Discussão durante a 133ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Defesa da rejeição do processo de impeachment da Presidente Dilma Rousseff em razão do não cometimento de crime de responsabilidade.

Autor
Lídice da Mata (PSB - Partido Socialista Brasileiro/BA)
Nome completo: Lídice da Mata e Souza
Casa
Senado Federal
Tipo
Discussão
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Defesa da rejeição do processo de impeachment da Presidente Dilma Rousseff em razão do não cometimento de crime de responsabilidade.
Publicação
Publicação no DSF de 31/08/2016 - Página 51
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • DEFESA, REJEIÇÃO, PROCESSO, IMPEACHMENT, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, MOTIVO, LEGALIDADE, UTILIZAÇÃO, DECRETO FEDERAL, OBJETIVO, ABERTURA, CREDITO SUPLEMENTAR, AUSENCIA, AUTORIZAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, REGULARIDADE, OBTENÇÃO, EMPRESTIMO, ORIGEM, BANCO DO BRASIL, BENEFICIARIO, GOVERNO FEDERAL, DESTINAÇÃO, FINANCIAMENTO, PLANO, SAFRA.

    A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA. Para discutir. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, estamos nos aproximando de um momento de decisão. Findos os argumentos, encerrados os debates, quase nada de novo a ser dito. Chegou o momento de exercer o nosso voto.

    É hora de um diálogo definitivo com a história. Decidiremos, amanhã, se a Presidenta Dilma Vana Rousseff deve ser afastada definitivamente do cargo que ocupa, legitimamente, pelo voto de mais de 50 milhões de brasileiros e brasileiras.

    Com os nossos votos, decidiremos se iremos privá-la de seus direitos políticos por oito anos!

    Esses últimos dias foram extremamente valiosos para quem, como juízes que somos, se entregou de fato, honesta e integralmente, à busca da verdade.

    Depois deste momento, Senadora Gleisi, nenhum de nós será como dantes.

    Os depoimentos das testemunhas e dos informantes; a corajosa e brilhante defesa da Presidenta Dilma, diferentemente do que foi afirmado há pouco, que falou durante 15 horas, de improviso, respondendo a todos, embora incomode a muitos o sucesso de uma mulher, o talento de uma mulher; a argumentação da Acusação e da Defesa e as inúmeras manifestações dos Srs. e Srªs Senadoras compuseram um quadro completo, evidenciaram toda a trama política que nos trouxe até aqui.

    Muitos capítulos certamente ainda não se revelaram. Os bastidores ainda seguem, em muitos aspectos, nas sombras. Mas o tempo implacável certamente acabará por trazer tudo à luz do Sol.

    Ainda assim, aqui neste plenário, muitas coisas ficaram desnudadas, cristalinas, evidenciadas: o conluio entre técnicos do TCU para a construção de uma tese; o patrocínio do partido derrotado nas urnas para a acusação; a revanche política de um Presidente da Câmara dos Deputados, verdadeiro gângster político, Sr. Eduardo Cunha, que vislumbrou a oportunidade para alçar seu partido ao governo; o oportunismo político em seu momento de maior intensidade na nossa história; a traição de um Vice-Presidente que acintosamente conspirou e articulou para derrubar a Presidência; a deslealdade mais desassombrada de pessoas que exerceram cargos e usufruíram das benesses do poder e, subitamente, desembarcaram do governo de Dilma, para reembarcarem imediatamente pelas portas do fundo no governo interino; tudo isso abraçado pela grande mídia, para espanto da imprensa mundial, que age como um verdadeiro partido político.

    Srs. Senadores e Srªs Senadoras, em todo esse processo ficou demonstrado, de forma cristalina, que a Presidente Dilma Rousseff não cometeu nenhum crime de responsabilidade. E, aí, apela-se para o conjunto da obra, como já ouvimos tantas vezes. A ausência das provas sendo substituída pela retórica falaciosa.

    Impeachment, sem crime de responsabilidade comprovado, queiram ou não os defensores do afastamento da Presidenta Dilma, não tem outro nome: é golpe parlamentar. Um jogo de cartas marcadas. Farsa, como a que se viu no plenário do Senado, nessa fase final do julgamento do processo de Impeachment, quando os Senadores que apoiam o impedimento da Presidente Dilma simplesmente viraram as costas e taparam os ouvidos para os depoimentos das testemunhas de Defesa.

    O plenário semivazio, há poucas horas, num momento de apresentação da peça acusatória e da defesa, como se os votos, já acertados, não pudessem ouvir algo que os desviasse do caminho prometido. Farsa que começa a ser encenada logo após o resultado das eleições de 2014, quando os derrotados nas urnas questionaram as urnas eletrônicas e a legitimidade do processo eleitoral, tentando impugná-lo, sem sucesso, e depois apoiando a aprovação das chamadas pautas bombas, com o nítido objetivo de inviabilizar a governabilidade e, finalmente, construindo a frágil tese jurídica do crime de responsabilidade, numa repetição farsesca do roteiro arquitetado por Carlos Lacerda, em 1950, quando iniciou a sua campanha contra a candidatura de Getúlio e escreveu: não deve ser candidato à Presidência; candidato, não deve ser eleito; eleito, não deve tomar posse; empossado, devemos recorrer à revolução para impedi-lo de governar.

    O impeachment é apenas um instrumento para a consumação do golpe, para entregar o poder a partidos políticos e programas derrotados nas urnas, impondo a precarização das relações trabalhistas, o primado do negociado sobre o legislado, o congelamento dos gastos públicos por 20 anos, entre outros retrocessos, e àqueles que traíram a Presidência, depois de se locupletar durante anos das benesses do poder que dividiram e das políticas que ajudaram a aplicar e das quais não fazem nem mea-culpa. Tudo isso temperado com uma pitada de constitucionalidade, com a rigorosa observação dos ritos, dos prazos, das formalidades da lei, das regras do processo, tendo o Presidente do STF como Presidente do julgamento, como se tudo isso fosse cerejas de um bolo amargo e indigesto, para mascarar a imaterialidade das denúncias.

    Pouco importa se a Presidente Dilma cometeu ou não crime de responsabilidade - e ela não cometeu nenhum, como ficou cabalmente comprovado em todo esse processo: querem cassar o mandato de uma Presidente legitimamente eleita, pelo conjunto da obra, pela impopularidade momentânea, pela perda da maioria parlamentar, esquecendo-se de que, no regime presidencialista, quem cassa o mandato do governante pelo conjunto da obra é o povo, nas urnas.

    O impeachment, nas condições em que está sendo decidido, não resolverá a crise político-econômica do País; ele a aprofundará. É uma opção pelo confronto, pelo radicalismo, pela divisão do País.

    Em qualquer regime parlamentar, quando cai um gabinete, convocam-se novas eleições. Aqui não: transforma-se o Senado num colégio eleitoral. Sou contra isso, porque a democracia não é um acessório do processo político.

    Nas sociedades modernas, a república não basta: há de ser uma república democrática. Entendo a democracia num sentido mais amplo. Não é apenas a garantia das liberdades políticas, mas a garantia do acesso de todos ao bem comum, ao direito a uma vida melhor, à saúde, à educação e à dignidade humana. A democracia é substantiva e exige respeito à vontade soberana do povo. Exige a existência de dois lados e o respeito à decisão da maioria. Apesar de milhões que se manifestaram contra um lado - o lado da Presidente -, milhões mais um decidem que esta é a maioria e que, portanto, esta vontade soberana deve ser respeitada.

    Por isso, defendo o caminho da pacificação e da união nacional, a convocação de um plebiscito, para consultar o povo sobre a antecipação das eleições presidenciais. Ao contrário do que alardeiam as cassandras do golpe, o povo tem dado sinais de que essa é a sua vontade. Recente pesquisa de opinião pública revelou que 60% dos brasileiros apoiam a proposta de uma saída democrática e que sejam realizadas novas eleições antes de 2018.

    Hoje - repito, Sr. Presidente -, escreve-se mais uma página infeliz da nossa história. Lamento com tristeza...

(Soa a campainha.)

    A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA) - ... a postura de alguns Senadores que, apesar de saberem que Dilma não cometeu nenhum crime que justifique sua cassação, preferem rasgar suas biografias, virar as costas para o passado.

    Em respeito à minha história, à minha trajetória de vida e de lutas e aos meus compromissos com a defesa da democracia, da liberdade, dos direitos dos trabalhadores e dos menos favorecidos, que hoje estão seriamente ameaçados, digo "não" ao impedimento da Presidente da República; digo "não" ao golpe; digo "não" à farsa parlamentar que se tenta impor à Nação neste momento trágico.

    Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não há possibilidade de se negociar o conceito de democracia; ele já foi decidido como caminho pelo povo brasileiro. E nós haveremos de respeitá-lo, mantendo a Presidente eleita, que não cometeu crime e que tem...

(Interrupção do som.)

    A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA) - ... todas as condições de continuar a governar. (Fora do microfone.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 31/08/2016 - Página 51