Discurso durante a 140ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Críticas ao Ministério Público por comportamento demonstrado em força-tarefa da operação Lava Jato envolvendo o nome do ex-Presidente Luís Inácio Lula da Silva.

Autor
Gleisi Hoffmann (PT - Partido dos Trabalhadores/PR)
Nome completo: Gleisi Helena Hoffmann
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
MINISTERIO PUBLICO:
  • Críticas ao Ministério Público por comportamento demonstrado em força-tarefa da operação Lava Jato envolvendo o nome do ex-Presidente Luís Inácio Lula da Silva.
Publicação
Publicação no DSF de 20/09/2016 - Página 35
Assunto
Outros > MINISTERIO PUBLICO
Indexação
  • CRITICA, COMPORTAMENTO, PROCURADOR, MINISTERIO PUBLICO, AMBITO, OPERAÇÃO, POLICIA FEDERAL, INVESTIGAÇÃO, CORRUPÇÃO, PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS), REFERENCIA, LUIZ INACIO LULA DA SILVA, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA.

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Obrigada, Sr. Presidente.

    Srs. Senadores, Srªs Senadoras, quem nos acompanha pela TV Senado, pela Rádio Senado, não poderia ser outro o tema a me trazer a esta tribuna que não a violência praticada contra o ex-Presidente Lula, na terça-feira da semana passada.

    Alguns colegas aqui já falaram sobre a denúncia - que, no caso, não considero como uma denúncia - que foi apresentada à sociedade, mas, na realidade, um ato de condenação feito de forma cinematográfica em relação ao Presidente Lula por procuradores da Operação Lava Jato no Estado do Paraná.

    Realmente o Brasil ficou impactado. Não só o Brasil, o mundo ficou impactado. Aqueles que queriam ver a desgraça do Presidente Lula comemoraram - não podia ser de outra forma - o discurso político, a ação acusatória, a condenação e a punição pública do Presidente feita por jovens promotores de Curitiba.

    Mas os que acreditam no Estado de direito, os que acreditam na democracia ficaram estarrecidos diante do comportamento do Ministério Público Federal, coisa não vista em nenhum momento da nossa história.

    E os apoiadores do Presidente Lula, além de estarrecidos, ficamos todos indignados. Assistimos, na terça-feira, a um verdadeiro atentado à dignidade humana, à dignidade humana do Presidente Lula, da D. Marisa, da sua família, posto que o que se viu naquele dia não foi uma denúncia como deve proceder o Ministério Público.

    E não estou aqui falando que o Ministério Público não deve dar publicidade dos seus atos. Pode, sim, convocar uma coletiva de imprensa; pode, sim, dar publicidade aos seus atos, mas tem que se basear pela tecnicidade, pela juridicidade, pela objetividade.

    O que vimos na terça-feira foi uma depreciação do papel do Ministério Público, um desrespeito a essa instituição, que todos nós respeitamos e defendemos. Mas não acredito que aqueles procuradores, naquele momento, representavam essa instituição, que é tão importante para a democracia de um País. A forma como um dos procuradores se referiu ao Presidente Lula não atenta só contra a dignidade dele; atenta contra a nossa Constituição, contra os Códigos de Processo, contra o Estado democrático de direito.

    Foram usados adjetivos, acusações que não têm base, que não têm prova. Foi feito um discurso político afirmando que o Presidente Lula era chefe de uma quadrilha, era chefe de uma quadrilha de criminosos, de uma organização criminosa. Adjetivou-se o Presidente Lula, a sua família, de todos os tipos. Fez-se um discurso político, eminentemente político, através de um PowerPoint que não dizia nada.

    Aliás, nas bolinhas, havia temas como expressividade, poder de decisão. O que isso tem a ver com uma acusação? O que se via era apenas o PowerPoint com o nome do Presidente Lula no meio e uma série de setas apontadas para ele. Se as pessoas não ouvissem as acusações, se não lessem o que estava ali, apenas sabiam que o Presidente Lula estava sendo flechado. E aquelas flechas apontavam exatamente para a sua culpabilidade.

    Mas qual não foi a surpresa, quando a denúncia foi formalizada: nem organização criminosa, nem formação de quadrilha estavam entre os crimes. Mas esses são crimes tipificados na nossa legislação, inclusive na lei que fala sobre as organizações criminosas.

    Há uma diferença incrível entre o que foi dito e a denúncia efetivada. A denúncia efetivada era sobre a possível propriedade por parte do Presidente Lula de um apartamento no Guarujá; e também sobre o possível benefício que ele teria recebido de uma empreiteira por guardar os seus bens, aqueles que recebeu de presente como Presidente da República.

    Em relação a essa denúncia, o outro Promotor, também, candidamente diz: "Não temos provas cabais, mas temos convicção." Ora, que brincadeira é essa contra o Estado de direito brasileiro, contra a democracia brasileira? Isso não se faz num país que se pretende democrático.

    Como é que nós vamos aceitar um show pirotécnico como foi esse de terça-feira? Bem disse a Senadora Vanessa, aqui, que deixou estarrecidos, inclusive, aqueles que apoiam o Governo atual, que apoiam intransigentemente a Lava Jato e que não querem ver o Presidente Lula se candidatar novamente em 2018, de tão pífia que foi a acusação. Para os senhores terem uma ideia, até agora esses jovens procuradores - jovens procuradores! -, não deram sequer entrevista para explicar o que fizeram e por que fizeram.

    Não há problema nenhum, vou dizer novamente, em tornar pública uma denúncia do Ministério Público. Pode-se convocar a imprensa, sim, pode-se fazer a exposição, mas ela tem de ter base, tem de ter fatos, tem de ter provas. Isso nada mais foi do que uma ação política, eminentemente política, para justificar algo que vinha sendo dito, que teriam de condenar o Presidente Lula. Quiçá quiseram pedir a prisão do Presidente. Realmente não havia condições.

    Nós estamos voltando, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, à Idade Média, onde a convicção bastava para que alguém fosse julgado e condenado.

    Lembro aqui - não posso esquecer! - os ensinamentos da grande Rose Marie Muraro, que, quando falava sobre a queima das bruxas na Idade Média, dizia que a igreja tinha um manual. Eu fui ler esse manual e, de fato, era - chamava-se O Martelo das Feiticeiras - um manual de como deviam ser torturadas as mulheres para delas obter a confissão e de como as provas, ainda que não fossem provas fáticas, tinham que ser levadas à presença do juiz, para que depois as mulheres fossem queimadas.

    É isso que nós estamos revivendo na nossa sociedade! Nós não podemos achar que é normal, como Senadores e como Senadoras - ainda que parte de V. Exªs não goste do Presidente Lula, não goste do PT, queira acabar com o PT, não queira que o Lula seja reeleito, ainda assim! Porque, se nós jogarmos no lixo as conquistas que nós tivemos no Estado de direito, nós vamos estar jogando no lixo a democracia, mas, sobretudo, o direito que dá base para que nós estejamos aqui hoje, fazendo o debate neste País. Portanto, é muito grave o que aconteceu.

    E aí eu pergunto: teremos PowerPoint para outros indiciados, acusados, inquiridos na Operação Lava Jato? Quantos mais vão ter a primazia de ser expostos em rede de TV, rede nacional, e ficar por uma tarde inteira sendo espezinhados pelo Ministério Público, sendo julgados? Porque ali não foi a apresentação de uma denúncia - falou-se da denúncia, que não conseguiu ser colocada com os fatos e com as provas -, mas foi, sobretudo, um julgamento, uma decisão, uma condenação e já uma penalização.

    O Presidente Lula fez muito bem em vir quarta-feira a público para se defender, defender a sua história, defender o seu legado, defender o que fez por este País. E eu estou falando aqui com muitos Senadores e Senadoras que, mesmo sendo oposição ao que foi o governo Lula e ao que foi o governo Dilma, mesmo sendo contrários ao PT e mesmo apoiando hoje este Governo ilegítimo que está aí, sabem o legado que o Presidente Lula deixou.

    Agora mesmo o Senador Elmano veio aqui para falar da grave seca que assola o Nordeste brasileiro e que também assola outras regiões do País. Eu queria lembrar qual foi a cruzada que fez o presidente Lula para enfrentar a seca no Nordeste brasileiro, no Sertão nordestino: a iniciativa de fazer a transposição do São Francisco, a iniciativa de fazer um programa de cisternas, a iniciativa de fazer poços artesianos, a iniciativa de levar empresas e indústrias para a Região Nordeste ter sustentabilidade, de fazer o Bolsa Família, de dar aumento ao salário mínimo, um conjunto de ações que melhorou o nosso País.

    Talvez devessem julgar o Lula, sim, julgar em rádio e televisão, mas dizer também o seu legado.

(Soa a campainha.)

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) - Ter a coragem, a hombridade, a decência de conhecer um pouco de História.

    Seria bom que esses meninos, esses jovens procuradores, que se acham arautos da moralidade, defensores da coisa pública, que acham que vão resgatar e redimir o País da corrupção, conhecessem a História de 500 anos deste País e o que se fez durante 500 anos para o povo brasileiro. Aí talvez poderiam - poderiam! - se colocar para fazer um discurso político.

    Não tenho nada contra discurso político - estamos em uma democracia e pode-se fazer. Mas o Ministério Público não é lugar de fazer discurso político. E a apresentação de uma denúncia não pode ser um discurso político.

    O Presidente Lula falou do seu legado, falou das conquistas, falou do que fez para este Brasil. O Presidente Lula, com altivez, falou do que fez para a área social, para a área do desenvolvimento econômico, para o funcionalismo público.

    E qual foi a reação quando...

(Interrupção do som.)

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) - Obrigada, Presidente.

    Qual foi a reação, quando o Presidente Lula questionou esses jovens procuradores de se colocarem como tão sábios ou como tão acima de tudo que temos, inclusive da lei, eles que dizem que todos têm que ser subjugados à lei, que dizem que funcionários públicos concursados não poderiam se sobrepor por serem concursados a quem presta um concurso político e se submete, de quatro em quatro anos, ao voto... Fizeram uma campanha no funcionalismo público para dizer que o presidente Lula era contra os servidores públicos, mas servidor público tem recordação, tem consciência, sabe que quem falou que servidor público era marajá não foi o presidente Lula; sabe que quem falou que servidor público não gostava de trabalhar não foi o presidente Lula. O presidente Lula, pelo contrário, valorizou o serviço público, contratou mais de 230 mil servidores, abriu novas universidades, melhorou as relações das políticas efetivas de Estado, ou seja, colocou o Estado brasileiro para funcionar. Esses procuradores deveriam saber disso.

    Nós sempre tivemos muita consideração e respeito pelo Ministério Público Federal. Consideramos que são guardiões da lei, fiscais da lei, mas não podem se comportar como estão se comportando. Essas atitudes que temos visto, principalmente atitudes lá de Curitiba, desmerecem o Ministério Público, transformam o nosso respeito e a nossa consideração em temeridade, em questionamento sobre a seriedade e o embasamento das denúncias que o Ministério Público está fazendo sobre todo mundo. Porque se é para fazer um show midiático, se é para fazer disso uma disputa política, então, não é no Ministério Público que nós vamos resolver esse problema.

    Não achem e não acusem que é porque temos medo de haver investigação. Não temos medo de haver investigação.

(Soa a campainha.)

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) - Aliás, se nós do PT tivéssemos medo de sermos investigados, o presidente Lula na sua gestão e a presidenta Dilma também na sua gestão, gestões do PT, não teriam criado tantos mecanismos de transparência e de apoio a investigações neste País. Foi o Lula que criou a Controladoria-Geral da União, que agora teve seu papel alterado; foi o Lula que começou o fortalecimento do Ministério Público e da Polícia Federal; foi o Lula que criou o Portal da Transparência, a publicização dos atos; foi Lula e Dilma que criaram a Lei de Acesso à Informação, a Lei das Organizações Criminosas, que permitiu essas delações, a Lei do Colarinho Branco.

    Não houve neste País governo, não houve neste País governo que mais proporcionou condições para fazer investigação aqui no Brasil sobre a Administração Pública e sobre a gestão - não houve! E agora...

(Interrupção do som.)

(Soa a campainha.)

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) - Para terminar. Está sendo vítima da má utilização desses instrumentos.

    Esperamos, sinceramente, que o Ministério Público, que tem como papel fiscalizar e proteger os princípios e interesses fundamentais da sociedade, o faça. Por isso, o seu funcionamento é independente de qualquer dos três Poderes: Executivo, Legislativo e Judiciário. Como uma instituição com tal responsabilidade na democracia, é totalmente absurdo, abusivo, fora dos parâmetros democráticos que membros dos seus quadros façam juízos morais e políticos cada vez que convocam uma coletiva e apresentam uma denúncia.

    Pedimos, com veemência, que o Ministério Público cumpra o seu papel e que os meninos de Curitiba se deem ao respeito, respeitem a Constituição, respeitem as leis e respeitem a História deste País!


Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/09/2016 - Página 35