Discurso durante a 133ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Interrogatório da Presidente Dilma Rousseff sobre o cometimento de crime de responsabilidade.

Autor
Aloysio Nunes Ferreira (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/SP)
Nome completo: Aloysio Nunes Ferreira Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Interrogatório da Presidente Dilma Rousseff sobre o cometimento de crime de responsabilidade.
Publicação
Publicação no DSF de 30/08/2016 - Página 28
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • INQUIRIÇÃO, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, MOTIVO, PROCESSO, IMPEACHMENT, CRIME DE RESPONSABILIDADE, REFERENCIA, UTILIZAÇÃO, DECRETO FEDERAL, OBJETIVO, ABERTURA, CREDITO SUPLEMENTAR, AUSENCIA, AUTORIZAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, OBTENÇÃO, EMPRESTIMO, ORIGEM, BANCO DO BRASIL, BENEFICIARIO, GOVERNO FEDERAL, DESTINAÇÃO, FINANCIAMENTO, PLANO, SAFRA.

    O SR. ALOYSIO NUNES FERREIRA (Bloco Social Democrata/PSDB - SP) - Sr. Presidente, Senhora Presidente, é um fato notório que o seu Governo omitiu o registro obrigatório no Banco Central de passivos vultosíssimos, que ultrapassaram R$50 bilhões. Isso é uma ilegalidade de tamanho tal que não poderia dispensar o consentimento de uma alta autoridade, que, no caso, é Vossa Excelência.

    Essas dívidas foram ocultadas dos olhos dos cidadãos e dos órgãos do controle para que o seu Governo continuasse gastando além dos limites recomendados pela prudência e fixados na lei.

    A senhora descumpriu, assim, um dever fundamental, que é o dever da transparência, que é o fundamento da confiança que deve reger as relações tanto nos contratos privados quanto no contrato político no exercício do seu mandato.

    Mais ainda: têm a sua assinatura os decretos que, quando foram emitidos, estavam em desconformidade com os limites da lei fixada pelo Congresso na época, e, com isso, a senhora usurpou competências do Congresso.

    Quero dizer também à senhora que, na minha opinião, a senhora, de caso pensado, cometeu os crimes de responsabilidade definidos na Lei nº 1.079.

    E a senhora se apresenta agora como vítima de um golpe.

    A nossa geração viveu na mocidade o golpe de 1964, e nós sabemos muito bem o que é isso. E nós trabalhamos para reconstituir as instituições democráticas do País, que hoje se apresentam pujantes e das quais todos nós nos orgulhamos. E, se, nas chamadas pedaladas, a senhora falseou contas públicas, omitindo no registro do Banco Central o volume de atrasos que se verificavam, a senhora agora falseia a história sobre a natureza do processo que estamos vivendo.

    Este processo, Senhora Presidente, destina-se justamente a fazer cumprir a Constituição, a assegurar a soberania da lei, e não ao contrário. E a atuação do Supremo Tribunal Federal, em todas as suas etapas, desde a Câmara dos Deputados, reforçou a obediência às normas do devido processo legal. E o País, hoje, Senhora Presidente, vive um clima de paz e de normalidade. Ninguém prega a violência como método para a resolução da crise política. Todos que quiseram se manifestar pacificamente o fizeram. A própria imprensa, que muitos qualificam aqui de golpista, registra os fatos e repercute todas as opiniões, sem reservas. E o Vice-Presidente, que foi eleito diretamente na sua chapa, exerce o papel que lhe é atribuído pela Constituição, que a senhora jurou obedecer.

    A agenda do impeachment já vai ficando para trás, e os partidos políticos, todos eles, já se preparam para as eleições municipais e para as eleições que virão em 2018, que haverão de transcorrer em normalidade e com o País já saindo da crise.

    Portanto, eu indago: como golpe? Golpe com a supervisão do Supremo Tribunal Federal? Golpe quando a senhora vem exercendo todo o seu direito de defesa, em todas as instâncias, não apenas aqui, no Congresso, através do seu ilustre Advogado, mas também perante a opinião pública, mobilizando apoios?

    A senhora sabe que o Supremo Tribunal Federal é o órgão a que compete, em última instância, a guarda da Constituição. E a senhora sabe também...

    (Soa a campainha.)

    O SR. ALOYSIO NUNES FERREIRA (Bloco Social Democrata/PSDB - SP) - ... sabe também que cabe ao Ministério Público a incumbência da defesa da ordem jurídica como um todo, e não apenas das formas jurídicas. A senhora está perante o seu juiz natural: é o Senado reunido como órgão judiciário.

    E eu pergunto à senhora: por que, sabendo disso tudo, a senhora não atalhou esse processo recorrendo ao Supremo Tribunal ou ao Ministério Público Federal? João Goulart não tinha a quem recorrer; a senhora tem: instituições democráticas. No entanto, a senhora preferiu recorrer a uma organização internacional.

    Este processo vai, sim, Senhora Presidente, gerar precedente sério daqui para frente. Se a senhora perder o seu mandato, nenhum governante haverá de abusar das suas competências e afrontar as regras essenciais que garantem a saúde financeira do Estado.

    A minha pergunta é: por que não recorreu até agora a quem pudesse socorrê-la nesse processo...

    (Interrupção do som.)

    O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski) - V. Exª termine a frase.

    (Soa a campainha.)

    O SR. ALOYSIO NUNES FERREIRA (Bloco Social Democrata/PSDB - SP) - ... que a senhora insiste em qualificar como golpe?

    A SENHORA DILMA VANA ROUSSEFF - Sr. Senador Aloysio Nunes, eu quero dizer para o senhor uma frase muito simples: eu estou recorrendo àquilo que a Constituição prevê. Porque essa história de querer que eu transfira para outrem a responsabilidade que é do Senado... Por que não recorri? Porque a responsabilidade constitucional, Senador, está aqui. São os Srs. Senadores que têm, pela Constituição, o poder de me julgar.

    O que eu estou dizendo, Senador, é que, se me julgarem sem crime de responsabilidade, é golpe. Eu não estou dizendo que é golpe agora. A hora que julgarem e condenarem uma Presidente inocente, sem crime de responsabilidade, é um rotundo golpe; é um golpe integral. Eu não recorro ao Supremo Tribunal Federal agora, porque não esgotei essa instância, não acabei de tratar o problema aqui.

    A que é que eu recorreria ao Supremo? Ora, os Srs. Senadores e as Srªs Senadoras não votaram. Eu vim aqui, Senador, porque eu respeito essa instituição e acho que, se ela der esse passo, ela estará compactuando com o golpe. Ela não está compactuando com o golpe hoje. Não houve julgamento! Agora, no momento em que ela proferir uma sentença que não tenha por base um crime de responsabilidade provado... E não é uma questão política, porque a questão política, o conjunto da obra, a gente resolve nas urnas; a gente resolve disputa nas urnas. O que a gente resolve aqui é se há ou não crime de responsabilidade.

    Crime de responsabilidade é uma exigência da Constituição. A Constituição estabelece que você pode ter o impeachment da Presidente. Está certo. Mas em que condições? Havendo crime de responsabilidade. Porque, caso contrário, instaura-se o discricionário, instaura-se o "Deus nos acuda".

    Então, este processo é fundamentalmente um processo que passa pelos Srs. Senadores e pelas Srªs Senadoras. Eu disse na minha fala: eu respeito os meus julgadores, porque eles chegaram aqui com os mesmos votos que eu obtive nas urnas. Estou aqui, ao respeitá-los, argumentando. Argumentando como? Argumentando, dizendo: Srs. Senadores, por favor, não cometam o crime de condenar uma inocente. É isso que eu estou dizendo.

    Estou dizendo que, além disso, é fundamental que a gente perceba que nós vivemos numa etapa diferente, fim da Guerra Fria... Imensas características transformaram ou quase inviabilizaram, aqui na América Latina, o golpe militar. E não sou eu que estou inventando; há uma profusa literatura a respeito do chamado golpe parlamentar, como é que ele se dá, o que acontece quando você não tem um presidente culpado de um crime de responsabilidade. Quando você não tem esse presidente culpado, o que você cria é um golpe militar... Perdão, um golpe parlamentar - não militar.

    Por isso é que eu fiz aquela imagem, para ficar claro: a árvore da democracia, numa situação, você corta com um machado; na outra, se você não respeitar as regras constitucionais, é como se você colocasse nessa árvore um parasita. Por quê? A partir do momento em que isso é possível, tudo passa a ser possível. Quando qualquer sistema político aceita condenar um inocente, nós sabemos, a história mostra - e não só mostra aqui, mostra em várias circunstâncias - o que acontece: você cria um nível de exceção que terá consequências políticas.

    Então, é nesse sentido que eu falo. Eu não estou aqui dizendo que, hoje, há um golpe de Estado. Eu estou dizendo o seguinte: condenem-me que esse golpe é irreversível, condenem-me e ele é irreversível.

    E, aí, uma das mais importantes instituições deste País, que é o Senado da República, terá cometido um crime contra uma pessoa inocente. E é isso que nós não podemos admitir; é isso que está em questão; é isso que eu acredito ser a peça central deste processo.

    E, aí, desculpem-me, mas há elementos um tanto quanto desproporcionais, em querer condenar uma Presidenta por três decretos de crédito suplementar, previstos, sim, na legislação, previstos na Constituição, previstos na LOA, regulados pela Lei de Responsabilidade Fiscal.

    Acho que esta discussão a respeito da meta orçamentária ameaça profundamente a Lei de Responsabilidade Fiscal. É pela Lei de Responsabilidade Fiscal que se controla o gasto do Governo Federal, da União. Nós controlamos o gasto utilizando o decreto de contingenciamento. Antes era só no decreto; chegamos a colocar na lei de 14 e a repetir na de 15, que nenhum decreto de crédito suplementar - e vocês aprovaram - pode ultrapassar ou estar acima do decreto de contingenciamento.

    Está escrito na lei.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 30/08/2016 - Página 28