Discurso durante a 143ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Críticas aos empréstimos e investimentos subsidiados concedidos pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) a grandes empresas nacionais e a países estrangeiros durante o Governo do Partido dos Trabalhadores.

Autor
Alvaro Dias (PV - Partido Verde/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ECONOMIA:
  • Críticas aos empréstimos e investimentos subsidiados concedidos pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) a grandes empresas nacionais e a países estrangeiros durante o Governo do Partido dos Trabalhadores.
Publicação
Publicação no DSF de 28/09/2016 - Página 5
Assunto
Outros > ECONOMIA
Indexação
  • COMENTARIO, PRISÃO, ANTONIO PALOCCI, EX MINISTRO DE ESTADO, RESULTADO, OPERAÇÃO, POLICIA FEDERAL, INVESTIGAÇÃO, CORRUPÇÃO, PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS), RELAÇÃO, DESVIO, OPERAÇÕES OFICIAIS DE CREDITO, EMPRESTIMO, BANCO NACIONAL DO DESENVOLVIMENTO ECONOMICO E SOCIAL (BNDES), BENEFICIARIO, EMPRESA NACIONAL, PAIS ESTRANGEIRO, ANGOLA, CUBA, VENEZUELA, EQUADOR, PERU, ARGENTINA, CRITICA, UTILIZAÇÃO, BANCO OFICIAL, INTERESSE, POLITICO, ATENÇÃO, SIGILO, INFORMAÇÕES, OPERAÇÃO FINANCEIRA, GOVERNO ESTRANGEIRO, PROJETO DE LEI DO SENADO (PLS), AUTOR, ORADOR, COMBATE, INFORMAÇÃO SIGILOSA, APRESENTAÇÃO, DADOS, BALANÇO FINANCEIRO, BANCO DE DESENVOLVIMENTO.

    O SR. ALVARO DIAS (Bloco Social Democrata/PV - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidente, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, ontem, em mais uma fase da Operação Lava Jato, discutiu-se a forma com que a força-tarefa vem investigando e conduzindo os seus trabalhos.

    O que se procurou destacar, além, evidentemente, da prisão de um ex-ministro, foi o pronunciamento de um ministro do atual Governo, o Ministro da Justiça, na tentativa de desviar o foco do fato principal.

    Alguns procuraram dar repercussão maior ao que disse o Ministro da Justiça, em Ribeirão Preto, às razões que levaram o Ministro Palocci à prisão. O que nós constatamos é que o Ministro da Justiça pode ter, evidentemente, cometido um ato falho, um equívoco, ao responder questões referentes à Operação Lava Jato, pressionado que foi por um movimento popular. Admite-se o equívoco do Ministro, mas é um equívoco certamente insignificante, diante da grandeza dos fatos que levaram o ex-Ministro Palocci à prisão.

    O que nós queremos considerar é a relação dessa prisão com empréstimos concedidos pelo BNDES. Creio que é relevante fazer esta relação. É importante destacar este fato. Desde 2005, se não me falha a memória, nós estamos comparecendo reiteradamente a esta tribuna para abordar aquilo que consideramos desvio de finalidade nas operações de crédito realizadas pelo BNDES. O BNDES tornou-se um instrumento basilar na construção do que se denominou campeãs nacionais à política de fomento, à formação de conglomerados empresariais, multinacionais brasileiras, grandes o suficiente para competir globalmente, que foi levada a cabo por meio de grandes empréstimos do BNDES, subsidiados pelos pagadores de impostos no Brasil, política que hoje já se constata que foi um fracasso.

    A imprensa divulgou que uma das razões da prisão do ex-Ministro fora o pagamento de propina em troca da aprovação de uma medida provisória. Divulgou-se equivocadamente que aquela medida provisória autorizava empréstimo ao exterior. Não, aquela medida provisória não autorizava empréstimo ao exterior. Se não me falha a memória, a Medida Provisória nº 460 tratava de desoneração. Ela concedia, portanto, benefícios, no campo da desoneração, a empresas brasileiras. O que autoriza o empréstimo ao exterior é o anexo do Decreto nº 4.418, de 2002, que contém o estatuto social da empresa pública, o BNDES.

    Os governos que se sucederam fizeram diversas modificações no estatuto do BNDES. Uma delas o Decreto nº 6.322, de 2007, assinado pelo então Presidente Lula, que modificou o estatuto para incluir como função do Banco - abro aspas -: "[...] financiar a aquisição de ativos e investimentos realizados por empresas de capital nacional no exterior, desde que contribuam para o desenvolvimento econômico e social do País." Uma redação, portanto, subjetiva e abrangente.

    Concomitantemente às modificações no estatuto do BNDES, grandes aportes financeiros foram realizados pelo Tesouro Nacional ao banco. De 2008 a 2014, como já destacamos aqui inúmeras vezes, foram repassados ao caixa do BNDES cerca de R$716 bilhões, sendo R$470 bilhões do Tesouro Nacional e o restante de recursos do FGTS, do FAT e do PIS/Pasep, portanto recursos dos trabalhadores brasileiros. Foram repassados, no ano de 2008, R$159 bilhões do FAT, PIS/Pasep e FGTS; em 2014, o valor acumulado chegou a R$243 bilhões. Já os aportes do Tesouro foram de R$43 bilhões, em 2008, e o acumulado, em 2014, chegou a R$473 bilhões, como afirmei anteriormente. Somadas as duas fontes, portanto, chegamos aos R$716 bilhões.

    Para fazer aportes ao BNDES, o Tesouro Nacional emitiu títulos, pagando juro básico, hoje, de 14,25%. Depois, emprestou ao BNDES com juro igual à TJLP, hoje, de 7,5%, mas, entre 2012 e 2014, ficou entre 5% e 6%. Com esta diferença de 14,25% a 5% e 6%, o Tesouro Nacional, ou melhor, o contribuinte brasileiro sai perdendo. Sai perdendo o trabalhador, porque os recursos que têm origem no FGTS, no FAT e no PIS/Pasep são remunerados muito aquém da remuneração corriqueira no mercado, e perde outra vez o contribuinte brasileiro, porque acaba subsidiando essa diferença entre o juro pago pelo Governo e o juro pago pela empresa beneficiada com empréstimo do BNDES ou pelo país beneficiado com empréstimo do BNDES.

    Aliás, é bom dizer o que significa isso em valor, em número. Até 2060, o contribuinte brasileiro pagará em subsídios pelas operações do BNDES, realizadas entre 2008 e 2014, o valor de R$184 bilhões, montante que poderá ser bem maior, visto que poderá ocorrer que nem todos os que contrataram esses empréstimos, que foram agraciados, portanto, com esses benefícios, pagarão ao banco. Esses recursos não retornarão. Refiro-me não só a empresas como também a países. Nós já temos exemplos de países que não pagam os empréstimos tomados junto ao nosso País. E, recentemente, tivemos o perdão de dívidas de países da África, exatamente para que eles possam contrair conosco novos empréstimos.

    Com estrutura normativa aplainada e caixa robusto, o BNDES se tornou uma poderosa instituição de financiamento com alta ingerência do Poder Executivo em suas políticas. Essa característica, somada ao crescente volume de empréstimos subsidiados e liberação dos mesmos, segundo critérios questionáveis, tornou o BNDES um atraente espaço onde instalar a corrupção.

    Aproveitando essa estrutura normativa, adotou-se uma política internacional com atuação mais incisiva em países da África e da América Central, que receberam diversos investimentos do BNDES subsidiados pelo contribuinte brasileiro. São tantos os países que se beneficiaram de forma inusitada! Inclusive, alguns deles com a prática do empréstimo sigiloso, até então desconhecido.

    Surpreendemo-nos com a informação, em determinado momento, de que Angola e Cuba seriam países beneficiados com empréstimos sigilosos. E essa tentativa de obter informações a respeito desses empréstimos foi uma tentativa sempre frustrada porque se alegava que esses empréstimos foram concedidos sigilosamente em atendimento aos dispositivos legais daqueles países, ou seja, em respeito à legislação daqueles países, evidentemente em desrespeito à legislação do nosso País, já que a nossa Lei Maior, a Constituição Federal, impõe transparência e publicidade dos atos públicos.

    Não há paralelo em outras instituições financeiras importantes em outros países. Podemos citar o Banco Mundial (Bird). São bancos que financiam nações, que concedem empréstimos externos, mas nunca sigilosamente. Não há o sigilo bancário para empréstimos celebrados entre nações.

    É propósito de um projeto que apresentei, já aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça e que deve ter prosseguimento a sua tramitação; projeto que impõe o fim do sigilo bancário para empréstimos, transações entre nações. Dinheiro público envolvendo a Nação e outro país é dinheiro que tem que ser do conhecimento da população brasileira, do contribuinte, que paga impostos, em relação à sua aplicação e ao seu destino; à sua origem e o seu destino. Não há por que não conferir publicidade a esses atos da Administração Pública, e não há, portanto, por que preservar o sigilo bancário nessas circunstâncias.

    Com a 35ª fase da Operação Lava Jato, intitulada Omertà, a população conheceu o conteúdo de uma planilha apreendida pela Polícia Federal, um registro que indica que, entre 2008 e final de 2013, foram pagos mais de R$128 milhões a partidos políticos, agentes públicos, incluindo o ex-Ministro Antonio Palocci. Curiosamente, o período identificado pela Polícia Federal como profícuo para o pagamento de propinas não difere daquele em que o BNDES funcionou como poderosa instituição de financiamento, com alta ingerência do Poder Executivo.

    Nós temos aqui uma tabela que mostra a evolução dos aportes adicionais do Tesouro para o BNDES. Esses aportes aumentaram significativamente, se nós consideramos de 2008 até 2014.

    Este gráfico mostra a evolução ascendente desses aportes de forma expressiva, recursos públicos com subsídios que chegarão a R$160 bilhões, como dissemos, até 2060, bancando esses empréstimos privilegiados grandes empresas amigas dos detentores do poder e nações também amigas dos detentores do poder.

    O outro gráfico mostra exatamente o desembolso do BNDES de 1995 a 2014, evolução excepcional que mostra o gráfico. Isso, sobretudo, envolvendo nações amigas dos governantes do Brasil.

    Um outro gráfico mostra a evolução dos valores captados por empresas de obras públicas em contratos com o BNDES. Para operações no exterior, entre 2007 e 2014, também há uma evolução excepcional.

    Temos um outro gráfico que mostra desonerações tributárias e renúncias fiscais que contribuíram para o desequilíbrio fiscal e que também são suspeitas de servirem de instrumentos de captação de propina por meio de venda de medidas provisórias. E é isso o que está em investigação.

    Somados os anos de 2012, 2013 e 2014, as desonerações atingiram R$104 bilhões. Sem dúvida, uma causa essencial da crise fiscal vivida pelo País e do maior rombo na história da Administração Pública brasileira, nas finanças governamentais.

    É essa a referência essencial no que diz respeito a essa fase da Operação Lava Jato, a 35ª fase.

    Chega-se aos empréstimos vultosos do BNDES não só a empresas nacionais, mas a outras nações.

    Em determinado momento, Senador Cristovam Buarque, após um discurso que pronunciamos desta tribuna sobre empréstimos concedidos à Venezuela, recebi um telefonema do representante da Transparência Internacional no Brasil, e ele alertava para o fato de que esses empréstimos contribuíam para o comprometimento de compromissos assumidos pelo Brasil com outras nações, de combater a corrupção internacional, porque esses empréstimos alimentavam a corrupção em outras nações, já que empréstimos concedidos por meio de empreiteiras de obras públicas que realizavam obras em outros países quase sempre sem o critério rigoroso exigido para as licitações públicas, porque prevalecia, obviamente, quem levava os recursos para a execução da obra. Portanto, compromissos assumidos pelo nosso País com outras nações em eventos internacionais, em documentos celebrados de responsabilidade recíproca, foram desonrados pelo nosso País ao alimentar a corrupção em outras nações com empréstimos favorecidos,...

(Soa a campainha.)

    O SR. ALVARO DIAS (Bloco Social Democrata/PV - PR) - ... empréstimos a Cuba, a Angola, à Venezuela, ao Equador, ao Peru, à Argentina, gerando emprego certamente em outros países, mas alimentando a corrupção internacional em detrimento dos interesses do nosso País, já que mergulhamos o País numa crise sem precedentes, com a inflação, com a recessão, com o desemprego, com o caos na saúde, com o retrocesso na educação, com segurança pública temerária, um crescimento econômico pífio. Enfim, a causa certamente é esse modelo, é esse sistema de governança de promiscuidade que elege o balcão de negócios como caminho para a solução dos problemas nacionais e que determina o aparelhamento do Estado, com o loteamento dos cargos, abrindo as portas para a corrupção desenfreada.

    Certamente, esta Operação Lava Jato, aplaudida pela maioria dos brasileiros e criticada por alguns, está estabelecendo o marco de um novo rumo para o Brasil, já que, obviamente, temos razões para acreditar que essa indignação que campeia solta de norte a sul do Brasil, essa revolta que foi contida e que extravasou nas ruas do País depois de muito tempo exige não apenas a substituição de pessoas, mas exige, acima de tudo, a substituição desse modelo, exige a mudança da cultura política no nosso País, exige a mudança em relação a conteúdo, a atitude, a comportamento.

    Eu imagino que a classe política tem um papel preponderante agora, na esteira da experiência adquirida com os últimos fatos, especialmente na esteira da experiência que se adquire agora com a revelação de fatos estarrecedores através da Operação Lava Jato. É responsabilidade da classe política determinar a mudança de rumos em nosso País.

    Sr. Presidente, nós acreditamos sim que o Brasil tem jeito e que as mudanças ocorrerão. É um país à espera de reformas, e a reforma essencial e prioritária, eu repito, muito mais do que a reforma do sistema, é a substituição dele, a substituição desse sistema promíscuo de governança por um sistema que estabeleça uma relação republicana entre os Poderes, atendendo as expectativas do povo brasileiro.

    Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/09/2016 - Página 5