a campainha.)

    A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - Olha o que diz o relatório do TCU: que o Poder Executivo encaminhou ao Congresso o PLN 15, de 2009, que propunha redução da meta para 1,4% do PIB. Tais parâmetros passaram a ser adotados nas reavaliações bimestrais, mesmo antes da aprovação do Congresso Nacional, o que veio a acontecer no dia 9/10/2009.

    Cadê a novidade do que a Presidente Dilma fez? Por que, então, não foi crime em 2009? E em 2001, que a meta foi mudada por medida provisória por Fernando Henrique Cardoso?

    Então, que o senhor fale se vale esse relatório, porque, se não tem lei, teria uma norma, como o senhor mesmo disse, e a norma que tinha era essa. E isso é capaz de dar legalidade, no entendimento do Tribunal, portanto, a tudo o que fez e assinou a Presidente Dilma?

    Obrigada.

    O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski) - O Sr. Ricardo Lodi com a palavra para a resposta.

    O SR. RICARDO LODI - Obrigado.

    Na verdade, parece-me que a decisão do Tribunal de Contas da União, de outubro de 2015, contraria esse precedente de 2009. Há uma virada jurisprudencial. E por quê? Muito se diz que essa decisão de 2009 não trata de créditos adicionais. Mas a nossa dúvida não é essa; a nossa dúvida é se os projetos de lei em tramitação no Congresso Nacional já devem constar dos relatórios bimestrais ou não. A questão é essa. O precedente é importante por isso.

    E o TCU entendeu, em 2009, que esses projetos podem constar dos relatórios bimestrais, desde que no último bimestre, no último relatório se adote a norma em vigor, a meta em vigor, já aprovado o projeto de lei ou não. Quer dizer, esse precedente é fundamental. E findo o ano, em 2009, o projeto foi aprovado, como o foi em 2015, e o TCU entendeu que não há mais questionamento a fazer.

    Portanto, houve uma alteração de 2009 para 2015, até porque nos relatórios bimestrais se faz uma projeção futura, se coloca nesses relatórios bimestrais todos os projetos de lei que o Governo, o Poder Executivo espera que sejam aprovados, não só de mudança de meta, mas de reajuste de servidor. Qualquer outra coisa relevante deve constar dessa provisão, dessa projeção bimestral, e não apenas a alteração de meta.

    Eu queria aproveitar esse minuto que eu tenho ainda para complementar a resposta anterior, que não deu tempo.

    Na verdade, quando se diz que a jurisprudência do TCU nas pedaladas anterior não vale...

(Soa a campainha.)

    O SR. RICARDO LODI - ... porque o montante atual é maior e o atraso foi maior, está-se querendo dizer o seguinte: que algo que surge como uma obrigação ex lege se transforma em operação de crédito pelo seu inadimplemento.

    Ora, esse é um fenômeno jurídico absolutamente impossível de acontecer. Uma obrigação ex lege não se transforma em operação de crédito por conta do montante e do tamanho desse atraso.

    Haverá sempre uma obrigação ex lege. Com juros ou sem juros, não importa. A existência de juros não dá a natureza jurídica de obrigação de crédito.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/08/2016 - Página 100