Pela Liderança durante a 140ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Críticas ao Ministério Público por comportamento demonstrado em força-tarefa da operação Lava Jato envolvendo o nome do ex-Presidente Luís Inácio Lula da Silva.

Autor
Humberto Costa (PT - Partido dos Trabalhadores/PE)
Nome completo: Humberto Sérgio Costa Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Pela Liderança
Resumo por assunto
MINISTERIO PUBLICO:
  • Críticas ao Ministério Público por comportamento demonstrado em força-tarefa da operação Lava Jato envolvendo o nome do ex-Presidente Luís Inácio Lula da Silva.
Aparteantes
Ataídes Oliveira, Vanessa Grazziotin.
Publicação
Publicação no DSF de 20/09/2016 - Página 11
Assunto
Outros > MINISTERIO PUBLICO
Indexação
  • CRITICA, COMPORTAMENTO, PROCURADOR, MINISTERIO PUBLICO, AMBITO, OPERAÇÃO, POLICIA FEDERAL, INVESTIGAÇÃO, CORRUPÇÃO, PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS), REFERENCIA, LUIZ INACIO LULA DA SILVA, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA.

    O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, telespectadores da TV Senado, ouvintes que nos acompanham pela Rádio Senado, o Brasil assistiu estarrecido, na última quarta-feira, a mais um duro golpe contra os fundamentos do Estado de direito, dessa vez desferido diretamente por integrantes do Ministério Público, por setores que compõem o Ministério Público, instituição à qual cabe, constitucionalmente, a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.

    Pois foi exatamente contra tudo isso que o grupo do Procurador Deltan Dallagnol investiu pesadamente no desarrazoado espetáculo midiático da semana passada, em que escancarou a caçada implacável que tem empreendido contra o ex-Presidente Lula, nem que custe a própria credibilidade da Operação Lava Jato.

    Nós julgávamos que fatos lamentáveis dessa natureza estavam sepultados na nossa República desde aquela fatídica sessão em que a Câmara dos Deputados embalou para o Senado o golpe parlamentar contra a Presidenta Dilma. Mas não; o senso da sobriedade não chegou para todos, e uma vez mais nós vimos a democracia servir de tapete a pés desavisados.

    Pela primeira vez na nossa história, observamos a lei, as provas e o trabalho investigativo que devem fundamentar uma denúncia serem substituídos por um PowerPoint que virou piada até entre os críticos mais ferrenhos do PT.

    Foi essa apresentação - algo similar a um trabalho escolar produzido por um aluno de mediana dedicação aos estudos - que serviu de base para o mantra repetido à exaustão pelos procuradores de que Lula era o líder supremo ou o comandante máximo da organização criminosa ou, ainda, o general da "propinocracia", expressão cunhada também pela criatividade daquele grupo de integrantes do Ministério Público.

    Aliás, alguns jornais deram, inclusive, como notícia que a forma como aquela pretensa denúncia foi apresentada teria incomodado inclusive o Procurador-Geral da República, Rodrigo Janot. Não sabemos se isso é verdade ou não, mas o fato é que essa notícia foi veiculada. Acredito até que seja verdadeira, porque aquilo que aconteceu compromete lamentavelmente a imagem de um órgão tão importante como é o Ministério Público Federal.

    Pregaram isso como numa celebração religiosa. Falaram e falaram como quem entoa um cântico. Reiteraram cansativamente como se fizessem uma oração com a finalidade de doutrinar a plateia de jornalistas convidada a assistir a tudo numa sala de hotel alugada pelo dinheiro público para promover esse show particular. Todos foram convidados, salvo o bom direito. Esse não estava lá, não apareceu na apresentação dos procuradores em nenhum momento. Foi o grande ausente da festa da força-tarefa de Curitiba da Lava Jato.

    Como é que se acusa um indivíduo sem provas? Como é que se faz uma denúncia dessa gravidade baseada em convicções e não em elementos probatórios e argumentos fáticos?

    Nós ouvimos dos procuradores afirmações aterradoras ao direito. E aqui abro aspas para reproduzir uma delas: "não teremos aqui provas cabais de que Lula é o efetivo proprietário no papel do apartamento" - fecho aspas. Ou seja, não existem provas cabais, mas, mesmo assim, manda-se indiciar e denunciar um indivíduo, como se fosse proprietário daquele imóvel, por recebimento de supostas vantagens indevidas.

    Outra: os procuradores acusam Lula e D. Marisa de falsidade ideológica na assinatura de um contrato de compra de imóvel, do qual eles desistiram. Mas para que o contraditório se eu o desprezo? Disseram lá - e mais uma vez abro aspas: "isso por si só não levaria a uma conclusão peremptória, mas se torna ainda mais suspeito" - fecho aspas. Não se conclui nada em definitivo, não se prova nada, tudo é na base da suspeição. Mas quem precisa de conclusões peremptórias quando o que se quer é acusar, acusar, acusar, independentemente de provas?

    Isso lembra o Brasil da escravidão, em que havia o chamado crime de suspeição, evidentemente aplicado aos nossos negros, fossem eles escravos ou libertos. Bastava que a autoridade pública os considerasse suspeitos. Pronto; era o suficiente para aplicar a medida de segurança, que era a cadeia. E, se o indivíduo fosse forro, problema dele. Provasse ele, mesmo encarcerado, que era livre e não tinha cometido nada que o desabonasse. Estamos nós retrocedendo a esse período?

    Vejam mais: considerou-se Lula o comandante máximo da organização criminosa, o general do esquema batizado de propinocracia, como já disse aqui. Mas onde está a denúncia contra ele por formação de quadrilha, a exata tipificação em que se enquadra alguém acusado de cometer um crime dessa natureza, o de líder de organização criminosa? Ela não existe. Os procuradores não o denunciaram por isso, apesar de o terem acusado sobejamente do crime, citando o seu nome 121 vezes no espetáculo pirotécnico que promoveram. É mais um exemplo de que estamos diante de um ato ou de incompetência ou de extrema má-fé. E quero ressaltar que considero os membros do Ministério Público Federal muito competentes.

    No fim de semana, tomamos conhecimento de que o material enviado à Justiça pelos procuradores de Curitiba contra o ex-Presidente se pautava fortemente numa delação que foi cancelada - vejam bem, cancelada! - por ordem do Procurador-Geral da República. Mas aqueles membros do Ministério Público simplesmente ignoraram esse fato e tomaram discricionariamente como válido aquilo que foi invalidado pelo próprio chefe da PGR, informações que integram um esboço desconsiderado. Rasgaram, além de tudo, um princípio básico do direito que diz que aquilo que não está nos autos não está no mundo. E a delação que eles usaram para acusar Lula é absolutamente inexistente no mundo jurídico.

    Por outro lado, para os que bem observaram o conjunto de delações utilizadas para tentar incriminar o ex-Presidente Lula, muitas delas questionadas pelo próprio Ministério Público Federal, dado o teor contraditório dos réus confessos que colaboraram, sentiu-se falta de uma, naquela beleza do PowerPoint: justamente a de um delator que acusava Lula de o tratar por Paulinho, a do Sr. Paulo Roberto Costa.

    Os procuradores, sempre tão diligentes, abandonaram a juntada dessa delação, que é um dos epicentros da Lava Jato. No texto da denúncia, alterações de trechos sensíveis dela foram usadas com o objetivo deliberado de incriminar Lula. Hoje, não sou eu, é a Folha de S.Paulo que traz o registro do fato, mostrando que os procuradores denunciaram Lula por solicitar, aceitar promessa e receber vantagens indevidas do Sr. Paulo Roberto Costa. Mas o próprio Sr. Paulo Roberto sempre negou, categoricamente, essa afirmação em todos os depoimentos que prestou até hoje, incluindo a sua delação firmada com o Ministério Público.

    Então, eu pergunto: é lícito adulterar a fala de um réu para tentar incriminar alguém?

(Soa a campainha.)

    O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Eu queria perguntar aos procuradores de Curitiba se isso não poderia ser caracterizado como um crime de falsidade ideológica.

    Pois bem, Sr. Presidente, de forma que ficamos todos extremamente horrorizados com essa forma espetaculosa e desproporcional com que os membros do Ministério Público de Curitiba trataram um tema dessa gravidade, que envolve um ex-Presidente da República e sua família. E não é só pela sua condição de ex-Presidente da República, porque, independentemente disso, ele está submetido à lei como qualquer cidadão; e sempre esteve submetido a ela, mas, se trucidam a razão, a ponderação e o bom direito com um homem público que tem a dimensão política e popular de Lula, o que é que não se está disposto a fazer quando se quiser incriminar um brasileiro comum?

(Soa a campainha.)

    O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Não estamos aqui defendendo pessoas. Estamos aqui defendendo a democracia e o Estado de direito, que não podem ser pisoteados pela cruzada messiânica de alguns que se sentem ungidos para cumprir uma promessa divina, uma missão divina na Terra, à custa dos direitos e garantias fundamentais assegurados pela nossa Constituição.

    A falta de sobriedade vista na semana passada chocou todos, e fica evidente que todo esse espetáculo midiático serviu exatamente como cortina de fumaça para encobrir a fragilidade da denúncia apresentada. Como não existe a mínima consistência na acusação, a saída foi produzir uma peça teatral cheia de clichês para que a atuação afetada dos atores opacasse a tibieza do texto que interpretavam.

    Eu espero que o juiz Sérgio Moro, a quem foi distribuída a denúncia, aja com a imparcialidade e a parcimônia que faltaram aos procuradores. Ou isso ou estará destruído o edifício jurídico que erguemos no Brasil, no qual provas e fatos, e não convicções pessoais, são fundamentais para embasar o devido processo legal.

    Um País que já consumou um golpe político contra uma Presidenta democraticamente eleita não pode agora referendar um golpe jurídico sobre os direitos mais básicos e elementares de todos os cidadãos.

    É possível acusar, indiciar, denunciar, pronunciar, julgar e condenar qualquer um, independentemente da posição que ocupe na pirâmide social. É isso a que todos aspiramos, mas, sem provas, sem fatos e em inobservância à lei, estaremos autorizando que ilegalidades e crimes sejam oficialmente cometidos para que alguém seja enquadrado sem que nada de concreto lhe pese. Aparentemente, é um caminho mais fácil, principalmente quando usado contra nossos inimigos, mas é também o atalho mais promissor para a completa destruição dos direitos e garantias individuais e, consequentemente, da democracia.

(Soa a campainha.)

    O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Agradeço a V. Exª pela tolerância.

    Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/09/2016 - Página 11