Discussão durante a 133ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Defesa da rejeição do processo de impeachment da Presidente Dilma Rousseff em razão do não cometimento de crime de responsabilidade.

Autor
Vanessa Grazziotin (PCdoB - Partido Comunista do Brasil/AM)
Nome completo: Vanessa Grazziotin
Casa
Senado Federal
Tipo
Discussão
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Defesa da rejeição do processo de impeachment da Presidente Dilma Rousseff em razão do não cometimento de crime de responsabilidade.
Publicação
Publicação no DSF de 31/08/2016 - Página 59
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • DEFESA, REJEIÇÃO, PROCESSO, IMPEACHMENT, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, MOTIVO, LEGALIDADE, UTILIZAÇÃO, DECRETO FEDERAL, OBJETIVO, ABERTURA, CREDITO SUPLEMENTAR, AUSENCIA, AUTORIZAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, REGULARIDADE, OBTENÇÃO, EMPRESTIMO, ORIGEM, BANCO DO BRASIL, BENEFICIARIO, GOVERNO FEDERAL, DESTINAÇÃO, FINANCIAMENTO, PLANO, SAFRA.

    A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM. Para discutir. Sem revisão da oradora.) - Muito obrigada, Sr. Presidente, Srªs Senadoras, Srs. Senadores.

    Sr. Presidente, eu quero iniciar este meu pronunciamento neste momento tão difícil para o nosso País, para a nossa democracia, para a nossa gente, reafirmando o que me parece tão cristalinamente claro: que o julgamento da Presidenta da República por crime de responsabilidade é um erro; é um erro crasso, desses que nos cobrarão um preço alto e amargo, agora e por muitos anos ainda por vir, se não tivermos o discernimento e a coragem de rejeitar as acusações vazias e infundadas que fazem contra a Presidenta Dilma.

    Quero, em primeiro lugar e, portanto, Sr. Presidente, abordar simplesmente e tão somente os fatos.

    Pois bem: imaginemos todos nós que um cidadão seja acusado de um crime - não importa que crime. Imaginem que a denúncia contra esse cidadão seja apresentada por um seu reconhecido adversário. "É da ordem da vida", muitos dirão; "adversários acusam seus inimigos todos os dias em toda parte, com ou sem razão."

    Imaginem, porém, que essa denúncia, proposta por um adversário, seja acolhida, em uma primeira instância, por um desafeto confesso, vingativo, como foi o caso da Senhora Presidente Dilma.

    Mas como? Não deveria ter esse juiz se declarado impedido de examinar a denúncia contra um seu inimigo?

    Mas sigamos, porque a farsa apenas começou.

    Aceita a denúncia, procede-se ao julgamento da admissibilidade. E o juízo, formado por 513 Deputados e Deputadas, ofereceu ao País um verdadeiro espetáculo de horror, onde declararam publicamente que a Presidenta Dilma estava sendo julgada ali, admitindo-se uma denúncia, não pelo que estava no processo, mas pelo tal conjunto da obra.

    Diríamos: mas como? Como, em um julgamento, condenar um réu, qualquer que seja o réu, por crimes alheios à coisa julgada?

    Continuemos, porque a maldade é uma arte.

    Acolhida a denúncia, o processo avança para uma nova instância, onde se constitui uma comissão especial e, na comissão especial, elegem um relator do mesmo partido acusador, ou seja, que comunga das mesmas ideias, compartilha da mesma legenda, joga no mesmo time.

    Mais uma vez pergunto: como? Não é da ordem e do bom senso que a isenção, a neutralidade e a imparcialidade estariam novamente, e irremediavelmente, prejudicadas?

    Sigamos, porém, porque a tirania sempre encontra um pretexto.

    Pois bem, depois de formada a Perícia - e somente graças ao Supremo Tribunal Federal a Perícia chegou à conclusão de que não houve qualquer crime por parte da Presidenta Dilma -, não foi identificado nenhum ato comissivo do réu. Está escrito isso. Repito porque é importante que se repita: a Junta Pericial, constituída pela Comissão, afastou qualquer possibilidade de imputação de crime à ré, Presidenta Dilma Rousseff.

    A essa decisão somou-se ainda a decisão do Ministério Público Federal que, da mesma forma, disse: operacionalização do Plano Safra não é operação de crédito, portanto, não é crime.

    Chegamos assim, senhoras e senhores, ao epílogo desta história. Aqui falam que o rito seguiu todas as normas legais e que o direito de defesa foi amplamente garantido, entretanto, os fatos nos levam a repetir o que disse a Presidenta Dilma ontem daquela tribuna - abre aspas -: "Tem-se afirmado que este processo de impeachment seria legítimo porque os ritos e os prazos teriam sido respeitados. No entanto, para que seja feita a justiça e a democracia se imponha, a forma só não basta. É necessário que o conteúdo de uma sentença também seja justo. E, no caso, jamais haverá justiça na minha condenação."

    A história do Brasil, senhoras e senhores, nos oferece uma ferida ainda aberta desse engodo: o Golpe de 1964 foi inicialmente elaborado pela imprensa, celebrado pela imprensa, festejado por setores da classe média e pelos oposicionistas a João Goulart. Os tolos acreditavam que se tratava apenas de uma intervenção pontual. Os ingênuos acreditavam que era possível suspender a democracia por tempo determinado.

    Infelizmente, a semelhança aqui não é mera coincidência. Porque também chegamos ao epílogo deste excepcionalíssimo processo que pretende remover Dilma Rousseff da Presidência da República.

    Pode ser o epílogo de uma página só, se esta Casa decidir hoje que não! Que o Brasil não está disposto a se tornar o país em que os réus sejam julgados e condenados sem terem cometido um crime sequer. Que não, que o Brasil não é e não voltará a ser uma república de bananas! Que não, que o Brasil não será o troféu dos hipócritas, dos oportunistas e dos inescrupulosos. E é esta, senhoras e senhores, exatamente a questão que está em discussão hoje aqui.

    Deixemos a hipocrisia de lado, senhoras e senhores - repito: deixemos a hipocrisia de lado. Não há ninguém neste plenário que acredite que Dilma Rousseff esteja sendo julgada pelos crimes que lhe são atribuídos na peça acusatória encomendada, sob medida, pelo partido derrotado nas últimas eleições.

    O que está em discussão aqui é até que ponto estamos dispostos a fazer uso político do Tribunal de Contas da União, a rasgar a Constituição, a fraturar o Estado democrático de direito e a inovar a própria doutrina jurídica para fazer que seja feita a vossa vontade. O que está em discussão aqui é até que ponto estamos dispostos a instaurar um juízo de exceção para remover a Presidenta da República, que foi eleita democraticamente pelo povo brasileiro. O que está em discussão aqui é até que ponto os fins justificam os meios. É isso o que estamos discutindo. É essa a lição que estamos ensinando às futuras gerações. E são respostas que nós precisamos dar, precisamos responder: Quem somos nós? O que entendemos por justiça? Que espécie de democracia é o Brasil?

    Essas respostas, me assustam, senhoras e senhores.

    Porque há os que querem Dilma Rousseff fora do cargo, uma Presidenta que foi democraticamente eleita pelo simples cálculo político e pela perspectiva do poder. A estes eu não digo nada: sabemos todos o fim que lhes reserva a história.

    Há também os que querem Dilma Rousseff fora da Presidência simplesmente pela esperança - que todos esperamos que seja vã - de encerrar a investigação dos ilícitos da Lava Jato. A estes digo apenas que o futuro não é mais como era antigamente, que este País tem sede de justiça, e que esta sede de justiça não será aplacada por nenhum hiato constitucional.

    E há, por fim, os que já não se intimidam de dizer, sem nenhum constrangimento, que querem Dilma Rousseff fora da Presidência pelo "conjunto da obra". A esses eu pergunto: qual artigo? Qual a lei? Na Constituição, onde está o crime praticado pela Presidente Dilma? Não podemos, senhoras e senhores, transformar este Parlamento num colégio eleitoral e levar ao Palácio do Planalto quem não obteve um voto sequer da população brasileira.

    Se autorizarmos que o ódio, a raiva, o despeito, a misoginia, o preconceito vençam agora, como evitar que triunfem mais adiante, quando os julgados poderemos ser nós? Como exigir imparcialidade e isenção se não fomos nós mesmos capazes de praticá-las? Como reivindicar a justiça se não soubemos assegurá-la?

    Ora, Sr. Presidente, este é um momento muito triste da nossa história, é o momento talvez...

(Soa a campainha.)

    A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - ... mais triste que já vivi na minha vida. Quero dizer a vocês: eu voto "não" porque não estou num tribunal de exceção. Eu voto "não" porque sou contra golpe parlamentar; eu voto "não" à usurpação da soberania popular.

    Por fim, sabemos que aqui o que está acontecendo não é um impeachment, é uma disputa política daqueles que perderam as últimas quatro eleições e querem, a toda força e com todo peso, voltarem a aplicar o seu projeto neoliberal, projeto nocivo ao Brasil, projeto nocivo a todo povo brasileiro, à gente mais pobre principalmente.

    Vou andar pelas ruas de cabeça erguida. Não tem problema de perder os votos que tive, porque em breve serei reconhecida, porque fiquei do lado da justiça, fiquei do lado da verdade e fiquei do lado da democracia, da minha Amazônia e do meu Brasil.

    Obrigada, Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 31/08/2016 - Página 59