Pronunciamento de José Aníbal em 25/08/2016
Discurso durante a 133ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal
Interrogatório da Presidente Dilma Rousseff sobre o cometimento de crime de responsabilidade.
- Autor
- José Aníbal (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/SP)
- Nome completo: José Aníbal Peres de Pontes
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
GOVERNO FEDERAL:
- Interrogatório da Presidente Dilma Rousseff sobre o cometimento de crime de responsabilidade.
- Publicação
- Publicação no DSF de 30/08/2016 - Página 61
- Assunto
- Outros > GOVERNO FEDERAL
- Indexação
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- INQUIRIÇÃO, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, MOTIVO, PROCESSO, IMPEACHMENT, CRIME DE RESPONSABILIDADE, REFERENCIA, UTILIZAÇÃO, DECRETO FEDERAL, OBJETIVO, ABERTURA, CREDITO SUPLEMENTAR, AUSENCIA, AUTORIZAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, OBTENÇÃO, EMPRESTIMO, ORIGEM, BANCO DO BRASIL, BENEFICIARIO, GOVERNO FEDERAL, DESTINAÇÃO, FINANCIAMENTO, PLANO, SAFRA.
O SR. JOSÉ ANÍBAL (Bloco Social Democrata/PSDB - SP) - Sr. Presidente Lewandowski, Senador Renan Calheiros, Senhora Dilma Rousseff.
Nos conhecemos há 50 anos. Terminada a adolescência, tínhamos iniciado a nossa militância política em Belo Horizonte, no movimento estudantil de resistência à ditadura. Queríamos mudar o Brasil. Também iniciamos uma amizade que espero perdure no apreço recíproco.
A senhora sabe: eu torci por você como Presidente do Brasil até meados de 2012, quando publicou a famigerada Medida Provisória nº 579, que artificialmente desorganizou o setor elétrico e o fez mergulhar em uma crise que perdura. Por sua determinação, nenhuma das 400 emendas apresentadas à MP foi considerada.
Afinal, movida por uma postura autocrática, a senhora tinha um claro propósito político- eleitoral. Então, constatei que sua motivação impulsiva em reduzir a conta de luz na marra resultaria em dar com mão pequena o que, logo a seguir, seria retirado com mão grande. Com efeito, como gostava de dizer Celso Furtado - estudamos juntos -, pouco depois todas as famílias brasileiras pagaram em média cinco vezes mais o equivalente ao desconto que receberam.
Não estou aqui para julgar a senhora - seria penoso para mim -, mas vou julgar suas pedaladas, seus decretos, seus crimes de responsabilidade e o conjunto de sua obra que tanto sofrimento impõe ao povo do Brasil.
Presidente, seu governo já não existe mais. Em horas, já não existirá mais a sua Presidência. Nós não faremos aqui mais do que determina a Constituição e o que é o anseio da imensa maioria dos brasileiros, mobilizados aos milhões pelo desejo intenso de mudanças.
Afinal, o legado que a senhora nos deixa nos está levando a um retrocesso devastador, a começar pelos programas sociais, praticamente inviabilizados por sua gestão no período final, mas que serão mantidos pela determinação do novo Governo e pelo voto responsável e comprometido com as mudanças do Congresso Nacional para acertar as contas públicas, duramente depredadas nos últimos anos.
É a condição para a recuperação do emprego. Será crucial para que os brasileiros que vivem do seu trabalho também possam recuperar suas contas. Pesquisa da semana passada indica que 30% das famílias que vivem de aluguel estão com atraso de pagamento. Desgraçadamente, é o que têm que fazer para garantir a compra de comida e a conta de luz.
Presidente, a senhora se tornou uma especialista - e nós vimos aqui, ao longo do dia, hoje - em terceirizar suas responsabilidades. O BC americano é o culpado pela desvalorização do Real; a crise internacional é culpada pela queda do PIB - no entanto, a economia brasileira, nos últimos três anos, cresceu 2,72% menos do que as demais economias, em média, da América Latina -; os técnicos do Planejamento são os culpados pelos decretos; o Banco Central é o culpado pelo não reconhecimento das pedaladas; Eduardo Cunha é o culpado...
(Soa a campainha.)
O SR. JOSÉ ANÍBAL (Bloco Social Democrata/PSDB - SP) - ... pelo desastre fiscal.
O fato é, Presidente, que as empresas do Brasil, estatais, os bancos públicos, os fundos de pensão para os quais, no caso dos Correios, funcionários, 100 mil ativos e inativos ou mais, vão ter que contribuir com mais 17%, durante 23 anos, para recuperar o rombo deixado por sua gestão. E não é diferente dos outros.
A senhora sabe que não tem a mais mínima condição de continuar a governar. Durante essas longas horas aqui, hoje, a senhora não teve a humildade de reconhecer qualquer dos seus graves erros, seja como Presidente do Conselho da Petrobras, Pasadena, seja em todos os outros episódios desastrosos e, finalmente, na devastação das contas públicas.
Não resta...
(Interrupção do som.)
O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski) - Alguns segundos para complementar, por gentileza.
(Soa a campainha.)
O SR. JOSÉ ANÍBAL (Bloco Social Democrata/PSDB - SP) - ... a nós outra alternativa, senão puni-los, em obediência à Constituição e às leis.
A SENHORA DILMA VANA ROUSSEFF - Sr. Senador José Aníbal, a quem eu conheço há 50 anos. Sei perfeitamente a forma pela qual o senhor se conduz. Espero que o senhor tenha, em relação a esse processo, uma posição de imparcialidade e que o senhor não me condene antes da hora.
Acho que é... O senhor me desculpe, mas acho que é uma falha profunda no devido processo legal, e eu nunca soube que isto era possível, que um julgador, na hora em que uma testemunha está depondo, externe o seu julgamento. Lamento, Senador José Aníbal, que o senhor não cumpra os mínimos princípios do devido processo legal, que me assegura amplo direito de defesa, e fico estarrecida por isso partir do senhor, que me conhece há muitos anos.
Além disso, Sr. Senador, eu queria dizer ao senhor que, se o senhor me julga pelo que aconteceu em 2012 no caso do setor elétrico, ou o senhor desconhece o que havia naquele momento no setor elétrico, ou o senhor tem uma interpretação da lei diferente da que eu tenho. Por quê, Senador? Porque aquela mudança não se deve a uma tentativa de reduzir eleitoralmente, para efeitos eleitorais, a tarifa de energia elétrica em 2012 para efeitos em 2014. Ela se deve a uma coisa, Senador, que este País tem de passar a respeitar. A gente tem de respeitar contrato. Para respeitar contrato... A gente respeita contrato quando beneficia o concessionário e a gente respeita contrato, Senador, quando beneficia o usuário, quando beneficia a população. Naquele momento, Senador, os contratos que foram diminuídos foram aqueles que estavam vencidos. Por quê? Porque os contratos, no setor elétrico, duram de 30 a 35 anos e podem ser renovados. Ao completar-se a renovação, o que ocorreu foi, pura e simplesmente, que, a partir daí, não fazia sentido continuar pagando a amortização que já tinha sido paga pela população brasileira. É papel do Estado defender aqueles mais frágeis, e foi isto que nós fizemos. Pela primeira vez neste País, nós utilizamos o contrato em benefício da população. Ele estava vencido. Não havia por que continuar pagando e dando lucro a quem não devia ter lucro. Naquele momento, deveria se passar à população, pela lei contratual, expressa e clara nos contratos, esses ganhos. Sinto muito se foi por isto que o senhor teve essa posição e essa conduta.
Além disso, Senador, é importante sinalizar que não se pode tratar aqui de inocentar o Sr. Eduardo Cunha. Ele não é inocente neste processo de impeachment! Não, Senador! Este processo de impeachment tem um desvio inicial, o chamado pecado original, reconhecido, inclusive, por um dos meus acusadores: a chantagem explícita.
Então, Senador, não pretendo transferir as minhas responsabilidades, mas peço ao senhor que também não transfira as suas, como já tentaram transferir aqui para os movimentos de rua. Eu já disse que os movimentos de rua apoiavam o Sr. Eduardo Cunha. E, se há fraude nessa história, Senador, é que a defesa do combate à corrupção era feita neste momento. Não, Senador, não foi isto que nós vimos! Nós vimos o oposto.
Ademais, Senador, as quedas... Eu não posso deixar de reiterar o fato de que nós vivemos uma conjuntura de declínio da atividade econômica no mundo.
Eu não estou dizendo que todas as coisas que aconteceram no Brasil derivam-se disso. Os reajustes na tarifa de energia derivam da mais grave falta de água, sendo bem simples para aqueles que me escutam entenderem. A última vez, antes disso, que tinha havido uma crise dessa proporção, Senador, sabe o que aconteceu? O maior racionamento da história deste País.
Diante da queda brutal do nível de águas, que, no seu Estado, resultou no chamado volume morto, abaixo do volume morto, no setor elétrico, nós utilizamos o mecanismo que a lei aprovou, que é ligar as térmicas, porque esse sistema hoje, no Brasil, é hidrotérmico, e as térmicas, Senador, custam caro porque o senhor paga o combustível. Com as hidrelétricas, o senhor não paga a água; o senhor não paga o combustível. Só paga o combustível - água, neste caso, entre aspas - quando há uma brutal escassez de energia.
E aí, Senador, a queda para 9% do maior reservatório do País - que é não Itaipu, é Furnas -, no passado, criava todas as consequências adversas e perversas do racionamento. Hoje, o que criaram? Criaram o aumento da tarifa de energia. Agora, Senador, durante o nosso período, em 2016, como os reservatórios foram recuperados para 52%, em média, no Sudeste, o que acontece, Senador? Nós pudemos tirar as bandeiras que aumentavam a tarifa de energia. Novamente, pelo que eu tenho lido na imprensa, o Governo interino está pretendendo retomá-las. Por quê, Senador? Por alguma maldade do Governo interino? Não - aí eu vou ser justa -, porque começou a faltar água no Nordeste de forma muito preocupante; muito preocupante.
E aqui eu gostaria de dizer ao senhor que não é possível ter dois pesos e duas medidas. Atribuir - e é o que está em julgamento - a três decretos e ao Plano Safra, que tem por base subsídio à agricultura, é, de fato, desproporcional a qualquer análise econômica séria, mas é o instrumento político escolhido por aqueles que, de fato, têm outros objetivos políticos: condenar-me antecipadamente, como o senhor fez, mostrando claramente que a história do rito não basta, Senador. É preciso que o rito formal seja seguido, mas é necessário, imprescindível, que o conteúdo também seja objeto da maior consideração, e lamento que o senhor não tenha sido.