Discurso durante a 133ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Interrogatório da Presidente Dilma Rousseff sobre o cometimento de crime de responsabilidade.

Autor
Simone Tebet (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/MS)
Nome completo: Simone Nassar Tebet
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Interrogatório da Presidente Dilma Rousseff sobre o cometimento de crime de responsabilidade.
Publicação
Publicação no DSF de 30/08/2016 - Página 26
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • INQUIRIÇÃO, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, MOTIVO, PROCESSO, IMPEACHMENT, CRIME DE RESPONSABILIDADE, REFERENCIA, UTILIZAÇÃO, DECRETO FEDERAL, OBJETIVO, ABERTURA, CREDITO SUPLEMENTAR, AUSENCIA, AUTORIZAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, OBTENÇÃO, EMPRESTIMO, ORIGEM, BANCO DO BRASIL, BENEFICIARIO, GOVERNO FEDERAL, DESTINAÇÃO, FINANCIAMENTO, PLANO, SAFRA.

    A SRª SIMONE TEBET (PMDB - MS) - Obrigada, Sr. Presidente, Senhora Presidente.

    Durante esses meses na Comissão Especial de Impeachment, ouvindo as testemunhas, com o laudo pericial e documentos, eu constatei que esses atos, tanto os decretos quanto as pedaladas fiscais de Vossa Excelência, do exercício de 2015 - é disso que estamos tratando neste julgamento, crime de responsabilidade por esses atos no ano de 2015 -, não foram atos isolados. Na realidade, são consequência do descontrole da irresponsabilidade fiscal de seu Governo. E não começou agora, começou lá em 2009 e agravou-se em 2013. Desde lá, o governo abandonou a responsabilidade fiscal e começou a adotar manobras fiscais conhecidas como contabilidade criativa ou maquiagem fiscal para ocultar, esconder da sociedade e dos investidores reais a real situação financeira e das finanças públicas do País e a incapacidade do governo de Vossa Excelência de cumprir metas e cortar gastos.

    Sem cortes em 2013, a bola de neve já não podia ser mais contida com essa contabilidade criativa. Sem reconhecer erros anteriores, abro parênteses (gastou-se o que tinha o que não tinha em excesso e pegou emprestado com quem não podia, que são os bancos públicos) Vossa Excelência começa a pedalar. O ano de 2015, inicia-se com passivos oriundos de pedaladas fiscais com o Banco do Brasil, Caixa Econômica, Fundo de Garantia, BNDES, que alcançaram R$51 bilhões não contabilizadas pelo Banco Central. Só o fez depois de provocado pelo TCU.

    Apesar da queda das receitas, as despesas foram ampliadas. E, aí, na linha de raciocínio do Senador Anastasia - acho que Vossa Excelência poderia explicar um pouquinho melhor, que não ficou muito bem esclarecido - Vossa Excelência editou decreto de suplementação sem autorização desta Casa, descumprindo uma meta fiscal vigente, na época, de R$55,8 bilhões, trabalhou em cima de uma meta pendente de aprovação de R$5,8 bilhões, e, inclusive, alguns decretos empenhados.

    A conclusão a que chego: tantos decretos e pedaladas não foram meras operações contábeis ou isoladas; fizeram parte de uma estratégia fiscal destinada a inflar artificialmente o resultado primário e continuar gastando recursos de que não dispunha, e buscando recursos com quem não podia, os bancos públicos.

    O que quero dizer, Senhora Presidente, é que se vendeu ao Brasil um Brasil irreal, vendeu-se um Brasil irreal aos brasileiros. Os números não confiáveis levaram à perda da confiança do Governo e à retração de investimentos. Investidores pisaram o freio, parou-se de investir, PIB negativo por três anos consecutivos, recessão, desemprego recorde de mais de 12 milhões de brasileiros. Estamos, por isso, diante da maior crise econômica da história do País.

    Diante disso, faço os seguintes questionamentos a Vossa Excelência: se Vossa Excelência pudesse voltar no tempo, faria diferente alguma coisa em relação à sua política fiscal? Continuaria a perseguir uma meta fiscal fixada unilateralmente pelo Executivo, abrindo créditos suplementares incompatíveis com a meta vigente em desrespeito à separação dos Poderes? Ainda, obrigaria os bancos públicos a suportar, com recursos próprios, despesas primárias que são da União, atrasando o pagamento além do limite da lei, em alguns casos, por quase três anos, e, com isso, pagando juros? E, por fim, se Vossa Excelência porventura voltar à Presidência da República - efetivamente está agora, mas se for absolvida pelo Plenário...

    (Soa a campainha.)

    A SRª SIMONE TEBET (PMDB - MS) - ... do Senado Federal - o que V. Exª fará para recuperar o equilíbrio das contas públicas, cobrir o gigantesco rombo fiscal e reconquistar a confiança do povo brasileiro?

    Muito obrigada.

    A SENHORA DILMA VANA ROUSSEFF - Eu reitero, Senadora Simone Tebet, que a meta fiscal é aprovada pelo Congresso, Senadora. Não é uma ação unilateral do Executivo. A meta fiscal é uma interação entre o Executivo e o Legislativo. E as previsões legais, Senadora... há uma previsão na Constituição: é proibido abrir crédito suplementar sem autorização legislativa. Aí tem uma lei, Senadora, que a senhora votou e que a senhora autorizou, que está no art. 4º: o Executivo pode abrir créditos suplementares, desde que eles sejam compatíveis com a obtenção do resultado primário. Há uma terceira lei, Senadora, que transforma as despesas com créditos suplementares reféns do decreto de contingenciamento, ou seja, o decreto de contingenciamento reduz o efeito da abertura de créditos suplementares.

    Quero lhe dizer, Senadora, que é absolutamente regulado por lei. E a lei mais importante, a lei finalística nessa regulação é a Lei de Responsabilidade Fiscal. A Constituição autoriza, a LDO diz em que... A Constituição proíbe, só por lei. A LDO, que é uma lei que a senhora aprovou, diz em que condições você pode abrir e a LRF diz o seguinte: abra, agora essa abertura não produzirá efeitos para além daqueles que já estão vigentes, do decreto de contingenciamento.

    Então, não adianta abrir o decreto de crédito suplementar, porque ele não produz efeitos, a não ser que você descontingencie. E não há nenhuma prova de que nós descontingenciamos.

    Além disso, Senadora, no caso dos bancos públicos, é impossível essa visão. Vocês estão criminalizando a política fiscal. Por que eu vou falar que vocês estão criminalizando a política fiscal? Porque, Senadora, não foi o Brasil que passou por uma crise, Senadora. Esta crise...

    A senhora falou que nós começamos a maquiar desde 2009. Não, Senadora! Desde 2009, nós começamos a enfrentar a maior crise que houve no mundo, depois da de 29. O que foi feito... E 2009 é o Governo Lula. Eu não espero que a senhora queira me julgar por governos anteriores, mas eu vou defender o que foi feito no Governo Lula, porque eu concordo com o que foi feito.

    Em 2009, Senadora, diante da maior e mais grave crise que o mundo enfrentou, e nós ainda não saímos dela... Essa crise começa nos países desenvolvidos. É quebra do Lehman Brothers que abre a crise. Há crise também de todos os derivativos imobiliários, há um processo acelerado de contaminação internacional, cai de forma absolutamente acentuada o comércio internacional, afetando o mundo inteiro.

    O que faz o Governo Lula? O Governo Lula assume políticas anticíclicas, para impedir que o efeito principal da crise chegue a nós.

    Faz isso e, em 2010, temos uma significativa recuperação, mas a crise continua lá fora e continua forte. Eu lembro à senhora que, em 2011, 2012, 2013, há a crise o euro, Senadora, com o euro em via de quebrar. Ou seja, em via de quebrar não porque o Reino Unido saiu da União Europeia, mas em via de quebrar por quê? Porque os bancos europeus estavam completamente bichados. Por isto: uma desaceleração brutal na atividade econômica. Eu participei de pelo menos duas reuniões a esse respeito. Então, Senadora, nós não inventamos a crise, não. Ela vinha por aí.

    E o que acontece conosco? Acontece que nós evitamos a chegada dela. Nós seguramos o emprego. Nós seguramos que o emprego não se ampliasse na proporção em que estava ampliando nos países desenvolvidos. Ocorre, Senadora, que a crise nos atinge, e nos atinge de forma forte. Infelizmente, a partir de outubro de 2014, você tem fim do superciclo das commodities; você tem, além disso, a saída dos americanos da política de expansão de crédito três dias depois que acabou o segundo turno. Isso deu um estremecimento geral em todas as moedas do mundo. E elas despencaram. É isso que explica por que o câmbio explode. Depois disso, há a desaceleração da China, que é efeito e causa dessas coisas.

    Além disso, você tem a maior, uma das maiores crises energéticas do Brasil por falta de água. E se expressa em São Paulo, Senadora, pelo regime morto do Cantareira, que nós seguramos, porque não houve, ao contrário do passado, racionamento de energia. Houve o quê? Nós tivemos de colocar as térmicas para rodar.

    É bom lembrar que, para a gente fazer uma comparação, os reservatórios do País, o maior deles, tinha 42% de água em 31 de dezembro, aliás, em 1º de janeiro de 2014. Tinha 9% em 1º de janeiro de 2015 - 9%, Senadora -, ou seja, o Brasil passou essa crise hídrica com 9% no Sudeste, não era no Nordeste, era no Sudeste. É isso que explica o volume morto não só do Cantareira, mas o volume morto de Minas Gerais. Minas Gerais não entrou em colapso hídrico por um minuto. Nós não entramos porque tínhamos térmicas, e pagamos por isso.

    Então, Senadora, me desculpa, querer dizer que a crise fiscal do País é por conta de três decretos - três decretos! -, me perdoe, e operação de subsídio, e não de crédito do Banco do Brasil para os produtores, é inverter completamente a causalidade. Eu não sei em que mundo nós estaríamos se uma crise da proporção da que está acontecendo no Brasil fosse devida a isso. Não é devida a isso, Senadora, pelo contrário.

    Eu quero dizer para a senhora que o Fundo Monetário Internacional tem revisado as políticas de austeridade fiscal, porque há horas em que elas não dão certo. Sabe quando que elas não dão certo, Senadora? Quando há uma queda violenta da receita. E, aí, eles estão criando nova geração de regras fiscais.

    É só acessar o Fundo Monetário que a senhora verá que é impossível superar uma crise da proporção das que nós enfrentamos só cortando. Em 2016, nós mandamos ao Congresso uma flexibilização para que fosse possível manejar essa situação.

    Eu não estou dizendo que sou eu que estou adotando isso. Estou dizendo, nesta avaliação das dificuldades com políticas fundamentalistas de austeridade fiscal, o que elas produzem num país. Elas produzem o quê? Elas produzem a queda.

    Agora, a mim me espanta - a mim me espanta -, que, no caso dos produtores rurais, principalmente naqueles Estados dominantemente integrados e representados por produtores rurais, haja essa visão de criminalizar a política relacionada do Plano Safra. As consequências... Eu sou favor de pagar passivo, tanto é que, detectado o passivo, eu paguei - a vista, ali! Fichamos. Podíamos ficar discutindo parcelamento. Pagamos o passivo. Preferimos pagar o passivo. Falaram: "Ah, tem passivo?" E nós pagamos.

    Agora, eu quero dizer: continuem criminalizando o Plano Safra, e as consequências sobre ele e sobre os recursos disponíveis vão ocorrer. É impossível! Cria esse pavor no sistema de execução desse processo e vai ser uma dificuldade enorme executar um Plano Safra daqui para frente.

     


Este texto não substitui o publicado no DSF de 30/08/2016 - Página 26