Discurso durante a 133ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Interrogatório da Presidente Dilma Rousseff sobre o cometimento de crime de responsabilidade.

Autor
José Agripino (DEM - Democratas/RN)
Nome completo: José Agripino Maia
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Interrogatório da Presidente Dilma Rousseff sobre o cometimento de crime de responsabilidade.
Publicação
Publicação no DSF de 30/08/2016 - Página 84
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • INQUIRIÇÃO, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, MOTIVO, PROCESSO, IMPEACHMENT, CRIME DE RESPONSABILIDADE, REFERENCIA, UTILIZAÇÃO, DECRETO FEDERAL, OBJETIVO, ABERTURA, CREDITO SUPLEMENTAR, AUSENCIA, AUTORIZAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, OBTENÇÃO, EMPRESTIMO, ORIGEM, BANCO DO BRASIL, BENEFICIARIO, GOVERNO FEDERAL, DESTINAÇÃO, FINANCIAMENTO, PLANO, SAFRA.

    O SR. JOSÉ AGRIPINO (Bloco Social Democrata/DEM - RN) - Sr. Presidente, eu me refugiei nesse cantinho aqui porque o barulho estava ensurdecedor e eu tive que me refugiar aqui para poder ser ouvido.

    Eu quero cumprimentar o Presidente Lewandowski, cumprimentar a Presidente Dilma Rousseff, cumprimentar as Srªs e Srs. Senadores, e, de forma objetiva e clara, Presidente Dilma, eu queria ir direito ao assunto.

    Nós estamos aqui há horas conversando sobre pedaladas fiscais, edição de decretos, conversando sobre a legalidade e a ilegalidade desses fatos. Ocorre que esses fatos têm que se circunstanciar em uma sequência de fatos e dentro de determinadas circunstâncias. Você não usa pedalada se você não estiver sem dinheiro. É um remédio para a falta de recursos, tanto é que, nos governos do PT, que foram quatro, alguns são observados do ponto de vista da prática de pedaladas, outros não, porque houve momentos de bonança e houve momentos de escassez de recursos. As pedaladas, portanto, foram o remédio usado para a escassez de recursos, o uso de bancos públicos como elementos antecipadores de recursos que a União não tinha para que prioridades de Governo não parassem. Como aqui foi dito, subsídios, para, por exemplo, Plano Safra, Minha Casa, Minha Vida e tantos outros programas de Governo.

    Muito bem. Resta saber se o remédio usado - a pedalada - era, como alternativa, o melhor e o legal e se houve, dentro da crise de falta de recursos, alertas para o que poderia estar por vir. E aí é quando eu quero me valer de alertas que ocorreram, por exemplo, em julho de 2013, quando técnicos do Tesouro Nacional elaboraram um diagnóstico de 97 páginas sobre a situação fiscal e econômica do País, concluindo - aqui estão os relatórios - que, ao final de 2015, o Tesouro Nacional estaria com um passivo de 41 bilhões na conta do subsídio em atraso por ter conseguido mais subsídios do que podia - não tinha orçamento para fazê-lo. O prazo para um possível downgrade seria de dois anos, ou seja, era um sinal amarelo aceso. Isso é um documento da Secretaria do Tesouro Nacional. A contínua exposição fiscal, na ausência de correções, afeta a credibilidade da política econômica. Tudo isso consta de um relatório da Secretaria do Tesouro Nacional. Mais: em janeiro de 2014, um documento da Coordenação-Geral de Operações de Crédito do Tesouro Nacional fala a coisa que mais me preocupa.

    No item 1.4:

Não obstante as considerações para manutenção das metas fiscais estabelecidas, entendemos importante apresentar os valores do passivo existentes na Copec e o cenário preocupante de contínua elevação desse passivo junto às instituições financeiras tanto no ano em curso como nos dois próximos, perspectiva sempre solicitada nas análises orientadas pela Lei de Responsabilidade Fiscal.

    Quais são esses dois e qual era o cenário preocupante? Eu sei e passo a ler:

A partir de 2011, o crescimento é contínuo dos recursos de supostas pedaladas.

    (Soa a campainha.)

    O SR. JOSÉ AGRIPINO (Bloco Social Democrata/DEM - RN) -

Em 2011, foram R$10 milhões de saques contra os bancos públicos; em 2012, R$15 bilhões, em 2013, R$30 bilhões; em 2014, R$55 bilhões; em 2015, R$60 bilhões. O crescimento do valor e do débito junto aos bancos públicos é apenas parte da ponta do iceberg de um fato maior. Em 2011, a dívida bruta do País estava em 55% do PIB, ou R$2 trilhões. No final de 2015, a dívida pulou para 66% do PIB, ou cerca de R$4 trilhões.

    Como o meu tempo está acabando, eu quero ir direto à pergunta. Suponho que Vossa Excelência conhecia estes números. Por que, como gestora chefe do País, não antecipou providências, atendendo a recomendações do Tesouro e do Tribunal de Contas da União que evitariam mandar para o Congresso proposta de ajuste fiscal que teve um claro objetivo de legalizar decretos sem cobertura congressual? É a pergunta que faço a Vossa Excelência.

    A SENHORA DILMA VANA ROUSSEFF - Sr. Senador Agripino, de fato, eu aqui estou sendo julgada por duas questões: decretos de crédito suplementar, sobre o que creio que fui bastante exaustiva ao responder ao nobre Senador Reguffe. Então, não podemos aqui, Senador, misturar uma coisa com a outra. O senhor vem falando de Plano Safra. É isso que está em questão. Pois bem, Senador, toda a alegação da Acusação é que Plano Safra é operação de crédito. Toda a opinião da Acusação, pelo menos a que está nos autos, considera que os decretos feriram a Constituição porque são operações de crédito, e é vedado - os decretos, não; desculpa, o Plano Safra - ao Governo Federal estabelecer relações de operação de crédito não autorizadas pelo Congresso com bancos públicos. É essa que é a questão.

    Ora, Senador, primeiro, a conta do senhor é muito estranha, porque o TCU apurou um valor de 55 bilhões ao final de 2015 como sendo todos os passivos pendentes. Se a gente for somar os dos senhores, deve dar uns 200 bilhões. Foram 55 bilhões a estimativa do TCU, e foram pagos, Senadores - foram pagos. Por quê? Essa é uma questão que, havendo autorização, se paga. O que acontece com essa questão do Plano Safra?

    Se vocês não concordam comigo, eu quero citar algumas instituições que afirmaram, ao longo do processo, que não é operação de crédito:

    1. Todo o corpo técnico do Ministério da Fazenda, do Planejamento, da AGU e da Casa Civil. Aliás, vale lembrar que a Secretaria do Tesouro afirmou isto em nota elaborada após o meu afastamento - não foi antes; foi após o meu afastamento - dizendo: não é operação de crédito.

    O Ministério Público do Distrito Federal disse: não é operação de crédito, e, se vão criminalizar a Presidenta da República no ano de 2015, que criminalizem todos, desde 2000.

    Os auditores da Serur do TCU, cuja opinião foi ignorada pelo comando daquela instituição.

    Grandes especialistas na matéria, como Heleno Torres, um advogado, da USP; Misabel Derzi, da UFMG; Carlos Nascimento, da Universidade de Pernambuco, e Ricardo Lodi, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, para citar alguns.

    Essa questão, Senador, se é ou não operação de crédito, é, no mínimo, controversa. A lei de 92 estabeleceu que se tratava de subvenção que a União faria ao Banco do Brasil.

    Por que não é operação de crédito? Porque a União não toma nada emprestado do Banco do Brasil. O Banco do Brasil empresta a produtores. O que nós fazemos é a equalização dos juros. Nós pagamos a diferença entre o juro de mercado e o juro que o Plano Safra estipula, após ouvido o Conselho Monetário Nacional, para as respectivas operações em que o Banco do Brasil vai ter com os produtores rurais.

    Neste processo, há diferenças em relação ao tamanho dos produtores, ao pagamento em dia dos produtores, há várias questões relativas aos produtores. Não é uma trivialidade apurar-se e pagar-se.

    Ao longo desse processo... Eu estou me referindo agora à declaração do Ministério Público Federal. Ao longo desse processo, do momento em que essa lei autorizou esse procedimento, uma lei de 1992 - posso até pegar o número para o senhor -, ninguém, nem o TCU, nem ninguém do Congresso, questionou se o processo seria esse, porque, se questionasse, teria havido um processo do TCU e a operação teria sido interrompida.

    Esse processo começa a ser questionado em abril de 2015. Como são 55 bilhões; e a suposição é que o TCU gostaria que nós pagássemos 55 bilhões a vista; e nós vivíamos uma situação de queda da arrecadação, nós entramos com pedido de reexame junto ao TCU. O TCU só decidirá, em definitivo, sobre a matéria em dezembro de 2015. Neste momento, o Governo faz uma pergunta ao TCU sobre as condições pelas quais, a partir daquele momento, nós não só deveríamos registrar isto que a lei dizia, que era uma autorização de subvenção da União, por meio do Banco do Brasil, perguntamos: devemos registrar? E por que não registaram antes? Pergunta o TCU. Não registramos antes, porque a metodologia do Banco Central não considerava isso nem tampouco dívida, nem tampouco impactando o resultado primário. Aí perguntamos: podemos pagar parcelado? O TCU levou um tempo para responder, e nós achamos que essa seria uma nova controvérsia e preferimos, Senador, pagar integralmente o passivo. Nós pagamos, na verdade, esses 55 mais 16, totalizando 71 bilhões. O que eram os 16? Era o devido neste momento pelo ano de 2015.

    Acredito, Senador, que este processo teve mudada a sua interpretação, o que não pode acontecer retroativamente. Não é possível que uma coisa venha sendo feita por todos os governos e que, um belo dia, o TCU diga: não é possível continuar fazendo, e isso signifique voltar para trás e não: daí para frente, não se poder fazer! Eu não tenho como voltar atrás e impedir que todos os atos praticados anteriormente sejam cancelados, eles não serão cancelados. É base da segurança jurídica o princípio da irretroatividade da lei - eu não posso retroagir.

    Então, Senador, essa foi uma discussão controversa. Ela não foi uma discussão tranquila, não era certo que era para fazer assim. Nós entramos com pedido de reexame. Eu não concordo, Senador, que se misture nessa questão que nós estamos discutindo outras questões que não estão pendentes, porque, se nós vamos discutir as outras questões que não estão pendentes, a gente para esse julgamento, discute essas questões e volta para o julgamento, porque o que tem de ser decidido é, primeiro, ao contrário do que dizem todos esses, incluindo o Ministério Público Federal do Distrito Federal, se foi com dolo, se foi porque, de repente, nós acreditamos que era assim, ou se essa era a praxe e que mudou no meio do jogo.

    O que nós afirmamos da defesa é que mudou no meio do jogo; mudaram a regra do jogo, quando estava no segundo tempo do jogo, e, aí, querem que a gente volte atrás não só para o primeiro tempo desse jogo, mas para o primeiro tempo de todos os jogos que, anteriormente, aconteceram. Por quê?

    Este não é, eu repito, não é um processo simples, tanto é que, depois de muita discussão, nós chegamos a um acordo. Daqui para a frente, serão seis meses para ter a proposta de pagamento, e, aí, tendo a proposta de pagamento, são cinco dias para pagar. Esta que foi a alteração. E isto, repito, começou em abril de 2015, - essa discussão - nessas condições que eu estou dizendo; não sou eu que só falo, falo das perícias, falo dos especialistas. Agora, além disso, além deste fato, tem um outro fato muito importante: não há retroatividade, não há por qualquer consideração legal correta. Então, se é daqui para a frente, que seja daqui para a frente.

    Quero lembrar que, daqui para a frente, nós saldamos todos os passivos, todos os passivos pendentes, e isso, Senador, num momento de maior dificuldade fiscal. Não era um momento de grande e de enorme margem de manobra fiscal, não era, e, mesmo assim, nós pagamos. Se fosse esse o entendimento passado, por que não pagaríamos quando havia melhores condições fiscais?

    Esta é uma questão que tem de ser analisada com a maior seriedade possível, porque ela integra a acusação. Eu sou acusada de duas coisas aqui: três decretos e as operações do Plano Safra, como sendo as chamadas pedaladas fiscais. E o mais interessante nesta história, Senador, é que não há - a perícia diz, todos dizem - um ato meu, porque a lei não mandava que assim fosse. A lei autorizava o Ministério da Fazenda, a partir do Conselho Monetário Nacional, a operar essa questão. A partir do momento em que não tem um ato meu neste processo, inventaram algo absolutamente kafkiano, que era a minha relação com o ex-Secretário do Tesouro, Arno Augustin. Diziam que a prova que eu participei era que não sabiam quando começava o Arno Augustin e quando eu começava. Nós éramos siameses.

    Ocorre, Senador, que tem aí uma profunda falha nesse processo, até porque, talvez, ele tenha sido feito com um impulso no sentido de me condenar. Qual é a falha? É que o Arno Augustin, Senador, tinha deixado o Governo em dezembro de 2014, tinha assumido a Secretaria do Tesouro o Saintive.

    Portanto, Senador, nem a Acusação foi capaz de reconhecer essa questão fantástica, que é a minha relação não com o Arno Augustin, mas com o Saintive. Eu estou sendo acusada de ser amiga do Arno Augustin num momento em que ele não era mais Secretário do Tesouro. Beira ao mais completo e integral absurdo.

    Muito obrigada, Senador.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 30/08/2016 - Página 84