Discurso durante a 133ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Interrogatório da Presidente Dilma Rousseff sobre o cometimento de crime de responsabilidade.

Autor
Ana Amélia (PP - Progressistas/RS)
Nome completo: Ana Amélia de Lemos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Interrogatório da Presidente Dilma Rousseff sobre o cometimento de crime de responsabilidade.
Publicação
Publicação no DSF de 30/08/2016 - Página 17
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • INQUIRIÇÃO, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, MOTIVO, PROCESSO, IMPEACHMENT, CRIME DE RESPONSABILIDADE, REFERENCIA, UTILIZAÇÃO, DECRETO FEDERAL, OBJETIVO, ABERTURA, CREDITO SUPLEMENTAR, AUSENCIA, AUTORIZAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, OBTENÇÃO, EMPRESTIMO, ORIGEM, BANCO DO BRASIL, BENEFICIARIO, GOVERNO FEDERAL, DESTINAÇÃO, FINANCIAMENTO, PLANO, SAFRA.

    A SRª ANA AMÉLIA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Sr. Presidente, Ministro Ricardo Lewandowski, Sr. Senador Renan Calheiros, não é para mim nem confortável, nem regozijo, nem satisfação estar agora exercendo o papel de juíza, porque nós fomos eleitos para legislar e para fiscalizar o Poder Executivo, entre outras responsabilidades, mas não vou fugir a essa responsabilidade que me foi conferida pelos 3,4 milhões eleitores do meu querido Rio Grande do Sul, por mais dolorosa que seja.

    Este é o momento mais importante deste histórico julgamento político. A Defesa de Sua Excelência, ao participar de todo o processo, aceitou a legalidade do impeachment, e foi lhe assegurada também, em todos os momentos, ampla defesa. Todas as contestações foram respondidas tempestivamente pelo Supremo Tribunal Federal. Não se ignora também a generosidade do País e das instituições, com as garantias asseguradas na sua defesa - aliás, muito maiores que aquelas concedidas no impeachment de Fernando Collor, hoje aqui também juiz.

    A sua presença aqui legitima o julgamento e derruba a narrativa de Sua Excelência e do seu Partido quando insiste, como fez agora em seu pronunciamento, em fazer a referência a golpe. O verdadeiro golpe foi contra milhões de brasileiros desempregados e milhares de jovens que ficaram, entre outras coisas, sem o Prouni, sem o Fies.

    A sua presença aqui também é um tributo à Constituição, à nossa Constituição, à Suprema Corte do País, que definiu o rito deste julgamento e jamais compactuaria com o golpe. Se assim fosse, se assim fosse, este processo teria sido suspenso na sua origem. O juiz constitucional do impeachment é o Senado Federal. O vigor democrático de nosso País está no funcionamento pleno das nossas instituições, do Poder Judiciário, do Ministério Público, do Poder Executivo, deste Parlamento e, sobretudo, da imprensa livre e democrática.

    Com tantas pessoas importantes presas na Operação Lava Jata, os brasileiros agora acreditam, sim, que ninguém - ninguém - está acima da lei. Ninguém está acima da lei, nem mesmo Presidente da República.

    Não estamos aqui julgando a sua biografia, não estamos aqui julgando o seu passado, a sua história pessoal, que eu respeito. Estamos aqui, sim, julgando atos praticados por Sua Excelência no seu Governo. A fraude fiscal e os decretos sem autorização do Congresso tinham, direta ou indiretamente, suas digitais e com claros objetivos eleitorais em 2014.

    O crime de responsabilidade, detalhado minuciosamente no libelo acusatório elaborado pelos Profs. Janaina Paschoal, Miguel Reale Júnior e Hélio Bicudo, não deixa margem à dúvida. O crime existiu nos decretos com a sua assinatura e na fraude fiscal, chamada por todos de pedalada, autorizada por Sua Excelência. Lembro, aliás, declaração do seu ex-Ministro da Casa Civil Jaques Wagner, no dia 18 de dezembro de 2015 - abro aspas, citação textual:

    (Soa a campainha.)

    A SRª ANA AMÉLIA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - "Quem banca a política econômica não é o Ministro da Fazenda, quem banca a política econômica é a Presidente da República".

    Para simplificar para a compreensão das pessoas, poderia até lembrar aqui o caso de um síndico de um prédio, mas nem é preciso.

    Senhora Presidente afastada, os fatos arrolados no libelo acusatório tiveram consequências não apenas legais, mas, como disse antes, econômicas e sociais. O descontrole fiscal exposto nos vastos déficits orçamentários produziu uma profunda desconfiança na solvência da nossa dívida pública.

    Se um dos seus argumentos para justificar as pedaladas, ou melhor, a fraude fiscal na contabilidade criativa, foi a queda da arrecadação, também isso proíbe a lei em nosso País.

    Por que Sua Excelência autorizou as dívidas aos bancos oficiais? Essa é a minha questão.

    A SENHORA DILMA VANA ROUSSEFF - Cumprimento a Senadora Ana Amélia, Senadora representante pelo meu Estado do Rio Grande do Sul.

    Senadora, a minha responsabilidade pela política econômica existe no sentido macroeconômico da palavra. Sabe por quê, Senadora? Porque eu fui eleita por 54,5 milhões de votos diretos. É isso que, de fato, o Ministro Jaques Wagner atestou para a senhora.

    Quanto à questão da legitimidade do julgamento, eu acho que a gente tem de fazer uma distinção. Nós não podemos achar que a mesma análise que se faz para o golpe de Estado baseado na intervenção militar é a mesma análise que se faz para um golpe de Estado que toda a literatura política chama de golpe de Estado parlamentar.

    Em que consiste a diferença? Consiste no fato de que, no golpe militar, é como se você tivesse uma árvore, Senadora, e essa árvore fosse derrubada; você derruba o governo e você derruba o regime democrático. O que tem acontecido, no que eles chamam de golpe parlamentar, é o fato de que você tira um Presidente que foi eleito pelo voto direto por razões que estão fragilizadas pelo fato de que não há crime de responsabilidade que as sustenta. Assim sendo, Senadora, é como se essa árvore não fosse derrubada, ela fosse atacada por um forte e um intenso ataque, por exemplo, de fungos - usando a árvore como exemplo. Você não derruba a árvore; você compromete a árvore; você cria parasitas na árvore.

    Por que eu compareço ao Senado? Porque o Senado da República do meu País é um espaço democrático, que tem de ser preservado. E só há uma forma de preservar quando se trata de golpes parlamentares, que tornam as interpretações democráticas questionáveis: é abrir o diálogo, acreditar na discussão crítica, respeitar as diferentes posições, mas sistematicamente lutar neste espaço político e defender seus pontos de vista.

    Por quê? Porque eu quero que a democracia no meu País saia ilesa desse processo. E mesmo se, em todas as oportunidades, se considerar que houve um rito correto, o que eu estou - e disse no meu discurso - questionando é que não basta o rito correto; há que ter um conteúdo justo. Não basta a forma, Senadora. Acho que essa é uma consideração que tem a ver com o devido processo legal ao qual estou sendo submetida. Quando você compromete a democracia, há várias formas de comprometer.

    Eu me lembro, Senadora, que uma das coisas que existia, logo após a minha prisão em 1970, era dizer que no Brasil não tinha nem ditadura, nem presos políticos. Foi uma luta sistemática nossa para demonstrar que havia ditadura e presos políticos. Aqueles que não gostam que o nome seja golpe querem encobrir um fato: que além, quando você constrói um crime de responsabilidade sem base real, sem efeito substantivo, ou seja, sem base substantiva, o que se está fazendo é, na verdade, encobrindo uma tentativa de tirar um governo que chegou a esse momento pelas urnas por um Governo que não teve voto e que está implantando um programa que não foi eleito, que não foi o programa vencedor.

    Esse fato, Senadora, mostra clara e cabalmente que ninguém, durante a eleição, defendeu que haveria um contingenciamento ou que haveria eu acho que o contingenciamento que eu chamo de macroeconômico, de criar um limite de gasto por 20 anos.

    Ninguém defendeu isso, Senadora. Ninguém aprovou isso. E é este processo, que se constitui numa eleição indireta, que me levou a concordar que, para ampliar a democracia no País, só há um caminho: as eleições diretas e a escolha de governantes pelo voto direito.

    Eu não tenho um apreço egoísta pelo meu mandato. Eu defendo o meu mandato, Senadora, porque ele é intrínseco à democracia. Há que provar que tem crime. Se não se provar que tem crime, Senadora, é golpe sim!


Este texto não substitui o publicado no DSF de 30/08/2016 - Página 17