Discurso durante a 133ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Interrogatório da Presidente Dilma Rousseff sobre o cometimento de crime de responsabilidade.

Autor
Regina Sousa (PT - Partido dos Trabalhadores/PI)
Nome completo: Maria Regina Sousa
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Interrogatório da Presidente Dilma Rousseff sobre o cometimento de crime de responsabilidade.
Publicação
Publicação no DSF de 30/08/2016 - Página 72
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • INQUIRIÇÃO, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, MOTIVO, PROCESSO, IMPEACHMENT, CRIME DE RESPONSABILIDADE, REFERENCIA, UTILIZAÇÃO, DECRETO FEDERAL, OBJETIVO, ABERTURA, CREDITO SUPLEMENTAR, AUSENCIA, AUTORIZAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, OBTENÇÃO, EMPRESTIMO, ORIGEM, BANCO DO BRASIL, BENEFICIARIO, GOVERNO FEDERAL, DESTINAÇÃO, FINANCIAMENTO, PLANO, SAFRA.

    A SRª REGINA SOUSA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Sr. Presidente, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, minha Presidenta, não posso e não quero tratá-la como ré. Aqui a Senhora é vítima. Vítima de uma trama engendrada a várias mãos: mãos do TCU, através de um procurador e um auditor fiscal, que confessaram juntos produzir a peça que serviu de fundamentação à tese da Acusação.

    A Senhora é vítima dos maus perdedores, que, impacientes, não conseguem esperar o outro jogo começar para entrar na disputa. Encomendaram e pagaram pareceres que encontrassem atalhos que os levariam ao Planalto, ainda que em papel de coadjuvantes.

    A Senhora é vítima deste Congresso, que lhe deixou quatro meses sem Lei Orçamentária - a Lei Orçamentária é de 20 de abril -, impôs pautas bombas, devolveu medidas provisórias, não aprovou o ajuste que a senhora propôs e engavetou por cinco meses o PLN que daria ao Governo nova meta fiscal diante da frustração de receitas.

    A Senhora é vítima de Eduardo Cunha por não ceder às chantagens. Aliás, a senhora está sendo julgada pelo que não fez, não cedeu; se tivesse cedido não estaria aqui. E Cunha vai ser premiado com o mandato pelo papel que desempenhou na farsa.

    A Senhora é vítima de uma parcela da mídia, da grande mídia, que inflava notícias negativas contra a senhora. A Rede Globo, por exemplo, parava novela e Jornal Nacional para transmitir ao vivo manifestações contra a senhora. Hoje a Globo está fazendo flashes, tinha coisa mais importante a fazer. Por exemplo, hoje à tarde estavam ensinando como se fazer um ovo cozido. A senhora é vítima da falsidade de seus aliados, que governaram com a senhora, gozavam de sua confiança, disputavam lugar nas fotografias e lhe beijavam a mão quase com devoção. Alguns serão seus algozes aqui; outros estão instalados confortavelmente nos Ministérios de interinos. Eu gostaria de ouvir o que a senhora diria a eles.

    Minha Presidenta, o recado que eles estão dando nesse processo é também para todas as mulheres que lutam, é o recado do machismo, do patriarcado, do colonialismo ainda arraigado nas mentes deste País. O que estão dizendo é o mesmo recado que deram ao longo da história a todas as mulheres que ousam, as quais sintetizo em Margarida Alves, nordestina, uma trabalhadora rural morta covardemente pelas balas do latifúndio. Com o seu impedimento, eles nos dizem: mulher não pode, precisa de permissão ou aí não é o seu lugar.

    A senhora, minha Presidente, é a antissinfonia do concerto da orquestra oficial. A senhora desafinou, Presidenta, quando ousou ser eleita Presidente da República sendo mulher, de esquerda, militante contra a ditadura e sem marido para posar a seu lado na fotografia, ainda que não belo, recatado e do lar. A senhora não cabe no modelito desenhado pela elite conservadora deste País.

    A pergunta que lhe faço é: a participação de alguns setores de algumas instituições nesse processo se deu de forma tortuosa e parcial, como é o caso do procurador de contas e do auditor fiscal do TCU, e do Ministério Público, que a impediu de nomear Ministros no seu Governo. Eu gostaria que a Senhora me dissesse se isso não compromete um pouco a credibilidade dessas instituições, para ficar nessas, porque outras também fizeram muita seletividade.

    Para finalizar, Senhora Presidenta, seja qual for o resultado amanhã, a gente segue em frente. Continue com essa firmeza que incomoda. Muitos queriam vê-la aqui cabisbaixa e você está aí altiva, segura, esperançosa.

    Nada é impossível, Presidenta...

    (Soa a campainha.)

    A SRª REGINA SOUSA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - ... aliás, já foi dito que a palavra impossível foi inventada por alguém que desistiu.

    Você, eu sei, não desiste nunca, porque você é Dilma coração valente.

    A SENHORA DILMA VANA ROUSSEFF - Senadora Regina, eu agradeço do fundo do coração suas palavras.

    Tem sempre - mas eu não acho que essa seja a razão, a razão única ou só essa a razão - um componente de misoginia e de preconceito contra as mulheres nas ações que ocorreram contra mim.

    Eu fui descrita, Senadora, como uma mulher dura e sempre disse que era uma mulher dura no meio de milhões de homens meiguíssimos. Eu nunca ouvi, Senadora, ninguém acusar um homem de ser duro, e a gente sabe que eles são. Muitas vezes, Senadora, disseram para mim: "mas você é sensível". Esta afirmação, Senadora, é estarrecedora, porque significa que conseguiram construir em torno de mim um nível de desumanização muito alto. Dizem também, Senadora, em alguns momentos, que eu estaria tão traumatizada com este processo que tomava remédios. Eu não tomo remédios. Eu não fico traumatizada com esse processo. A minha vida me ensinou e é por isso que eu sou a mesma mulher que resistiu à ditadura, porque eu aprendi ao longo da vida que nós não temos outra hipótese, a não ser entender que o que fala João Guimarães Rosa, dizendo que a vida requer da gente é coragem, talvez seja a maior verdade para a vida pessoal e política.

    Então, Senadora, eu quero dizer que houve esse componente, sim, em relação a mim. Há esse componente em relação a mim, mas, como eu reconheci no meu discurso, ao longo desse período, eu tive, por parte das mulheres do meu País, as Srªs Senadoras aqui presentes, as Deputadas, mas também pelas mulheres anônimas que eu encontrei ao longo desta trajetória, um grande apoio. Eu disse que elas me cobriram de flores porque é literal, Senadora. Não sei se a senhora lembra quando proibiram que o Palácio da Alvorada tivesse flores. Eu nunca mais deixei de receber flores no Palácio da Alvorada. Recebi tantas flores, tanto aquelas belíssimas e individuais que cada uma me dava e que formavam buquês, como propriamente vasos, vasinhos de todas as espécies de flores, me cobriram de flores e me protegeram com a solidariedade.

    Então, Senadora, eu tenho imensa gratidão pelas mulheres, bravas mulheres brasileiras do meu País.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 30/08/2016 - Página 72